Acórdão nº 2010/0047672-0 de T5 - QUINTA TURMA

Número do processo2010/0047672-0
Data15 Fevereiro 2011
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 165.806 - MT (2010⁄0047672-0)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO
ADVOGADO : MÁRCIO FREDERICO DE OLIVEIRA DORILÊO - DEFENSOR PÚBLICO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
PACIENTE : A.A.D.S.
PACIENTE : ELEANDRO FRANCO

EMENTA

HABEAS CORPUS. ROUBO DUPLAMENTE MAJORADO. DOSIMETRIA. PENA-BASE. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CULPABILIDADE. CONSIDERAÇÃO DAQUELA PRÓPRIA DO TIPO. INVIABILIDADE. CONDUTA SOCIAL E PERSONALIDADE. DESEMPREGO. ARGUMENTO INIDÔNEO. MOTIVOS DO CRIME. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. DESFAVORABILIDADE. MODUS OPERANDI. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. PREJUÍZO DA VÍTIMA. POSSIBILIDADE. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. CAUSA DE ESPECIAL AUMENTO. ANÁLISE NA PRIMEIRA FASE. ILEGALIDADE. OFENSA AO SISTEMA TRIFÁSICO. CONSTRANGIMENTO EM PARTE EVIDENCIADO. SANÇÃO REDIMENSIONADA. FIXAÇÃO DA REPRIMENDA NO MÍNIMO LEGAL. DESCABIMENTO. NEGATIVIDADE DE ALGUMAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS.

  1. Mostra-se inviável considerar como desfavorável aos agentes circunstância inerente à culpabilidade em sentido estrito, a qual é elemento integrante da estrutura do crime, em sua concepção tripartida.

  2. O fato de os pacientes não trabalharem, por si só, não evidencia a negatividade das circunstâncias judiciais da conduta social e da personalidade, tendo em vista que a falta de emprego, diante da realidade social brasileira, é infortúnio, e não algo tencionado.

  3. Não tendo o juiz sentenciante demonstrado, de forma concreta, as razões pelas quais considerou desfavoráveis aos pacientes os motivos do crime, de rigor a redução da pena-base nesse ponto, sob pena de violação aos princípios constitucionais da individualização da pena e da motivação das decisões judiciais.

  4. As circunstâncias do crime justificam maior elevação da reprimenda na primeira etapa da dosimetria, haja vista o modus operandi empregado no cometimento do delito, revelador de maior periculosidade dos agentes.

  5. Havendo suficiente fundamentação quanto às consequências do delito para a vítima, que sofreu diversos prejuízos em razão do crime praticado pelos acusados, não há que se falar em ilegalidade da sentença na parte em que aumentou a pena-base em razão da desfavorabilidade dessa circunstância judicial, nem do aresto que a manteve nesse ponto.

  6. Ofende ao sistema trifásico de aplicação da pena e às regras penalmente existentes o édito condenatório que leva em consideração a majorante legal do emprego de arma de fogo para elevar a sanção na primeira etapa da dosimetria.

  7. Inviável afastar a conclusão de maus antecedentes quando existente, na folha de antecedentes penais do paciente, condenação anterior transitada em julgado, diversa daquela considerada na segunda etapa da dosimetria a título de reincidência.

  8. Remanescendo circunstâncias judiciais negativas, devidamente justificadas na sentença, não há como fixar a sanção básica em seu mínimo legal.

    CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DE PENA. ARMA DE FOGO. POTENCIALIDADE LESIVA. AUSÊNCIA DE APREENSÃO E DE EXAME PERICIAL. DESNECESSIDADE. EXISTÊNCIA DE OUTROS MEIOS DE PROVA A ATESTAR O EFETIVO EMPREGO DO REVÓLVER. LESIVIDADE QUE INTEGRA A PRÓPRIA NATUREZA DO ARMAMENTO. PROVA EM SENTIDO CONTRÁRIO. ÔNUS DA DEFESA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL AFASTADO. MANUTENÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DO INCISO I DO § 2º DO ART. 157 DO CP.

  9. Para o reconhecimento da presença da causa de aumento de pena prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, mostra-se dispensável a apreensão da arma de fogo e a realização de exame pericial para atestar a sua potencialidade lesiva, quando presentes outros elementos probatórios que atestem o seu efetivo emprego na prática delitiva. Precedentes do STF.

  10. O poder vulnerante integra a própria natureza da arma de fogo, sendo ônus da defesa, caso alegue o contrário, provar tal evidência. Exegese do art. 156 do CPP.

  11. Exigir a apreensão e perícia no revólver comprovadamente empregado no assalto teria como resultado prático estimular os criminosos a desaparecer com o armamento, de modo que a aludida majorante dificilmente teria aplicação.

  12. Habeas corpus parcialmente concedido, apenas para reduzir as penas-base impostas aos pacientes, tornando a reprimenda, de cada um, definitiva em 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e pagamento de 66 (sessenta e seis) dias-multa, mantidos, no mais, a sentença condenatória e o acórdão objurgado.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ⁄RJ), G.D., Laurita Vaz e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 15 de fevereiro de 2011. (Data do Julgamento).

