Acordão nº 0002600-64.2009.5.04.0382 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 12 de Mayo de 2011

Magistrado ResponsávelHugo Carlos Scheuermann
Data da Resolução12 de Mayo de 2011
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0002600-64.2009.5.04.0382 (RO)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz Jose Luiz Dibe Vescovi, da 2ª Vara do Trabalho de Taquara, sendo recorrentes MARA TERESINHA SALDANHA DE SOUZA E CALÇADOS AZALÉIA S.A. e recorridos OS MESMOS E AST SERVIÇOS TEMPORÁRIOS LTDA.

A reclamante e a primeira reclamada, inconformadas com a sentença de procedência parcial (fls. 417-25 e 437), interpõe recurso ordinário.

A reclamante, às fls. 442-7, busca a reforma da decisão recorrida quanto aos tópicos relacionados à justa causa para a despedida, reintegração no emprego, feriados trabalhados, horas extras e descontos salariais, pretendendo ainda afastar a inépcia declarada em relação ao pedido de diferenças de participação nos lucros e resultados de 2008, parcela que postula agregar à condenação.

A primeira reclamada, às fls. 453-70, pretende afastar a multa decorrente da interposição de embargos de declaração tidos como protelatórios e a reforma da decisão recorrida quanto ao vínculo de emprego no período da contratação temporária, adicional de insalubridade (e sua base de cálculo), diferenças de participação nos lucros e resultados, FGTS e critérios para liquidação da sentença.

Contra-arrazoados os recursos pela reclamante (fls. 477-8), pela segunda reclamada (fls. 505-8) e pela primeira reclamada (fls. 511-16), os autos são encaminhados a este Tribunal.

É o relatório.

ISTO POSTO:

PRELIMINARMENTE

DO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE QUANTO À REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO

As reclamadas argúem, nas contrarrazões, o não conhecimento do recurso ordinário da reclamante quanto ao pedido de reintegração, em virtude de seu caráter inovatório, requerendo o desentranhamento da documentação trazida no item 1.7 na forma da SJ 8 do TST.

Com razão.

A reclamante, no item 2 de seu recurso ordinário, pretende sua reintegração no emprego “tão logo seja comprovado a sua incapacidade para o trabalho a ser revelada pela oportuna perícia médica a ser realizada nos autos do processo previdenciário ora noticiado no item 1.7” (processo movido pela reclamante contra o Instituto Nacional do Seguro Social, conforme ali transcrito).

Ocorre que na petição inicial da presente demanda - que, juntamente com a defesa, fixa os limites da lide - não foi formulado pedido de reintegração no emprego, mas tão somente de reversão da justa causa adotada como motivo da despedida. Assim, porque é defeso à parte inovar após a apresentação da defesa, a pretensão, formulada apenas nas razões de recurso, sequer pode ser conhecida.

Neste contexto, ainda que não seja o caso de aplicação da SJ 8 do TST para o desentranhamento da documentação trazida no item 1.7, “colada” à petição, conforme sustentam as recorridas, por se tratar de informações processuais, acolhe-se a prefacial argüida e não se conhece da pretensão recursal de reintegração no emprego.

MÉRITO

I - RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE

DA JUSTA CAUSA PARA A DESPEDIDA

O Juízo da origem considerou válida a rescisão contratual com base no art. 482, “e”, da CLT.

Considerou que a reclamada traz com a defesa as advertências e suspensões aplicadas anteriormente ao atraso no dia 24-11-08, evidenciando a desídia da reclamante “em razão do reiterado comportamento que não observava a sua prestação principal dentro do contrato de emprego - trabalhar” (fls. 418v.-419v.).

A reclamante investe contra a decisão.

Destaca que trouxe aos autos documentos que justificam as faltas ao trabalho. Diz que a reclamada desconsiderou seu tempo de serviço (mais de um ano) e entendeu que poucas faltas eram justificadoras de sua “demissão”, o que implica excessivo rigor. Ressalta que possui ação ajuizada contra o INSS, pleiteando o reconhecimento do direito à concessão do benefício previdenciário “auxílio doença”, e que neste processo “será revelado desde quando a reclamante está incapaz para o trabalho, comprovando assim todas as faltas justificadas em tempo em decorrência de sua patologia de ordem psiquiátrica.” Transcreve dados da ação referida. Refere que segundo a doutrina as faltas injustificadas caracterizam inadimplemento da obrigação de trabalhar. Destaca que sofreu descontos salariais decorrentes de atrasos e que então a “demissão” por justa causa representa nova punição para o mesmo fato (“bis in idem”). Transcreve decisão do TST que entende amparar sua tese. Acrescenta que “Na defesa de fls., sequer a Recorrida contesta o fato, devendo ser fictamente confessa no particular, porquanto não apresentou contestação e impugnação específica. Logo, contrariamente ao que decidiu o Juízo de primeiro grau, sequer haveria necessidade de comprovar que a Recorrida não aceita atestados médicos, a exceção daqueles de sua confiança.” Requer o provimento do apelo para afastar a justa causa para a despedida e, via de conseqüência, condenar a reclamada ao pagamento do aviso-prévio, 13º salário proporcional, férias proporcionais e indenização referente ao seguro-desemprego.

