Acórdão nº 2010/0009552-0 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2010/0009552-0
Data15 Fevereiro 2011
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.176.587 - RS (2010⁄0009552-0)

RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX
RECORRENTE : F.H.C.I.S.
ADVOGADO : EDUARDO DE ARAUJO RIBEIRO FONYAT E OUTRO(S)
RECORRENTE : CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF
ADVOGADO : GILBERTO ANTONIO PANIZZI FILHO E OUTRO(S)
RECORRIDO : A.J.F. -S. E OUTRO
ADVOGADO : KURT ERING GASTRING
SUCESS. DE : WALTER FERNANDES - SUCESSÃO

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART. 105, III, "A", DA CF⁄1988. ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. FUNDO DE COMPENSAÇÃO DE VARIAÇÃO SALARIAL - FCVS. MORTE DO MUTUÁRIO. COBERTURA SECURITÁRIA DAS PRESTAÇÕES VINCENDAS. ALEGAÇÃO, POR PARTE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA HABITACIONAL, DE PARCELAS EM ABERTO ATÉ A DATA DO SINISTRO. ACÓRDÃO QUE ATRIBUIU O MONTANTE DE EVENTUAIS PARCELAS EM ATRASO AO FCVS. ART. 2º, § 3º DA LEI 10.150⁄00. IMPOSSIBILIDADE. DEFICIÊNCIA NA DEMONSTRAÇÃO DOS DÉBITOS PRETÉRITOS. SÚMULA 7⁄STJ. PRESCRIÇÃO. SÚMULA 150⁄STF. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO AOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO. SÚMULA 283⁄STF. VIOLAÇÃO DO ART. 535, DO CPC. INOCORRÊNCIA.

  1. Recurso especial da Caixa Econômica Federal - CEF:

    1.1. O Fundo de Compensação de Variação Salarial - FCVS é espécie de seguro que visa a cobrir eventual saldo devedor existente após a extinção do contrato. O saldo devedor, por seu turno, é um resíduo do valor contratual causado pelo fenômeno inflacionário. Embora o FCVS onere o valor da prestação do contrato, o mutuário tem a garantia de, no futuro, quitar sua dívida desobrigando-se do eventual saldo devedor, que, muitas vezes, alcança o patamar de valor equivalente ao próprio.

    1.2. A liquidação antecipada com desconto integral do saldo devedor é cabível nos contratos de financiamentos imobiliários regidos pelo Sistema Financeiro da Habitação - SFH, desde que contenham cláusula de cobertura pelo Fundo de Compensação de Variação Salarial - FCVS, e tenham sido firmados até 31 de dezembro de 1987, à luz do disposto no parágrafo 3.º, do artigo 2.º, da Lei n.º 10.150, de 21 de dezembro de 2000, verbis:

    "Art. 2º Os saldos residuais de responsabilidade do FCVS, decorrentes das liquidações antecipadas previstas nos §§ 1º, 2º e 3º, em contratos firmados com mutuários finais do SFH, poderão ser novados antecipadamente pela União, nos termos desta Lei, e equiparadas às dívidas caracterizadas vencidas, de que trata o inciso I do § 1º do artigo anterior, independentemente da restrição imposta pelo § 8º do art. 1º.

    [...]

    § 3º As dívidas relativas aos contratos referidos no caput, assinados até 31 de dezembro de 1987, poderão ser novadas por montante correspondente a cem por cento do valor do saldo devedor, posicionado na data de reajustamento do contrato, extinguindo-se a responsabilidade do FCVS sob os citados contratos."

    1.3. Precedentes: Resp 956.524⁄RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 06.11.2007, DJ 21.11.2007, p. 332; Resp 1.075.284⁄MG, Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 07⁄10⁄2008, DJe 04⁄11⁄2008.

    1.4. Outrossim, "o saldo devedor ao encargo do FCVS necessita do pagamento de todas as parcelas do débito para cumprir sua finalidade de quitação das obrigações. As benesses da Lei 10.150⁄00, no tocante à novação do montante de 100%, refere-se ao saldo devedor, não incluídas aí, as parcelas inadimplidas". (REsp 1.014.030⁄SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 05⁄05⁄2009, DJe 21⁄05⁄2009) No mesmo sentido: REsp 1.146.184⁄RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 28⁄09⁄2010, DJe 08⁄10⁄2010; AgRg no REsp 961.690⁄RS, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 16⁄09⁄2008, DJe 07⁄11⁄2008.

    1.5. Na hipótese sub judice, à míngua de comprovação das parcelas em atraso e acenando para a prescrição de eventual débito (Súmula 150⁄STF), porquanto decorridos mais de 20 (vinte) anos da citação válida do filho do primeiro mutuário, o aresto recorrido atribuiu ao FCVS a responsabilidade pelo adimplemento de eventuais parcelas em atraso antes do sinistro (morte) do primeiro mutuário, imposição que merece ser conjurada à luz da jurisprudência desta Egrégia Corte Superior, mercê de o saldo devedor ao encargo do FCVS não incluir eventuais parcelas inadimplidas pelo mutuário.

    1.6. Consectariamente, a ausência de prova do inadimplemento bem como a impossibilidade jurídica de se impor ao FCVS quitar parcelas em atraso, com fulcro na jurisprudência da Corte, conjuram qualquer obrigação da CEF.

