Processo nº 2007.042.012329-8 de Oitava Câmara Criminal, 4 de Mayo de 2010

Número do processo0012453
Data04 Maio 2010
Originating Docket Number2007.042.012329-8


Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 1

TRIBUNAL DE JUSTIÇA OITAVA CÂMARA CRIMINAL RECURSO EM SENTIDO ESTRITO N.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

RELATOR: Desembargador Gilmar Augusto Teixeira RECORRENTE: PEDRO LUIZ DE MIRANDA MACK RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO 1: JOSÉ ADILSON MARQUES BEVILACQUA ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO 2: LUCIANA FARACO DE CAROLIS RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIOS CONSUMADOS, COM DOLO EVENTUAL, EM CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO E OMISSÃO DE SOCORRO, EM CONCURSO FORMAL IMPRÓPRIO. RECURSO DA DEFESA TÉCNICA TRAZENDO, EM PRELIMINAR: EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO DO MAGISTRADO E VIOLAÇÃO AO PRINCIPIO DA IDENTIDADE FÃSICA DO JUIZ; NO MÉRITO: DESEJO DE DESPRONÚNCIA, POR NÃO PROVADOS OS ELEMENTOS DO CRIME DOLOSO, HAVENDO, NO MÁXIMO, EM TESE,

DELITOS CULPOSOS, EM HOMENAGEM AO PRINCÃPIO DA ESPECIALIDADE, QUE LEVARIAM A DESCLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES. DO AGRAVO RETIDO: O recorrente, após as alegações finais do Ministério Público, requereu diligências, que foram indeferidas, apresentando recurso de agravo retido, com requerimento expresso de julgamento antes do apelo. Recurso de Agravo que não se conhece, posto que inexistente na seara processual penal este Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 2 recurso contra decisão que indeferiu diligências, no procedimento do júri, na primeira fase, e logo após a apresentação das alegações finais do Ministério Público, que, diga-se de passagem, não possuÃa previsão legal. PRIMEIRA PRELIMINAR: Quanto à exceção de suspeição do magistrado, a matéria já foi objeto de apreciação, através do processo n'º 2009.056.00025, onde foi rejeitada liminarmente por este relator, posto que o motivo alegado, vale repisar, que o magistrado seria suspeito porque a mãe de uma das vÃtimas do delito é escrivã de outra vara criminal na mesma Comarca, e que os juÃzes se revezam em tabelamento, não é hipótese prevista no art. 254, do C.P.P. Preliminar Rejeitada. SEGUNDA PRELIMINAR: A segunda preliminar diz respeito a alegada inobservância do princÃpio da identidade fÃsica do juiz. Para espancar a alegação de ausência de nulidade, o Ministério Público argumenta que tal princÃpio não é aplicável na espécie, posto que somente utilizável quando se tratar de sentença, não sendo a pronúncia uma sentença, mas uma decisão interlocutória mista. A assertiva não seduz o relator por duplo motivo: O primeiro legal, qual seja, a determinação contida no '§ 5'º, do art. 394, do CPP, da aplicabilidade subsidiária das disposições do procedimento ordinário aos procedimentos especiais, sumário e sumarÃssimo, sendo que o '§ 2'º, do art.

399, do CPP é inerente ao procedimento comum ordinário. Em segundo lugar, em face de interpretação teleológica, posto não Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 3 haver lógica que o referido princÃpio não se aplique aquele que concluiu a instrução nas hipóteses de crimes dolosos contra a vida e que, por força da imediação em relação à s pessoas cujos depoimentos e declarações foram por ele colhidos, com a oitiva de testemunhas, ofendidos, peritos e interrogatórios, tudo garantido pelo contato direto e a oralidade, não estivesse bem mais capacitado do que qualquer outro para proferir a decisão de pronúncia, impronúncia, desclassificatória ou de absolvição sumária. O princÃpio da identidade fÃsica do magistrado está diretamente ligado à oralidade e a imediação entre ele e os demais, razão pela qual a ele incumbe decidir. A oralidade tem como escopo possibilitar o magistrado avaliar pessoalmente a lide, a forma como as partes se desincumbiram na realização da prova, restando sem sentido se a decisão fosse proferida por outra pessoa fÃsica diversa daquela que colheu a prova. Por outro lado, note-se que a Lei n'º 11.689/08 também estabeleceu, para os crimes dolosos contra a vida, procedimento diverso do anterior, fazendo com que a audiência de colheita da prova seja una. Adotou o princÃpio da concentração, o que significa dizer que, ao menos em tese, eis que previsto em lei, agora o procedimento envolve uma única audiência para oitiva de todos os personagens do processo, com alegações finais orais e decisão a ser proferida em seguida aos debates. Aqui está oportunizada a oralidade e a identidade fÃsica do juiz. Por tais razões, deve o princÃpio também ser compreendido, como Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 4 aplicável, em tais hipóteses. De outro lado, mesmo que tal não seja o entendimento, no caso em julgamento, a magistrada que realizou o interrogatório e colheu a prova foi uma, mas o julgador que proferiu a decisão interlocutória foi outro. No entanto, a instrução findou em abril de 2008, quando o princÃpio ainda não era previsto em lei, enquanto a decisão interlocutória foi prolatada em março de 2009, quando já estava em vigor a nova redação do art. 399, do CPP. Ocorre que a magistrada que realizou a instrução foi removida do juÃzo, que ficou vago de 09 de maio de 2008 até 03 de março de 2009, quando assumiu a titularidade o magistrado que proferiu o deciso atacado.

Independentemente de qualquer discussão sobre o conflito de leis no tempo, é certo que não se pode exigir que magistrado removido do juÃzo venha a proferir decisão em processo cuja instrução tenha realizado. Embora haja omissão quanto a tal ponto no '§ 2'º, do art. 399, do CPP, a doutrina vem se posicionando sobre a possibilidade de aplicação da analogia ou interpretação extensiva com o Código de Processo Civil, no concernente ao disposto no art. 132, daquele diploma, para concluir que o princÃpio da identidade fÃsica do juiz fica excetuado quando o magistrado estiver convocado, licenciado, afastado por qualquer motivo, promovido ou aposentado. Por esses argumentos, deve a preliminar ser rejeitada. NO MÉRITO, não há dúvida da ocorrência da conduta fática, do resultado e nexo de causalidade. O que se discute é a Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 5 existência, na conduta, do dolo eventual ou da culpa. Da prova coligida podem ser extraÃdos alguns indÃcios, a saber: Há testemunho no sentido de que o pronunciado desenvolvia elevada e excessiva velocidade do veÃculo que conduzia, sendo que o local permitia a velocidade máxima de 40km/h, enquanto tais indÃcios chegam a acusar velocidade superior a 100km/h.

Há também testemunho de que o pronunciado, antes do embate contra as vÃtimas, não reduziu ou desviou, sendo que uma delas foi lançada a uma distância superior a 12 metros.

Após o ocorrido, não diminuiu a velocidade, fugindo do local.

Não há marcas de frenagem. O fato ocorreu à s 5 h, tendo o recorrente saÃdo de uma boate, onde, segundo encarte de consumo de bebidas com o seu nome, ele teria consumido dose de whisky 8 anos e energético. O Laudo pericial aponta ausência de obstáculo à visibilidade do agente em relação ao local do fato. A conjugação de todos estes dados permite ao magistrado encontrar o que se denomina de indÃcios do dolo eventual para os crimes de homicÃdio na forma narrada na denúncia. Estes indÃcios existem porque estão presentes todos os fatos de eficácia probatória. Vale afirmar, não estamos diante da hipótese, isto em relação ao recorrente, de azar ou falsificação do fato indicador. Há certeza processual da relação de causalidade entre o fato indicador e o indicado, bem como presença de pluralidade de indÃcios. Além do mais, conjugados, levam à uma certeza do fato investigado, pois são precisos e Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N Ú N C I A L 6 concorrem harmonicamente a indicar o mesmo fato, o que permite consolidar, em razão do forte nexo lógico, a conclusão sobre a possibilidade de existência do dolo eventual na conduta do agente. É certo que há um grande embate e uma dificuldade, no campo probatório, pois no campo das idéias doutrinárias é mais fácil, saber quando se está diante da hipótese de dolo eventual ou culpa consciente. É muito simples afirmar que o 'querer' o resultado é o dolo direto, enquanto o 'assumir' pertence ao eventual, finalizando por pontificar que na culpa consciente, tal qual no dolo eventual, existe a previsibilidade do resultado, mas neste ele é assumido, arcado ou avocado, o que não ocorre com aquela. No entanto, no mundo da prova, onde quase nunca há confissão do elemento subjetivo ou normativo, o exegeta deve se valer das diversas circunstâncias que lhe são ofertadas para chegar a uma conclusão, isto se o caso concreto lhe permitir. Não podemos olvidar que a análise do meio utilizado pelo agente e que, com a sua conduta, levou-o ao resultado, é por demais importante. Na prática de toda a conduta que sempre é finalisticamente dirigida à realização de uma vontade, seja lÃcita ou não, há sempre a escolha de determinado meio ou meios para a consecução do fim almejado. Assim, teremos um elemento informativo probatório muito sério para chegarmos à conclusão da existência do dolo eventual quando, segundo o plano do agente, a realização de um tipo for reconhecida como possÃvel, sem que tal Recurso em Sentido Estrito n.'º 0012453-52.2007.8.19.0042

P R O N à N C I A L 7 reconhecimento oriente o agente a renunciar o seu projeto de ação. Aceitar o risco do resultado significa concordar que os meios escolhidos por ele podem levar ao resultado e, mesmo assim, não renunciar ao prosseguimento de sua conduta. E nem se diga que um pensamento do tipo 'vamos deixar ao acasoâ afaste o dolo eventual. Ao inverso, é sinônimo de assunção do resultado. Para que se desloque a solução do dolo eventual para a culpa consciente deve haver respaldo nos dados objetivos da confiança na evitação...

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