Decisão nº 101951 de STF. Supremo Tribunal Federal, 1 de Febrero de 2010

Data01 Fevereiro 2010
Número do processo101951

Desição

DECISÃO HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO EM FLAGRANTE PELA SUPOSTA PRÁTICA DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CAUTELAR IDÔNEA DA DECISÃO QUE NEGOU O PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. LIMINAR INDEFERIDA NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. Relatório 1. Habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado pelos advogados DAVID TEIXEIRA DE AZEVEDO, MORONI MORGADO MENDES COSTA, SANDRO LÍVIO SEGNINI e ANDRÉ DIAS DE AZEVEDO, em favor de WILLIAM ROBERTO LEITE, contra decisão do Ministro Haroldo Rodrigues, do Superior Tribunal de Justiça, que, em 10.9.2009, expôs o caso e indeferiu o pedido de medida liminar requerido no Habeas Corpus 153.099. 2. Tem-se, nos autos, que o Paciente foi preso em flagrante no dia 30.9.2009, por ter sido encontrado com ele 2,5 gramas de substância entorpecente conhecida como “crack”, acondicionada em 13 invólucros plásticos. Assim, foi lavrado Auto de Prisão em Flagrante pela prática, em tese, da infração prevista no art. 33 da Lei 11.343/06 (tráfico de drogas), fls. 26-40. Foi requerido ao Juízo de primeiro grau que relaxasse a prisão em flagrante ou concedesse liberdade provisória ao Paciente, o que foi negado em 8.10.2009 (fl. 114). Em 14.10.2009, o Ministério Público ofereceu denúncia contra o Paciente atribuindo-lhe a conduta descrita no art. 33, caput, c.c. art. 40, inc. III, ambos da Lei n. 11.343/06 (tráfico de drogas nas imediações de estabelecimento de ensino), fls. 117-119. Novo pedido de relaxamento da prisão em flagrante ou, alternativamente, liberdade provisória foi feito no dia 19.10.2009 (fls. 124-133) e, novamente, indeferido no dia 21.10.2009 (fl. 137). 3. Contra essa decisão o Paciente impetrou o Habeas Corpus 990.09.286606-0 no Tribunal de Justiça de São Paulo, Relator o Des. Eduardo Braga, que em 27.10.2009 indeferiu a liminar requerida, nos termos seguintes: “Os impetrantes interpõem a presente ordem de HABEAS CORPUS em favor dos paciente acima nomeado, alegando que ele está sofrendo constrangimento ilegal por parte do MM(a) Juiz(a) de Direito da 19ª Vara Criminal, Fórum Central Criminal Barra Funda, da comarca de Guarulhos, conforme Processo n. 1601/2009. Buscam os impetrantes, em favor do paciente, o benefício da liberdade provisória, bem como o relaxamento do flagrante, o que foi denegado em primeiro grau. Afirmam que o paciente é viciado em drogas e não traficante. Que a quantidade de entorpecente encontrada na posse do paciente foi de apenas 2,5 gramas, ou seja, quantidade ínfima, portanto, não destinada ao comércio. Requereu liminar. FICA INDEFERIDA A LIMINAR. Destarte, não é possível, por ora, data vênia, deferir liminarmente a ordem, mesmo porque, a medida liminar em HABEAS CORPUS só é cabível quando o constrangimento ilegal é manifesto e detectado de imediato, o que não se percebe no caso em comento. Melhor que ulteriormente seja examinado o mérito do presente pedido. Requisitem-se informações, com urgência. Com a resposta, abra-se vista à Douta Procuradoria-Geral de Justiça” (fl. 151). 4. Impetrou-se, então, em favor do Paciente, o Habeas Corpus 153.099 no Superior Tribunal de Justiça, sobrevindo a decisão objeto da presente impetração, com os fundamentos seguintes: “Tratam os autos de habeas corpus deduzido em favor de William Roberto Leite, indicada como autoridade coatora o Tribunal de Justiça de São Paulo, objetivando a concessão da liberdade provisória ao paciente. A liminar, na via eleita, não tem previsão legal, sendo criação da jurisprudência para casos em que a urgência, necessidade e relevância da medida se mostrem evidenciadas de forma indiscutível na própria impetração e nos elementos de prova que a acompanham. Não vislumbro, neste juízo preliminar, o fumus boni juris necessário à concessão da medida de urgência, exigindo a verificação do alegado constrangimento uma análise mais percuciente dos elementos de convicção contidos nos autos, o que ocorrerá por ocasião do julgamento de mérito. Assim, indefiro a liminar. Solicitem-se informações ao Tribunal de origem e ao Juiz de primeiro grau, abrindo-se, após, vista dos autos ao Ministério Público Federal” (fl. 175). 5. No presente habeas corpus, os Impetrantes reiteram as questões suscitadas no Superior Tribunal de Justiça e defendem que: “embora o art. 44 da Lei de Tóxicos tenha trazido vedação à liberdade provisória para o crime do art. 33, a lei 11.464/2007, posterior, alterou o art. 2º, II, da Lei dos Crimes Hediondos para revogar a proibição à liberdade provisória para o crime, entre outros, de tráfico ilícito de entorpecentes. Desse modo, o Magistrado pode determinar o relaxamento da prisão, ou ainda conceder liberdade provisória. Além disso, as decisões do Juízo do Departamento de Inquéritos Policiais (doc. 1 fls. 90), do Juízo da 19ª Vara Criminal Central de São Paulo (doc 3, fls. 14) foram sucintas e fundamentaram-se apenas na gravidade abstrata do crime de tráfico de drogas” (fl. 8). 