Acórdão nº 2010/0078649-7 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2010/0078649-7
Data17 Fevereiro 2011
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.193.160 - RS (2010⁄0078649-7)

RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : J.J.F.
ADVOGADO : CAIO MARTINS LEAL E OUTRO(S)
RECORRENTE : A.D.S.M. E OUTROS
ADVOGADOS : ALEXANDRE LIMA WUNDERLICH E OUTRO(S)
S.D.C.E.O. LILIANC.R.E.O. MARCELOA.A. E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO AO ART. 23 DA LEI 8.429⁄92. SÚMULAS 280⁄STF E 7⁄STJ. OFENSA AO ART. 7º, I, DA LEI 8.906⁄94. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. FATOS REGISTRADOS NAS INSTÂNCIAS DE ORIGEM QUE NÃO COMPROVAM O ELEMENTO SUBJETIVO (DOLO). AFASTAMENTO DAS CONDENAÇÕES.

  1. Trata-se de dois recursos especiais que impugnam demanda referente à ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul em desfavor de servidor público (Oficial de Justiça), advogados e respectivo escritório de advocacia, na qual se requereu a aplicação das penalidades impostas pelo inciso I do artigo 12 da Lei 8.429⁄92, em razão da alegada prática da conduta de improbidade administrativa prevista no artigo 9º, inciso I, da mesma lei, consistente na percepção do montante de R$ 300,00 (trezentos reais) supostamente pagos como gratificação em razão do cumprimento imediato de mandado de busca e apreensão, por meio de depósito de cheque emitido pelo escritório de advocacia em que atuam os demais réus, em conta corrente de titularidade do recorrente que ostenta a função de agente público.

  2. Acórdão recorrido que, reformando sentença que havia julgado improcedente a demanda com base na ausência de dolo, condenou os réus em todas as sanções pleiteadas na exordial, em síntese, ao argumento de que, por ter o depósito sido realizado dias após o cumprimento do mandado em quantia superior à das custas a ele referentes, teria sido devidamente demonstrado o enriquecimento ilícito do servidor, bem como a conduta indevida dos co-réus, proprietário e demais componentes do escritório de advocacia demandados.

  3. Afasta-se a violação aos artigos 165, 458 e 535 do CPC, porquanto o acórdão recorrido se manifestou de forma clara e fundamentada sobre todos os aspectos necessários ao deslinde da questão.

  4. Não se conhece da alegação de contrariedade ao artigo 23, inciso II, da Lei Federal n. 8.249⁄92, por demandar a análise da Lei Complementar 10.098⁄94 e das provas dos autos, atraindo as Súmulas 280⁄STF e 7⁄STJ.

  5. No que tange à violação do artigo 7º do Estatuto da Advocacia, o recurso especial não merece conhecimento, pois o mencionado dispositivo de lei não foi objeto de análise pela Corte de origem, nem foram opostos embargos de declaração a fim de suscitar a discussão da matéria. Desse modo, ressente-se o recurso, quanto ao ponto, do indispensável prequestionamento da questão federal, atraindo, à espécie, a incidência da Súmula 282 do STF.

  6. Esta Corte Superior, recentemente, fixou entendimento segundo o qual, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do réu como incurso nas previsões da Lei de Improbidade Administrativa é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado no dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Precedentes: REsp 1130198⁄RR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 15⁄12⁄2010; EREsp 479.812⁄SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, DJe 27⁄9⁄2010; REsp 1149427⁄SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 9⁄9⁄2010; EREsp 875.163⁄RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30⁄6⁄2010; REsp 414.697⁄RO, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 16⁄9⁄2010.

  7. No caso concreto, não podem persistir as condenações dos recorrentes, pois, de acordo com as premissas fáticas registradas na sentença e no acórdão, em que pese demonstrado o depósito da quantia de R$ 300,00 na conta corrente do agente público, deve-se considerar, para fins de caracterização da conduta de improbidade, os fatos mencionados pela sentença, quais sejam: (a) improcedência do processo administrativo contra ele instaurado em razão da inexistência de ajuste prévio tendente ao recebimento de propina; (b) inexistência de central de mandados na Comarca onde atuava, o que impunha a realização de depósitos referentes à condução diretamente em sua conta; (c) existência de praxe de disponibilização dos números das contas bancárias dos oficiais de justiça para conhecimento público; (d) ausência de prova de que se tenha privilegiado o cumprimento do mandado em detrimento de outros; e (e) ausência de prova de que os co-réus, em comunhão de esforços e conjugação de vontades, tenham prometido ao oficial de justiça gratificação pelo cumprimento diligente de mandado de busca e apreensão.

  8. Ademais, os fatos considerados pela corte a quo não demonstram o dolo, tendo em vista que o acórdão recorrido entendeu pela ocorrência do ato de improbidade administrativa em razão do suposto enriquecimento ilícito do agente público, e com fundamento em elementos objetivos (depósito de numerário superior às custas na conta de sua titularidade), não havendo clara menção à demonstração de conluio prévio entre o agente público e os co-réus, de vontade de receber vantagem indevida, para possibilitar a realização de ato inerente à sua função; nem tampouco o enriquecimento ilícito, já que o numerário recebido foi devidamente restituído.

