Acórdão nº 2010/0101899-8 de T1 - PRIMEIRA TURMA

Número do processo2010/0101899-8
Data15 Março 2011
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.941 - SP (2010⁄0101899-8)

RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : S.A.D.O. E OUTROS
ADVOGADO : OVÍDIO ROCHA BARROS SANDOVAL E OUTRO(S)
RECORRIDO : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROCURADORA : L.R.G. E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS DO REQUERENTE. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. CONTRARIEDADE. PARTE ADVERSA E JUIZ, DE OFÍCIO, DECORRENTE DE FUNDADAS RAZÕES. CRITÉRIOS OBJETIVOS.

  1. Trata-se de recurso especial cuja controvérsia orbita em torno da concessão do benefício da gratuidade de justiça.

  2. O STJ, em sede de recurso especial, conforme delimitação de competência estabelecida pelo artigo 105, III, da Constituição Federal de 1988, destina-se a uniformizar a interpretação do direito infraconstitucional federal, razão pela qual é defeso, em seu bojo, o exame de matéria constitucional, cuja competência é do STF.

  3. Há violação dos artigos e da Lei n. 1.060⁄50, quando os critérios utilizados pelo magistrado para indeferir o benefício revestem-se de caráter subjetivo, ou seja, criados pelo próprio julgador, e pelos quais não se consegue inferir se o pagamento pelo jurisdicionado das despesas com o processo e dos honorários irá ou não prejudicar o seu sustento e o de sua família.

  4. A constatação da condição de necessitado e a declaração da falta de condições para pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios erigem presunção relativa em favor do requerente, uma vez que esta pode ser contrariada tanto pela parte adversa quanto pelo juiz, de ofício, desde que este tenha razões fundadas.

  5. Para o indeferimento da gratuidade de justiça, conforme disposto no artigo 5º da Lei n. 1.060⁄50, o magistrado, ao analisar o pedido, perquirirá sobre as reais condições econômico-financeiras do requerente, podendo solicitar que comprove nos autos que não pode arcar com as despesas processuais e com os honorários de sucumbência. Isso porque, a fundamentação para a desconstituição da presunção estabelecida pela lei de gratuidade de justiça exige perquirir, in concreto, a atual situação financeira do requerente.

  6. No caso dos autos, os elementos utilizados pelas instâncias de origem para indeferir o pedido de justiça gratuita foram: a remuneração percebida e a contratação de advogado particular. Tais elementos não são suficientes para se concluir que os recorrentes detêm condições de arcar com as despesas processuais e honorários de sucumbência sem prejuízo dos próprios sustentos e os de suas respectivas famílias.

  7. Recurso especial provido, para cassar o acórdão de origem por falta de fundamentação, a fim de que seja apreciado o pedido de gratuidade de justiça nos termos dos artigos e da Lei n. 1.060⁄50.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial para cassar o acórdão de origem por falta de fundamentação, a fim de que seja apreciado o pedido de gratuidade de justiça nos termos dos artigos e , da lei 1060⁄50, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido, Teori Albino Zavascki e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 15 de março de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO BENEDITO GONÇALVES

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.941 - SP (2010⁄0101899-8)

    RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
    RECORRENTE : S.A.D.O. E OUTROS
    ADVOGADO : RICARDO MARCHI E OUTRO(S)
    RECORRIDO : FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
    PROCURADORA : L.R.G. E OUTRO(S)

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Trata-se de recurso especial interposto por S.A. deO. e outros, com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado (fl. 86):

    AGRAVO DE INSTRUMENTO - Justiça Gratuita - Pressuposta da assistência judiciária integral e gratuita é a insuficiência de recursos financeiros (art. 5º, LXXIV da CF) própria de um estado de penúria - Comprovada a impossibilidade financeira de alguns autores - Análise dos demonstrativos de pagamento - Falta de verossimilhança da alegação de pobreza jurídica com relação aos autores que auferem proventos acima de R$ 2.400,00 líquidos, computados os descontos legais - Decisão reformada em relação aos requerentes que percebem proventos inferiores a R$ 2.400,00.

