Acórdão nº 2010/0195547-1 de T2 - SEGUNDA TURMA

Número do processo2010/0195547-1
Data17 Fevereiro 2011
ÓrgãoSegunda Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.217.951 - PR (2010⁄0195547-1)

RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
RECORRENTE : I.B.I.M.E.S.L.
ADVOGADO : ALTIVO JOSÉ SENISKI E OUTRO(S)
RECORRIDO : U.F.D.P.U.
PROCURADOR : JAQUELINE MAGGIONI PIAZZA E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE GARANTIA CELEBRADO POR PARTES DISTINTAS DAQUELAS QUE AJUSTARAM O CONTRATO PRINCIPAL. COMPORTAMENTO INICIAL QUE VINCULOU O ATUAR NO MESMO SENTIDO OUTRORA APONTADO. QUEBRA DA CONFIANÇA. RESPONSABILIDADE. PROIBIÇÃO DE COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO (NEMO POTEST VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM).

  1. Não merece prosperar a alegação da recorrente quanto à apontada contradição no aresto impugnado, porquanto nota-se que a conclusão em favor da sua legitimidade partiu da análise, não meramente das partes que formalmente subscreveram a fiança, mas do que efetivamente consistia o objeto desse negócio jurídico - a garantia quanto ao fornecimento de microcomputadores na concorrência pública que ensejou a contratação entre a recorrida e a IBM WTC.

  2. Neste sentido, não há contradição no argumento segundo o qual "não há outra forma, senão através da carta de fiança, para explicar a intervenção da IBM BRASIL como garante" e a tese de que carta de fiança não foi relevante para a prolação do acórdão, pois tal irrelevância foi observada tão só sob o ponto de vista formal, isto é, apenas sob a ótica das partes que subscreveram a mesma carta.

  3. Quanto à apontada afronta aos arts. 985 e 1.483 do Código Civil, verifica-se que o aresto objurgado aparentemente admitiu um contrato de fiança verbal entre a recorrente e a Universidade Federal do Paraná, o que, a princípio, afrontaria ao art. 1.483 do Código Civil de 1916.

  4. Contudo, o presente caso apresenta uma peculiaridade que não pode ser ignorada. É que, como bem destacado pela Corte a quo, o ajuste entre a recorrente e o B.B.S.A., tinha exatamente por fim dar garantia ao acordo entabulado entre a Universidade Federal do Paraná e a IBM WTC para o fornecimento de microcomputadores.

  5. Deste modo, entender pela irresponsabilidade da IBM BRASIL resultaria em desprover de qualquer eficácia o contrato celebrado entre esta e a mencionada instituição bancária. Adotar um entendimento contrário à legitimidade da recorrente levar-nos-ia a uma questão indecifrável, a um verdadeiro paradoxo: para que serviria o contrato de garantia ante o inadimplemento do contrato principal?

  6. Deve-se, portanto, atribuir função econômico-individual ao ajuste, sobretudo diante da redação do art. 422 e do parágrafo único do art. 2.035 do Código Civil de 2002, os quais impõe aos negócios jurídicos - mesmo àqueles constituídos antes da entrada em vigor deste diploma, a obediência à cláusula geral de ordem pública da boa-fé objetiva, a qual, por sua vez, sujeita ambos os contratantes à recíproca cooperação a fim de alcançar o efeito prático que justifica a própria existência do contrato. Sobretudo, também, porque a ninguém é dado vir contra o próprio ato, proibindo-se o comportamento contraditório (nemo potest venire contra factum proprium).

  7. De fato, o nemo potest venire contra factum proprium "veda que alguém pratique uma conduta em contradição com sua conduta anterior, lesando a legítima confiança de quem acreditara na preservação daquele comportamento inicial" (TEPEDINO, Gustado; BARBOZA, Heloisa Helena; e MORAES, M.C.B. de. Código Civil interpretado conforme a Constituição da República. vol. II. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 20) e, na presente hipótese, o comportamento inicial da recorrente (celebração do contrato de garantia quanto ao cumprimento do contratado de fornecimento de microcomputadores) gerou a expectativa justificada da recorrida de que aquela prosseguiria atuando na direção outrora apontada.

  8. Recurso especial conhecido e não provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte resultado de julgamento:

    "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."

    Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Herman Benjamin (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Humberto Martins.

    Brasília (DF), 17 de fevereiro de 2011.

    MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES , Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.217.951 - PR (2010⁄0195547-1)

    RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES
    RECORRENTE : I.B.I.M.E.S.L.
    ADVOGADO : ALTIVO JOSÉ SENISKI E OUTRO(S)
    RECORRIDO : U.F.D.P.U.
    PROCURADOR : JAQUELINE MAGGIONI PIAZZA E OUTRO(S)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT