Decisões Monocráticas nº 1750 de STF. Supremo Tribunal Federal, 18 de Marzo de 2011

Magistrado ResponsávelMin. Dias Toffoli
Data da Resolução18 de Marzo de 2011
Tipo de RecursoAção Civel Originária

D ECIS Ã O: Vistos.

Cuida-se de ação ordinária de obrigação de fazer cumulada com pedido de tutela antecipada ajuizada por Renato Mello Pereira Junior em face do Estado de Santa Catarina, no qual se requer a condenação dos réus ao fornecimento de medicamentos e demais materiais necessários a tratamento de saúde.

O pedido de tutela antecipatória foi deferido ao postulante, no sentido de que o Estado de Santa Catarina lhe fornecesse os medicamentos e materiais requeridos (fl. 57).

Por sua vez, o ente federado regional, ao apresentar sua contestação (fls. 59/73), defendeu a necessidade do chamamento ao processo da União e do Município de Videira, ante a solidariedade passiva existentes entre os componentes da federação e incidente sobre os casos relativos à direito à saúde, sendo, por conseguinte, necessário o deslocamento do feito à Justiça Federal (art. 109, I, CF/88).

Frisou, ademais, a necessidade do título executivo equacionar a responsabilidade de cada pessoa de direito público interno no custeio da condenação.

Em réplica (fls. 86/97), o autor refuta a imprescindibilidade do chamamento ao feito da União e do Município de Videira, uma vez que nesta matéria todos os entes concorrem para o pagamento dos remédios, evitando-se retardamentos processuais desnecessários.

Declinando da competência (fls. 102/103), o Juízo da Comarca de Videira remeteu o feito à Vara Federal de Caçador, o qual, reconhecendo-se incompetente, reencaminhou os autos para o Juizado Especial Adjunto daquela mesma subseção judiciária (fl. 106).

A seguir, foi deferido o chamamento ao processo dos demais requeridos (fls. 113/114), com a consequente ordenação de citação e extensão dos efeitos da tutela antecipatória aos novos réus.

Contestação da União (fls. 125/146) e do Município de Videira (fls. 150/153).

Ocorre que, posteriormente, o magistrado do Juizado Especial Federal Cível de Caçador reconsiderou a decisão que havia reconhecido o pleito de chamamento ao feito da União, em razão de sua falta de interesse processual (fl. 170/171) na causa, e determinando o retorno dos autos ao Juízo estadual da Comarca de Videira/SC.

Inconformado com essa decisão, o Estado de Santa Catarina interpôs recurso inominado (fls. 178/186), julgado parcialmente procedente pela 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Santa Catarina, a fim de consignar a necessidade de remessa do processo à Justiça Federal comum para processar a demanda, diante da incompatibilidade do rito especial com a figura da intervenção de terceiros.

Reforça que a esse juízo, então, caberia firmar a legitimidade processual passiva da União e assim processar a causa, ou, conforme o caso, refutá-la, devolvendo os autos à Justiça Comum estadual (fl. 213/214).

Por fim, o Juízo da Vara Federal de Caçador, entendendo se fazer presente possível conflito federativo instalado entre o Estado de Santa Catarina e a União, no sentido da repartição do ônus com a concessão dos medicamentos e futuro exercício de direito de regresso por aquele ente que arcar com os custos da condenação em face dos demais (fls. 226/229), remeteu os autos a esta Suprema Corte.

É o relatório.

Ascenderam os autos a esta Corte, com fundamento no permissivo do artigo 102, I, f, da Constituição Federal, declinando o juízo ordinário de sua competência por entender presente conflituosidade de cunho federativo estabelecido entre a União e o Estado de Santa Catarina, haja vista a possibilidade de condenação solidária dos entes, envolvidos no fornecimento de medicamento e demais materiais necessários ao tratamento médico do autor.

Contudo, a teor da regra constitucional de competência e da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não se pode reconhecer a aptidão do feito para deflagar o exercício de jurisdição nesta sede.

É o teor da regra fixada na Constituição Federal: Art

Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe: I - processar e julgar, originariamente: (...) f) as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta.

