Acórdão nº 2007.34.00.029548-9 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, 2ª Turma, 8 de Junio de 2011

Número do processo2007.34.00.029548-9
Data08 Junho 2011
ÓrgãoSegunda turma

Assunto: Revisão Geral Anual (mora do Executivo - Inciso X, Art. 37, Cf 1988) - Sistema Remuneratório - Servidorpúblico Civil - Administrativo

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.34.00.029548-9/DF

RELATORA: EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA ALVES DA SILVA

APELANTE: SINDICATO DOS POLICIAIS RODOVIÁRIOS FEDERAIS NO ESTADO DE

TOCANTINS

ADVOGADO: RAFAELLE DE SOUSA SILVA LEITE

APELADO: UNIÃO FEDERAL

PROCURADORA: ANA LUISA FIGUEIREDO DE CARVALHO

ACÓRDÃO

Decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do voto da Relatora.

Brasília-DF, 8 de junho de 2011.

Desª Federal NEUZA ALVES Relatora

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.34.00.029548-9/DF

RELATÓRIO

A EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA ALVES (RELATORA):

O MM Juízo Federal da 15ª Vara da Seção Judiciária da Bahia julgou improcedente o pedido formulado pelo SINDICATO DOS POLICIAIS RODOVIÁRIOS FEDERAIS NO ESTADO DE TOCANTINS, com vista à concessão do reajuste de 13,23% sobre a remuneração de seus associados, em razão da aplicação conjunta das Leis nº 10.697 e 10.698/2003, esta última que deferiu a chamada Vantagem Pecuniária Individual no importe de R$59,87 (fls. 163/166) Custas e honorários advocatícios arbitrados em R$2.000,00, a cargo do autor.

Em seu recurso de fls. 169/180 o requerente postula a reforma da sentença, aduzindo, em resumo, que a concessão da mencionada VPI correspondeu a um verdadeiro subterfúgio do Governo Federal visando aplicação de uma revisão geral de vencimentos com patamares diferenciados para os seus destinatários, conforme confessado pelo então Ministro do Planejamento.

Aduz que a iniciativa legislativa exercida pelo Presidente da República para a concessão da VPI se amolda à exigência constitucional referente à revisão geral dos servidores públicos dos três Poderes da União.

Segue dizendo que não se há de falar, na espécie, em lei específica para o deferimento judicial da revisão, visto que tal exigência é dirigida apenas à própria Administração.

Da mesma forma, sustenta que a adoção do procedimento vergastado vulnera o art. 37, X, da CF/88, razão pela qual seus associados fazem jus ao reajuste de 13,23% deferido aos servidores do Poder Executivo que obtiveram esse patamar de aumento remuneratório com o deferimento da sobredita VPI.

Transcreve doutrina que considera abonadora de sua pretensão recursal.

Contrarrazões a fls. 186/188.

É o relatório.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2007.34.00.029548-9/DF

VOTO

A EXMª SRª DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA ALVES (RELATORA):

Com parcial razão o sindicato apelante.

Consigno, de pronto, não ter a menor dúvida de que o Poder Executivo objetivou conceder, mediante o expediente de dar início à deflagração dos dois processos legislativos simultâneos, que resultaram na edição das Leis nº 10.697 e 10.698, ambas de 03.07.2003, uma revisão ampla e geral sobre a remuneração de todos os servidores públicos federais civis, e que assim o fez em razão de seu inconformismo com o fato de que a dotação orçamentária que havia sido prevista para esse reajuste (amplo e geral) permitia a sua concessão linear e igualitária em percentual por ele considerado como insignificante para uma parte considerável dos servidores do próprio Poder Executivo.

Assim, veio o referido Poder a optar pela dicotomização da forma de concessão dessa revisão geral, concedendo-a, de um lado, em percentual idêntico (1%) para todos os destinatários, com a utilização de uma parte do numerário incluído no orçamento para essa finalidade e, de outro, com o uso do restante da dotação orçamentária inicialmente prevista para a concessão dessa mesma revisão, agora não mais com igual percentual para todos os contemplados, mas sim com a estratégia de seu deferimento em valores absolutos idênticos (R$59,87), o que veio a propiciar a incidência da revisão com os mais variados percentuais para os servidores, de acordo com o seu cargo, classe e função, concedendo-se, assim, um reajuste com índice maior para aqueles servidores que ganhavam menos.

Pois bem, o art. 37, X, da Constituição Federal assegura aos servidores públicos o direito à revisão anual de remuneração, sempre na mesma data e sem distinção de índices.

A referida revisão anual, é importante que se fixe esse conceito, corresponde a uma recomposição vencimental voltada à preservação do equilíbrio financeiro dos servidores, impedindo assim que ocorra uma redução real - e não apenas nominal - em suas remunerações.

