Acórdão nº REsp 1210553 / RJ de T3 - TERCEIRA TURMA

Magistrado ResponsávelMinistra NANCY ANDRIGHI (1118)
EmissorT3 - TERCEIRA TURMA
Tipo de RecursoRecurso Especial

RECURSO ESPECIAL Nº 1.210.553 - RJ (2010⁄0164671-5)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : VALE S⁄A
ADVOGADOS : P.A.D.F.G.
ALBERTOP.R.
CARLOSA.D.S.L.E.O. MIGUELP.N.
ANTÔNIOC.F.
RECORRIDO : FUNDAÇÃO PETROBRÁS DE SEGURIDADE SOCIAL PETROS
ADVOGADOS : LUIZ ALFREDO TAUNAY E OUTRO(S)
J.P.S.P.
LEONARDOF.L.

EMENTA

PROCESSO CIVIL. DEVOLUTIVIDADE RECURSAL. TEORIA DA CAUSA MADURA. LEGITIMIDADE DAS PARTES. CIVIL E COMERCIAL. COMPRA E VENDA MERCANTIL DE OURO A TERMO. COBRANÇA DE EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. PLANOS BRESSER, VERÃO E COLLOR. CORREÇÃO MONETÁRIA. ANATOCISMO. PROVA PERICIAL. QUESTÃO DE FATO. QUITAÇÃO. AUSÊNCIA DE NULIDADE CONTRATUAL. RECOMPOSIÇÃO DE VALOR DE MOEDA. PRECLUSÃO INEXISTENTE. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

  1. Trata-se de questionamento acerca da responsabilidade por reposição de expurgos inflacionários, ocorridos na liquidação de contratos de compra e venda de aproximadamente cinco toneladas de ouro entre empresa fundidora e entidade de previdência privada, com intermediação de instituição responsável pelo registro da operação no mercado de capitais.

  2. O Tribunal de origem, ao apreciar questões levantadas até a interposição de apelação, atua nos limites da devolutividade recursal (art. 535, § 1o, do CPC). O simples fato de apreciar questão preliminar omissa na sentença não evidencia por si só a aplicação da teoria da causa madura (art. 535, § 3o, do CPC). Precedentes.

  3. A instituição intermediadora – Cetip S.A. – atua na operação por imposição legal e simplesmente registra a circulação dos papéis representativos da custódia do metal. Ao registrar e custodiar os contratos de compra e venda, atua como mera mandatária dos titulares do crédito lastreado em ouro, não se responsabilizando por problemas decorrentes do adimplemento contratual (art. 13 do Regulamento de Operações do Sistema Nacional do Ouro).

  4. Assim como ocorre na revisão de contratos de investimentos em fundos de renda fixa (CDB), é devida a cobrança de expurgos inflacionários relativos aos planos econômicos Bresser, Verão e Collor nos contratos de compra e venda mercantil de ouro a termo.

  5. É inviável rever conclusões de perícia que apontam inexistência de anatocismo, pois implica reexame de fatos e provas, o que é vedado pela Súmula 7⁄STJ.

  6. Inexiste nulidade da quitação do negócio celebrado, mas mera recomposição de valor de moeda, que não está sujeita à preclusão temporal sob pena de se permitir o enriquecimento sem causa e o desequilíbrio contratual. Precedente.

  7. Recurso não provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, P. deT.S. e Vasco Della Giustina votaram com a Sra. Ministra Relatora. Dr(a). PEDRO PAULO SALLES CRISTÓFARO, pela parte RECORRENTE: VALE S⁄A. Dr(a). JOSÉ PAULO SEPULVEDA PERTENCE, pela parte RECORRIDA: F.P.D.S.S.P.

    Brasília (DF), 12 de abril de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    Relatora

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.210.553 - RJ (2010⁄0164671-5)

    RECORRENTE : VALE S⁄A
    ADVOGADOS : P.A.D.F.G.
    ALBERTOP.R.
    CARLOSA.D.S.L.E.O. MIGUELP.N.
    ANTÔNIOC.F.
    RECORRIDO : FUNDAÇÃO PETROBRÁS DE SEGURIDADE SOCIAL PETROS
    ADVOGADOS : LUIZ ALFREDO TAUNAY E OUTRO(S)
    JOSÉ PAULO SEPULVEDA PERTENCE

    RELATÓRIO

    A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

    Cuida-se de recurso especial interposto por VALE S⁄A com fundamento nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo TJ⁄RJ.

    Ação: de cobrança movida pela requerida, PETROS, em face de VALE S.A., a fim de obter o pagamento de diferenças relativas aos expurgos inflacionários previstos pelos Planos Verão e Collor, verificados na liquidação em espécie de contratos mercantis de compra e venda de ouro a termo (fls. 271⁄340), nos quais a requerente figurava como vendedora e a requerida, como compradora. (e-STJ fls. 3⁄17).

    Segundo consta dos autos, a ré teria disponibilizado em oferta pública a venda de 15 toneladas de ouro em 29⁄9⁄1988. A autora, por ser entidade de previdência complementar fechada, adquiriu 4,8 toneladas do metal para entrega futura, contudo, devido a questões de rentabilidade, optou por exercer o direito de arrependimento contratualmente previsto e exigir a restituição dos valores investidos em espécie, ao invés de receber o metal fisicamente. Devido aos planos Bresser e Collor, entende a autora que houve indevido expurgo inflacionário no momento em que recebera o valor investido de volta. Sustenta que o índice aplicado à época pela VALE não correspondia ao da inflação existente, sendo que o resgate deveria ter sido amparado em rendimento idêntico ao das cadernetas de poupança. Pugnou pela condenação da sociedade requerida ao ressarcimento dos seguintes itens: (i) diferença de correção monetária sobre a taxa de 42,72% (IPC de janeiro de 1989) e 44,8% (IPC de abril de 1990); (ii) valor principal da condenação monetariamente corrigido desde o vencimento dos contratos, somados às diferenças indevidamente expurgadas (IPC de março a maio de 1990 e fevereiro de 1991); (iii) juros contratuais até o vencimento dos contratos; (iv) juros de mora até o integral cumprimento da sentença.

