Decisão da Presidência nº 4241 de STF. Supremo Tribunal Federal, 1 de Julio de 2010

Data01 Julho 2010
Número do processo4241

DECISÃO

Trata-se de pedido de suspensão de segurança, formulado pela União e pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), contra duas decisões do Superior Tribunal de Justiça, proferidas na Petição nº 7.985/DF (fls. 124-130) e no Mandado de Segurança nº 15.339/DF (fls. 132-139), ambas da relatoria do Ministro HUMBERTO MARTINS.

Na origem, o INSS ajuizou ação de dissídio de greve, com pedido de tutela antecipada, autuada no STJ como Petição, para obter provimento no sentido de determinar o imediato retorno às atividades dos peritos médicos do Instituto, em greve nacional desde o dia 22.6.2010, ou, alternativamente, a ordem para que pelo menos 80% (oitenta por cento) dos profissionais continuassem trabalhando.

No mesmo dia, a Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social (ANMP) impetrou Mandado de Segurança, com pedido de liminar, para impedir as autoridades impetradas de aplicar medidas punitivas aos filiados, com declaração de legalidade do movimento grevista.

A decisão ora impugnada é do seguinte teor: 1) Reconheço a existência de conexão da presente demanda com a Pet 7985/DF, pois relativa às mesmas partes e à mesma greve em questão, devendo ser autuada em apenso para julgamento conjunto, nos termos do art. 105 do Código de Processo Civil; 2) defiro parcialmente o pedido de liminar da ANMP, requerida no presente mandado de segurança, para determinar que o movimento grevista não é abusivo, afastando qualquer medida punitiva que possa ser tomada pelo INSS contra os médicos peritos que aderirem à greve, garantindo o pleno exercício do direito constitucional à greve: e 3) defiro parcialmente o pedido de liminar do INSS, requerido na PET 7985, para impor limites ao exercício do direito à greve, garantindo a manutenção dos serviços prestados com, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento) dos médicos peritos em cada unidade administrativa, operacional e de atendimento ao público, sob pena de multa diária de cinqüenta mil reais à ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MÉDICOS PERITOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL – ANMP. (fl. 138 – grifos do original) .

No pedido de suspensão, os requerentes sustentam haver grave lesão à ordem e à saúde públicas na liminar concedida, Isto porque não se poderia conceder uma liminar para permitir a paralisação de serviço público essencial.

Ora, admitir que, na greve, os peritos médicos do INSS só devem atender a 50% da demanda por benefícios previdenciários e assistenciais seria o mesmo que admitir que, em caso de greve, os bombeiros só devem apagar 50% dos incêndios, a polícia só deve prender 50% dos criminosos flagrados ou que os Hospitais podem deixar morrer 50% dos pacientes. (fl. 5).

Aduzem que as lesões seriam decorrentes do fato de a perícia médica do INSS ser condição imprescindível para concessão de benefícios previdenciários por incapacidade, no âmbito do regime geral de Previdência Social, bem como para concessão dos benefícios assistenciais para portadores de deficiência.

Trazem dados estatísticos relativos aos atendimentos prestados pelos profissionais em greve: Atualmente, a concessão dos benefícios por incapacidade acima citados representa quase 60% da totalidade de requerimentos de benefícios previdenciários protocolados nas Agências da Previdência Social em todo o território nacional. (fl. 7).

Alegam que a manutenção da liminar implicará a não realização diária de 15.000 (quinze mil) das 30.000 (trinta mil) perícias médicas já agendadas.

Defendem ser constitucional a questão em discussão, relativa aos limites de greve de servidores públicos, nos termos do art. 37, VII, da Constituição da República.

Por fim, sustentam que esta Corte, no julgamento da Rcl nº 6.568, Rel.

Min.

EROS GRAU, teria sido enfática quanto à impossibilidade de exercício de greve dos servidores públicos ligados à ordem e à saúde públicas.

Assim, na esteira do precedente do Plenário do STF, é inconteste a manifesta impossibilidade de se inserir os peritos médicos no elenco de servidores alcançados pelo direito de greve, tendo em vista a essencialidade dos serviços prestados (...) (fl. 14).

