Acórdão nº RHC 25232 / AM de T5 - QUINTA TURMA

Número do processoRHC 25232 / AM
Data17 Maio 2011
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 25.232 - AM (2009⁄0004375-4)

RELATORA : MINISTRA LAURITA VAZ
RECORRENTE : J.A.D.S.T.
ADVOGADO : DEOCLÉCIO DIAS BORGES E OUTRO(S)
RECORRIDO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 3º , INCISO III, DA LEI 8.137⁄90 E ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIME DE ADVOCACIA ADMINISTRATIVA FAZENDÁRIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO-EVIDENCIADA DE PLANO. PARTICIPAÇÃO EM CONDUTA TÍPICA SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADA PELA DENÚNCIA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ATIPICIDADE DA CONDUTA DESCRITA. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

  1. O Recorrente alega falta de justa causa para a ação penal quanto ao crime do art. 3º , inciso III, da Lei 8.137⁄90, aduzindo, apenas, inexistirem provas de que teria se associado ao corréu funcionário público para praticar o crime de advocacia administrativa, perante as autoridades fazendárias. Essa tese demanda minucioso exame do conjunto fático e probatório, que deve ser feito pelo Juízo ordinário, durante a instrução criminal contraditória.

  2. Embora o crime de advocacia administrativa fazendária tenha como sujeito ativo funcionário público, em se tratando de elementar do crime, nada impede a responsabilização penal de terceiro, que não ostente essa condição, como partícipe. Inteligência do art. 30 do Código Penal.

  3. Não configura o crime de falsidade ideológica o simples fato de assinar uma petição em processo judicial ou administrativo elaborada por outra pessoa, responsabilizando-se pelo que foi escrito. Ademais, descabe concluir que o Recorrente inseriu declaração falsa nos mencionados documentos pelo simples fato de terem sido eles supostamente elaborados pelo corréu funcionário público, em defesa de interesses privados.

  4. Eventual contradição na narrativa da exordial, por descrever, ao mesmo tempo, participação esporádica e associação estável entre o Recorrente e seu corréu funcionário público, não tornaria inepta a denúncia, que somente se configura "quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP" (RHC 18.502⁄SP, 5.ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 15⁄05⁄2006), inexistentes na espécie.

  5. Recurso parcialmente provido para trancar a ação penal apenas com relação ao crime de falsidade ideológica, determinando que o Ministério Público Federal analise a possibilidade de conceder ao acusado a suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei n.º 8.099⁄95.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e A.V.M. (Desembargador convocado do TJ⁄RJ) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

    Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp.

    Brasília (DF), 17 de maio de 2011 (Data do Julgamento)

    MINISTRA LAURITA VAZ

    Relatora

    RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 25.232 - AM (2009⁄0004375-4)

    RECORRENTE : J.A.D.S.T.
    ADVOGADO : DEOCLÉCIO DIAS BORGES E OUTRO(S)
    RECORRIDO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO

    RELATÓRIO

    A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:

    Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus, impetrado em favor de J.A.D.S.T., denunciado como incurso no art. 299 do Código Penal e no art. 3º, inciso III, da Lei n.º 8.137⁄90, contra acórdão denegatório proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, assim ementado:

    "PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. FALTA DE JUSTA CAUSA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.

    I – Não é inepta a denúncia que bem individualiza a conduta dos acusados, com exposição do fato criminoso, na forma preceituada no art. 41 do Código de Processo Penal.

    II – A jurisprudência é firme no sentido de que o trancamento de ação penal, em sede de habeas corpus, impetrado com fundamento na ausência de justa causa, é medida excepcional, que, em princípio, não tem cabimento quando a denúncia ofertada narra suficientemente fatos que constituem crime e indícios sérios de autoria, exigindo-se, também, para seu exame, dilação probatória incompatível com a via estreita do writ.

    III – Habeas corpus denegado." (fl. 515)

    Embargos de declaração foram opostos pela Defesa e rejeitados.

    Narram os autos que o ora Recorrente foi denunciado como partícipe no crime de advocacia administrativa e nas sanções do crime de falsidade ideológica porque teria, na condição de advogado, assinado peças processuais elaboradas pelo Procurador da Fazenda Nacional J.F.C., que seria sócio de fato do seu escritório de advocacia, o qual era utilizado para exercer, de forma dissimulada, a defesa de interesses privados perante a administração fazendária, valendo-se da qualidade de funcionário público do corréu.

    Repisando os argumentos da impetração originária, o Recorrente sustenta, em longo arrazoado, que os fatos narrados na denúncia não constituem crime.

    Afirma, para tanto, que "não era à época dos fatos, não é atualmente, e nunca foi funcionário público," bem como "não atuou como co-autor em crime próprio e nem como partícipe em crime próprio" (fl. 545), não podendo lhe ser imputada a prática de crime de advocacia administrativa.

    Defende, nessa linha, falta de justa causa para a ação penal porque não restou provada a suposta sociedade de fato com o Procurador da Fazenda Nacional, tampouco "não há uma prova sequer de que o Paciente tenha utilizado uma peça processual que seja, produzida ou co-produzida pelo Procurador, em ação que tenha em qualquer dos pólos a Fazenda Nacional" (fl. 546), logo, não há prova de que seja coautor do delito de advocacia administrativa fazendária. Aduz que, de todo modo, eventual intercâmbio de conhecimentos, ou até mesmo o fato de assinar petição escrita por outrem não configura o crime de falsidade ideológica, por falta de elemento essencial do tipo.

    Por fim, sustenta a inépcia da denúncia porque, ao mesmo tempo, afirma que o Procurador da Fazenda Nacional era sócio de fato e recebia pagamentos por cada serviço prestado ao escritório do Recorrente, o que configura contradição.

    Requer, assim, o provimento do recurso para trancar a ação penal em sua totalidade, ou apenas em relação ao crime de falsidade ideológica, deferindo a suspensão condicional do processo prevista no art. 89 da Lei n.º 9.099⁄95.

    O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 611⁄634, opinando pela desprovimento do recurso.

    É o relatório.

    RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 25.232 - AM (2009⁄0004375-4)

    EMENTA

    RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART. 3º , INCISO III, DA LEI 8.137⁄90 E ART. 299 DO CÓDIGO PENAL. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIME DE ADVOCACIA ADMINISTRATIVA FAZENDÁRIA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO-EVIDENCIADA DE PLANO. PARTICIPAÇÃO EM CONDUTA TÍPICA SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADA PELA DENÚNCIA. FALSIDADE IDEOLÓGICA. ATIPICIDADE DA CONDUTA DESCRITA. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

  6. O Recorrente alega falta de justa causa para a ação penal quanto ao crime do art. 3º , inciso III, da Lei 8.137⁄90, aduzindo, apenas, inexistirem provas de que teria se associado ao corréu funcionário público para praticar o crime de advocacia administrativa, perante as autoridades fazendárias. Essa tese demanda minucioso exame do conjunto fático e probatório, que deve ser feito pelo Juízo ordinário, durante a instrução criminal contraditória.

  7. Embora o crime de advocacia administrativa fazendária tenha como sujeito ativo funcionário público, em se tratando de elementar do crime, nada impede a responsabilização penal de terceiro, que não ostente essa condição, como partícipe. Inteligência do art. 30 do Código Penal.

  8. Não configura o crime de falsidade ideológica o simples fato de assinar uma petição em processo judicial ou administrativo elaborada por outra pessoa, responsabilizando-se pelo que foi escrito. Ademais, descabe concluir que o Recorrente inseriu declaração falsa nos mencionados documentos pelo simples fato de terem sido eles supostamente elaborados pelo corréu funcionário público, em defesa de interesses privados.

  9. Eventual contradição na narrativa da exordial, por descrever, ao mesmo tempo, participação esporádica e associação estável entre o Recorrente e seu corréu funcionário público, não tornaria inepta a denúncia, que somente se configura "quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 43 do CPP" (RHC 18.502⁄SP, 5.ª Turma, Rel. Min. GILSON DIPP, DJ de 15⁄05⁄2006), inexistentes na espécie.

  10. Recurso parcialmente provido para trancar a ação penal apenas com relação ao crime de falsidade ideológica, determinando que o Ministério Público Federal analise a possibilidade de conceder ao acusado a suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei n.º 8.099⁄95.

    VOTO

    A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):

    O recurso merece parcial provimento.

    Especificamente em relação ao Recorrente, narra a denúncia o seguinte:

    "MÁRIO DA CRUZ GLÓRIA e J.A.D.S.T. são advogados e sócios do escritório Tolentino e Glória Advogados e Consultoria Fiscal. Consoante exaustivamente retratado no tópico 3, “A” e “B” desta denúncia, o referido escritório servia de biombo para atuação criminosa do denunciado J.F.C., que, por ser Procurador da Fazenda Nacional, não poderia prestar serviços de advocacia. JOSIAS, então, valia-se do acobertamento oferecido pelos ora denunciados para exercer, de forma dissimulada, a defesa de interesses privados.

    Em depoimento prestado perante a autoridade policial, J.A.D.S.T. disse que quando possuía dúvidas quanto à elaboração de recursos judiciais, tributários e cível, tirava estas dúvidas com JOSIAS, e que às vezes entregava disquetes para JOSIAS fazer...

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