Acórdão nº HC 116901 / SP de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoHC 116901 / SP
Data14 Junho 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 116.901 - SP (2008⁄0215534-6)

RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
IMPETRANTE : A.A.F.D. - DEFENSOR PÚBLICO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : SÉRGIO DA SILVA CARVALHO

EMENTA

HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E USO DE DOCUMENTO FALSO. CONDENAÇÃO. ABOLITIO CRIMINIS. TESE NÃO EXAMINADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME PERMANENTE. NULIDADE INEXISTENTE. DOSIMETRIA DA PENA. PROCESSO EM CURSO. PERSONALIDADE DESVIADA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 444⁄STJ.

  1. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça examinar a pretensão da Defesa, de reconhecer a atipicidade da conduta em razão da abolitio criminis, se a matéria não foi submetida a exame das instâncias ordinárias, sob pena de supressão de instância. A questão não foi arguida nas alegações finais ou nas razões da apelação, sequer em sede de embargos de declaração que poderiam ser opostos contra o acórdão proferido pela Corte estadual.

  2. Embora a apelação devolva ao Tribunal estadual toda a matéria objeto de controvérsia, a Defesa não pode formular habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça arguindo, somente aqui, qualquer tese, sem antes levar o tema a debate das instâncias inferiores. Tal interpretação afronta o princípio do duplo grau de jurisdição.

  3. Tratando-se de réu preso em flagrante pelo cometimento de delito permanente, não há que falar em nulidade por ausência de mandado judicial. Precedentes.

  4. Inquéritos e processos em curso não podem ensejar o aumento da pena base, sob pena de violação do princípio da presunção de não culpabilidade, não servindo para valorar negativamente os antecedentes, a personalidade ou a conduta social do réu. Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça.

  5. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, concedido em parte para reduzir a reprimenda imposta ao paciente.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça: "A Turma, por unanimidade, conheceu parcialmente da ordem de habeas corpus e, nesta parte, a concedeu em parte, nos termos da Sra. Ministra Relatora." Os Srs. Ministros Og Fernandes, S.R.J., V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS) e Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ⁄CE) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília, 14 de junho de 2011(Data do Julgamento)

    Ministra Maria Thereza de Assis Moura

    Relatora

    HABEAS CORPUS Nº 116.901 - SP (2008⁄0215534-6)

    RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
    IMPETRANTE : A.A.F.D. - DEFENSOR PÚBLICO
    IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
    PACIENTE : SÉRGIO DA SILVA CARVALHO

    RELATÓRIO

    MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA:

    Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de S.D.S.C., apontando-se como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (Apelação Criminal nº 993.08.010826-9).

    Noticiam os autos que o paciente foi condenado à pena de 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, em regime fechado, e 22 (vinte e dois) dias-multa, como incurso no art. 16, parágrafo único, inciso IV, da Lei n.º 10.826⁄2003, e no art. 304, c⁄c o art. 297, na forma do art. 69, todos do Código Penal.

    Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, ao qual o Tribunal a quo negou provimento, consignando, no que interessa (fls. 57⁄63):

    Por primeiro, a nulidade arguida não prospera. Segundo informam os autos, o apelante foi preso em razão da denúncia anônima que revelava ser ele procurado pela Justiça. Policiais em trabalho de averiguação, o abordaram em frente a sua residência e, casualmente, o reconheceram, já que se identificou com documento falso. Após o réu admitir a posse de arma de fogo em sua residência, os milicianos ali ingressaram e a apreenderam. Patente o estado de flagrância delitiva, nada havendo de ilegal na conduta dos policiais. (...) A garantia constitucional da inviolabilidade de domicílio não é absoluta, comporta exceções, como no caso, em que, no local, estava sendo praticado um crime, tanto que os policiais fizeram as apreensões, como acima destacado. O artigo 150, § 3º, e inciso II, do Código Penal, estatui: "Não constitui crime a entrada ou permanência em casa alheia ou em suas dependências: a qualquer hora do dia ou da noite, quando algum crime está sendo ali praticado ou na iminência de o ser".

    Não discrepa a doutrina: "Dispõe o artigo 303 que, nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência, o que, na verdade é despiciendo, já que, nessa espécie de ilícito, a consumação se prolonga no tempo, dependendo da vontade do agente, como ocorre nos crimes de seqüestro (art. 148, do CP), de extorsão mediante seqüestro (art. 159, do CP), nos crimes cuja conduta é "guardar consigo", "ter em depósito", "transportar" etc. Nessas hipóteses o crime está sendo cometido durante o tempo da consumação, havendo pois caso típico de flagrância. (...)

