Acórdão nº 2010/0143236-8 de T3 - TERCEIRA TURMA

Data05 Abril 2011
Número do processo2010/0143236-8
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 181.231 - RO (2010⁄0143236-8)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
IMPETRANTE : P N DE M
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA
PACIENTE : P N DE M (PRESO)

EMENTA

HABEAS CORPUS. SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. ALIMENTANTE ADVOGADO. INADIMPLÊNCIA VOLUNTÁRIA E INESCUSÁVEL. PRISÃO CIVIL. PEDIDO DE REDUÇÃO DO TEMPO DE CUMPRIMENTO DA MEDIDA. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. PRETENSÃO DE TRANSFERÊNCIA PARA SALA DE ESTADO MAIOR OU CASA DO ALBERGADO OU DE CONVERSÃO EM PRISÃO DOMICILIAR. INADMISSIBILIDADE. A SEGREGAÇÃO CIVIL JÁ É UMA PRISÃO ESPECIAL. DIFERENÇAS ENTRE PRISÃO CIVIL E PRISÃO CRIMINAL. WRIT CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, DENEGADO.

  1. O STJ, em princípio, não pode apreciar diretamente em habeas corpus questão não debatida no tribunal apontado como autoridade coatora, sob pena de incorrer em indevida supressão de instância.

    Inadmissibilidade de exame da pretensão de redução do tempo de cumprimento da medida privativa de liberdade.

  2. A prisão civil e a prisão criminal possuem naturezas e fundamentos jurídicos distintos. Não é recomendável, portanto, o devedor de alimentos inadimplente cumprir a medida restritiva da liberdade em sala de Estado Maior ou Casa do Albergado ou, ainda, obter o benefício da prisão domiciliar.

  3. Apesar do Supremo Tribunal Federal ter reconhecido a constitucionalidade do art. 7º, V, da Lei 8.906⁄94 (Estatuto dos Advogados), na parte em que determina o recolhimento à prisão de advogados, antes de sentença transitada em julgado, em sala de Estado Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar, tal norma somente se aplica às prisões cautelares penais, não se refletindo nas prisões civis, ainda mais se considerar a hipótese de execução de alimentos definitivos oriundos de decisão já transitada em julgado ou de acordo homologado judicialmente.

  4. O instituto da prisão civil por inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia - permitido pelos arts. 5º, LXVII, da CF, 7º, 7, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), 18 e 19 da Lei 5.478⁄68 e 733, § 1º, do CPC - não constitui sanção penal, não ostentando, portanto, índole punitiva ou retributiva, mas, ao revés, é uma medida coercitiva, imposta com a finalidade de compelir o devedor recalcitrante a cumprir a obrigação de manter o sustento dos alimentandos, de modo que são inaplicáveis as normas que regulam o Direito Penal e a Execução Criminal.

  5. Em casos excepcionais, como o indivíduo ser portador de moléstia grave, de necessidades especiais ou de idade avançada e o estabelecimento prisional não puder suprir tais necessidades de caráter contínuo, a jurisprudência vem admitindo outras formas de execução da medida restritiva da liberdade, como a prisão domiciliar, mas, mesmo nesses casos, o fundamento utilizado é constitucional, qual seja, a preservação da dignidade da pessoa humana - e não normas de índole penal.

  6. A aplicação dos regramentos da execução penal, como forma de abrandar a prisão civil, poderá causar o desvirtuamento do instituto, já que afetará, de modo negativo, sua finalidade coercitiva, esvaziando, por completo, a medida de execução indireta da dívida alimentar, em detrimento do direito fundamental dos alimentandos à uma sobrevivência digna.

  7. A prisão civil já é uma forma de prisão especial, pois os presos civis devem ser recolhidos em "estabelecimento adequado" e, na falta deste, "em seção especial da Cadeia Pública" (art. 201 da LEP - Lei 7.210⁄84). É dizer, a privação da liberdade dos alimentantes inadimplentes deverá ser efetivada em local próprio, diverso do destinado aos presos criminais, o que preserva o devedor dos efeitos deletérios da convivência carcerária.

