Acórdão nº REsp 1235952 / RN de T2 - SEGUNDA TURMA

Magistrado ResponsávelMinistro HERMAN BENJAMIN (1132)
EmissorT2 - SEGUNDA TURMA
Tipo de RecursoRecurso Especial

RECURSO ESPECIAL Nº 1.235.952 - RN (2011⁄0018379-0)

RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
RECORRIDO : L G B E OUTROS
ADVOGADO : ESEQUIAS PEGADO CORTEZ NETO E OUTRO(S)
RECORRIDO : J DOS S
ADVOGADO : PAULO DE TARSO PEREIRA FERNANDES
RECORRIDO : T P E OUTROS
ADVOGADO : ESEQUIAS PEGADO CORTEZ NETO E OUTRO(S)
RECORRIDO : C.D.E.D.R.D.S.E.O.
ADVOGADO : JOSÉ DANIEL DINIZ

EMENTA

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AGENTES POLÍTICOS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL. SECRETÁRIOS DE ESTADO. COMPETÊNCIA. PRERROGATIVA DE FORO. CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. COMPETÊNCIAS IMPLÍCITAS COMPLEMENTARES. REMESSA AO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL.

  1. Trata-se de Ação Civil Pública contra os recorridos em razão da prática de atos de improbidade administrativa, descritos como dispensa indevida de licitação, desvio de verbas públicas, autorização de despesas não previstas em lei e desvio de finalidade na implementação do "Programa do Leite", com prejuízo aos cofres públicos no valor de aproximadamente R$ 10 milhões.

  2. Após sentença de procedência, o acórdão acolheu a alegação de inaplicabilidade de Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos e, em relação aos demais, anulou a sentença por cerceamento de defesa. O Recurso Especial pugna pela reforma do acórdão nesses dois pontos.

  3. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça decidiu pela submissão dos agentes políticos à Lei de Improbidade Administrativa (Rcl 2.790⁄SC, Corte Especial, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJe 4.3.2010).

  4. Todavia, o mesmo precedente estabelece privilégio de foro aos agentes políticos em ações de improbidade – com base em construção amparada em julgado do STF –, na relevância do cargo de determinados sujeitos, no interesse público ao seu bom e independente exercício e na idéia de competências implícitas complementares.

  5. A Constituição do Estado do Rio Grande do Norte prevê prerrogativa de Foro a Secretários de Estado.

  6. Recurso Especial parcialmente provido para reconhecer a aplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa aos recorridos, agentes políticos, com remessa, de ofício, dos autos ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte para que julgue a demanda em competência originária.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator." Os Srs. Ministros Mauro Campbell Marques, Cesar Asfor Rocha, Castro Meira e Humberto Martins votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília, 02 de junho de 2011(data do julgamento).

    MINISTRO HERMAN BENJAMIN

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.235.952 - RN (2011⁄0018379-0)

    RELATOR : MINISTRO HERMAN BENJAMIN
    RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE
    RECORRIDO : L G B E OUTROS
    ADVOGADO : ESEQUIAS PEGADO CORTEZ NETO E OUTRO(S)
    RECORRIDO : J DOS S
    ADVOGADO : PAULO DE TARSO PEREIRA FERNANDES
    RECORRIDO : T P E OUTROS
    ADVOGADO : ESEQUIAS PEGADO CORTEZ NETO E OUTRO(S)
    RECORRIDO : C.D.E.D.R.D.S.E.O.
    ADVOGADO : JOSÉ DANIEL DINIZ

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO HERMAN BENJAMIN (Relator): Trata-se de Recurso Especial interposto, com fundamento no art. 105, III, "a", da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, assim ementado:

    CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DEDUZIDA CONTRA VÁRIOS RÉUS, DENTRE ELES, TRÊS SECRETÁRIOS DE ESTADO. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 8.429⁄92 AOS AGENTES POLÍTICOS. AGRAVA RETIDO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO QUE INACOLHEU A TESE JURÍDICA DEDUZIDA EM MANIFESTAÇÃO DOS RÉUS. POSIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ARESTOS DA CORTE SUPREMA QUE CHANCELAM A TESE JURÍDICA DE INAPLICABILIDADE DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AOS AGENTES POLÍTICOS (RCL 2138, ADI 2797, RE 228977, RE 579799 AgR). SECRETÁRIOS DE ESTADO. SUJEIÇÃO À RESPONSABILIZAÇÃO PELO SISTEMA DA LEI Nº 1.079⁄50, QUE DEFINE COMO CRIME DE RESPONSABILIDADE OS ATOS QUE ATENTAREM CONTRA A PROBIDADE NA ADMINISTRAÇÃO (ART. 4º, V, C⁄C ART. 74, DA LEI Nº 1.079⁄50). ESTADOS FEDERADOS: ORGANIZAÇÃO E REGÊNCIA PELAS CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS E LEIS QUE ADOTAREM, OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA CARTA DA REPÚBLICA (CF, ART. 25). CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. PRINCÍPIO DA SIMETRIA. PREVISÃO DE JULGAMENTO DOS CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS SECRETÁRIOS DE ESTADO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (CONSTITUIÇÃO DO ESTADO, ART. 71, I, c). PRERROGATIVA DE FORO NO JULGAMENTO DOS DELITOS POLÍTICOS QUE RESULTA DA PRINCIPIOLOGIA DA CARTA DA REPÚBLICA, SEGUIDA PELA CARTA ESTADUAL POR FORÇA DO PRINCÍPIO DA SIMETRIA. ACOLHIMENTO DA TESE DE INAPLICAÇÃO DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA AOS SECRETÁRIOS DE ESTADO. AGRAVO RETIDO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO COM RELAÇÃO AOS AGENTES POLÍTICOS SECRETÁRIOS DE ESTADO (ART. 17, § 11 DA LEI Nº 8.429⁄92). PROSSEGUIMENTO DO FEITO COM RELAÇÃO AOS DEMAIS RÉUS. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA POR CERCEAMENTO DE DEFESA. TRANSFERÊNCIA PARA O MÉRITO. MÉRITO: JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. SENTENÇA QUE RECUSOU A PRODUÇÃO DE PROVAS EM PROCESSO DE ALTA COMPLEXIDADE. HIPÓTESE EM QUE O JULGAMENTO ANTECIPADO APOIOU-SE EM DEPOIMENTOS TOMADOS PERANTE O MINISTÉRIO PÚBLICO, SEM O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E SEM A PRESENÇA DOS ACUSADOS. SENTENÇA QUE EMBORA RECONHEÇA IMPLICITAMENTE A IMPORTÂNCIA DA PRODUÇÃO DE PROVAS, RECUSA-A, EM PREJUÍZO À DEFESA DOS RÉUS. QUESTÕES FÁTICAS COMPLEXAS E CONTROVERTIDAS QUE NÃO ENSEJARAM O JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. LESÃO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. CERCEAMENTO DO DIREITO SUBJETIVO PROCESSUAL DA PARTE NA PRODUÇÃO DE OUTRAS PROVAS. ACOLHIMENTO DA PRELIMINAR PARA ANULAR A SENTENÇA E DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS À INFERIOR INSTÂNCIA, PARA A REALIZAÇÃO DE INSTRUÇÃO COM RELAÇÃO AOS DEMAIS RÉUS.

  7. O Supremo Tribunal Federal, pelo seu Plenário e pela Segunda Turma, fixou o entendimento "nos termos do qual a Constituição do Brasil não admite concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos" (RE 579799, AgR⁄SP; Rcl 2138, RE 228977). Como Guardião da Carta da República e seu intérprete máximo, a palavra do Supremo Tribunal Federal é um "legado transmitido, continuamente, de geração a geração, a todos os Juízes que transpuserem seus umbrais, é imenso e é indestrutível, pois desse legado legado resulta a lição - tão cuidadosamente preservada nas decisões deste Tribunal de que o respeito à ordem constitucional legítima, a proteção das liberdades e a repulsa ao arbítrio qualificam-se como fins superiores que devem inspirar a conduta daqueles que pretendem construir e consolidar, no Brasil, o Estado Democrático de Direito" (Ministro Celso de Mello).

  8. Ação de Improbidade Administrativa manejada pelo Ministério Público contra vários réus, dentre eles três Secretários de Estado, aos quais se atribui prática de atos qualificados, em tese, como ímprobos, previstos na Lei nº 8.429⁄92.

  9. O Secretário de Estado mantém com o Estado um vínculo cuja natureza é política, e não profissional, e no exercício de suas atribuições gozam de independência e autonomia e não se sujeitam ao regime jurídico único previsto na Constituição Federal para os servidores públicos que se incluem entre os agentes administrativos. O art. 40, da Carta Magna, dirige-se aos servidores públicos, e não alcança os agentes políticos.

  10. O agente político não se confunde com titular de cargo em comissão, de confiança ou de função gratificada. Sendo a figura jurídica do Secretário de Estado um agente político, consoante criteriosa análise da Constituição Federal, da Constituição do Estado e da legislação federal (Lei nº1.079⁄50).

  11. A Carta da República atribui julgamento dos crimes de responsabilidade dos Ministros de Estado (ressalvada a hipótese de conexão com os crimes de responsabilidade praticados pelo Presidente e Vice- Presidente da República, consoante art. 51, I, CF, cujo julgamento dá-se pelo Senado Federal, em sessão presidida pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, c). Por simetria, em respeito aos princípios da Carta Federal (CF, art. 25), a Constituição do Estado do Rio Grande do Norte (ressalvada a hipótese dos crimes de responsabilidade do Governador do Estado e dos Secretários, quando conexos com aqueles, cujo julgamento é feito pelo Tribunal Especial previsto na Constituição do Estado, em sessão presidida pelo Presidente do Tribunal de Justiça, consoante artigo 65 e § 1º, da Constituição do Estado do RN), prevê o julgamento dos crimes de responsabilidade dos Secretários de Estado pelo Tribunal de Justiça (CE, art. 71, I, c)

  12. Tendo a Constituição do Estado do Rio Grande do Norte, em obediência ao princípio da autonomia dos entes federados (CF, art. 25), previsto como crimes de responsabilidade do Governador e dos Secretários de Estado "aqueles definidos em lei federal" (CE, art. 65, §1º) e, tendo a Lei Federal nº 1.079 de 10 de abril de 1950 definido como crimes de responsabilidade do Governador do Estado e dos seus Secretários "os atos definidos como crime nesta lei", e ainda, tendo a mesma Lei 1.079⁄50 definido como crime de responsabilidade a prática de "atos que atentarem contra a probidade na administração (art. 4º, caput, e inciso V), resta juridicamente impossível sancionar-se os Secretários de Estado pela prática de atos de improbidade definidos pela Lei nº 8.429⁄92, pois a Carta da República não admite ocorrência de dois regimes de responsabilidade político-administrativa dos agentes políticos, pois que consistiria em inadmissível bis in idem.

  13. A prerrogativa de foro para o julgamento dos crimes de responsabilidade, prevista na Constituição do Estado do Rio Grande do Norte, resulta da principologia da Constituição Federal, em obséquio ao princípio da simetria, o que somente reforça a conclusão de que os Secretários de Estado...

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