Requerem, liminarmente, a suspensão da liminar proferida no MS nº 15.339 e na Pet nº 7.985, em trâmite na 1ª Seção do STJ, com determinação de imediato retorno dos profissionais às atividades, sob pena de multa diária de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), aplicável à Associação Nacional dos Médicos Peritos da Previdência Social, e também com a declaração de ilegitimidade e abusividade da greve. 2.

Não é caso de suspensão.

De acordo com o regime legal de contracautela (Leis nº 8.437/92, nº 9.494/97 e nº 12.016/09, e art. 297 do RISTF), compete a esta Presidência suspender execução de decisões concessivas de segurança, de liminar ou de tutela antecipada, proferidas em única ou última instância, pelos tribunais locais ou federais, para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

A cognição do pedido exige, contudo, demonstração da natureza constitucional da controvérsia (cf.

Rcl nº 497-AgR, Rel.

Min.

CARLOS VELLOSO, Plenário, DJ de 06.4.2001; SS nº 2.187-AgR, Rel.

Min.

MAURÍCIO CORRÊA, DJ de 21.10.2003 e; SS nº 2.465, Rel.

Min.

NELSON JOBIM, DJ de 20.10.2004).

Está preenchido o requisito, pois em jogo, aqui, suposta violação ao art. 37, VII, da Constituição da República, que diz com o direito de greve dos servidores públicos.

Não há dúvida, portanto, de que a matéria discutida na origem se reveste de índole constitucional.

A Corte tem entendido, com base nas diretrizes normativas que disciplinam as medidas de contracautela, não ser vedado ao Presidente do Supremo Tribunal Federal proferir um juízo mínimo de delibação a respeito das questões jurídicas presentes na ação principal, caracterizado pela probabilidade de a decisão contra a qual se pede a suspensão ser contrária às normas existentes na ordem jurídica.

Nesse sentido: SS nº 846-AgR, Rel.

Min.

SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ de 29.5.96; e SS nº 1.272-AgR, Rel.

Min.

CARLOS VELLOSO, DJ de 18.5.2001).

Na espécie, em juízo de plausibilidade do direito invocado pelos requerentes – fumus boni iuris –, verifico que a liminar concedida pelo Ministro HUMBERTO MARTINS está conforme o entendimento desta Suprema Corte, no sentido de que o direito de greve dos servidores públicos não é absoluto.

Aliás, seria truísmo dizer que na Constituição da República não existem direitos de caráter absoluto.

Com efeito, esta Corte julgou procedente a Rcl nº 6.568 (Rel.

Min.

EROS GRAU, Plenário, DJe de 25.9.2009), firmando entendimento de que é da Justiça Comum a competência para julgar conflitos entre servidores públicos e os entes da administração ao qual estão vinculados.

Na ocasião, reconheceu-se afronta ao decidido na ADI nº 3.395.

Consta do acórdão que diversos Ministros fizeram considerações acerca da extensão do direito de greve outorgado pela Constituição da República aos servidores públicos.

Alguns, como consta do meu voto, adiantando pronunciamento sobre a amplitude do direito, a fim de evitar dificuldades, caso não houvesse, por parte do Supremo Tribunal Federal, a quem compete a garantia da integridade da Constituição, nenhuma sinalização sobre o direito de greve de policiais civis.

Mas também consta do acórdão que outros integrantes da Corte preferiram não se manifestar quanto à extensão do direito de greve, como no caso do Ministro RICARDO LEWANDOWSKI: E como a lei que estabelece as regras para a greve no setor privado diz que ‘devem ser mantidos os serviços ou atividades essenciais’, penso, como todo o respeito, que não podemos definir, desde logo, quais sejam essas atividades ou serviços essenciais.

Isso ficaria a cargo do tribunal ou da Justiça comum local.

Da mesma forma o Ministro CARLOS BRITTO: Então, não acompanho Sua Excelência quanto à proibição do direito de greve para os policiais civis, mas acompanho, sim, na conclusão de que a competência para conhecer e julgar as causas judiciais promovidas pelos servidores públicos é da Justiça comum.

Por fim, o Ministro MARCO AURÉLIO: Não devo – repito – avançar – cada dificuldade em seu dia – para como que me substituir – e haveria até mesmo incongruência, porque estou a julgar algo voltado à preservação da competência do Supremo – ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Que esta Corte estadual examine de direito, com ampla liberdade, segundo o convencimento daqueles que integram o órgão competente para fazê-lo, a ação ajuizada, sem necessidade de ter qualquer aconselhamento a respeito.