Não por outra razão o saudoso e brilhante Mestre Hely Lopes Meirelles[1] denominou essa revisão geral como sendo um "aumento impróprio", já que destinado não a proporcionar um incremento nos ganhos dos servidores, mas sim a preservar o poder de compra de suas remunerações, consagrando-se assim o princípio da irredutibilidade real destas.

A revisão ou reajuste geral de vencimentos, portanto, se traduz em uma garantia constitucional que tem por escopo a preservação do poder de compra da remuneração dos servidores públicos, e sempre será feita na mesma data, ou seja, em momento idêntico para todos os servidores, e com os mesmos índices também para todo o rol de destinatários.

A conclusão a que se chega, portanto, é a de que a Constituição Federal veda a concessão de revisão geral de remuneração de forma seccionada, seja temporalmente, para se privilegiar, primeiro, um grupo de servidores, e somente em momento posterior os demais, seja quanto à sua magnitude, com a concessão de índices distintos de reajuste para os servidores.

Outra característica importantíssima da revisão geral de remuneração, mormente para o contexto ora analisado, diz respeito à expressa ressalva constante no texto constitucional em comento (art. 37, X), atinente à necessidade de observância da iniciativa privativa, em cada caso, para a deflagração dos correlatos processos legislativos.

Assim, o reajuste ou revisão geral de remuneração dos servidores federais somente pode ser efetuado mediante projeto de lei iniciado pelo Presidente da República, tendo em vista o quanto disposto no art. 61, § 1º, II, a, da CF/88, que assim estabelece:

Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

(...)

II - disponham sobre:

  1. criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remuneração;

Como visto, somente o Presidente da República dispõe da competência para iniciar o processo voltado à concessão da revisão geral remuneratória, o que não ocorre quando se tratar de revisões ou aumentos específicos dos servidores, concedidos em razão da carreira a que pertencem.

Nesse último caso, a competência para o início dos respectivos processos legislativos é privativa dos Chefes dos Poderes a que estão vinculados os servidores. Portanto, quando se tratar de aumento propriamente dito, a lei será de iniciativa do Poder Executivo para os servidores desse Poder, conforme previsto no art. 61, § 1º, II, a, do Livro Regra; do Poder Legislativo, para os aumentos a serem concedidos aos seus servidores (arts. 51, IV e 52, XIII, da CF/88); e do Poder Judiciário, para os seus próprios servidores, na forma do art. 96, II, b, do Diploma Político.

Em abono a essa linha interpretativa, confira-se o pertinente ensinamento de José dos Santos de Carvalho Filho[2]:

"A distinção entre revisão geral e revisão específica tem relevância também no que diz respeito à iniciativa da lei que tiver tais objetivos. Tratando-se de revisão geral, a iniciativa da lei compete ao Presidente da República e aos demais Chefes do Executivo, conforme estabelecem os arts.

37, X e 61, § 1º, II, "a", da CF. As revisões específicas, porém, dependem de lei cuja iniciativa compete à autoridade dirigente em cada Poder, dispondo em tal sentido o mesmo art. 37, X, da CF. Nessa hipótese, por conseguinte, não se aplica o citado art. 61, § 1º, que trata da iniciativa privativa do Presidente da República."

Tal o contexto, é forçosa a conclusão de que a única forma que o Presidente da República, como Chefe do Poder Executivo Federal, dispõe para conceder revisão salarial aos servidores dos Três Poderes da União, é mediante a deflagração de um processo legislativo voltado à concretização da garantia prevista no art. 37, X, da CF, ou seja, direcionado à revisão anual da remuneração dos servidores públicos em geral, porque os aumentos específicos de cada categoria somente podem ser concedidos por lei iniciada no âmbito dos próprios Poderes a que se vinculam os servidores a serem contemplados.

Por essa razão, o Presidente da República não possui competência legiferante para propor ao Congresso Nacional a concessão de uma simples "vantagem pecuniária" destinada a todos os servidores públicos federais, independentemente do Poder a que eles se vinculam. A sua competência, com todo esse alcance, repita-se, é restrita à revisão anual de remuneração, e foi com esse intuito, mesmo que obliquamente, que se procedeu para dar início ao projeto de lei que culminou com a edição da Lei nº 10.698/2003, concessiva do que se veio a chamar de "Vantagem Pecuniária Individual".

Um questionamento que eventualmente pode ser feito para ilidir a conclusão de que a mencionada VPI não correspondeu a outra coisa que não uma revisão geral de remuneração, sobre a qual se vestiu uma camuflagem destinada a propiciar a (constitucionalmente vedada) distinção de índices em sua aplicação, é o de que, em verdade, o Presidente da República teria apenas extrapolado da sua excepcional competência legislativa, e que por essa razão a correção de rumo a ser empreendida não poderia ser feita mediante o reconhecimento da VPI como um aumento geral disfarçado,...

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