  2. Recurso especial de FIN-HAB Crédito Imobiliário S⁄A:

    2.1. O recurso especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice erigido pela Súmula 07⁄STJ.

    2.2. In casu, o Tribunal de origem, à luz do acervo fático-probatório juntado aos autos, concluiu pela insuficiência da comprovação de débitos anteriores ao sinistro (morte) do primeiro mutuário, verbis:

    "Retomando a matéria já debatida, não se conhecem as razões da alegada impontualidade, nem se demonstrou sua efetividade. Há informações de que ocorrera pagamentos a menor, nada vem documentado pela credora embora o embargante pretenda alegar sua efetividade. O devedor faleceu antes da execução e informa-se que a seguradora deu cobertura ao restante da dívida sem qualquer prova documental do pagamento de prêmio, nem de planilhas que demonstrem prestações em atraso ou pagamentos a menor.

    (...)

    Advertindo o embargante das penalidades do art. 538, parágrafo único do CPC, mantenho o entendimento já manifestado. A solução mais adequada mostrou-se pela via eleita, através da cobertura securitária do contrato no que diz com as parcelas do mútuo, e, quanto ao saldo devedor residual, de responsabilidade do FCVS, acolhendo-se eventual diferença ou impontualidade - não demonstradas - abrangidas na liquidação antecipada com desconto de 100%, que alcança os contratos anteriores a 1987, como é o caso dos autos."

    (fls. 243⁄247, e-STJ - negrito nosso)

    2.3. Destarte, ressalte-se que a alegação da recorrente no sentido de que "a ré⁄embargante juntou com a peça de contestação planilha atualizada da dívida, objeto das prestações anteriores ao falecimento do mutuário, que ocorreu em março⁄88" (fl. 261, e-STJ) não foi objeto dos aclaratórios opostos em duas oportunidades (fls. 201⁄204 e 237⁄240, e-STJ), restando assim interditada a sua cognição na presente sede recursal.

    2.4. A ausência de impugnação a fundamento do acórdão recorrido, no que respeita à ocorrência de prescrição, revela a deficiência das razões do recurso especial, atraindo a incidência do enunciado sumular n.º 283 do STF, mercê de o acórdão recorrido ter assentado, litteris:

    "Nos termos da Súmula 150 do STF prescreve a execução no mesmo prazo da prescrição da ação. Na forma do Código Civil anterior, aplicável à hipótese dos autos, os contratos entre particulares ostentam prescrição vintenária. Já decorreram mais de vinte anos entre a citação válida do segundo falecido."

    (fl. 243, e-STJ)

    2.5. Precedentes: REsp 1.148.132⁄SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 21⁄10⁄2010, DJe 05⁄11⁄2010; AgRg no REsp 1.190.735⁄RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21⁄09⁄2010, DJe 13⁄10⁄2010; AgRg no REsp 1.015.137⁄PE, Rel. Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 20⁄05⁄2010, DJe 07⁄06⁄2010.

    2.6. O artigo 535, do CPC, resta incólume quando o Tribunal de origem, embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos, mercê de o magistrado não estar obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

  3. Recurso especial da Caixa Econômica Federal - CEF conhecido e provido. Recurso especial de FIN-HAB Crédito Imobiliário S⁄A parcialmente conhecido e desprovido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da PRIMEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conheceu do recurso especial da Caixa Econômica Federal e dar-lhe provimento e conhecer parcialmente do recurso da FIN HAB Crédito Imobiliário S⁄A e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Arnaldo Esteves Lima, Benedito Gonçalves e Hamilton Carvalhido votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 15 de fevereiro de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO LUIZ FUX

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.176.587 - RS (2010⁄0009552-0)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO LUIZ FUX(Relator): Trata-se de recursos especiais interpostos pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF e por FIN-HAB CRÉDITO IMOBILIÁRIO S⁄A, ambos com fulcro no artigo 105, III, “a”, do permissivo constitucional, em face de decisão de última instância proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região.

    A exposição da sentença melhor elucida a questão fática:

    ANDRÉIA JORNADA FERNANDES e J.A.J.F. ajuizaram perante a Egrégia Justiça Estadual a presente ação ordinária em face da FIN-HAB CRÉDITO IMOBILIÁRIO S⁄A objetivando, em síntese, a quitação, nos termos da Lei nº 10.150⁄00, de contrato de financiamento habitacional celebrado no âmbito do SFH.

    Relataram que o seu falecido avô havia adquirido o imóvel residencial onde residem por intermédio de mútuo feneratício contraído junto à demandada. A avença em comento previu o resgate da dívida mediante o adimplemento de 204 parcelas mensais sucessivas, bem como contou com contribuição ao Fundo de Compensação das Variações Salariais.

    Prosseguiu afirmando que por força da inadimplência do mutuário originário, o agente financeiro intentou processo de execução hipotecária. Em decorrência do rito expropriatório ora mencionado, o Sr. Cláudio Gilberto Fernandes, pai dos requerentes, foi citado. A mutação do pólo passivo da execução decorreu do falecimento do Sr. Walter Fernandes, avô dos demandantes e mutuário da FIN-HAB. O falecimento do devedor implicou quitação do saldo devedor da dívida em janeiro de 1989 em razão da indenização securitária percebida...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT