Acórdão nº HC 122456 / RJ de T5 - QUINTA TURMA

Data05 Abril 2011
Número do processoHC 122456 / RJ
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 122.456 - RJ (2008⁄0267202-1)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ
IMPETRANTE : F.A.F. E OUTROS
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2A REGIÃO
PACIENTE : AGOSTINHO SERÓDIO BOECHAT

EMENTA

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. DELITOS PRATICADOS NA CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. QUESTIONAMENTO SOBRE O PRAZO E EXTENSÃO DOS DADOS CAPTADOS. MATÉRIA NÃO APRECIADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. EXISTÊNCIA DE INVESTIGADOS NO EXERCÍCIO DO CARGO ELETIVO DE VEREADOR À ÉPOCA DOS FATOS. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA E DILIGÊNCIAS DETERMINADAS POR MAGISTRADO FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA, NA FASE INVESTIGATÓRIA, ANTES DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA E QUE TEVE SUA INCOMPETÊNCIA RATIONE MATERIAE POSTERIORMENTE DECLARADA PELO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE ILICITUDE DAS PROVAS. VALIDADE DAS DILIGÊNCIAS DEFERIDAS POR JUIZ INCOMPETENTE NA FASE PRÉ-PROCESSUAL. INTELIGÊNCIA DE PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DESTA CORTE. RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. PRÁTICA DO ATO PELO JUÍZO FEDERAL COMPETENTE QUANDO NENHUM DOS DENUNCIADOS ENCONTRAVA-SE NO EXERCÍCIO DA VEREANÇA. NULIDADE INEXISTENTE.

  1. A questão referente ao tempo e à dimensão das interceptações telefônicas não foi objeto do acórdão impetrado, o qual cuidou apenas da matéria referente à competência para processamento e julgamento do feito. Inviáveis tais análises por esta Corte, sob pena de indevida supressão de instância.

  2. Tem-se, no art. 1.º da Lei n.º 9.296⁄96, que "[a] interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça". Tal regra não impede, entretanto, o deferimento de autorização de referida diligência por Juízo diverso daquele que veio a julgar a ação penal, quando concedida ainda no curso das investigações criminais. Precedentes.

  3. "Quando [...] a interceptação telefônica constituir medida cautelar preventiva, ainda no curso das investigações criminais, a mesma norma de competência há de ser entendida e aplicada com temperamentos, para não resultar em absurdos patentes" (STF, HC 81260⁄ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 19⁄04⁄2002).

  4. Em 28⁄05⁄2007, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no julgamento de Arguição de Inconstitucionalidade n.º 01⁄06, declarou inconstitucional a prerrogativa de foro dos vereadores dos municípios do Estado do Rio de Janeiro, prevista no art. 161, inciso IV, alínea d, item 3, da Constituição Estadual. Portanto, no momento dos fatos ora questionados, aparentemente, os parlamentares municipais deveriam ser processados e julgados por Juízes de primeira instância.

  5. O fato de os Tribunais de hierarquia superposta terem posteriormente afirmado a validade da referida prerrogativa de foro, então afastada em controle difuso de constitucionalidade pela Corte fluminense, não impede que se considerem válidas as medidas cautelares requeridas ao tempo das investigações ao órgão julgador supostamente competente – qual seja, o Juízo Singular.

  6. Além disso, no caso concreto, havia a discussão, ainda, se a prerrogativa de foro estabelecida apenas na Constituição Estadual teria o condão de fixar, por analogia, a competência originária do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região, no caso de crimes sujeitos à jurisdição federal.

  7. Fundamentos que afastam, também, a alegação de invalidade das diligências e interceptações e de ilicitude das provas nelas obtidas, em razão de terem sido determinadas pelo Juízo Federal da Subseção Judiciária de Itaperuna⁄RJ – posteriormente declarado incompetente, ratione materiae, pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

  8. O fato de um dos investigados (então Presidente da Câmara de Vereadores) ter ocupado o cargo de Prefeito Municipal interinamente, por apenas 18 (dezoito) dias, no curso das investigações, não teria o condão de fazer modificar a competência para o deferimento das diligências requeridas pela autoridade policial.

  9. Se, posteriormente, na data em que houve o recebimento da denúncia pelo Juízo Federal de 1.º grau declarado competente pela Corte Regional, nenhum dos Corréus continuava investido no cargo eletivo de vereador, resta prejudicada a tese de que, em razão da prerrogativa de foro prevista na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, no caso de crimes de competência federal, por analogia, deveria a ação penal ser julgada originariamente pelo Tribunal Regional Federal da 2.ª Região.

  10. Uma vez expressamente recebida a peça acusatória pelo Juízo da 8.ª Vara Federal, competente para o julgamento da ação penal, cessa a discussão travada no presente writ acerca do validade do recebimento efetivado pelo Juízo Federal de Itaperuna⁄RJ.

  11. Ordem parcialmente conhecida e, nessa parte, denegada.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento,por unanimidade, conhecer parcialmente do pedido e, nessa parte, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Gilson Dipp votaram com a Sra. Ministra Relatora.

