Acórdão nº REsp 1012692 / RS de T1 - PRIMEIRA TURMA

Data26 Abril 2011
Número do processoREsp 1012692 / RS
ÓrgãoPrimeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.012.692 - RS (2007⁄0294222-7)

RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FISÍCA CREF⁄RS
ADVOGADO : FABIANA MAGALHÃES DOS REIS E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADOR : MÁRCIA NEVES PINTO E OUTRO(S)
INTERES. : CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA
ADVOGADO : CLÁUDIO ARAÚJO PINHO E OUTRO(S)

EMENTA

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSELHOS PROFISSIONAIS. EDUCAÇÃO FÍSICA. ATIVIDADES DIVERSAS (DANÇA, IOGA, ARTES MARCIAIS) INCLUÍDAS NA ATUAÇÃO DO CONSELHO REGIONAL PROFISSIONAL POR MEIO DE RESOLUÇÃO DO CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA. AUSÊNCIA DE CORRELAÇÃO COM A LEI. INEXISTÊNCIA DE JULGAMENTO EXTRA OU ULTRA PETITA. ADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA E LEGITIMIDADE DO PARQUET FEDERAL DECIDIDAS COM BASE EM FUNDAMENTAÇÃO CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS E DA LEI N. 9.696⁄1998.

  1. Recurso especial pelo qual o Conselho Regional de Educação Física do Estado do Rio Grande do Sul sustenta a obrigatoriedade de inscrição em seus quadros de profissionais diversos, por se considerar que os artigos e da Lei n. 9.696⁄1998 têm comando normativo suficiente para caracterizar as atividades por eles exercentes como próprias do profissional de educação física. Defendem-se, ainda: (i) a legitimidade do Ministério Público e adequação da ação civil pública; e (ii) a ocorrência de julgamento extra e ultra petita.

  2. No caso dos autos, em sede de apelação em ação civil pública movida pelo parquet estadual, o TRF da 4ª Região, entendendo ser ilegal e inconstitucional a Resolução n. 46⁄2002, do Conselho Federal de Educação Física, decidiu não ser possível que o Conselho Regional fiscalizasse e autuasse aqueles profissionais elencados na referida resolução, em especial os profissionais de dança, ioga, artes marciais e capoeira, sejam professores, ministrantes ou instrutores de tais atividades.

  3. O recurso especial não merece ser conhecido, no que se refere à alegação de violação da Lei n. 7.347⁄1985, pois as questões da legitimidade do Ministério Público e da adequação da ação foram decididas, exclusivamente, com apoio no art. 129, III, da Constituição Federal.

  4. No que pertine à alegação de ocorrência de julgamento extra e ultra petita, o recurso não merece provimento, pois, ante a reconhecida ilegalidade e inconstitucionalidade da resolução acima mencionada, a Corte de origem estendeu o comando da sentença àqueles que praticassem as atividades nela descritas, de tal sorte que não houve qualquer julgamento fora dos limites do que fora pedido pelo Ministério Público, sendo desinfluente o fato de não se ter feito alguma diferenciação a respeito da capoeira ou dos professores, ministrantes ou instrutores das atividades descritas naquela resolução.

  5. Quanto aos artigos e da Lei n. 9.696⁄1998, não se verificam as alegadas violações, porquanto não há neles comando normativo que obrigue a inscrição dos professores e mestres de danças, ioga e artes marciais (karatê, judô, tae-kwon-do, kickboxing, jiu-jitsu, capoeira etc) nos Conselhos de Educação Física, porquanto, à luz do que dispõe o art. 3º da Lei n. 9.696⁄1998, essas atividades não são caracterizadas como próprias dos profissionais de educação física.

  6. O art. 3º da Lei n. 9.696⁄1998 não diz quais os profissionais que se consideram exercentes de atividades de educação física, mas, simplesmente, elenca as atribuições dos profissionais de educação física.

  7. Subsidiariamente, deve-se anotar que saber, em cada caso, a atividade, principalmente, visada por aqueles profissionais que o recorrente quer ver inscritos em seu quadro, para o fim de verificar-se o exercício de atribuições do profissional de educação física, exige a incursão no acervo fático-probatório, o que é inviável ante o óbice da Súmula n. 7 do STJ.

  8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Hamilton Carvalhido, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Hamilton Carvalhido (voto-vista) e Arnaldo Esteves Lima votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Teori Albino Zavascki.