A inclusão da União no pólo passivo da lide, requerida pelo Estado de Santa Catarina, na forma do artigo 77 e seguintes do Código de Processo Civil, não foi objeto de apreciação definitiva por qualquer dos órgãos judiciais em que tramitou a causa.

Isso porque, conquanto tenha sido reconhecida a legitimidade do ente central na decisão proferida pelo Juizado Especial Federal Cível de Caçador, admitindo-se o chamamento ao processo (fl. 113v.), esta decisão foi reconsiderada em seguinte pronunciamento do mesmo juízo, acostado às folhas 170/171.

Tem-se, ademais, que nem a 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Santa Catarina, tampouco o juízo comum da Vara Federal de Caçador, teceram manifestações conclusivas a respeito do pedido de chamamento, pendente até o momento de definição.

A União, portanto, não é formalmente parte na presente ação, situação que, por si só, já obsta o seu conhecimento por esta Corte, com fundamento no artigo 102, I, f, da Constituição Federal.

Contudo, mesmo se fosse reconhecida a instalação de conflito entre a União e o Estado de Santa Catarina, tal conflito não deteria densidade suficiente para abalar o pacto federativo, e, portanto, não seria apto a deslocar a competência da ação para esta Suprema Corte.

A discussão principal nesta causa é a de dar efetividade ao direito fundamental à saúde do requerente, sendo a solidariedade no custeio do fornecimento de medicamentos problemática lateral, ou tão somente reflexa, inapta a provocar a manifestação do STF na qualidade Tribunal da Federação.

Pela propriedade e precisa adequação, repriso parte da decisão do Ministro Joaquim Barbosa na ACO nº 1.670/SC, em caso praticamente idêntico ao presente, em que foi reconhecida a incompetência desta Corte pelos seguintes argumentos: Não está caracterizada a competência originária desta Corte para conhecer do pleito.

Nos termos do art. 102, I, f da Constituição, compete ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar, originariamente, as causas e os conflitos entre a União e os Estados, a União e o Distrito Federal, ou entre uns e outros, inclusive as respectivas entidades da administração indireta.

Ao interpretar o texto constitucional mencionado, expressiva parcela da jurisprudência desta Corte considera relevante para o reconhecimento da competência originária do Supremo Tribunal Federal a intensidade do risco de ruptura da harmonia federativa causada pela lide.

Registro, nesse sentido, as ementas de alguns precedentes: 'EMENTA: COMPETÊNCIA.

AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA.

AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS DA UNIÃO CONTRA O ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL.

ACIDENTE DE TRÂNSITO.

Questão patrimonial que não implica conflito federativo.

Precedente.

Questão de ordem resolvida para determinar o retorno dos autos ao juízo de origem.' (ACO 518 QO, Relator(a): Min.

JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 24/06/2004, DJ 20-08-2004 PP-00036 EMENT VOL-02160-01 PP-00015 RTJ VOL-00191-03 PP-00771); 'E M E N T A: AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO CONSELHO FEDERAL DE FARMÁCIA CONTRA O ESTADO DO ACRE - INCOMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 102, I, 'F', DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - AUSÊNCIA DE CONFLITO FEDERATIVO - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - O art. 102, I, 'f', da Constituição confere, ao Supremo Tribunal Federal, a posição eminente de Tribunal da Federação, atribuindo-lhe, nessa condição de órgão de cúpula do Poder Judiciário, competência para dirimir as controvérsias que irrompam no seio do Estado Federal, opondo as unidades federadas umas às outras, e de que resultem litígios cuja potencialidade ofensiva revele-se apta a vulnerar os valores que informam o princípio fundamental que rege, em nosso ordenamento jurídico, o pacto da Federação.

Doutrina.

Jurisprudência. - O Supremo Tribunal Federal não dispõe de competência originária para processar e julgar causas instauradas, contra Estado-membro, por iniciativa de autarquia federal, especialmente se esta dispuser de 'estrutura regional de representação no território estadual respectivo' (RTJ 133/1059), pois, em tal hipótese, revela-se inaplicável a norma inscrita no art. 102, I, 'f', da Constituição, eis que ausente qualquer situação capaz de introduzir instabilidade no equilíbrio federativo ou de ocasionar ruptura da necessária harmonia entre as entidades integrantes do Estado Federal.