    Contestação: a requerente sustentou em sua defesa: (i) preliminar de ilegitimidade ativa da requerida, uma vez que a propriedade dos contratos foram transferidos fiduciariamente à CETIP S.A. - Balcão Organizado de Ativos e Derivativos; (ii) a extinção da obrigação, já que os títulos objeto de discussão foram devolvidos ao devedor; (iii) a outorga de quitação, nos termos do regulamento do SINO (Sistema Nacional do Ouro); e (iv) o anatocismo resultante da indevida cumulação de juros moratórios e compensatórios, sem previsão contratual.

    Despacho saneador: afastou as preliminares de mérito arguidas pela requerente (prescrição e decadência), sem apreciar, contudo, a preliminar de ilegitimidade ativa da requerida.

    Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido inicial (fls. 735⁄739), para condenar o recorrente a:

    (i) pagamento dos valores expurgados, recalculando-se a correção monetária do valor restituído à autora com base no IPC, segundo o percentual de 42,72% (janeiro⁄1989) e 44,80% (abril⁄1990), abatido o valor correspondente à correção monetária já paga que totaliza o valor de R$ 232.174.191,00 (duzentos e trinta e dois milhões e cento e setenta e quatro mil e cento e noventa e um reais);

    (ii) pagamento da correção monetária sobre os valores acima segundo a variação da UFIR-RJ;

    (iii) pagamento de juros remuneratórios à taxa de 0,5% ao mês;

    (iv) pagamento de juros moratórios à taxa de 0,5% ao mês até janeiro de 2003, e 1% a partir de então, nos termos do art. 406 do CC, contados das datas dos respectivos resgates (1o⁄10⁄1990, 1o⁄10⁄1991 e 1o⁄10⁄1992).

    Embargos de declaração: opostos para suprir as questões pertinentes à ilegitimidade passiva, quitação por entrega dos títulos e respectiva decadência para sua anulação e anatocismo (fls. 742⁄745), foram rejeitados (fl. 746).

    Acórdão: o TJ⁄RJ, por unanimidade, rejeitou a preliminar de ilegitimidade ativa e, no mérito, negou provimento ao recurso de apelação do ora recorrido (e-STJ fls. 765⁄777). O acórdão foi assim ementado (e-STJ fls. 821⁄822):

    APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. COMPRA E VENDA DE OURO. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA SENTENÇA. INEXISTÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM QUE NÃO SE SUSTENTA. RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE AS PARTES. PLANOS ECONÔMICOS. DIFERENÇA DE RENDIMENTOS. PLANO BRESSER, VERÃO E COLLOR.

    O fato de a decisão recorrida não enfrentar todas as questões arguidas pelas partes não enseja, por si só, o vício apontado pela ora Recorrente. Mormente quando tais questões são meramente de direito e a causa já se encontra madura para o julgamento, hipótese em que o Tribunal de Justiça, com esteio no art. 515, do CPC, poderá sanar o suposto vício e julgar diretamente o mérito da demanda A instituição do Balcão Organizado de Ativos e Derivativos - CETIP visa apenas promover uma ação coordenada, assegurar uma maior segurança aos vendedores e aos compradores, garantido àqueles que a entrega do objeto vendido será feita somente contra o efetivo pagamento do valor acordado e permitindo a estes que o pagamento somente seja processado mediante o recebimento do objeto da operação A CETIP funcionou apenas como órgão registrador e liquidante do contrato firmado entre as partes, não sendo este Órgão o titular dos valores negociados.

    É de sabença que os “planos econômicos” do Governo Federal à época para estabilização da economia, denominados “Bresser”, “Verão” e “Collor I e II” acarretaram sérias consequências econômicas, notadamente para os depósitos em caderneta de poupança. Em junho 1987, o “Planos Bresser” ocasionou perda na ordem de 42,72%¨, e o “Plano Collor”, em março, abril e maio de 1990, provocou perdas num primeiro momento de 84,32%, depois 44,80% e 7,87%, fechando em fevereiro de 1991 com mais 21,87%.

    A correção monetária não é um plus, nem se revela em um acréscimo, cuida-se de reposição do valor real da moeda, ou seja, do seu real poder de compra, constituindo, consequentemente, um imperativo de justiça e de equidade.

    RECURSO IMPROVIDO.

    Embargos de declaração: foram rejeitados.

    Recurso especial: interposto com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional (fls. 853⁄899), aponta, além de divergência jurisprudencial, ofensa:

    (i) aos arts. 6o, 267, VI, 458, II e III, e 535 do CPC, porquanto o juízo de primeiro grau não apreciou questões preliminares capazes de extinguir a lide sem julgamento de mérito, nem fundamentou adequadamente a rejeição dos embargos de declaração opostos;

    (ii) ao art. 515 do CPC, afirmando que o Tribunal de origem apreciou causa que não era madura, complementando indevidamente questão omissa na...

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