Decisão Monocrática nº 2008/0254654-4 de CE - CORTE ESPECIAL

Data09 Junho 2011
Número do processo2008/0254654-4
ÓrgãoCorte Especial (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.110.811 - RS (2008/0254654-4) (f) RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL RECORRIDO : J C S

ADVOGADO : CARLOS FREDERICO BARCELLOS GUAZZELLI - DEFENSOR PÚBLICO E OUTRO DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público, com fulcro no art. 105, III, "a", da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Consta dos autos que o Recorrido foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 157, § 2º, I e II, do Código Penal, nos seguintes termos:

"No dia 27 de setembro de 2005, por [...], o denunciado J, em concurso com mais um elemento não identificado, subtraiu, para si, mediante grave ameaça, com emprego de arma de fogo, contra D M, um automóvel marca Mercedes Benz, modelo A-160, contendo em seu

interior a bolsa da vítima com carteira de identidade, carteira de habilitação, carteira de radialista, cartão da UNIMED, cartão Itaú/Credicard, Cartão de crédito do Banco Citibank, cartão da conta corrente do Banco Citibank ag. Carlos Gomes, cartão e um talão de cheques da Caixa Econômica Federal, ag. Shopping Center iguatemi, cartão da loja C&A, crachá da empresa da Rede Pampa, agenda

eletrônica, duas agendas profissionais. No interior do veículo também encontravam-se o licenciamento CLV 2005, um aparelho celular marca Motorola, preto, [...] e um celular marca Samsung, [...].

Na ocasião, o denunciado e seu comparsa, estando um deles munido de um revólver, começaram a bater no vidro do carro da vítima, que assustada, abriu a porta e os mesmos entraram. A vítima ainda tentou esconder a bolsa, mas diante da exigência deles entregou. Saíram em fuga com o veículo e a bolsa da vítima. A vítima comunicou a polícia do ocorrido, e registrou o fato na 8ª DP. O cartão de crédito da vítima foi indevidamente usado após o roubo.

A vítima, olhando o álbum de fotos da Delegacia, reconheceu Jonatas, como sendo um dos autores que cometeu o delito em tela.

O veículo, localizado no dia seguinte, foi devidamente restituído à vítima." (fls. 2/3)

A denúncia foi recebida em 24/10/2005 (fl. 2). Após regular

instrução criminal, foi o acusado condenado nos exatos termos da exordial acusatória à pena de 5 (cinco) anos e 4 (quatro) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, mais multa. A sentença foi publicada no dia 9/4/2007 (fls. 91v).

Contra tal decisão, a defesa interpôs recurso de apelação, tendo a Corte local dado parcial provimento à irresignação para afastar a majorante do emprego de arma de fogo, mantendo, contudo, a

reprimenda fixada no édito condenatório, em acórdão que restou assim ementado:

"ROUBO MAJORADO. 1. TESE DEFENSIVA. OMISSÃO NA SENTENÇA.

INOCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. 2. MÉRITO. 2.1. PROVA. PALAVRA DA VÍTIMA. RECONHECIMENTO. APOIO NAS DEMAIS PROVAS. SUFICIÊNCIA.

2.1. CONCURSO DE AGENTES. OCORRÊNCIA. 2.2. EMPREGO DE ARMA.

APREENSÃO E PERÍCIA. NECESSIDADE. 2.3. APENAMENTO ADEQUADO. MÍNIMO LEGAL. 2.4. EXCLUSÃO DA PENA DE MULTA. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA INDERROGABILIDADE DA PENA.

PRELIMINAR REJEITADA.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO." (fl. 122)

Irresignado, o Parquet interpõe o presente recurso especial ao fundamento de que o aresto objurgado teria negado vigência ao art.

157, § 2º, I, do Estatuto Repressor.

Alega que é desnecessária a apreensão e perícia do artefato lesivo para a configuração da supramencionada majorante, estando sua incidência comprovada, na espécie, pelas demais provas produzidas nos autos.

Contrarrazões apresentadas (fls. 164/170), foi o recurso ministerial admitido na origem. A defesa, por sua vez, também interpôs recurso especial, que não foi admitido pelo Tribunal a quo.

A Douta Subprocuradoria Geral da República manifestou-se pelo provimento do presente apelo nobre.

Decido.