    Observância de tal regramento na espécie, já que o paciente se encontra segregado em uma sala administrativa, reservada, da Penitenciária local, não havendo contato com os presos comuns (aqueles que respondem ou responderam por algum delito).

  8. A expressão "sala de Estado Maior" é anacrônica, não devendo o conceito ser restringido a um recinto dentro de quartel. Ao contrário, deve ser entendido como uma sala sem grades, possuidora de adequadas condições de higiene e segurança (comodidades condignas), o que a distingue de cela, cuja finalidade típica é o aprisionamento de alguém.

  9. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, denegado.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente do habeas corpus e, nesta parte, denegar a ordem, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Massami Uyeda, S.B. e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 05 de abril de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

    (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 181.231 - RO (2010⁄0143236-8)

    RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
    IMPETRANTE : P N DE M
    IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA
    PACIENTE : P N DE M (PRESO)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (Relator): Cuida-se de habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, impetrado por P N DE M, em benefício próprio, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia.

    Consta dos autos que a filha do paciente ajuizou Execução de Alimentos pelo rito do art. 733 do CPC, requerendo o pagamento de prestações alimentares devidas pelo executado.

    Citado, o devedor aduziu, entre outras alegações, que não possuía condições de pagar a integralidade do valor requerido.

    O MM. Juiz singular, todavia, repelindo as arguições apresentadas pelo executado, determinou sua prisão civil pelo prazo de 90 dias (fl. 10).

    Impetrado habeas corpus perante a Corte de Justiça local, a ordem restou parcialmente concedida, a fim de permitir ao devedor inadimplente se ausentar do presídio durante o dia para trabalhar. O aresto restou assim ementado:

    Habeas corpus. Alimentos. Prisão civil. Legalidade. Mudança do regime prisional do fechado ao aberto. Procedente.

    Se o decreto de prisão civil decorrente de débito alimentício está de acordo com as formalidades previstas no Código de Processo Civil, inexiste ilegalidade a ser corrigida pela via do habeas corpus.

    O regime fechado, assim, revela-se inadequado, pois preso não poderá exercer ofício e quitar sua dívida, sendo melhor abrandar-se o cumprimento da pena durante o prazo fixado na sentença, com a obrigação de o paciente apresentar-se no presídio diariamente às 19h30 min e de lá ser liberado pela direção também todos os dias, às 6h00min, inclusive sábados e domingos, desde que comprove de imediato emprego definido. (fl. 17)

    Por isso o presente mandamus, pugnando o impetrante paciente pela concessão da ordem, a fim de que seja recolhido em Casa do Albergado - estabelecimento destinado ao regime prisional aberto -, ou, ao menos, seja transferido para uma sala de Estado Maior, ao argumento de que, em razão de sua condição de advogado, faz jus à prisão especial, nos termos do art. 7º, V, do Estatuto da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). Pleiteia, ainda, a redução do tempo de encarceramento: de 90 dias para 60 dias, alegando que o tempo de prisão arbitrado é exorbitante (fls. 01⁄09).

    O pedido de liminar foi indeferido às fls. 58⁄61.

    Informações prestadas às fls. 82⁄93.

    Parecer do Ministério Público Federal, às fls. 96⁄101, opinando pelo conhecimento parcial e pela denegação da ordem na parte conhecida.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 181.231 - RO (2010⁄0143236-8)

    RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
    IMPETRANTE : P N DE M
    IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA
    PACIENTE : P N DE M (PRESO)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (Relator): Em que pesem as alegações ventiladas na inicial, a hipótese é de parcial conhecimento da impetração e de denegação do writ na parte conhecida.

    De início, com relação à pretensão de redução do tempo de cumprimento da medida privativa da...

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