Acórdão nº 2009/0062779-8 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2009/0062779-8
Data16 Dezembro 2010
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 1.132.743 - RS (2009⁄0062779-8)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
AGRAVANTE : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
AGRAVADO : L.C.A.L.
ADVOGADO : MARINA TEREZINHA WEIAND LINDEN E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PIS⁄COFINS. COMPENSAÇÃO. TRIBUTO SUJEITO À LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. ARTIGO 4º DA LC 118⁄2005. DETERMINAÇÃO DE APLICAÇÃO RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONTROLE DIFUSO. CORTE ESPECIAL. RESERVA DE PLENÁRIO. (RECURSO REPETITIVO - RESP 1.002.932-SP). PIS E COFINS. INCIDÊNCIA SOBRE RECEITAS TRANSFERIDAS PARA OUTRAS PESSOAS JURÍDICAS. LEI N.º 9.718⁄91, ART. 3º, § 2º, III. NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA. AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO.

  1. As normas jurídico-tributárias admitem a dicotomia entre as cognominadas leis de eficácia limitada ou condicionada. Consoante a doutrina do tema, "as normas de eficácia limitada são de aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a eficácia.". Isto porque, "não revestem dos meios de ação essenciais ao seu exercício os direitos, que outorgam, ou os encargos, que impõem: estabelecem competências, atribuições, poderes, cujo uso tem de aguardar que a Legislatura, segundo o seu critério, os habilite a se exercerem".

  2. A lei 9.718⁄91, art. 3º, § 2º, III, optou por delegar ao Poder Executivo a missão de regulamentar a aplicabilidade desta norma. Destarte, o Poder Executivo, competente para a expedição do respectivo decreto, quedou-se inerte, sendo certo que, exercendo sua atividade legislativa constitucional, houve por bem retirar a referida disposição do universo jurídico, através da Medida Provisória 1991-18⁄2000, numa manifestação inequívoca de aferição de sua inconveniência tributária.

  3. Conquanto o art. 3º, § 2º, III, da Lei supracitada tenha ostentado vigência, careceu de eficácia, ante a ausência de sua imprescindível regulamentação. Assim, é cediço na Turma que "se o comando legal inserto no artigo 3º, § 2º, III, da Lei n.º 9718⁄98 previa que a exclusão de crédito tributário ali prevista dependia de normas regulamentares a serem expedidas pelo Executivo, é certo que, embora vigente, não teve eficácia no mundo jurídico, já que não editado o decreto regulamentador, a citada norma foi expressamente revogada com a edição de MP 1991-18⁄2000".

  4. Deveras, é lícito ao legislador, ao outorgar qualquer benefício tributário, condicionar o seu gozo. Tendo o legislador optado por delegar ao Poder Executivo a tarefa de estabelecer os contornos da isenção concedida, também essa decisão encontra amparo na sua autonomia legislativa.

  5. Conseqüentemente, "não comete violação ao artigo 97, IV, do Código Tributário Nacional o decisório que em decorrência deste fato, não reconhece o direito de o recorrente proceder à compensação dos valores que entende ter pago a mais a título de contribuição para o PIS e a COFINS.

    "In casu", o legislador não pretendeu a aplicação imediata e genérica da lei, sem que lhe fossem dados outros contornos como pretende a recorrente, caso contrário, não teria limitado seu poder de abrangência."

  6. O princípio da irretroatividade impõe a aplicação da LC 118, de 9 de fevereiro de 2005, aos pagamentos indevidos realizados após a sua vigência e não às ações propostas posteriormente ao referido diploma legal, posto norma referente à extinção da obrigação e não ao aspecto processual da ação correspectiva.

  7. O advento da LC 118⁄05 e suas conseqüências sobre a prescrição, do ponto de vista prático, implica dever a mesma ser contada da seguinte forma: relativamente aos pagamentos efetuados a partir da sua vigência (que ocorreu em 09.06.05), o prazo para a repetição do indébito é de cinco a contar da data do pagamento; e relativamente aos pagamentos anteriores, a prescrição obedece ao regime previsto no sistema anterior, limitada, porém, ao prazo máximo de cinco anos a contar da vigência da lei nova.

  8. Isto porque a Corte Especial declarou a inconstitucionalidade da expressão "observado, quanto ao art. 3º, o disposto no art. 106, I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional", constante do artigo 4º, segunda parte, da Lei Complementar 118⁄2005 (AI nos ERESP 644736⁄PE, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 06.06.2007).