Analisa-se.

A justa causa, resultante da prática de falta grave pelo empregado, é a pena máxima aplicada ao trabalhador faltoso, pelo que deve ser robustamente provada. Dentre as hipóteses elencadas na lei e que caracterizam a justa causa está a desídia, que, segundo os ensinamentos de Délio Maranhão, se evidencia pelo descumprimento das obrigações contratuais de prestação de serviços de forma produtiva, quantitativa e qualitativamente. E, embora se configure, em regra, pela prática ou omissão de vários atos, essas faltas, por devidamente punidas com penas de advertências e suspensões, não servem de motivo autorizador da ruptura contratual de iniciativa do empregador, por justa causa, sob pena de caracterização de dupla penalização. Em outras palavras, as faltas já punidas com advertências e suspensões não podem servir de motivo para a justa causa, sendo que somente o cometimento de nova falta pelo empregado pode ensejar sua despedida motivada pela caracterização da desídia.

A reclamante manteve com a primeira reclamada contrato de trabalho no período de 01-11-07 a 01-12-08 (TRCT, fl. 47). No curso deste contrato, conforme demonstram os documentos juntados às fls. 45-6, foi advertida em razão de faltas injustificadas ao serviço em 01-09-08 e 22-09-08. Em virtude de nova ausência, em 20-10-08, foi suspensa por um dia e, pelo atraso injustificado ao trabalho no dia 24-11-08, foi desligada por justa causa na forma prevista no art. 482, “e”, da CLT em 01-12-08.

Tais circunstâncias demonstram a observância, pelo empregador, da gradação das penalidades, com o objetivo pedagógico de evitar atitude abrupta e desprovida de amparo legal. A seqüência de comportamentos faltosos, em que pese punidos proporcional e imediatamente, gerou o término do limite de tolerância do empregador, ou a quebra da confiança inerente à relação contratual. Neste contexto, considerando que a reclamante já sofrera, em face das demais ausências injustificadas ao serviço, as penas de advertência e suspensão, persistindo, mesmo assim, na prática de conduta incompatível com os deveres do empregado (atraso injustificado), resta caracterizada sem sombra de dúvida a desídia, que é comportamento elencado entre as faltas graves autorizadoras da ruptura contratual de iniciativa do empregador por justa causa (art. 482, e, CLT).

De outro lado, não há, como alega a recorrente, prova documental justificadora das faltas ao trabalho, na medida em que os atestados médicos trazidos com a inicial datam de 23-04-08 e 16-09-08 (fl. 9v.) e aquele juntado na manifestação sobre a defesa é de 27-04-09 (fl. 341v.), posterior inclusive ao término do contrato de trabalho, sendo ainda irrelevante para a matéria ora discutida a noticiada ação contra o INSS.

Quanto à alegação de não aceitação de atestados médicos, não merece maiores considerações porque nada a respeito foi argüido na petição inicial e tampouco na manifestação sobre a defesa.

Por fim, o fato de a empregadora ter procedido ao desconto dos dias trabalhados não implica dupla punição. Isto porque o desconto salarial decorre do fato da não prestação de trabalho, ao passo que a despedida decorre do acúmulo das condutas faltosas que, configurando conduta desidiosa, autoriza a justa causa para a despedida.

Nega-se provimento.

DOS FERIADOS TRABALHADOS

O Juízo da origem indeferiu o pedido de pagamento das horas extras referentes aos dias feriados (item 18.1.9, fl. 6) ao argumento de que são válidos os acordos juntados às fls. 174-97, pelos quais os empregados validaram a troca do trabalho nestes dias por descanso em outro dia, prevalecendo a vontade coletiva (fl. 419v.).

A demandante recorre.

Diz que referidos acordos coletivos foram impugnados e que não foi demonstrada a adesão de 75% dos trabalhadores (cláusula 15 das normas coletivas), razão pela qual as reclamadas devem ser condenadas ao pagamento das horas trabalhadas em feriados, com acréscimo de 100%.

À análise.

Os documentos juntados nas fls. 174 e seguintes (“Termo de Acordo de Troca de Feriados”) estabelecem que “Considerando que houve manifestação por parte da maioria dos funcionários da vontade de ter um descanso maior no mês, RESOLVE O SINDICATO DOS TRABALHADORES NAS INDÚSTRIAS DE CALÇADOS, COMPONENTES E DO VESTUÁRIO DE PAROBÉ E CALÇADOS AZALÉIA S/A, com anuência da COMISSÃO DE FUNCIONÁRIOS, acordar o seguinte: Haverá a troca do feriado do dia 28 de março de 2003 pelo dia 02 de maio de 2003. (...)” Referido ajuste está firmado, além do representante da empresa, por uma comissão de funcionários e pelo representante do sindicato dos trabalhadores.

Entende-se que as partes podem ajustar condições de trabalho via negociação das vontades coletivas no espaço em que o legislador permite, caso da organização da prestação laborativa que não invada o tema da segurança, higiene e saúde do trabalho. Assim, a vontade coletiva prevalece sobre a legislação pertinente, sob pena de o Poder Judiciário interferir para restringir garantia constitucional conferida às coletividades. Com...

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