Decisão Monocrática nº 2010/0095166-3 de T1 - PRIMEIRA TURMA
Número do processo | 2010/0095166-3 |
Data | 26 Abril 2011 |
Órgão | Primeira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil) |
RECURSO ESPECIAL Nº 1.195.960 - BA (2010/0095166-3)
RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO
RECORRENTE : ESTADO DA BAHIA
PROCURADORES : BRUNO ESPINEIRA LEMOS E OUTRO(S)
PAULO EMILIO NADIER LISBÔA E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA
DECISÃO
Recurso especial interposto pelo Estado da Bahia, com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão do Conselho da Magistratura do Estado da Bahia, assim ementado:
"AÇÃO CIVIL PÚBLICA - APELAÇÃO VOLUNTÁRIA DO RÉU NÃO CONHECIDA EM FACE DE SUA INTEMPESTIVIDADE - DECISÃO MONOCRÁTICA DO DES. RELATOR - APRECIAÇÃO DO FEITO EM SEDE DE REMESSA NECESSÁRIA - INSCRIÇÃO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES SOB GUARDA JUDICIAL NO PLANSERV COMO
DEPENDENTES DO SEGURADO GUARDIÃO - PRELIMINARES DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO A QUO, CARÊNCIA DE AÇÃO, ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM, NULIDADE DA CITAÇÃO E SUSPENSÃO DO PROCESSO REJEITADAS - COMPETÊNCIA QUANTO À MATÉRIA DO JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE - OBJETO DA DEMANDA ENVOLVENDO MATÉRIA DISTINTA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL E DOS FUNDOS DE NATUREZA INSTITUCIONAL, BEM COMO DO ARGUIDO CONTROLE CONCENTRADO DE INCONSTITUCIONALIDADE - ADMISSIBILIDADE DO MANEJO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA - INTERESSE COLETIVO STRICTO SENSU DEVIDAMENTE CARACTERIZADO - FUNÇÃO INSTITUCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROMOVER A REFERIDA DEMANDA - CONTESTAÇÃO APRESENTADA APRESENTADA
TEMPESTIVAMENTE PELO RÉU - NULIDADE DA CITAÇÃO NÃO EVIDENCIADA ANTE A AUSÊNCIA DE PREJUÍZO - A GUARDA CONFERE À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE A CONDIÇÃO DE DEPENDENTE NOS TERMOS DO ART. 33 §3º DO ECA -
INEXISTÊNCIA DE REVOGAÇÃO INTEGRAL DO ALUDIDO DISPOSITIVO LEGAL - LIMINAR EXTRA PETITA IMPLICITAMENTE CONFIRMADA NA SENTENÇA - REFORMA DO DECISUM PARA CASSAR A MEDIDA INITIO LITIS - INTEGRAÇÃO APENAS PARCIAL DA SENTENÇA.
I - A Justiça da Infância e da Juventude é competente para conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos, afetos à criança e ao adolescente (Art. 148, IV, do ECA).
Assim, envolvendo Ação Civil Pública onde se discute o direito de crianças e adolescentes sob guarda judicial se inscreverem no Plano de Saúde dos Servidores Públicos do Estado da Bahia, como
dependentes do segurado guardião, constata-se que o juízo a quo é o competente para apreciar e julgar o feito.
II - A Seguridade Social engloba um conceito amplo, abrangente, universal, destinado a todos que dela necessitam, desde que haja previsão na lei sobre determinada contingência a ser coberta. É, na verdade, o gênero do qual são espécies a Previdência Social, a Assistência Social e a Saúde (Sérgio Pinto Martins in Direito da Seguridade Social, 19ª Edição pág. 45). O PLANSERV, por sua vez, foi criado pela Lei 7249/88 que 'dispõe sobre o Sistema Social dos Servidores Públicos Estaduais', mas não integra a Previdência Social. Ele é apenas o Plano de Saúde dos Servidores Públicos Estaduais, onde estes têm toda a liberdade tanto de aderirem quanto de se desvincularem ora discutido a qualquer tempo, enquanto que o art. 201 da Carta Magna prevê que a 'Previdência Social será
organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e filiação obrigatória'. Ademais, o PRANSERV é custeado pelo FUNSERV - vinculada à Secretaria de Administração, ao passo que a Previdência estadual é custeada pelo FUNPREV - vinculada à Secretaria da
Fazenda. Assim, não se constata a presença da hipótese contida no art. 1º. § único, da Lei 7347/85, referente à vedação do manejo da via eleita para veicular pleito que trate de contribuições
previdenciárias.