  9. Recurso especial interposto por J.J.F. conhecido parcialmente, e nessa parte, provido, para afastar a condenação imposta pela Corte de Origem.

  10. Recurso especial interposto por A. daS.M. e outros conhecido parcialmente, e nessa parte, provido, para afastar as condenações impostas pela Corte de Origem.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente dos recursos especiais e, nessas partes, dar-lhes provimento para afastar a condenação imposta pela Corte de Origem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Luiz Fux, Teori Albino Zavascki e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 17 de fevereiro de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO BENEDITO GONÇALVES

    Relator

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    PRIMEIRA TURMA

    Número Registro: 2010⁄0078649-7 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.193.160 ⁄ RS
    Números Origem: 10300047244 3810300047244 70024445892 70025360041 70026270785 70027487107
    PAUTA: 21⁄10⁄2010 JULGADO: 21⁄10⁄2010

    Relator

    Exmo. Sr. Ministro BENEDITO GONÇALVES

    Presidente da Sessão

    Exmo. Sr. Ministro BENEDITO GONÇALVES

    Subprocurador-Geral da República

    Exmo. Sr. Dr. AURÉLIO VIRGÍLIO VEIGA RIOS

    Secretária

    Bela. BÁRBARA AMORIM SOUSA CAMUÑA

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE : J.J.F.
    ADVOGADO : CAIO MARTINS LEAL E OUTRO(S)
    RECORRENTE : A.D.S.M. E OUTROS
    ADVOGADOS : ALEXANDRE LIMA WUNDERLICH E OUTRO(S)
    S.D.C.E.O. LILIANC.R.E.O. MARCELOA.A. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

    ASSUNTO: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO - Atos Administrativos - Improbidade Administrativa

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia PRIMEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Retirado de Pauta por indicação do Sr. Ministro Relator.

    Brasília, 21 de outubro de 2010

    B.A.S.C.

    Secretária

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.193.160 - RS (2010⁄0078649-7)

    RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
    RECORRENTE : J.J.F.
    ADVOGADO : CAIO MARTINS LEAL E OUTRO(S)
    RECORRENTE : A.D.S.M. E OUTROS
    ADVOGADOS : ALEXANDRE LIMA WUNDERLICH E OUTRO(S)
    S.D.C.E.O. LILIANC.R.E.O. MARCELOA.A. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos por J.J.F. e por A. daS.M. e outros, o primeiro com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, e o segundo tão somente com fulcro na alínea "a", contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que deu provimento à apelação do Ministério Público Estadual e condenou os recorrentes por prática de atos de improbidade administrativa, assim ementado (fl. 1.462):

    AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CARACTERIZAÇÃO. VANTAGEM OBTIDA POR OFICIAL DE JUSTIÇA. DEPÓSITO BANCÁRIO EFETUADO POR ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA, A FIM DE AGILIZAR CUMPRIMENTO DE MANDADO. APLICAÇÃO DO ART. 9º, I, C⁄C ARTIGO 3º, DA LEI DE IMPROBIDADE. SANÇÕES IMPOSTAS. ARTIGO 12, I, DA LEI 8.429⁄92.

    Caracteriza-se como ato de improbidade administrativa a vantagem obtida por Oficial de Justiça, diante do depósito efetuado na sua conta bancária por escritório de advocacia, após agilizar cumprimento de mandado de busca e apreensão.

    Tratando-se de quantia superior ao valor correspondente às custas do mandado, tendo ocorrido o depósito do valor dias após o cumprimento do mandado, resta demonstrado o enriquecimento indevido do servidor, bem como a conduta indevida dos demais co-réus, proprietário e demais componentes do escritório de advocacia demandados.

    Aplicação do artigo 9º, I, c⁄c artigo 3º da Lei 8.429⁄92.

    Imposição aos demandados das sanções previstas no artigo 12, I, da Lei 8.429⁄92.

    Precedentes do TJRGS e STJ.

    Apelação provida.

    Os primeiros embargos de declaração opostos por J.J.F. foram rejeitados, por acórdão cuja ementa se encontra à fl. 1.536 dos autos. Da mesma forma, não foram acolhidas as alegações dos segundos declaratórios, conforme se depreende da ementa acostada às fls. 1.585.

    Nas razões do apelo especial, o agente público recorrente alega a ocorrência de desrespeito aos seguintes artigos de lei:

    (i) artigo 535, inciso II, do CPC, por não ter a Corte de origem se manifestado sobre dispositivos legais considerados indispensáveis ao deslinde do feito. Sobre o mesmo artigo, afirma também a ocorrência de divergência jurisprudencial.

    (ii) artigo 23, inciso II, da Lei Federal n. 8.249⁄92, em razão do não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT