Acórdão nº 2009/0099555-2 de T6 - SEXTA TURMA
Data | 22 Março 2011 |
Número do processo | 2009/0099555-2 |
Órgão | Sexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil) |
HABEAS CORPUS Nº 137.144 - PE (2009⁄0099555-2)
RELATORA | : | MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA |
IMPETRANTE | : | P.L.N. E OUTROS |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO |
PACIENTE | : | R.P.D.S. (PRESO) |
EMENTA
PENAL. DESCAMINHO. INSIGNIFICÂNCIA. DÉBITO DE R$ 2700,00. ART. 20 DA LEI 10.522⁄02: LIMITE DE R$ 10.000,00. PRECEDENTES DO STF E DO STJ.ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRECEITO SECUNDÁRIO. DERROGAÇÃO PELO ART. 8º DA LEI Nº 8.072⁄90. PENA. EXASPERAÇÃO. FLAGRANTE ILEGALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. POSSE DE ARMA DE FOGO. PERÍODO DA VACATIO LEGIS. ABOLITIO CRIMINIS.
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Pacificou-se no STF e no STJ a compreensão de que autuações fiscais aduaneiras aquém de dez mil reais não possuem dignidade penal, à luz do princípio da insignificância, que evidencia no comportamento atipicidade material em relação ao art. 334 do Código Penal.
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Segundo entendimento do STF, adotado por esta Corte (EResp nº 149.768⁄SP), para o crime de associação para o tráfico (art. 14 da Lei nº 6.368⁄76), há de ser aplicado o preceito secundário (pena), instituído pelo art. 8º da Lei nº 8.072⁄90 (de 3 a 6 anos de reclusão sem multa), afastando-se a pena de multa.
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Fica mantida a reprimenda do crime de tráfico porque aferir se a pena-base foi exasperada de modo indevido, com reflexos na dosimetria, somente se coloca viável em sede de habeas corpus quando demonstrada flagrante ilegalidade, não ocorrente na espécie.
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Fundado o apenamento em variadas circunstâncias judiciais desfavoráveis, notadamente a expressiva quantidade de droga apreendida, 4,5 Kg de "crack", substância de alto poder de viciamento e, por isso mesmo, de grande capacidade de destruição da saúde, o que, aliado ao modo em que perpetrado o delito, com logística de vulto e organização audaz, denotam e dão supedâneo ao aumento, que não se mostra desproporcional, mas decorrente da discricionariedade fundamentada, própria da atividade judicante.
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Este Sodalício firmou entendimento no sentido de que a vacatio legis estabelecida pelos artigos 30 e 32 da Lei nº 10.826⁄2003 para a regularização das armas dos seus proprietários e possuidores é reconhecida hipótese de abolitio criminis temporalis, inclusive se a arma tiver numeração raspada ou for de uso restrito.
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É de rigor a extinção da punibilidade se o paciente foi condenado, como incurso no artigo 16, caput da Lei nº 10.826⁄03, por ter em sua posse uma arma de fogo, de uso restrito, em 17⁄03⁄2006, dentro de sua residência, no período da vacatio legis, prorrogado pela Lei nº 11.706⁄2008
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Habeas corpus concedido em parte apenas para reconhecer a atipicidade do descaminho e reduzir a pena privativa de liberdade (total) a 14 anos de reclusão (09 anos para o tráfico e 05 anos para a associação) e, ex offício, afastar a pena de multa neste último crime e reconhecer a abolitio criminis da posse de arma (art. 16, caput da Lei nº 10.826⁄03), mantida a pena de multa do tráfico.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, concedeu parcialmente a ordem de habeas corpus e expediu ordem de ofício, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora." Os Srs. Ministros Og Fernandes, Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ⁄SP) e Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ⁄CE) votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.
Brasília, 22 de março de 2011(Data do Julgamento)
Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora
HABEAS CORPUS Nº 137.144 - PE (2009⁄0099555-2)
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA IMPETRANTE : P.L.N. E OUTROS IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO PACIENTE : R.P.D.S. (PRESO) RELATÓRIO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA:
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de R.P.D.S., apontando como autoridade coatora a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da Quinta Região (Apelação Criminal n.º 2006.83.02.000332-0).
Segundo se colhe, o paciente, juntamente com outras duas pessoas, foi denunciado e, em primeiro grau de jurisdição, foi absolvido da prática descrita no art. 334, §1º do Código Penal e condenado no art. 12 c⁄c o art. 18, inciso I e 14 todos da Lei nº 6.368⁄76 e no art. 16 da Lei nº 10.826⁄2003, a uma pena total de 19 anos e 04 meses de reclusão, no regime inicial fechado.
Manejada apelação pelo Ministério Público Federal, foi provida para condenar o paciente por prática descrita no art. 334, §1º do Código Penal (descaminho), afastando o princípio de bagatela, porque o valor das mercadorias internalizadas no país (R$ 2.300,00) não autoriza concluir pela atipicidade, além do que trata-se de crime contra a Administração Pública, aumentando ainda as penas pelos outros delitos, resultando em uma pena total de 27 anos e 03 meses de reclusão.
Daí a presente impetração, pretendendo:
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absolvição pelo delito do art. 16 da Lei nº 10.826⁄03 (posse ilegal de arma de fogo de uso restrito), porque, à época em que ocorrida a conduta (17⁄03⁄2006), era momentaneamente atípica, nos termos das Leis nºs 10.884⁄04, 11.118⁄05, 11.191⁄05, 11.706⁄08 e 11.922⁄09, que conferiram nova redação aos arts. 30 e 32 do Estatuto do Desarmamento, conforme o entendimento desta Corte;
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absolvição do crime de descaminho (art. 334, caput do Código Penal), pela atipicidade material (insignificância), pois o valor dos bens é de R$ 2.300,00, amparados, portanto, pelo limite de R$ 10.000,00 da Lei nº 10.522⁄02, com redação dada pela Lei nº 11.033⁄04 e
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anulação da dosimetria realizada pelo Tribunal de origem, pois é desproporcional e violadora da individualização das penas, pois fixada a pena-base para o tráfico em 12 anos de reclusão, ou seja, no quádruplo do mínimo, e, para o crime de associação, em 07 anos e 06 meses de reclusão, mais do que o dobro, patamar que supera o limite máximo previsto no art. 8º da Lei nº 8.072⁄90. Para o crime de descaminho, a fixação em 06 anos de reclusão, no máximo previsto em lei, também seria exagerada. Salienta a impetração que todas os aumentos não estariam providos de fundamentos bastantes, pois baseados em fórmulas vazias e abstratas e também em elementos que, em última ratio, seriam próprios dos tipos penais, ocorrendo bis in idem.
Pede, em liminar, sejam suspensos os efeitos do acórdão e, no mérito, seja deferida a ordem para absolver o paciente da posse ilegal de arma e do crime de descaminho, anulando ainda a dosimetria, no tocante aos demais delitos, com nova fixação das penas.
Os autos, inicialmente distribuídos ao Ministro Nilson Naves, foram ao Ministério Público Federal sem informações (fls. 614⁄640) e, determinada pelo Supremo Tribunal Federal, a imediata redistribuição do feito (fl. 690), veio à minha relatoria, tendo sido indeferida a liminar (fls. 707⁄711).
O novo parecer do Ministério Público Federal é pela concessão parcial da ordem (fls. 2171⁄2179).
É o relatório.
HABEAS CORPUS Nº 137.144 - PE (2009⁄0099555-2)
EMENTA
PENAL. DESCAMINHO. INSIGNIFICÂNCIA. DÉBITO DE R$ 2700,00. ART. 20 DA LEI 10.522⁄02: LIMITE DE R$ 10.000,00. PRECEDENTES DO STF E DO STJ.ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRECEITO SECUNDÁRIO. DERROGAÇÃO PELO ART. 8º DA LEI Nº 8.072⁄90. PENA. EXASPERAÇÃO. FLAGRANTE ILEGALIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. POSSE DE ARMA DE FOGO. PERÍODO DA VACATIO LEGIS. ABOLITIO CRIMINIS.
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Pacificou-se no STF e no STJ a compreensão de que autuações fiscais aduaneiras aquém de dez mil reais não possuem dignidade penal, à luz do princípio da insignificância, que evidencia no comportamento atipicidade material em relação ao art. 334 do Código Penal.
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Segundo entendimento do STF, adotado por esta Corte (EResp nº 149.768⁄SP), para o crime de associação para o tráfico (art. 14 da Lei nº 6.368⁄76), há de ser aplicado o preceito secundário (pena), instituído pelo art. 8º da Lei nº 8.072⁄90 (de 3 a 6 anos de reclusão sem multa), afastando-se a pena de multa.
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Fica mantida a reprimenda do crime de tráfico porque aferir se a pena-base foi exasperada de modo indevido, com reflexos na dosimetria, somente se coloca viável em sede de habeas corpus quando demonstrada flagrante ilegalidade, não ocorrente na espécie.
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Fundado o apenamento em variadas circunstâncias judiciais desfavoráveis, notadamente a expressiva quantidade de droga apreendida, 4,5 Kg de "crack", substância de alto poder de viciamento e, por isso mesmo, de grande capacidade de destruição da saúde, o que, aliado ao modo em que perpetrado o delito, com logística de vulto e organização audaz, denotam e dão supedâneo ao aumento, que não se mostra desproporcional, mas decorrente da discricionariedade fundamentada, própria da atividade judicante.
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Este Sodalício firmou entendimento no sentido de que a vacatio legis estabelecida pelos artigos 30 e 32 da Lei nº 10.826⁄2003 para a regularização das armas dos seus proprietários e possuidores é reconhecida hipótese de abolitio criminis temporalis, inclusive se a arma tiver numeração raspada ou for de uso restrito.
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É de rigor a extinção da punibilidade se o paciente foi condenado, como incurso no artigo 16, caput da Lei nº 10.826⁄03, por ter em sua posse uma arma de fogo, de uso restrito, em 17⁄03⁄2006, dentro de sua residência, no período da vacatio legis, prorrogado pela Lei nº 11.706⁄2008
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Habeas corpus concedido em parte apenas para reconhecer a atipicidade do descaminho e reduzir a pena privativa de liberdade (total) a 14 anos de reclusão (09 anos para o tráfico e 05 anos para a associação) e, ex offício, afastar a pena de multa neste último crime e reconhecer a abolitio criminis da posse de arma (art. 16, caput da Lei nº 10.826⁄03), mantida a pena de multa do tráfico.
VOTO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA(Relatora):
De início, quanto à incidência do princípio da insignificância em relação ao delito de descaminho, a matéria em foco encontra-se pacificada tanto no âmbito desta Corte como do Pretório Excelso.
Do Supremo Tribunal Federal, colhem-se os seguintes precedentes:
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