Acórdão nº REsp 1189213 / GO de T4 - QUARTA TURMA

Data22 Fevereiro 2011
Número do processoREsp 1189213 / GO
ÓrgãoQuarta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.189.213 - GO (2010⁄0062053-8)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : BRADESCO AUTO⁄RE COMPANHIA DE SEGUROS E OUTROS
ADVOGADO : GUSTAVO MIGUEZ DE MELLO E OUTRO(S)
RECORRENTE : M.V.C.S.S.
ADVOGADO : CRISTIANE ROMANO E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CLÁUSULA DE CONTRATO DE SEGURO. PERDA TOTAL OU FURTO DE VEÍCULO. INDENIZAÇÃO. VALOR DE MERCADO REFERENCIADO. INEXISTÊNCIA DE ABUSIVIDADE. LEGALIDADE. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO.

1. Não há violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o acórdão hostilizado, embora não examine individualmente cada um dos argumentos suscitados pela parte, adota fundamentação suficiente, decidindo integralmente a controvérsia. É indevido conjecturar-se a existência de omissão, contradição ou obscuridade no julgado apenas porque decidido em desconformidade com os interesses da parte.

2. É inviável o exame, na via estreita do recurso especial, de alegada ofensa a dispositivo constitucional.

3. Fica inviabilizado o conhecimento de tema trazido na petição de recurso especial, mas não debatido e decidido nas instâncias ordinárias, tampouco alegado em sede de embargos de declaração, porquanto ausente o indispensável prequestionamento.

4. O Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública, na defesa de interesses individuais homogêneos, nos termos do art. 81, III, do Código de Defesa do Consumidor.

5. Não há julgamento extra petita, quanto à anulação de ato normativo da SUSEP, porquanto consta do pedido formulado na exordial da ação civil pública.

6. As seguradoras disponibilizam mais de uma espécie de contrato de seguro de automóvel ao consumidor, cada qual com diferentes preços. Há contratos que estabelecem que a indenização do sinistro deve ser feita pelo valor do veículo determinado na apólice e há contratos que determinam que essa indenização securitária seja realizada pelo valor de mercado referenciado. Cabe ao consumidor optar pela modalidade que lhe pareça mais favorável.

7. Não é abusiva, por si só, a cláusula dos contratos de seguro que preveja que a seguradora de veículos, nos casos de perda total ou de furto do bem, indenize o segurado pelo valor de mercado na data do sinistro.

8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Raul Araújo, que lavrará o acórdão. Votou vencido o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão. Votaram com o Sr. Ministro Raul Araújo os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Aldir Passarinho Junior e J.O. deN. Sustentou oralmente, o Dr. Gustavo Miguez de Mello, pela parte Recorrente.

Brasília, 22 de fevereiro de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO RAUL ARAÚJO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.189.213 - GO (2010⁄0062053-8)

RECORRENTE : BRADESCO AUTO⁄RE COMPANHIA DE SEGUROS E OUTROS
ADVOGADO : GUSTAVO MIGUEZ DE MELLO E OUTRO(S)
RECORRENTE : M.V.C.S.S.
ADVOGADO : CRISTIANE ROMANO E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

1. Cuida-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face de Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, Novo Hamburgo Cia de Seguros Gerais, Minas-Brasil Seguradora, Real Previdência e Seguros S⁄A, AGF Brasil Seguros S⁄A, Caixa Seguros, Porto Seguro Cia de Seguros Gerais, BR Paulista Seguros (PAULISEG), A.S. e Previdência, B.V.C. deS.,H.S.B.S., Bradesco Seguros e Vera Cruz Seguradora S⁄A. Alega o autor, com base no Código Civil e Código de Defesa do Consumidor, que é abusiva a cláusula "padrão" que autoriza as seguradoras de veículos a efetuar o pagamento da indenização, nos casos de perda total e furto do veículo segurado, pelo valor de mercado referenciado, na data do sinistro. Sustenta que, com tal conduta, o segurado paga à seguradora o prêmio adequado ao valor do bem segurado, ao tempo da contratação, mas no momento de se pagar a indenização, quando ocorre o sinistro, o valor considerado é diferente, reduzido em proporção à depreciação do automóvel.

O Juízo de primeira instância rejeitos as preliminares das contestações e julgou procedente o pedido, declarando a nulidade do art. 13 do Anexo I da Circular SUSEP n. 145, de 07⁄11⁄2000, bem como o item 18 do Parecer Normativo n. 05, de 11⁄03⁄2003, da SUSEP e a nulidade das cláusula de seguro de veículos firmadas na modalidade de "valor de mercado". Condenou, ainda, as Seguradoras a indenizarem os segurados residentes e domiciliados no Estado de Goiás, relativamente aos contratos de seguro de automóveis firmados a partir de 31⁄01⁄2001, mais precisamente aqueles que tiveram sinistros que implicaram em perda total, nos valores correspondentes à diferença entre o que foi pago e o que se acha ajustado na respectiva apólice, se inferior a este, tudo acrescidos de juros de mora e correção monetária. A sentença estabeleceu que a liquidação do julgado deverá ser feita em autos desmembrados, um para cada seguradora, e mediante prova pericial, em cada contrato de segurado individual, de modo a se apurar se há diferença a ser devolvida (fls. 1.677⁄1.704).