    MINISTRO JORGE MUSSI

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 165.806 - MT (2010⁄0047672-0)

    IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO
    ADVOGADO : MÁRCIO FREDERICO DE OLIVEIRA DORILÊO - DEFENSOR PÚBLICO
    IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO
    PACIENTE : A.A.D.S.
    PACIENTE : ELEANDRO FRANCO

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública em favor de A.A.D.S. e ELEANDRO FRANCO, contra acórdão proferido pela Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso que deu parcial provimento à Apelação n.º 71992⁄2009, interposta pela defesa, para redimensionar a reprimenda do paciente ALEXANDRO para 11 (onze) anos e 9 (nove) meses de reclusão, em regime inicial fechado, e multa, mantida, no mais, a sentença que condenou os acusados pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, inciso I e II, c⁄c o art. 29, ambos do CP.

    O impetrante alega a ocorrência de constrangimento ilegal, ao argumento de que o juiz sentenciante não teria motivado, adequada e concretamente, a fixação da reprimenda imposta aos pacientes, em flagrante ofensa ao disposto no art. 93, inciso IX, da CF, e ao princípio da individualização da pena.

    Destaca que, "não obstante a constatação de tamanha nulidade, a irresignação recursal da defesa, também por equívoco, não suscitou tal argumentação que, vale dizer, por se tratar de matéria de ordem pública, poderia ser reconhecida de ofício a qualquer tempo" (e-STJ fl. 6).

    Considera que as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP teriam sido apreciadas de maneira vaga, genérica e imprecisa, o que evidenciaria a nulidade do édito condenatório.

    Defende que não consta dos autos qualquer elemento concreto que permita manter na condenação dos pacientes a majorante prevista no inciso I do § 2º do art. 157 do CP, "considerando que a suposta arma empregada no cometimento do delito não fora apreendida e, consequentemente, não ficaram demonstrados a eficiência e o potencial ofensivo do aludido instrumento" (e-STJ fl. 17).

    Requer a concessão da ordem constitucional para que seja reformado o acórdão objurgado, determinando ao Tribunal de Justiça Estadual que proceda à nova aplicação da pena imposta aos pacientes, excluindo-se, ainda, a majorante prevista no art. 157, § 2º, inciso I, do CP.

    Informações prestadas.

    A douta Subprocuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da ordem.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 165.806 - MT (2010⁄0047672-0)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Inicialmente, cumpre esclarecer que, no que pertine à alegada ilegalidade na aplicação da pena, "este Superior Tribunal de Justiça já consolidou o entendimento segundo o qual é viável o exame da dosimetria da pena por meio de habeas corpus, quando evidenciado, sem a necessidade de exame de provas, eventual desacerto na consideração de circunstância judicial ou errônea aplicação do método trifásico, resultando daí flagrante ilegalidade e prejuízo ao réu", sendo inclusive orientação pacificada que "a existência de recurso próprio ou de ação adequada à análise do pedido não obsta a apreciação das questões na via do habeas corpus, tendo em vista sua celeridade e a possibilidade de reconhecimento de flagrante ilegalidade no ato recorrido, sempre que se achar em jogo a liberdade do réu" (HC n.º 77.964⁄SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 21-2-2008).

    Vale dizer, a revisão da pena imposta pelas instâncias ordinárias via habeas corpus é possível, mas somente em situações excepcionais, de manifesta ilegalidade ou abuso de poder reconhecíveis de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios.

    No caso em análise, verifica-se que, em primeiro grau, o paciente ELEANDRO foi condenado à pena de 11 (onze) anos, 1 (um) mês e 10 (dez) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e multa, e ALEXANDRO, à reprimenda de 12 (doze) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, no modo inicial mais gravoso, e multa, ambos como incursos no art. 157, § 2º, incisos I e II, c⁄c o art. 29, ambos do CP, porque, segundo a denúncia, verbis:

    "[...] no dia 19.12.2007, por volta das 23h, [...], os denunciados [...], agindo em conluio prévio e unidade de desígnios, mediante grave ameaça exercida pelo emprego de armas de fogo, subtraíram coisas móveis alheias para si, consistentes em 2 notebooks das marcas Toshiba e HP, documentação pessoal, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em espécie e 3 folhas de cheque, sendo uma delas de um cliente, pertencentes à vítima D.A.G.

    Conforme restou apurado, no dia, horário e local acima descritos, a vítima D.A.G. encontrava-se em sua residência trabalhando, momento em que foi surpreendido pela entrada dos denunciados utilizando capacetes e com armas de fogo tipo revólver, empunhadas.

    Ato contínuo, os denunciados anunciaram tratar-se de um assalto e determinaram a vítima Douglas que se deitasse no chão e não olhasse para eles, eis que não queriam ser reconhecidos.

    Enquanto um dos denunciados permaneceu com a arma apontada para a vítima...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT