Acórdão nº REsp 1109298 / RS de T2 - SEGUNDA TURMA

Número do processoREsp 1109298 / RS
Data26 Abril 2011
ÓrgãoSegunda Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.109.298 - RS (2008⁄0279009-9)

RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
RECORRENTE : N.B.L.
ADVOGADA : FERNANDAG.H. E OUTRO(S)
RECORRIDO : ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PROCURADOR : HOMERO SO JOBIM NETO E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. BASE DE CÁLCULO. ESTABELECIMENTOS. MESMO TITULAR. TRANSFERÊNCIA ENTRE FÁBRICA E CENTRO DE DISTRIBUIÇÃO. ARTIGO 13, § 4º, DA LC 87⁄96.

  1. Discute-se a base de cálculo do ICMS em operações efetuadas pela recorrente entre a Fábrica (SP), o Centro de Distribuição (SP) e a Filial situada no Rio Grande do Sul. Precisamente, a controvérsia refere-se à base de cálculo adotada na saída de produtos do Centro de Distribuição com destino ao Estado gaúcho, o que demanda a interpretação do artigo 13, § 4º, da LC 87⁄96.

  2. Em resumo, a recorrente fabrica mercadorias em São Paulo-SP e as transfere às filiais espalhadas pelo Brasil. Em virtude do grande volume, utiliza, algumas vezes, o Centro de Distribuição localizado em São Bernardo do Campo-SP, antes de proceder à remessa.

  3. Constatou o aresto que, na saída das mercadorias do Centro de Distribuição paulista, a recorrente registrava como valor das mercadorias um preço superior ao custo de produção, próximo ou maior do que o valor final do produto (nas alienações ocorridas entre a Filial gaúcha e o comércio varejista ou atacadista daquele Estado).

  4. A sociedade empresária recolheu aos cofres paulistas ICMS calculado com base no valor majorado, gerando crédito na entrada dos bens na Filial do RS, onde a alienação das mercadorias a terceiros acarretou débito de ICMS, que acabou compensado com os créditos anteriores pagos ao Estado de São Paulo. Em consequência, concluiu o acórdão recorrido: "... o Estado de origem acaba ficando com todo o imposto, e o Estado de destino apenas com o dever de admitir e compensar os créditos do contribuinte" (fl. 1.172v).

  5. A questão jurídica em debate, portanto, refere-se à base de cálculo do ICMS na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado do mesmo titular - artigo 13, § 4º, da LC 87⁄96.

  6. Na espécie, por diversas razões a base de cálculo do ICMS deve ser o custo da mercadoria produzida nos termos do artigo 13, § 4º, II, da LC 87⁄96 (e não a entrada mais recente).

  7. Em primeiro, a interpretação da norma deve ser restritiva, pois o citado parágrafo estabelece bases de cálculos específicas. Em segundo, os incisos estão conectados às atividades do sujeito passivo, devendo ser utilizado o inciso II para estabelecimento industrial. Em terceiro, a norma visa evitar o conflito federativo pela arrecadação do tributo, o que impede a interpretação que possibilita o sujeito passivo direcionar o valor do tributo ao Estado que melhor lhe convier.

  8. A apuração do valor da base de cálculo pode ser feita por arbitramento nos termos do artigo 148 do CTN quando for certa a ocorrência do fato imponível e a declaração do contribuinte não mereça fé, em relação ao valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados. Nesse caso, a Fazenda Pública fica autorizada a proceder ao arbitramento mediante processo administrativo-fiscal regular, assegurados o contraditório e a ampla defesa, exatamente o que ocorreu no caso, em que foi utilizado o próprio L. deI. doC. deD.

  9. Em termos de arbitramento, o que não se permite na seara do recurso especial é apurar a adequação do valor fixado, por esbarrar no óbice previsto na Súmula 7⁄STJ. Precedentes.

  10. Em outro capítulo, a recorrente postula o afastamento da Taxa Selic, sob o argumento de que sua utilização nos débitos tributários é indevida. Todavia, o acórdão apenas mencionou que não haveria prova de sua utilização nos cálculos. Incidem, no ponto, as Súmulas 282⁄STF e 211⁄STJ, já que não houve prequestionamento da tese levantada no especial.

  11. Quanto à multa aplicada, a recorrente pediu a aplicação do artigo 2º do Decreto-Lei nº 834⁄69 e do artigo 112 do CTN. Além disso, argumentou que a penalidade deveria ser objeto de revisão, pois estaria extremamente abusiva (60 % sobre o valor principal devido).

  12. A Corte de origem afirmou que o dispositivo invocado pela recorrente não estaria mais em vigor, fundamento que não foi combatido, atraindo a aplicação da Súmula 283⁄STF. A análise da razoabilidade da multa implicaria a interpretação da norma constitucional prevista no artigo 150, IV, da CF, o que não se permite na via especial.

  13. O recurso interposto com fundamento na alínea "b" do permissivo constitucional não pode ser conhecido, pois a recorrente não esclarece de que modo o aresto teria julgado válido ato de governo local contestado em razão de lei federal.

  14. Alegações genéricas quanto às prefaciais de afronta ao artigo 535 do Código de Processo Civil não bastam à abertura da via especial pela alínea "a" do permissivo constitucional, a teor da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal.

  15. Em relação ao período de 01⁄01⁄1997 a 04⁄12⁄1997, houve o lançamento por homologação. Tendo havido pagamento antecipado, ainda que reduzido, rege-se a decadência pela regra do art. 150, § 4º, do CTN, que fixa o prazo de cinco anos, a contar do fato gerador, para a homologação do pagamento realizado pelo contribuinte. Em razão disso, nesse ponto, prospera a irresignação da decadência parcial da obrigação tributária inserida no auto de lançamento nº 0008699640.

  16. Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe parcial provimento nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Cesar Asfor Rocha votaram com o Sr. Ministro Relator. Sustentou oralmente a Dra. Renata Pagy Bonilha, pela parte RECORRENTE: NESTLÉ BRASIL LTDA

    Brasília, 26 de abril de 2011(data do julgamento).

    Ministro Castro Meira

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.109.298 - RS (2008⁄0279009-9)

    RELATOR : MINISTRO CASTRO MEIRA
    RECORRENTE : N.B.L.
    ADVOGADO : GRAZIELA PINTO DE FARIAS
    RECORRIDO : ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
    PROCURADOR : HOMERO SO JOBIM NETO E OUTRO(S)

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): Trata-se de ação anulatória de débito fiscal em que a recorrente contesta autos de lançamento lavrados pelo Estado do Rio Grande do Sul por menor recolhimento de ICMS.

    O aspecto fático foi bem delineado pela autora, ora recorrente, sendo oportuno colacionar o seguinte excerto da inicial para esclarecimento da situação posta em juízo:

    Os estabelecimentos industriais da AUTORA localizados no Estado de São Paulo transferem sua produção para o estabelecimento comercial situado no Município de São Bernardo do Campo, denominado Centro de Distribuição.

    Tais operações são realizadas em perfeita consonância com a legislação estadual paulista e nacional havendo apuração e recolhimento do ICMS em tais transferências, mediante a utilização do valor da entrada mais recente como base de cálculo do tributo.

    O Centro de Distribuição por sua vez, transfere as mercadorias para os diversos estabelecimentos comerciais também com a utilização do valor da entrada mais recente como base de cálculo do ICMS.

    Em decorrência, as mercadorias ingressaram no estabelecimento da AUTORA, através da transferência pelo Centro de Distribuição - SP, com o valor da entrada mais recente.

    No entanto, segundo a Ré, a base de cálculo nas transferências realizadas deveria ser o valor do custo da mercadoria e não da entrada mais recente, o que acabou gerando destaque a maior de ICMS nas notas e conseqüentemente, apropriação indevida de créditos e diminuição do saldo de imposto a pagar (fl. 10-11).

    O acórdão, proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, deu provimento à apelação do ora recorrido para julgar improcedente o pedido formulado na ação constitutiva negativa, nos termos da seguinte ementa:

    APELAÇÃO CÍVEL. ICMS. ANULAÇÃO DE AUTOS DE LANÇAMENTO. DECADÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS. INTERPOSIÇÃO DE ESTABELECIMENTO AINDA NO ESTADO DE ORIGEM. AGREGAÇÃO DE VALOR. TRANSFERÊNCIA PARA FILIAL NO ESTADO DE DESTINO. BASE DE CÁLCULO. CREDITAMENTO. EXCLUSÃO DO PLUS VALORATIVO E ARBITRAMENTO. MULTA. TAXA SELIC.

  17. Decadência.

    Não dizendo a hipótese com autolançamento, mas com autuação, incide o art. 173, I, e não o art. 150, § 4º, ambos do CTN. Portanto, o qüinqüênio para constituir o crédito conta-se a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado.

  18. Cerceamento de defesa.

    2.1 – Se as partes, antes da sentença, foram devidamente consultadas a respeito de quais provas ainda queriam produzir, a que teve julgamento desfavorável não pode requerer a anulação do processo por cerceamento de defesa, uma vez não tendo se posicionado adequadamente no momento oportuno.

    2.2 – Ademais, se a matéria de fato, no quanto interessa ao julgamento, se ostenta suficiente e inclusive incontroversa, não há por que ampliar a dilação probatória.

  19. Operações interestaduais. Interposição de estabelecimento ainda no Estado de origem. Agregação de valor. Transferência para filial no Estado de destino. Base de cálculo. Agregação de valor. Base de cálculo. Creditamento.

    3.1 – Proceder consistente no seguinte: (a) transferência dos produtos de estabelecimento industrial para interposto estabelecimento comercial, denominado Centro de Distribuição, ambos do mesmo titular e no Estado de origem; (b) agregação de valor (plus) na operação de saída do industrial (preço de custo) para a de entrada no comercial (Centro de Distribuição), deixando os produtos pelo menos próximos do preço final, quando não até superior, conservando, porém, para fins de avaliação patrimonial, enquanto estocados (Livro de Inventário), o preço de custo; (c) transferência, em operação interestadual, para estabelecimento comercial (filial), do mesmo titular, pelo preço com valor agregado...

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