Inicialmente, rechaça-se a preliminar arguida nas contrarrazões ao recurso especial, relativa à falta de prequestionamento, já que se constata da leitura da ementa acima transcrita que a matéria objeto do presente apelo nobre foi devidamente enfrentada pelo Tribunal a quo, tanto que redundou no afastamento da majorante do emprego de arma de fogo.

Estando preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, passo à análise da tese ministerial.

Quanto à majorante do emprego de arma de fogo, assim se manifestou o Juízo de primeiro grau:

"Cuida-se de crime de roubo majorado pelo emprego de arma de fogo e concurso de agentes, imputando ao denunciado J C S, tendo como vítima D M.

A existência do fato delituoso - materializada pelas ocorrências de recuperação e de devolução de veículo, autorização para devolução e avaliação indireta -, inclusive no tocante às majorantes do emprego de arma - cujo reconhecimento, segundo a orientação majoritária da jurisprudência pátria, dispensa a apreensão da arma e sua submissão a exame pericial - e concurso de agentes, bem como a autoria

imputada ao réu, estão suficientemente comprovadas pela voz da ofendida D M, de valor privilegiado em delito desta natureza, garantindo que foi atacada por dois elementos - "... Quando eu imbiquei o carro para entrar na garagem (...) olhei no vidro do lado, quase esquina com a regente e vi aqueles dois: um de touquinha e o outro mais parrudinho, qu eu reconheci na 8ª Delegacia, vinham descendo e botaram a arma no vidro que tem película - mas será que ele tá me exergando toda? Ele vinha para frente e botava "sai daí, sai daí", eu fiquei ... (...) Me deu uma coisa. O que vou fazer. E com medo que eles vissem o meu filho que estava ali na grade e atirassem nele (...) Juntei tudo aquilo e onde vou botar os

telefones. Saí porque ele batia com a arma na frente do vidro. Saí e veio esse maior, sai, sai, sai. Saí deixei o carro ligado e eles gritavam para mim "não me olha, não me olha ..." - reconhecendo o réu como sendo aquele que lhe retirou a bolsa e o outro, não

identificado, o elemento que a ameaçou com o revólver e, depois, saiu dirigindo o veículo [...].

Desta forma, induvidosa a ocorrência do roubo qualificado pelo uso da arma - "... a arma era preta, bem pretinha..." -, como garantiu a vítima, e concurso de agentes, na forma consumada, pois que parte da res furtiva não foi restituída à vítima, sendo impossível a

desclassificação pleiteada pela defesa, seja para o crime do art.

157, caput, com a exclusão das qualificadoras, ou para aquele do art. 155 ambos do Código Penal." (fls. 86/91)

O Tribunal de Justiça, por sua vez, assim se pronunciou:

"Quanto ao concurso de agentes, tenho que os elementos de prova não deixam qualquer dúvida acerca da sua incidência. A vítima relata pormenorizadamente a ação conjunta de dois agentes, oferecendo informações seguras quanto às características de ambos.

Entretanto, a mesma sorte não se aplica à segunda circunstância exasperadora. É que esta Câmara Criminal firmou posição no sentido de que, a não apreensão da arma empregada na empreitada delitiva inviabiliza o conhecimento quanto à potencialidade lesiva, o que acaba por desfigurar a majorante em espécie.

No particular, não houve apreensão da arma referida pela vítima.

Logo, a simples referência do emprego de arma não elide a

necessidade de comprovação da sua capacidade lesiva.

A majorante pelo emprego de arma de fogo somente deve ser aplicada quando a arma tiver real potencial ofensivo, o que é apurável, tão somente, por perícia técnica, idônea e válida, desqualificando, assim, a simples palavra da vítima.

Agora, deve ser considerada a decisão proferida pela Corte Superior, nos autos do RHC 81057/SP, julgado em 25.5.2004, quando decidiu, por atipicidade da conduta do delito de porte de arma (art. 10, Lei 9.437/97), trancar a ação penal, uma vez que não realizado o tipo penal à vista dos princípios da disponibilidade e da ofensividade, já que a arma de fogo seria inidônea para a produção de disparo.

Ora, sem apreensão e perícia na arma, impossível afirmar, com segurança, se a arma era potencialmente ofensiva, pois, em tese, poderia ser de brinquedo, desmuniciada ou ineficaz. A

funcionabilidade da arma não pode ser presumida.

Sendo incapaz de lesionar, não pode o acusado receber a mesma sanção penal daquele que pratica o delito com instrumento letal.

Importante ressaltar que o fato de não ter sido periciada a arma empregada no roubo - sequer...

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