Opostos embargos de declaração (fls. 1.709⁄1.711), foram parcialmente providos (fls. 1.774⁄1.780).

As rés apelaram (fls. 1.713⁄1.759 e 1.782⁄1.846).

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu provimento parcial à apelação da SUSEP, diminuindo a verba honorária, negando provimento aos demais recursos, conforme a seguinte ementa:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SEGURO DE AUTOMÓVEL. FURTO OU PERDA TOTAL DO BEM. INDENIZAÇÃO. PAGAMENTO PELO VALOR CONTRATADO. ESTIPULAÇÃO DE CLÁUSULA VINCULATIVA DA INDENIZAÇÃO AO VALOR DE MERCADO REFERENCIADO. ABUSIVIDADE. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, DE IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA, DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR, DE ILEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, DE CARÊNCIA DE AÇÃO E DE JULGAMENTO EXTRA PETITA.

I - Encontrando-se a pretensão postulada pelo Ministério Público Federal, nestes autos, tutelada por nosso ordenamento jurídico, dispondo, inclusive, de disciplina própria, em legislação específica, no caso, o Código de Defesa do Consumidor, podendo a defesa dos direitos individuais homogênios, nela inseridos, ser instrumentalizada, individual ou coletivamente (Lei nº 8.078⁄90, art. 81, caput, e respectivo parágrafo único, inciso III), afiguram-se improcedentes as preliminares de impossibilidade jurídica do pedido e de impropriedade da ação civil pública. Preliminares rejeitadas.

II - O Ministério Público Federal tem legitimidade ativa para propor ação civil pública para defesa de interesses individuais homogêneos do consumidor, de relevante interesse público social, a teor do disposto no art. 6º, inciso VII, "b", da Lei n° 8.078⁄90 (Código de Defesa do Consumidor), a viabilizar a sua defesa em sede de ação coletiva, como na hipótese dos autos, em que se discutem regras de seguro de automóveis.

III - A inclusão, na petição inicial, de pedido expresso, no sentido de que seja declarada a nulidade das cláusulas permissivas de celebração de contrato de seguro, sob a modalidade de pagamento indenizatório pelo valor de mercado referenciado do bem segurado, abrange, além das cláusulas contratuais respectivas, os atos normativos expedidos pelo órgão competente para a regulação do setor, no caso, a Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, com base nos quais são firmados os aludidos contratos, a descaracterizar, na espécie, a alegada carência de ação e de ausência de interesse de agir, sob esse fundamento. preliminar rejeitada.

IV - Encontra-se o decreto sentencial em sintonia com o pedido formulado na inicial, de não se desgarrando, para mais ou para menos, como na hipótese e, comento, não prospera a preliminar de nulidade da sentença, sob o fundamento de julgamento extra petita. Rejeitada a prelimnar em referência.

V - Em se tratando de seguro de automóvel, como no caso, a superveniência de furto e⁄ou perda total do veículo, acarreta o pagamento de indenização, pela seguradora, tomando-se por referência a quantia pactuada na apólice, em relação à qual é qie o "valor do prêmio, nos termos do art. 781 do Código Civil em vigor, posto que o 'valor do interesse segurado", no caso, deverá corresponder à contraprestação do valor considerado, para fins de apuração do prêmio pago.

VI - Nos termos do art. 20, § 4°, do CPC, com observância dos parâmetros fixados nas alíneas a, b e c do § 3° do referido dispositivo legal, reduz-se a verba honorária, fixada em desfavor da Superintendência de Seguros Privados - SUSEP, para o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

VII - Apelação da SUSEP e remessa oficial parcialmente providas. Demais recursos desprovidos. Sentença reformada, em parte. (fls. 2.79⁄2.080)

Opostos embargos de declaração (fls. 2.085⁄2.098 e 2.099⁄2.107), foram rejeitados.

Inconformadas, as rés interpuseram recurso especial (fls. 2.136⁄2.161 e 2.197⁄2.257), alegando, em síntese:

I) Mafre Vera Cruz Seguradora S⁄A

  1. violação aos arts. 127 e 129 do CF; e 21 da lei 7.347⁄85 e 1º do CDC e da LC n. 75⁄93, tendo em vista a ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal;

  2. violação aos arts. 128 e 460 do CPC, havendo carência da ação, tendo em vista tratar-se a portaria da SUSEP de ato normativo válido e eficaz, que não foi objeto de pedido de anulação;

  3. violação ao art. 781 do CC, tendo em vista a legalidade da cláusula de pagamento da indenização, nos casos de perda total e furto do veículo segurado, pelo valor de mercado referenciado.

    II) Bradesco Seguros e outros

  4. violação ao art. 535, I e II do CPC, pois o Tribunal a quo deixou de se...

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