  9. Deveras, a norma inserta no artigo 3º, da lei complementar em tela, indubitavelmente, cria direito novo, não configurando lei meramente interpretativa, cuja retroação é permitida, consoante apregoa doutrina abalizada:

    "Denominam-se leis interpretativas as que têm por objeto determinar, em caso de dúvida, o sentido das leis existentes, sem introduzir disposições novas. {nota: A questão da caracterização da lei interpretativa tem sido objeto de não pequenas divergências, na doutrina. Há a corrente que exige uma declaração expressa do próprio legislador (ou do órgão de que emana a norma interpretativa), afirmando ter a lei (ou a norma jurídica, que não se apresente como lei) caráter interpretativo. Tal é o entendimento da AFFOLTER (Das intertemporale Recht, vol. 22, System des deutschen bürgerlichen Uebergangsrechts, 1903, pág. 185), julgando necessária uma Auslegungsklausel, ao qual GABBA, que cita, nesse sentido, decisão de tribunal de Parma, (...) Compreensão também de VESCOVI (Intorno alla misura dello stipendio dovuto alle maestre insegnanti nelle scuole elementari maschili, in Giurisprudenza italiana, 1904, I,I, cols. 1191, 1204) e a que adere DUGUIT, para quem nunca se deve presumir ter a lei caráter interpretativo - "os tribunais não podem reconhecer esse caráter a uma disposição legal, senão nos casos em que o legislador lho atribua expressamente" (Traité de droit constitutionnel, 3a ed., vol. 2o, 1928, pág. 280). Com o mesmo ponto de vista, o jurista pátrio PAULO DE LACERDA concede, entretanto, que seria exagero exigir que a declaração seja inseri da no corpo da própria lei não vendo motivo para desprezá-la se lançada no preâmbulo, ou feita noutra lei.

    Encarada a questão, do ponto de vista da lei interpretativa por determinação legal, outra indagação, que se apresenta, é saber se, manifestada a explícita declaração do legislador, dando caráter interpretativo, à lei, esta se deve reputar, por isso, interpretativa, sem possibilidade de análise, por ver se reúne requisitos intrínsecos, autorizando uma tal consideração.

    (...)

    ... SAVIGNY coloca a questão nos seus precisos termos, ensinando: "trata-se unicamente de saber se o legislador fez, ou quis fazer uma lei interpretativa, e, não, se na opinião do juiz essa interpretação está conforme com a verdade" (System des heutigen romischen Rechts, vol. 8o, 1849, pág. 513). Mas, não é possível dar coerência a coisas, que são de si incoerentes, não se consegue conciliar o que é inconciliável. E, desde que a chamada interpretação autêntica é realmente incompatível com o conceito, com os requisitos da verdadeira interpretação (v., supra, a nota 55 ao n° 67), não admira que se procurem torcer as conseqüências inevitáveis, fatais de tese forçada, evitando-se-lhes os perigos. Compreende-se, pois, que muitos autores não aceitem o rigor dos efeitos da imprópria interpretação. Há quem, como GABBA (Teoria delta retroattività delle leggi, 3a ed., vol. 1o, 1891, pág. 29), que invoca MAILHER DE CHASSAT (Traité de la rétroactivité des lois, vol. 1o, 1845, págs. 131 e 154), sendo seguido por LANDUCCI (Trattato storico-teorico-pratico di diritto civile francese ed italiano, versione ampliata del Corso di diritto civile francese, secondo il metodo dello Zachariæ, di Aubry e Rau, vol. 1o e único, 1900, pág. 675) e DEGNI (L'interpretazione della legge, 2a ed., 1909, pág. 101), entenda que é de distinguir quando uma lei é declarada interpretativa, mas encerra, ao lado de artigos que apenas esclarecem, outros introduzido novidade, ou modificando dispositivos da lei interpretada. PAULO DE LACERDA (loc. cit.) reconhece ao juiz competência para verificar se a lei é, na verdade, interpretativa, mas somente quando ela própria afirme que o é. LANDUCCI (nota 7 à pág. 674 do vol. cit.) é de prudência manifesta: "Se o legislador declarou interpretativa uma lei, deve-se, certo, negar tal caráter somente em casos extremos, quando seja absurdo ligá-la com a lei interpretada, quando nem mesmo se possa considerar a mais errada interpretação imaginável. A lei interpretativa, pois, permanece tal, ainda que errônea, mas, se de modo insuperável, que suplante a mais aguda conciliação, contrastar com a lei interpretada, desmente a própria declaração legislativa." Ademais, a doutrina do tema é pacífica no sentido de que: "Pouco importa que o legislador, para cobrir o atentado ao direito, que comete, dê à sua lei o caráter interpretativo. É um ato de hipocrisia, que não pode cobrir uma violação flagrante do direito" (Traité de droit constitutionnel, 3ª ed., vol. 2º, 1928, págs. 274-275)." (Eduardo Espínola e Eduardo Espínola Filho, in A Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, Vol. I, 3a ed., págs. 294 a 296).

  10. Consectariamente, em se tratando de pagamentos indevidos efetuados antes da entrada em vigor da LC 118⁄05 (09.06.2005), o prazo prescricional para o contribuinte pleitear a restituição do indébito, nos casos dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, continua observando a cognominada tese dos cinco mais cinco, desde que, na data da vigência da novel lei complementar, sobejem, no máximo, cinco anos da contagem do lapso temporal (regra que se coaduna com o disposto no artigo 2.028, do Código Civil de 2002, segundo o qual: "Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.").

  11. Desta sorte, ocorrido o pagamento antecipado do tributo após a vigência da aludida norma jurídica, o dies a quo do prazo prescricional para a...

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