    Brasília (DF), 26 de abril de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO BENEDITO GONÇALVES

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.012.692 - RS (2007⁄0294222-7)

    RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
    RECORRENTE : CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FISÍCA CREF⁄RS
    ADVOGADO : FABIANA MAGALHÃES DOS REIS E OUTRO(S)
    RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
    PROCURADOR : MÁRCIA NEVES PINTO E OUTRO(S)
    RECORRIDO : CONSELHO FEDERAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA
    ADVOGADO : CLÁUDIO ARAÚJO PINHO E OUTRO(S)

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO BENEDITO GONÇALVES (Relator): Trata-se de recurso especial interposto pelo Conselho Regional de Educação Física do Estado do Rio Grande do Sul - CREF⁄RS contra acórdão proferido pelo TRF da 4ª Região, cuja ementa é a seguinte:

    ADMINISTRATIVO. EXERCÍCIO REGULAR DE PROFISSÃO. ATIVIDADES DE DANÇA, IOGA E ARTES MARCIAIS. AUSÊNCIA DE EXERCÍCIO EXCLUSIVO PELOS PROFISSIONAIS DE EDUCAÇÃO FÍSICA.

    Dispõe a Lei n° 9.696⁄98, que regulamentou a profissão de Educação Física:

    'Art. 2° Apenas serão inscritos nos quadros dos Conselhos Regionais de Educação Física os seguintes profissionais:

    I - os possuidores de diploma obtido em curso de Educação, oficialmente autorizado ou reconhecido;

    II - os possuidores de diploma em Educação Física expedido por instituição ensino superior estrangeira, revalidado na forma da legislação em vigor;

    III - os que, até a data do início da vigência desta Lei, tenham comprovadamente exercido atividades próprias dos Profissionais de Educação Física, nos termos a serem estabelecidos pelo Conselho Federal de Educação Física.'

    Em atendimento ao dispositivo acima citado, o Conselho Regional Federal de Educação Física editou a Resolução n° 046⁄02 que dispõe:

    Art. 1º - O Profissional de Educação Física é especialista em atividades físicas, nas suas diversas manifestações ginásticas, exercícios físicos, desportos, jogos, lutas, capoeira, artes marciais, danças, atividades rítmicas, expressivas e acrobáticas, musculação, lazer, recreação, reabilitação, ergonomia, relaxamento corporal, ioga, exercícios compensatórios à atividade laboral e do cotidiano e outras práticas corporais -, tendo como propósito prestar serviços que favoreçam o desenvolvimento da educação e da saúde, contribuindo para a capacitação e⁄ou restabelecimento de níveis adequados de desempenho e condicionamento fisiocorporal dos seus beneficiários, visando à consecução do bem-estar e da qualidade de vida, da consciência, da expressão e estética do movimento, da prevenção de doenças, de acidentes, de problemas posturais, da compensação de distúrbios funcionais, contribuindo ainda, para consecução da autonomia, da auto-estima, da cooperação, da solidariedade, da integração, da cidadania, das relações sociais e a preservação do meio ambiente, observados os preceitos de responsabilidade, segurança, qualidade técnica e ética no atendimento individual e coletivo.

    A questão é que o inciso III, do art. 1° da Lei n° 9.696⁄98, não estabeleceu a forma como seria efetuado o registro daqueles profissionais de Educação Física que já estavam exercendo suas atividades na data de entrada em vigor da lei federal, bem com não definiu quem são os profissionais de Educação Física.

    A Resolução n° 046⁄02, por sua vez, não definiu quais seriam as atividades próprias dos profissionais de Educação Física, tendo sim arrolado quais os profissionais que deveriam se inscrever perante a entidade. E, ao ter assim procedido, teria esbarrado na norma constitucional que garante o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, insculpida no art. 5°, inc. XII, da Constituição Federal.

    Ademais, trata-se de regulamentação inconstitucional, pois teria estatuído condições ou qualificações especiais para o exercício de ofício ou profissão, havendo, contudo, para esse assunto, a reserva constitucional de lei de forma absoluta.

    Outrossim, ataca o inciso III do art. 1° da lei federal supra citada, a qual não definiu quais seriam as atividades próprias do profissional de educação física, tendo delegado ao demandante algo que este não tem competência para fazer, porquanto a edição de norma sobre tal matéria compete privativamente à União, consoante reza o inciso XVI, do art. 22, da Carta Magna.

    Consoante já mencionado anteriormente, o princípio da liberdade do exercício profissional sujeita-se, por expressa determinação constitucional (art. 5, XII, da CF), ao atendimento das qualificações técnicas estabelecidas pela lei, cabendo à União legislar quanto às condições para o exercício de profissões (art. 22, XVI, da CF):

    'Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade, nos termos seguintes:

    (...)

    IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;

    (...)

    XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, oficio ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;'

    'Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

    (...)

    XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício das profissões;'

    Corolário disto é que não pode ser imposta a exigência do registro e da inscrição no Conselho Regional de Educação Física de não graduados em Educação Física, principalmente se levarmos em conta que não há definição em lei do que seriam as atividades próprias desses profissionais, sem expressa previsão em lei ordinária federal.

    Neste sentido, a...

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