    Não participou do julgamento o Sr. Ministro Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ⁄RJ) - Art. 162, § 2º do RISTJ.

    SUSTENTOU ORALMENTE NA SESSÃO DE 14⁄12⁄2010: DR. RICARDO SIDI MACHADO DA SILVA (P⁄ PACTE)

    Brasília (DF), 05 de abril de 2011 (Data do Julgamento)

    MINISTRA LAURITA VAZ

    Relatora

    HABEAS CORPUS Nº 122.456 - RJ (2008⁄0267202-1)

    IMPETRANTE : F.A.F. E OUTROS
    IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2A REGIÃO
    PACIENTE : AGOSTINHO SERÓDIO BOECHAT

    RELATÓRIO

    A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:

    Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de A.S.B., em face do Tribunal Regional Federal da 2ª Região.

    Narram os Impetrantes ter sido decretada a quebra do sigilo telefônico do Paciente, pelo Juiz da Vara Federal de Itaperuna (RJ) em 26 de julho de 2007, a qual perdurou até 04 de dezembro do mesmo ano. Nova decretação ocorreu em 06 de março de 2008, tendo sido prorrogada até 16 de junho subsequente, totalizando as duas cerca de 274 (duzentos e setenta e quatro) dias.

    Na sequência, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia e requereu a prisão preventiva do Paciente e outros acusados, além da realização de diligências, as quais foram deferidas pelo Juízo mencionado quando do recebimento da peça acusatória, em 19 de junho de 2008 (fls. 482⁄568).

    Impetrou-se habeas corpus perante o Tribunal Regional Federal da 2ª Região. No julgamento deste, suscitou-se questão de ordem na qual concluiu-se que o Juízo de origem seria absolutamente incompetente para o julgamento da ação penal, em razão da matéria, nos termos da Resolução n.º 05⁄2006, daquela Corte, razão pela qual determinou-se a remessa do feito a uma das Varas Federais da Seção Judiciária do Estado Rio de Janeiro especializadas em delitos praticados por organizações criminosas (fls. 50⁄58). Dizem que, não obstante o reconhecimento da incompetência, não houve anulação dos atos investigatórios, nem se declarou a ilicitude das provas colhidas e, tampouco, revogou-se a prisão preventiva, a qual veio ser posteriormente cassada pelo Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus n.º 95.304⁄RJ.

    Encaminhados os autos da ação penal ao Juízo da 8ª Vara Federal Criminal do Estado do Rio de Janeiro, este deu-se por incompetente e determinou o encaminhamento da ação penal ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por considerar que haveria competência originária para julgá-la, tendo em vista figurarem três vereadores entre os acusados. Disse a Magistrada de 1º grau que, em razão de a Constituição do Estado do Rio de Janeiro prever que os edis fossem julgados pelo Tribunal de Justiça (art. 161, inciso IV, alínea "d", item 3), no âmbito federal, por analogia, exsurgiria a competência da Corte Regional detentora de jurisdição sobre a respectiva Unidade da Federação.

    Remetidos os autos ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, o Relator, em decisão monocrática, reafirmou a competência do Juízo de primeiro grau. A Defesa interpôs agravo regimental, ao qual o Plenário daquela Corte negou provimento, em acórdão assim ementado:

    "AGRAVO INTERNO. VEREADOR. COMPETÊNCIA FEDERAL. JUÍZO A QUO. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. PRIVILÉGIO DE FORO. INAPLICABILIDADE.

  12. A Constituição Pátria não inseriu no generoso rol de detentores do privilégio de se verem processados e julgados originariamente pelos Tribunais de 2ª instância, dentre outros, os membros das Câmaras Municipais, estando tal prerrogativa somente elencada na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, a qual em ato de altruísmo não se furtou de prevê-la.

    1. De acordo com a Constituição Federal, especificamente os arts. 25, caput, 29, caput, e 32, caput, vinculam-se aos Estados, Municípios e Distrito Federal, no exercício da autonomia legislativa que detêm, aos princípios constitucionais.

    2. É clara, portanto, a Carta Magna, ao ditar que o exercício da autonomia legislativa por parte dos entes da federação subordina-se aos axiomas constitucionais, o que revela indiscutível supremacia constitucional a que se submete a organização dos entes federativos.

    3. Destarte, todo e qualquer esforço exegético por parte do intérprete há de respeitar o sentido imposto pela hierarquia constitucional ('de cima para baixo'), o que significa dizer amiúde que a aplicação interpretativa do princípio da simetria, respeitada como referência maior a Constituição Federal, deságua no âmbito estadual e municipal, e nunca o inverso, sob pena de se negar vigência ao próprio texto constitucional.

    4. E nesse sentido, aponte-se que a competência da Justiça Federal é ditada pela Constituição Federal, art. 109, o qual em seu inciso IV prevê expressamente a competência dos juízes federais para o processamento e julgamento das infrações...

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