Acórdão nº 2009/0224319-0 de T3 - TERCEIRA TURMA

Data15 Março 2011
Número do processo2009/0224319-0
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.166.498 - RJ (2009⁄0224319-0)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : U.B.L. E OUTRO
ADVOGADOS : PATRICIA GUIMARÃES HERNANDEZ
L.C.G.
JOÃOV.D.C.
RECORRIDO : COMÉRCIOD.C.G.L.
ADVOGADO : LUIS ANTONIO NASCIMENTO CURI E OUTRO(S)

EMENTA

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA COMERCIAL. MARCA FRACA OU EVOCATIVA. POSSIBILIDADE DE CONVIVÊNCIA COM OUTRAS MARCAS. IMPOSSIBILIDADE DE CONFERIR EXCLUSIVIDADE À UTILIZAÇÃO DE EXPRESSÃO DE POUCA ORIGINALIDADE OU FRACO POTENCIAL CRIATIVO.

  1. Marcas fracas ou evocativas, que constituem expressão de uso comum, de pouca originalidade ou forte atividade criativa, podem coexistir harmonicamente. É descabida, portanto, qualquer alegação de notoriedade ou anterioridade de registro, com o intuito de assegurar o uso exclusivo da expressão de menor vigor inventivo.

  2. Marcas de convivência possível não podem se tornar oligopolizadas, patrimônios exclusivos de um restrito grupo empresarial, devendo o Judiciário reprimir a utilização indevida da exclusividade conferida ao registro quando esse privilégio implicar na intimidação da concorrência, de modo a impedi-la de exercer suas atividades industriais e explorar o mesmo segmento mercadológico. Aplicação da doutrina do patent misuse.

RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Massami Uyeda, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, P. deT.S. e Vasco Della Giustina votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 15 de março de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 1.166.498 - RJ (2009⁄0224319-0)

RECORRENTE : U.B.L. E OUTRO
ADVOGADOS : PATRICIA GUIMARÃES HERNANDEZ
L.C.G.
JOÃOV.D.C.
RECORRIDO : COMÉRCIOD.C.G.L.
ADVOGADO : LUIS ANTONIO NASCIMENTO CURI E OUTRO(S)

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

Trata-se de recurso especial interposto por U.B.L. e UNILEVER N.V., com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em face de acórdão exarado pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF 2ª Região).

Ação: ordinária de nulidade de registro de marca, com pedido de liminar específica da Lei 9.279⁄96, proposta por U.B.L. e U.N.V. em face deC.D.C.G.L. e INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL – INPI. Na inicial, as autoras relatam que há aproximadamente 22 anos são as titulares do registro da marca nominativa “EBONY”, utilizada pela linha de desodorantes “REXONA”, de sua fabricação. Contudo, em meados de 2004 a ré C.D.C.G.L. obteve o registro da marca “ÉBANO & MARFIM” junto ao INPI, circunstância que caracterizaria a utilização indevida da marca “EBONY”, de titularidade das autoras. Nesse sentido, “ao se deparar com um produto de higiene pessoal identificado pela marca ÉBANO & MARFIM, o consumidor, automaticamente, fará uma associação direta com a marca da 2ª Autora, pensando se tratar de produtos da mesma origem.” Requerem, por fim, a concessão de liminar para a imediata suspensão dos efeitos do registro do termo “ÉBANO & MARFIM”, bem como a posterior declaração de sua nulidade (fls. 4⁄18 e-STJ).

Ambos os réus ofereceram contestação. O INPI reconheceu a procedência do pedido formulado pelas autoras, pois a marca “ÉBANO & MARFIM” realmente não estaria dotada da necessária distintividade em relação a “EBONY” (fls. 249⁄297 e 386⁄389).

Sentença: julgou procedente a pretensão das autoras, aduzindo que “a marca registrada a favor da segunda Ré ÉBANO & MARFIM é nula por infração ao artigo 124, XIX da LPI e deve ser desconstituída sob pena de concorrência desleal” (fls. 519⁄524 e-STJ).

Acórdão: a ré C.D.C.G.L. interpôs recurso de apelação (fls. 530⁄534 e-STJ), ao qual o TRF da 2ª Região deu provimento, por maioria de votos. A decisão colegiada recebeu a seguinte ementa (fls. 567⁄578 e-STJ):

APELAÇÃO – PROPRIEDADE INDUSTRIAL – MARCA – COLIDÊNCIA - EXPRESSÕES DE USO CORRENTE – RECURSO PROVIDO

I – O uso generalizado das expressões “ÉBANO” (português) e “EBONY” (inglês) culminou por engendrar culturalmente mais uma forma de cor, a cor de ébano, associada hoje no imaginário popular à raça negra.

II – De forma que não se pode conferir o uso exclusivo de tal expressão no mercado, à semelhança do que ocorre com os vocábulos, branco, negro, amarelo, pardo, ruivo, alvo, mulato e tantos outros, por serem de uso corrente em nossa língua, não podendo o INPI, com base em anterioridade impeditiva, indeferir novas solicitações de terceiros, igualmente interessados, impondo-se, destarte, o ônus da convivência pacífica.

III – Apelação e Remessa Necessária providas.

Embargos infringentes: interpostos pelas autoras (fls. 583⁄596), foram rejeitados, conforme atesta a ementa abaixo transcrita (fls. 671⁄676 e-STJ):

PROPRIEDADE INDUSTRIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO MARCÁRIO. EBONY E ÉBANO. EXPRESSÕES RELACIONADAS AOS AFRODESCENDENTES.

A expressão ÉBANO, em português ou EBONY, em inglês, é frequentemente empregada para identificar os afrodescendentes, invocando, pois, no caso concreto, uma qualidade especial de um produto, merecendo, portanto, receber proteção de marca fraca, ou seja, ter de suportar o ônus da convivência pacífica.

Embargos Infringentes conhecidos e improvidos.

Recurso especial: interposto pelas sociedades U.B.L. e UNILEVER N. V. com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional. As autoras sustentam a necessidade de reforma do acórdão proferido pelo TRF da 2ª Região pelas razões a seguir, dentre outras (fls. 679⁄695 e-STJ):

O termo “EBONY” não pode ser considerado de uso comum para o segmento de mercado no qual é utilizado pelas recorrentes. Assim, para que “seja considerada irregistrável com base no artigo 124, VI, da LPI, a marca deve ter relação direta e imediata com o produto ou serviço que deseja assinalar, o que, definitivamente, não é o caso dos autos, já que o termo EBONY (ou ÉBANO, em português) é uma palavra que não tem qualquer relação com produtos de higiene pessoal” (fl. 690 e-STJ);

O registro da marca “ÉBANO & MARFIM” é absolutamente nulo em razão da preexistência do registro do termo “EBONY”, nos termos do art. 124, XIX, da Lei 9.279⁄96;

O entendimento defendido pelo acórdão recorrido vai de encontro ao adotado em diversos julgados paradigmas proferidos por esta Corte, em flagrante...

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