6. Requerem, assim, “seja deferido o pedido liminar para urgente deferimento da liberdade provisória e expedição de alvará de soltura para o paciente. No mérito, a concessão da ordem para que se mantenha a liminar até o julgamento definitivo da ordem de habeas corpus impetrada perante o Superior Tribunal de Justiça” (fl. 23). Examinada a matéria posta à apreciação, DECIDO. 7. A presente ação não oferece fundamentação jurídica que possibilite o seu regular prosseguimento no Supremo Tribunal Federal, uma vez que há outra ação de habeas corpus idêntica, pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça. A decisão questionada é monocrática e tem natureza precária, desprovida, portanto, de conteúdo definitivo. Nela, o Ministro Haroldo Rodrigues indeferiu tão somente a liminar requerida, por entender ausentes os requisitos para o acolhimento do pedido, requisitou informações ao Tribunal de Justiça de São Paulo e ao juízo de primeiro grau e determinou, ainda, o encaminhamento dos autos ao Ministério Público Federal, a fim de que, instruídos os autos, houvesse o regular prosseguimento do habeas corpus até o seu julgamento. Além disso, o pedido formulado na presente ação é idêntico ao que foi apresentado no Superior Tribunal de Justiça, que examinou tão somente o requerimento do pedido de medida liminar pleiteado. O que se pediu no Superior Tribunal de Justiça ainda não se exauriu nem em seu exame nem em sua conclusão. A jurisdição ali pedida está pendente, e o Superior Tribunal de Justiça está atuando de modo a prestar a jurisdição pleiteada. Inequívoca, portanto, é a incidência na espécie da Súmula 691 do Supremo Tribunal (“Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar”). 8. A jurisprudência do Supremo Tribunal tem admitido, em casos excepcionais e em face de circunstâncias fora do ordinário, o temperamento na aplicação daquela súmula. Tal excepcionalidade fica demonstrada nos casos em que se patenteie flagrante ilegalidade ou afronta a princípios constitucionais ou legais na decisão questionada, o que não se tem na espécie em pauta, não sendo, pois, o caso de se cogitar daquela flexibilização. Sem adentrar no mérito da impetração, mas apenas para afastar a alegação de estar-se diante de caso excepcional, ressalte-se que a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, na qual os elementos que a determinaram foram explicitados pelo Desembargador de maneira clara, comprova o pleno atendimento da legislação processual penal vigente - o que, de resto, foi confirmado pelo Superior Tribunal de Justiça. Trata-se, na espécie, de prisão em flagrante por suposto envolvimento do Paciente com tráfico ilícito de entorpecentes. A orientação do Supremo Tribunal firmou-se no sentido de que não cabe liberdade provisória no caso de prisão em flagrante por esse tipo de delito. A propósito, no julgamento do Habeas Corpus 93.302, de minha relatoria, DJe 9.5.2008, a Primeira Turma do Supremo Tribunal assentou que: “2. A proibição de liberdade provisória, nos casos de crimes hediondos e equiparados, decorre da própria inafiançabilidade imposta pela Constituição da República à legislação ordinária (Constituição da República, art. 5º, inc. XLIII): Precedentes. O art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.072/90 atendeu o comando constitucional, ao considerar inafiançáveis os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos. Inconstitucional seria a legislação ordinária que dispusesse diversamente, tendo como afiançáveis delitos que a Constituição da República determina sejam inafiançáveis. Desnecessidade de se reconhecer a inconstitucionalidade da Lei n. 11.464/07, que, ao retirar a expressão ‘e liberdade provisória’ do art. 2º, inc. II, da Lei n. 8.072/90, limitou-se a uma alteração textual: a proibição da liberdade provisória decorre da vedação da fiança, não da expressão suprimida, a qual, segundo a jurisprudência deste Supremo Tribunal, constituía redundância. Mera alteração textual, sem modificação da norma proibitiva de concessão da liberdade provisória aos crimes hediondos e equiparados, que continua vedada aos presos em flagrante por quaisquer daqueles delitos. 3. A Lei n. 11.464/07 não poderia alcançar o delito de tráfico de drogas, cuja disciplina já constava de lei especial (Lei n. 11.343/06, art. 44, caput), aplicável ao caso vertente. 4. Irrelevância da existência, ou não, de fundamentação cautelar para a prisão em flagrante por crimes hediondos ou equiparados: Precedentes. 5. Licitude da decisão proferida com fundamento no art. 5º, inc. XLIII, da Constituição da República, e no art. 44 da Lei n. 11.343/06, que a jurisprudência deste Supremo Tribunal considera suficiente para impedir a concessão de liberdade provisória. Ordem denegada”. Aliás, o entendimento no sentido de ser vedada a concessão de liberdade provisória aos presos em flagrante por tráfico de drogas tem sido acolhido por ambas as Turmas do Supremo Tribunal (v.g., HC 93.653, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 27.6.2008; HC 93.991, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 27.6.2008; HC 92.495, Rel. Min. Ellen Gracie, DJe 13.6.2008; HC 94.521-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 1º.8.2008; HC 92.874, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 20.6.2008; HC 92.757, Rel. Min. Menezes Direito, DJe 25.4.2008; e HC 93.300, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe 25.4.2008). 9. Acrescente-se, ainda, que a jurisprudência do Supremo Tribunal firmou-se no sentido de que “A presença de condições subjetivas favoráveis ao paciente não obsta a segregação cautelar, desde que presentes nos autos elementos concretos a recomendar sua manutenção, como se verifica no caso presente" (HC 94.465, Rel. Min. Menezes Direito, DJ 15.5.2009). 10. Na espécie vertente, as circunstâncias expostas na inicial e os documentos juntados comprovam ser imprescindível prudência na análise e na conclusão do que se contém no pleito, porque não se pode permitir, sem qualquer fundamentação, a supressão da instância a quo. Ora, a decisão liminar e precária proferida pelo Ministro Haroldo Rodrigues, do Superior Tribunal de Justiça, não exaure o cuidado do que posto a exame, estando a ação, ali em curso, a aguardar julgamento definitivo. Nesse sentido: “EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. IMPETRAÇÃO CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU LIMINAR NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA: INCIDÊNCIA DA SÚMULA 691 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. EXCEPCIONALIDADE NÃO DEMONSTRADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A decisão questionada nesta ação é monocrática e tem natureza precária, desprovida, portanto, de conteúdo definitivo. Não vislumbrando a existência de manifesto constrangimento ilegal, incide, na espécie, a Súmula 691 deste Supremo Tribunal (‘Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar’). Precedentes. 2. Agravo regimental não provido” (HC 90.716-AgR, de minha relatoria, DJ 1º.6.2007). E, ainda, “Ementa: HABEAS CORPUS - OBJETO - INDEFERIMENTO DE LIMINAR EM IDÊNTICA MEDIDA - VERBETE Nº 691 DA SÚMULA DO SUPREMO. A Súmula do Supremo revela, como regra, o não-cabimento do habeas contra ato de relator que, em idêntica medida, haja implicado o indeferimento de liminar” (HC 90.602, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 22.6.2007). Confiram-se, ainda, entre outros: HC 89.970, de minha relatoria, DJ 22.6.2007; HC 90.232, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 2.3.2007; e HC 89.675-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, DJ 2.2.2007. 11. De se realçar, também, que a requisição de informações pelo Relator no Superior Tribunal de Justiça impõe se reconheça a deficiência do pedido ali apresentado, fundamento, em tese, suficiente para o reconhecimento de haver razões jurídicas para o indeferimento de liminar e o seguimento regular da ação no Superior Tribunal de Justiça. 12. Por fim, não procede a alegação dos Impetrantes de que o Paciente é dependente químico e de que a droga encontrada com o ele seria para o seu uso pessoal, uma vez que é consolidado o entendimento deste Supremo Tribunal no sentido de que a verificação do acerto ou desacerto das decisões proferidas pelas instâncias antecedentes, neste caso, dependeria de reexame do conjunto fático-probatório, o que é juridicamente impossível de ocorrer nos limites constitucionais do habeas corpus. 13. Pelo exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus por manifestamente incabível, nos termos do art. 38 da Lei n. 8.038/90 e do art. 21, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, ficando prejudicado, por óbvio, o pedido de liminar. Publique-se. Brasília, 1º de fevereiro de 2010. Ministra CÁRMEN LÚCIA Relatora

Partes

Reclte.(s) : Estado do Ceará

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral do Estado do Ceará

recldo.(a/S) : Juiz de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Fortaleza (Processo Nº 2007.0033.9940-9/0)

intdo.(a/S) : Elieser Ribeiro de Oliveira

adv.(a/S) : Jefferson Rodrigues dos Santos

Publicação

DJe-027 DIVULG 11/02/2010 PUBLIC 12/02/2010

Observação

Legislação Feita por:(Mdc)

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