    Os recorrentes, nas razões do recurso especial, além de apontarem a ocorrência de dissídio jurisprudencial, alegam violação dos artigos 5º, LXXIV, da Carta Magna e e da Lei n. 1.060⁄50, acerca das seguintes questões (fls. 104-113):

    1. o acórdão recorrido afrontou o referido dispositivo constitucional, que estabelece normas para a concessão da assistência judiciária, na medida em que o texto magno não exige que a parte comprove insuficiência de recurso perante o Poder Judiciário para desfrutar da gratuidade de justiça, visto que tal prova só é exigida perante o serviço de assistência judiciária mantida pelo próprio Estado, que não se confunde com gratuidade de justiça;

    2. a decisão hostilizada contrariou lei federal, dando interpretação diferente daquela contida na Lei n. 1.060⁄50, buscando fundamentos que ignoram a real existência do texto de regência, uma vez que bastaria a simples afirmação de pobreza no sentido da lei, condição que se presume, independente de prova, na petição inicial;

    3. não se exige o estado de pobreza absoluto para a obtenção do benefício, já que a Lei n. 1.060⁄50 não o menciona como condição para a obtenção da assistência judiciária gratuita, mas sim a insuficiência de recurso;

    4. quando a lei fala em "necessitado", deve-se entender não como sentido de "miserável" ou "indigente", mas sim aquele que possui rendimentos suficientes apenas para a sua mantença e de sua família; e

    5. o fato de os autores perceberem salários considerados razoáveis (superiores a R$ 2.400,00, líquidos) não significa que neste momento de suas vidas estejam em condições de arcar com tais custas, considerando as despesas familiares pagas mensalmente com educação dos filhos, alimentação, habitação, vestuário, médicos, água, luz, telefone, transporte, entre outras.

    Por fim, requerem que seja reformada a decisão recorrida, dando provimento ao apelo extremo.

    Contrarrazões apresentadas (fls. 137⁄142).

    O apelo nobre foi admitido pelo Tribunal de origem (fls. 150⁄151).

    É o relatório.

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.196.941 - SP (2010⁄0101899-8)

    EMENTA

    PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ORDINÁRIA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. COMPETÊNCIA DO STF. DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS DO REQUERENTE. PRESUNÇÃO IURIS TANTUM. CONTRARIEDADE. PARTE ADVERSA E JUIZ, DE OFÍCIO, DECORRENTE DE FUNDADAS RAZÕES. CRITÉRIOS OBJETIVOS.

  8. Trata-se de recurso especial cuja controvérsia orbita em torno da concessão do benefício da gratuidade de justiça.

  9. O STJ, em sede de recurso especial, conforme delimitação de competência estabelecida pelo artigo 105, III, da Constituição Federal de 1988, destina-se a uniformizar a interpretação do direito infraconstitucional federal, razão pela qual é defeso, em seu bojo, o exame de matéria constitucional, cuja competência é do STF.

  10. Há violação dos artigos e da Lei n. 1.060⁄50, quando os critérios utilizados pelo magistrado para indeferir o benefício revestem-se de caráter subjetivo, ou seja, criados pelo próprio julgador, e pelos quais não se consegue inferir se o pagamento pelo jurisdicionado das despesas com o processo e dos honorários irá ou não prejudicar o seu sustento e o de sua família.

  11. A constatação da condição de necessitado e a declaração da falta de condições para pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios erigem presunção relativa em favor do requerente, uma vez que esta pode ser contrariada tanto pela parte adversa quanto pelo juiz, de ofício, desde que este tenha razões fundadas.

  12. Para o indeferimento da gratuidade de justiça, conforme disposto no artigo 5º da Lei n. 1.060⁄50, o magistrado, ao analisar o pedido, perquirirá sobre as reais condições econômico-financeiras do requerente, podendo solicitar que comprove nos autos que não pode arcar com as despesas processuais e com os honorários de sucumbência. Isso porque, a fundamentação para a desconstituição da presunção estabelecida pela lei de gratuidade de justiça exige perquirir, in concreto, a atual situação financeira do requerente.

  13. No caso dos autos, os elementos utilizados pelas instâncias de origem para indeferir o pedido de justiça gratuita foram: a remuneração percebida e a contratação de advogado particular. Tais elementos não são suficientes para se concluir que os recorrentes detêm condições de arcar com as despesas processuais e honorários de sucumbência sem prejuízo dos próprios sustentos e os de suas respectivas famílias.

  14. Recurso especial provido, para cassar o acórdão de origem por falta de fundamentação, a fim de que seja apreciado o pedido de gratuidade de justiça nos termos dos artigos e da Lei n. 1.060⁄50.

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Trata-se, originariamente, de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pelos servidores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo, na qual pleiteiam, em face da Fazenda Pública Estadual, o pagamento de vantagem pecuniária, a título de sexta-parte dos vencimentos integrais, incidentes sobre a totalidade dos vencimentos auferidos, que não vinha sendo adimplida nos moldes determinados pela Constituição Estadual, bem como o deferimento da justiça gratuita, ao fundamento de que não possuem condições de arcar com as custas e honorários advocatícios, sem que comprometam os seus próprios sustentos.

    O Juízo singular indeferiu a concessão da gratuidade de justiça nos seguintes termos:

    [...

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