    Na dosimetria penal, as básicas de ambos os crimes foram justificadamente fixadas 1⁄6 (um sexto) acima dos patamares mínimos, em razão do envolvimento anterior do apelante em crime grave, o admitido homicídio, circunstância judicial mais que suficiente para demonstrar personalidade distorcida, voltada para a prática criminosa, ensejadora de maior rigor no apenamento, não obstante o teor da certidão encartada às fls. 6 do penúltimo apenso, onde não consta sequer o fundamento da decisão ou o seu trânsito em julgado. Concretizaram-se, assim, as penas de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa para o crime de posse de arma e 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 11 (onze) dias-multa para o falso, totalizando, em virtude do concurso material de delitos, 5 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 22 (vinte e dois) dias-multa.

    Alega o impetrante que a prova que consta dos autos contra o paciente é ilegal, uma vez que foi obtida mediante violação do princípio constitucional da inviolabilidade domiciliar. Aduz que os policiais adentraram à residência do paciente sem mandado de busca e apreensão e ausente a situação de flagrante delito, em razão do recebimento de denúncia anônima, a qual noticiava o endereço de um indivíduo procurado pela justiça.

    Sustenta que a pena base do paciente foi exacerbada em 1⁄6, ao argumento de que ele ostentava maus antecedentes, assim considerado em razão da existência de processo em que foi extinta a sua punibilidade. Assevera que a pena base deve ser fixada no patamar mínimo, sob pena de ser violado o princípio constitucional da presunção de inocência. Enfatiza que o paciente é primário e não possui antecedentes criminais.

    Requer a concessão da ordem "a fim de se considerar ilícita a prova produzida em desfavor do paciente, para então absolvê-lo. Subsidiariamente, pugna a redução da pena base fixada ao mínimo legal, vez que ausentes elementos que demonstrem circunstâncias desfavoráveis" (fl. 5).

    Foram prestadas informações às fls. 82⁄99.

    O Ministério Público Federal opina pela concessão parcial da ordem (fls. 101⁄106).

    Com a petição de fls. 108⁄112, o impetrante adita a inicial, sustentando a ocorrência de abolitio criminis, em razão da alteração do estatuto do desarmamento, pois o paciente poderia devolver sua arma de fogo à autoridade policial. Acentua que a norma deve retroagir. Pugna, em consequência, pela absolvição do paciente.

    Conforme informação obtida por telefone junto ao Juízo da execução, o paciente cumpre pena em livramento condicional, com término previsto para 07.03.2013.

    E, em consulta à página eletrônica do Tribunal de origem, observa-se que houve a retificação do julgamento da apelação em 08.01.09, para constar que foi rejeitada a preliminar defensiva e parcialmente provido o apelo para reduzir ao mínimo legal o valor unitário da multa imposta (fls. 117⁄122).

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 116.901 - SP (2008⁄0215534-6)

    EMENTA

    HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E USO DE DOCUMENTO FALSO. CONDENAÇÃO. ABOLITIO CRIMINIS. TESE NÃO EXAMINADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. CONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRISÃO EM FLAGRANTE. CRIME PERMANENTE. NULIDADE INEXISTENTE. DOSIMETRIA DA PENA. PROCESSO EM CURSO. PERSONALIDADE DESVIADA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 444⁄STJ.

  6. Não cabe ao Superior Tribunal de Justiça examinar a pretensão da Defesa, de reconhecer a atipicidade da conduta em razão da abolitio criminis, se a matéria não foi submetida a exame das instâncias ordinárias, sob pena de supressão de instância. A questão não foi arguida nas alegações finais ou nas razões da apelação, sequer em sede de embargos de declaração que poderiam ser opostos contra o acórdão proferido pela Corte estadual.

  7. Embora a apelação devolva ao Tribunal estadual toda a matéria objeto de controvérsia, a Defesa não pode formular habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça arguindo, somente aqui, qualquer tese, sem antes levar o tema a debate das instâncias inferiores. Tal interpretação afronta o princípio do duplo grau de jurisdição.

  8. Tratando-se de réu preso em...

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