Precedentes.' (ACO 641 AgR, Relator(a): Min.

CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 24/04/2003, DJ 03-06-2005 PP-00004 EMENT VOL-02194-01 PP-00007 LEXSTF v. 27, n. 320, 2005, p. 19-28 RTJ VOL-00194-03 PP-00743); 'EMENTA: Ação Cível Originária. 2.

Questão de ordem. 3.

Estado da Paraíba contra a União. 4.

Ressarcimento de prejuízos sofridos em decorrência de acidente de trânsito entre veículos dos litigantes. 5.

A competência do Supremo Tribunal Federal apenas se configura em relação a conflitos federativos que possam afetar o equilíbrio da própria Federação brasileira.

Precedentes. 6.

A hipótese dos autos versa sobre questão estritamente patrimonial, sem qualquer fundamento político. 7.

Incompetência do Supremo Tribunal Federal. 8.

Devolução dos autos ao juízo de origem.' (ACO 379 QO, Relator(a): Min.

ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min.

GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 29/05/2003, DJ 05-09-2003 PP-00030 EMENT VOL-02122-01 PP-00022). 'EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS.

AQUISIÇÃO, DE BOA-FÉ, DE VEíCULO QUE FORA OBJETO DE FURTO.

DOCUMENTAÇÃO ADULTERADA.

DEMANDA QUE ENVOLVE PESSOAS FÍSICAS (COMPRADOR E VENDEDOR) E PESSOAS JURíDICAS DE DIREITO PÚBLICO (ESTADO DO PARANÁ, ESTADO DO RIO DE JANEIRO E DETRAN/RJ).

CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 102, INCISO I, LETRA 'F'.

INEXISTÊNCIA DE CONFLITO FEDERATIVO.

A controvérsia dos autos envolve questão meramente patrimonial, sem nenhum substrato político que possa caracterizar conflito federativo ou, de qualquer forma, afetar o equilíbrio da Federação brasileira.

Incompetência do Supremo Tribunal Federal.

Ação não conhecida.

Devolução dos autos ao Juízo de origem.

Precedentes.' (ACO 485, Relator(a): Min.

CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 11/03/2004, DJ 02-04-2004 PP-00007 EMENT VOL-02146-01 PP-00017 RTJ VOL 00192-01 PP-00025).

Confiram-se, ainda, a ACO 1.182 (rel.

min.

Ellen Gracie, decisão monocrática, DJ de 17.06.2008) e a ACO 788 (rel.

min.

Carlos Velloso, decisão monocrática, DJ de 28.10.2005). (...) No caso em exame, a ação envolve pleito de administrado, pessoa natural, para obtenção de medicamento essencial à sua saúde.

O interesse dos entes federados envolvidos, de eventual partilha de custos e ressarcimento, é secundário e incapaz de caracterizar densidade ao potencial risco de abalo ao pacto federativo.

Ademais, fosse acolhido o entendimento elaborado pelo Juízo de origem, o Supremo Tribunal Federal tornaria-se o órgão jurisdicional com competência originária para conhecer e julgar toda e qualquer causa que envolvesse pedido para fornecimento de medicamento.

Este não é o objetivo do art. 102, I, f da Constituição. (DJe de 09/12/10).

Ante o exposto, reconheço a incompetência do Supremo Tribunal Federal para a apreciação desta ação, devendo os autos serem devolvidos ao Juízo de origem.

Publique-se.

Intime-se.

Brasília, 18 de março de 2011.

Ministro D IAS T OFFOLI Relator Documento assinado digitalmente

Partes

Reqte.(s) : MinistÉrio PÚblico do Estado do Rio Grande do Norte

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral de JustiÇa do Estado do Rio Grande do Norte

reqdo.(a/S) : MunicÍpio de Natal

proc.(a/S)(Es) : Procurador-Geral do MunicÍpio de Natal

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