Acórdão nº 2007/0001795-0 de T4 - QUARTA TURMA

Data10 Agosto 2010
Número do processo2007/0001795-0
ÓrgãoQuarta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.796 - PR (2007⁄0001795-0)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄AP)
RECORRENTE : C.D.B.D.A.
ADVOGADO : WALTER BORGES CARNEIRO E OUTRO
ADVOGADOS : ÂNGELAB.M.
VINICIUSD.F.T. E OUTRO(S)
RECORRIDO : D.D.B.S.L.
ADVOGADO : FERNANDO ROCHA FILHO E OUTRO

EMENTA

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO. VALIDADE DE CLÁSULA. CESSAÇÃO DE ATIVIDADE DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS. NÃO-RENOVAÇÃO APÓS O TÉRMINO DO PRAZO PACTUADO, MEDIANTE PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Senhores Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ⁄AP), conhecer parcialmente do recurso especial, e nessa parte, dar-lhe provimento, divergindo do voto do Sr. Ministro Luis Felipe Salomão, Relator, que não conheceu do recurso especial, e os votos dos Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior e João Otávio de Noronha, no mesmo sentido da divergência, a Turma, por maioria, conheceu em parte do recurso especial e, nessa parte, deu-lhe provimento.

Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ⁄AP). Vencido o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Votaram com o Sr. Ministro Honildo Amaral de Mello Castro (Desembargador convocado do TJ⁄AP) os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior e J.O. deN.

Não participou do julgamento o Sr. Ministro Raul Araújo Filho.

Brasília, 10 de agosto de 2010(Data do Julgamento)

MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄AP)

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.796 - PR (2007⁄0001795-0)

RECORRENTE : C.D.B.D.A.
ADVOGADO : WALTER BORGES CARNEIRO E OUTRO
ADVOGADOS : ÂNGELAB.M.
VINICIUSD.F.T. E OUTRO(S)
RECORRIDO : D.D.B.S.L.
ADVOGADO : FERNANDO ROCHA FILHO E OUTRO

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

  1. Distribuidora de Bebidas Santiago Ltda ajuizou em face de Indústria de Bebidas Antarctica Polar S⁄A (antiga denominação de Companhia de Bebidas das Américas - AMBEV) ação de indenização por perdas e danos, inclusive morais, lucros cessantes e fundo de comércio, cumulada com apuração de encargos financeiros e repetição de indébito.

    A autora noticiou que é distribuidora exclusiva da marca "Antarctica", nos dez municípios do Estado do Paraná listados na inicial, durante 20 (vinte) anos sucessivamente. Alega que a exclusividade na distribuição foi imposta pela ré e que, a partir do ano de 1.995, em razão do projeto de autoria da requerida, denominado "Projeto Excelência 2.000", foi obrigada a realizar vultuosos investimentos, como aquisição de computadores, aumento do número de funcionários, bem como a remuneração destes, padronização da frota de caminhões, e aplicação de programas de controle de estoque, entre outros. Sustenta que a própria designação "Projeto Excelência 2.000" denuncia a intenção de preparação e a certeza de manutenção dos distribuidores para o próximo milênio. Assevera, assim, que os investimentos geraram a falsa impressão acerca da continuidade do contrato de distribuição no milênio que se descortinava.

    Aduz que, malgrado os investimentos realizados, a ré veio, "ano após ano, diminuindo substancialmente o fornecimento e a variedade dos produtos destinados à comercialização pela distribuidora autora e, ao mesmo tempo, vem prestigiando distribuidores vizinhos e supermercados da região, seja através de condições mais favoráveis de prazo e preço na aquisição dos produtos destinados à revenda, seja no tocante ao pleno abastecimento das mercadorias por eles requisitadas, proporcionando concorrência desleal" (fls. 42⁄43).

    Por outro lado, durante a vigência do contrato, a ré teria cobrado da autora, ilegalmente, encargos financeiros e juros remuneratórios superiores ao limite permitido (6% ao ano), mostrando-se, ademais, abusiva a cobrança da "verba de propaganda", a qual teria ocorrido sem nenhum benefício à autora e sem qualquer prestação de contas (fl. 81)

    Decorridos aproximadamente 03 (três) anos da implantação do "Projeto Excelência 2.000", alegadamente sem qualquer justificativa negocial, a ré notificou extrajudicialmente a autora, na data de 03.06.98, que em 25.01.99 cessaria a vigência do contrato de distribuição, servindo a notificação de aviso de que não havia mais interesse por parte da ré na manutenção do pacto (fls. 45⁄46).

    A presente ação tem, portanto, o seguinte desiderato (fls. 85⁄86):

    1. indenização por danos patrimoniais e extrapatrimoniais sofridos com a resolução do contrato de distribuição;

    2. indenização decorrente da frustração das expectativas geradas pela implementação do Projeto Excelência 2.000 e pelo corte de fornecimento, abrangendo lucros cessantes, danos emergentes, inclusive os relativos a venda direta realizada pela Ré;

    3. indenização relativa ao fundo de comércio desenvolvido pela Autora, ao longo dos vinte anos de atuação no mercado;

    4. ressarcimento relativo a recompra de vasilhames, benfeitorias imobilizadas, despesas com rescisões de contratos de trabalho;

    5. indenização pelo abalo moral do nome comercial da autora, pela discriminação comercial, pelas vendas diretas, pela prática de abuso do poder econômico e pela cobrança de encargos indevidos;

    6. indenização pelo dano patrimonial e extrapatrimonial decorrente da invasão de área e supressão de área de atuação da distribuidora autora, incentivado pela ré, inclusive lucros cessantes e danos emergentes;

    Ajuizou-se, ademais, medida cautelar inominada, visando à manutenção do fornecimento dos produtos à autora, nas mesmas condições dos seus distribuidores, enquanto perdurar a ação principal, tendo sido, com efeito, concedida a liminar requerida (fl. 703).

    O Juízo de Direito da 17ª Vara Cível da comarca de Curitiba julgou improcedentes os pedidos contidos na cautelar e na ação principal, revogando, por consequência, a liminar concedida. (fls. 701⁄718)

    Em grau de apelação, todavia, a sentença foi reformada para se julgar parcialmente procedentes os pedidos, nos termos da ementa ora transcrita:

    APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS FIRMADOS AO LONGO DE MAIS DE 20 (VINTE) ANOS - DENÚNCIA UNILATERAL PELA CONCEDENTE - ABUSIVIDADE - PRINCÍPIO DA BOA-FÉ - PREJUÍZOS DECORRENTES DA DESATIVAÇÃO OU PERDA DE UTILIDADE DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS DA CONCESSIONÁRIA - INDENIZAÇÃO - DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES. INDENIZAÇÃO CUMULATIVA DECORRENTE DE INVASÃO DE ÁREA - VENDAS DIRETAS DA FÁBRICA PRATICADAS NO TERRITÓRIO DA DISTRIBUIDORA - DESLEALDADE COMERCIAL. DIREITO À REPETIÇÃO DE VALORES PAGOS - COBRANÇA DE ENCARGOS NAS VENDAS À PRAZO PELA CONCEDENTE ACIMA DO LIMITE DE 12% (DOZE POR CENTO) AO ANO - PRINCÍPIO DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO - PRÁTICA USURÁRIA LEGALMENTE VEDADA. GASTOS COM PUBLICIDADE E PROPAGANDA - DESENVOLVIMENTO DA MARCA JUNTO AO MERCADO - RESSARCIMENTO PARCIAL DEFERIDO À DISTRIBUIDORA. FUNDO DE COMÉRCIO - NÃO RECONHECIMENTO DA PERDA DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL COMO BEM INCORPÓREO - PROSSEGUIMENTO DAS ATIVIDADES DA CONCESSIONÁRIA. DANO MORAL DECORRENTES DO TÃO SÓ DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES CONTRATUAIS - NÃO CONFIGURAÇÃO. APURAÇÃO DOS VALORES EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA.

    Apelo parcialmente provido.

  2. Tratando-se de contrato de distribuição de longa e ininterrupta duração, não pode a parte concedente, a quem não mais interessava o seu prosseguimento, furtar-se do dever de responder pelos danos sobrevindos à concessionária pelo rompimento unilateral da avença, sob pena de fazer tábua (sic) rasa do princípio geral da boa-fé informador das relações contratuais, dos próprios textos legais e também de soluções proeter legem, nos casos omissos. O nexo de causalidade entre o ato unilateral de rompimento do contrato e os prejuízos conseqüentes, até aqui suportados apenas pela distribuidora, está perfeitamente delineado, merecendo acolhimento o pedido de condenação da concedente no pagamento de indenização pela ruptura do pacto de distribuição de bebidas, a abranger os danos emergentes e os lucros cessantes.

  3. Embora os contratos firmados garantissem exclusividade à distribuidora, na respectiva região geográfica, apurou-se a ocorrência de vendas diretas pela fábrica a preços inferiores, com violação do contrato e dos princípios da boa-fé e da lealdade comercial. A conduta predatória da concedente, verdadeira concausa do declínio das vendas da distribuidora, informa o dever de indenizar.

  4. A função social do contrato não permite tolerar taxas de juros ou encargos cobrados pelos contratantes, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente, superiores a 12% (doze por cento) ao ano. A cobrança acima deste limite, por pessoa física ou jurídica que não integre o sistema bancário nacional, tipifica crime de usura a ser punido nos termos da lei.

  5. Não merece acolhimento o pedido de indenização do fundo de comércio desenvolvido pela distribuidora, ao longo dos 20 (vinte) anos de atuação no mercado, quando não restou concretizada a perda do estabelecimento comercial como bem incorpóreo, nem houve a cessão completa de suas atividades de distribuição.

  6. Embora se admita ser a pessoa jurídica passível de sofrer dano moral (STJ, Súmula nº 227), não merece acolhimento o pedido de indenização por abalo do nome comercial e dano moral da distribuidora, em decorrência de discriminação comercial sofrida em relação aos demais distribuidores, vendas diretas, prática de abuso do poder econômico e cobrança de valores exigíveis, porquanto o descumprimento de cláusulas contratuais, por si só, não constitui razão suficiente para caracterizar dano à honra objetiva de pessoa jurídica, assim entendida a mácula à sua imagem, admiração, respeito e credibilidade no comércio frente aos clientes e fornecedores. (fls. 810⁄812)

    Opostos embargos de declaração, foram eles rejeitados (fls. 848⁄856).

    Sobreveio, assim, recurso...

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