Acordão nº 0049900-88.2006.5.04.0103 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 24 de Marzo de 2011

Magistrado ResponsávelMaria Madalena Telesca
Data da Resolução24 de Marzo de 2011
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0049900-88.2006.5.04.0103 (RO)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 3ª Vara do Trabalho de Pelotas, sendo recorrentes CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF E MÁRIO FERnANDO DE MELLO e recorridos OS MESMOS.

Recorrem ordinariamente a reclamada (fls. 1.968-2.037) e adesivamente o reclamante (fls. 2.053-2.058), inconformados com a sentença de procedência, em parte, da ação, proferida pelo Juiz do Trabalho Frederico Russomano (fls. 1.941-1.949 e 1.965).

A reclamada busca a alteração da decisão quanto à negativa de prestação jurisdicional, à reintegração do reclamante com o conseqüente pagamento das parcelas decorrentes do vínculo de emprego até o retorno ao trabalho, à incorporação da gratificação de cargo, à manutenção de plano de saúde e aos honorários assistenciais.

O reclamante, por sua vez, visa à modificação do julgado no que tange à aplicação da Lei nº 9.962/00 e à reparação de dano moral.

Há contra-razões do reclamante às fls. 2.043-2.050 e da reclamada às fls. 2.062-2.083.

Processo não-submetido a parecer do Ministério Público do Trabalho.

Em razão da Resolução Administrativa nº 10/2010 deste Tribunal, os autos vieram conclusos a esta Magistrada, convocada para atuar na cadeira da Desembargadora Cleusa Regina Halfen.

É o relatório.

ISTO POSTO:

CONHECIMENTO

Os apelos são tempestivos (fls. 1.967, 1.968, 2.042 e 2.053) e as representações, regulares (fls. 2.040 e 27), bem como as custas processuais (fl. 2.039) e o depósito recursal são efetuados (fl. 2.038). Portanto, encontram-se preenchidos os pressupostos extrínsecos de admissibilidade dos recursos.

MÉRITO

A seguir, adotam-se como fundamentos as razões de decidir da lavra da Relatora originária, Desembargadora Cleusa Regina Halfen.

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA

1. NULIDADE DA SENTENÇA POR NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL

A reclamada aduz que a sentença, ao não apreciar a matéria ventilada nos embargos de declaração, viola os arts. 5º, LV e LIV, e 93, IX, da Constituição da República, os arts. 458, II, e 535 do CPC.

Sinala-se que o Juiz a quo rejeita os embargos de declaração opostos pelo autor, por considerar que inexistem as omissões apontadas. Com efeito, cabem embargos de declaração quando houver no julgado obscuridade, contradição, omissão ou manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso, nos termos dos arts. 769 e 897-A, ambos da CLT, c/c o art. 535 do CPC.

Segundo o princípio do livre convencimento, positivado no art. 131 do CPC, o Magistrado decide a controvérsia tomando por base os elementos que se lhe afiguram preponderantes, apontando os fundamentos que justificam a decisão (persuasão racional), não lhe sendo exigido rebater todas as teses e dispositivos de lei invocados pelas partes, mesmo nos embargos de declaração apresentados. Eventual erro de julgamento deve ser corrigido pela via recursal própria, pois, conforme o disposto no § 1º do art. 515 do CPC, o apelo devolve ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada, sendo objeto de apreciação e julgamento todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro, motivo pelo qual não se verifica qualquer prejuízo à ora recorrente.

Portanto, inexiste negativa de prestação jurisdicional, salientando-se que a questão ventilada pela reclamada nos embargos de declaração demonstra apenas discordância da solução dada à lide, visto que a embargante não se conforma com o exame da prova produzida nos autos, o que deve ser objeto de ataque específico em recurso próprio. Provimento negado.