Assim, não se pode, a rigor, afirmar que o Supremo Tribunal Federal teria decidido que servidores públicos de determinadas categorias estariam impedidos de realizar movimento grevista.

Mas também é verdade ter havido clara sinalização de que o direito de greve dos servidores não é absoluto.

E, no caso da Rcl nº 6.568, apontou-se no sentido da impossibilidade do exercício do direito por policiais civis.

As razões para tal restrição têm fundamento nos valores que incumbem a cada categoria de servidores públicos.

Se de natureza incontornável à subsistência do Estado, não vejo como se retirar da Constituição da República a possibilidade do direito de greve.

Consta do meu voto: Mas, neste caso, ela [a Constituição] se remete explicitamente à legislação infraconstitucional, atribuindo-lhe o poder de definir não apenas aspectos secundários desse exercício, mas até as categorias que podem exercê-lo.

Ainda que a lei não o faça, a interpretação unitária da Constituição me leva, junto com o eminente Relator no seu belo voto, a concluir que os policiais não têm direito de greve, assim como não o têm outras categorias, sobre as quais não quero manifestar-me na oportunidade, porque seria impertinente.

E não o têm, porque lhes incumbem, nos termos do artigo 144, caput, dois valores incontornáveis da subsistência de um Estado: segurança pública e a incolumidade das pessoas e dos bens.

Ora, é inconcebível que a Constituição tutele estas condições essenciais de sobrevivência, de coexistência, de estabilidade de uma sociedade, de uma nação, permitindo que os responsáveis pelos resguardo desses valores possam, por exemplo, entrar em greve, reduzindo seu efetivo a vinte por cento.

Não vejo, entretanto, como estender a vedação do direito de greve aos peritos médicos do INSS.

É que, conquanto lhes caibam funções socialmente relevantes, a eles não incumbem valores de amplitude bastante a por em risco a concepção, a coesão, a unidade da nação.

De modo que a restrição de direito que se pode retirar da Constituição da República não alcança a categoria de que ora se cuida.

Ademais, embora sejam originariamente profissionais da área da saúde, os peritos médicos do INSS não lidam diretamente com os valores subjacentes à obrigação constitucional de proteção e garantia da saúde propriamente dita, mas às consequências patrimoniais ou jurídicas desta decorrentes, relativas às questões previdenciárias ou assistenciais.

Quanto à alegação de grave lesão, verifico que a liminar impugnada, em vez de provocá-la, evita que ocorra.

É que, antes da decisão, a situação fática era de paralisação total das atividades, como narraram os requerentes.

O provimento, ao determinar a garantia dos serviços prestados, com um mínimo de 50% dos peritos, sob pena de vultosa multa diária em caso de descumprimento, evitou que a verdadeira lesão perdurasse por mais tempo.

Vale dizer, a liminar não trouxe inovação lesiva ao Poder Público no quadro fático.

Antes, restringiu o direito de greve, determinando o comparecimento de metade dos peritos médicos aos postos de trabalho.

E, em relação aos pedidos de aplicação de multa diária e de declaração de ilegitimidade e abusividade da greve, verifico haver absoluta impossibilidade jurídica para atendimento dos pleitos.

É que, em determinação normativa comum aos diplomas legislativos que disciplinam o regime jurídico de contracautela, Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes.

Nos estreitos limites do instituto, não cabe outra medida ao presidente que a suspensão da decisão impugnada. 3.

Ante o exposto, nego seguimento ao pedido, prejudicado o pedido de liminar (artigo 21, § 1º, do RISTF).

Publique-se.

Int..

Brasília, 1º de julho de 2010.

Ministro CEZAR PELUSO Presidente

Partes

Reqte.(s) : Instituto de GestÃo PrevidenciÁria do Estado do ParÁ - Igeprev

proc.(a/S)(Es) : Vagner Andrei Teixeira Lima

reqdo.(a/S) : Presidente do Tribunal de JustiÇa do Estado do ParÁ

intdo.(a/S) : Jose Augusto Lima de Lira

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