2. NEGOCIAÇÃO HABITUAL. NULIDADE DA DESPEDIDA POR JUSTA CAUSA. SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

Insurge-se a reclamada contra a declaração de nulidade da despedida por justa causa do autor e contra a condenação à reintegração do reclamante ao emprego com o pagamento dos salários (observados todos os itens componentes), inclusive gratificações, férias, gratificações natalinas, FGTS e demais vantagens decorrentes da relação de emprego, prestações vencidas e vincendas até a data do retorno (fl. 1.949). Assevera que o processo de apuração de responsabilidade disciplinar e civil, instaurado em face da suspeita de o reclamante desenvolver, juntamente com outros empregados, atividade econômica que importa concorrência com a empregadora, seguiu o disposto nos manuais normativos AE 079 e RH 138, sendo respeitado o contraditório e a ampla defesa. Obtempera que a denúncia partiu do empregado Carlos Jairo Limberger Hanh, por ter verificado fatos anormais envolvendo o autor. Sustenta que o reclamante confessa os fatos narrados na defesa, os quais também são corroborados pela prova testemunhal. Defende que a prova documental não deixa dúvidas acerca da participação do autor em empresa de factoring. Refere que o reclamante locava cofre na reclamada para guardar cheques de diversas empresas e que possuía contas de poupança conjuntas com o empregado Ezequias, as quais sofriam expressivas movimentações. Alude que a irmã do reclamante era sócia da empresa Sirius Fomento Mercantil. Relata que as ações movidas pelos empregados Ezequias e Marcos Agustinho foram julgadas improcedentes, sendo mencionado o reclamante como partícipe das práticas que ensejaram as despedidas por justa causa desses empregados. Acresce que a responsabilidade civil é independente da criminal, como preconiza o art. 935 do CC. Expõe que as movimentações financeiras efetuadas pelo reclamante e por Ezequias eram de grandes quantias e que o reclamante ou o empregado antes mencionado iam ao cofre locado pelo autor quase que diariamente. A reclamada também sinala que o reclamante não estava em gozo de benefício previdenciário quando da despedida e que, ainda que estivesse, poderia ser despedido por justa causa.

2.1. Despedida por justa causa. Negociação habitual

Justa causa é um ato faltoso cometido por uma das partes do contrato de trabalho dotado de tal gravidade que inviabiliza a continuação desse vínculo, autorizando a outra parte a rescindir o pacto laboral. O art. 482 da CLT elenca esses denominados justos motivos, entre eles, a negociação habitual, verbis:

Art. 482. Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

[...]

c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;

Embora seja notória a divergência doutrinária sobre o assunto ora examinado, entende-se que melhor analisa os termos do dispositivo supracitado o professor Wagner D. Giglio, cujos ensinamentos se transcreve:

1. O Código Comercial de 1850 já previa, como causa suficiente para a dispensa dos prepostos, a negociação por conta própria ou alheia sem permissão do preponente.

A Lei n. 62, de 5 de junho de 1935, também previu como justa causa para o despedimento do empregado, no art. 5.º, letra “b”, a “negociação habitual por conta própria ou alheia, sem permissão do empregador”.

Finalmente a Consolidação das Leis do Trabalho deu a redação definitiva, considerando justa causa a “negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço”.

2. O termo “negociação”, originário da lei comercial, superou os limites rígidos de sua conceituação primitiva, na aplicação trabalhista.

De fato, entende-se hoje que “negociação” significa mais do que o simples ato de comércio, para abranger todas as atividades do empregado, quer sejam industriais, comerciais, rurais, de transporte, etc.

Visou a lei, portanto, proibir a atividade do empregado prejudicial ao serviço ou concorrente à empresa.

Assim, o empregado que trabalha em empresa dedicada ao conserto de rádios e televisores, por exemplo, incide na falta em estudo se, sem permissão da empregadora, procede a reparos desses aparelhos, por sua conta, nas horas de folga, concorrendo com a empresa, embora não se possa falar, no caso, em “negociação”, stricto sensu.

2a. A exigência da habitualidade na prática faltosa foi elemento inserto pela Lei n. 62 e mantido pela redação da lei vigente.

Não basta, para a caracterização da falta, a prática de um único ato de concorrência, ou prejudicial ao serviço. Requer-se a reiteração de atos, de modo que a atividade se torne habitual, isto é, costumeira, comum, repetida. O empregado deverá agir de forma a se entender que pratica a atividade em caráter permanente e não ocasionalmente, a título esporádico.

2b. A atividade concorrente ou prejudicial poderá ser exercida pelo empregado como trabalhador autônomo, como empregador ou subordinado, isto é, por conta própria ou alheia.

Assim, incidirá na falta em exame o empregado que exerce atividade concorrente ou prejudicial ao serviço, quer o faça em outra empresa, como empregado, quer como empregador, mantendo sua própria empresa, quer ainda como trabalhador autônomo, sem subordinação.

Acontece, por vezes, de o empregado montar firma concorrente à de seu empregador, ou prejudicial ao serviço para ele prestado, mascarando a atividade através do expediente de colocá-la sob nome do cônjuge ou outro parente. Nem por isso se desfigurará a justa causa, pois exercerá a atividade por conta alheia, pouco importando que o beneficiário de seu esforço seja parente ou não.

2c. A permissão do empregador para que seu empregado exerça atividade concorrente ou prejudicial, entretanto, desfigura a justa causa.

A lei não especifica se a permissão deverá ser expressa ou se poderá ser implícita ou tacitamente concedida.

A permissão ou proibição será sempre uma das condições do vínculo empregatício. Em outras palavras: constituirá uma das cláusulas do contrato de trabalho.

Ora, se o contrato de trabalho, como um todo, poderá ser firmado expressa ou tacitamente, nos termos da lei, é de se concluir que uma de suas cláusulas, parte do contrato,...

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