III - Por outro lado, não se vislumbra a proibição contida no mesmo dispositivo de lei quanto ao ajuizamento de ação civil pública envolvendo fundos de 'natureza institucional', visto que, no caso dos autos, a matéria questionada refere-se às regras de admissão de menores no Plano de Saúde Propriamente dito. A querela debatida não envolve especificadamente o fundo que custeia o PLANSERV, não se podendo confundir questões administrativas intimamente ligadas ao objeto do plano com montante pecuniário que lhe dá sustentação financeira.
IV - Embora a procedência desta ação possa trazer reflexos de ordem econômica no Fundo respectivo, tais efeitos são indiretos, não se podendo olvidar que é princípio comezinho de hermenêutica que as normas que restringem direitos, como é a hipótese do dispositivo legal ressaltado pelo réu, devem ser interpretados restritivamente.
Do contrário, estariam excluídos da órbita da Ação Civil Pública, grande parte dos casos que envolvam o Poder Público como réu, pois as ações judiciais desta natureza em que o Estado participa cuidam com estrondosa frequência, pelo menos indiretamente, de 'tributo' ou 'fundos de natureza institucional', ambos excluídos pelo norma de referência, o que não se coaduna com o sentido da norma, tendo em vista que afetaria a própria razão de sua existência.
V - A ofensa à Carta Magna arguida na exordial compõe apenas a fundamentação apresentada pelo autor. Eventual reconhecimento de inconstitucionalidade, nesta hipótese, é feita dentro do controle difuso, com eficácia limitada às partes e ao pedido formulado, o que é perfeitamente possível através da via eleita.
IV - É função institucional do parquet 'promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos' (art. 129, III, da Constituição Federal). Na hipótese analisada, ao contrário do que sustentou o réu, a pretensão do Ministério Público abordou evidente interesse coletivo, transindividual e indivisível, caracterizado, ainda, por serem indeterminados os titulares do direito, embora determináveis, mas referente a um grupo de pessoas ligadas, em tese com a parte contrária por uma relação jurídica base, qual seja, a apontada qualidade de beneficiários dos segurados do PLANSERV que detém a guarda judicial de criança e adolescentes.
VII - Nada obstante o mandado de citação ter sido dirigido ao PLANSERV e não ao representante legal da acionada, o estado da Bahia apresentou, tempestivamente, a contestação de fls. 329 a 355, não existindo qualquer prejuízo para a defesa capaz de acarretar a nulidade processual pretendida.
VIII - A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários (Art. 33, § 3º ECA). Em que pese o posicionamento defendido pelo Estado da Bahia de que a Lei Federal nº 8213/91, alterada pela Lei nº 9528/97, que 'dispõe sobre os Planos de
Benefícios da Previdência Social', teria revogado 'tacitamente o art. 33, § 3º do ECA, acima transcrito, ao não incluir os menores sob guarda entre os beneficiários da previdência social o que se verifica é que, sem adentrar na seara específica de revogação da norma ventilada, que envolveria, inclusive, discussão acerca da especificidade das normas ou mesmo a análise aprofundada se a enumeração contida na lei seria taxativa ou meramente
exemplificativa, o que se constata, na realidade, é que, se o apontado dispositivo legal estivesse revogado, tal fenômeno estaria limitado à parte final do dispositivo que trata da relação
previdenciária, estando em pleno vigor todo o conteúdo restante da norma.
IX - Como se depreende da exordial, não há qualquer fato, fundamento jurídico ou pedido que embasasse a concessão de liminar envolvendo direitos individuais. Ao contrário disso, inexplicavelmente, e sem qualquer provocação do autor, o juiz concedeu medida initio litis no sentido do réu proceder a 'inclusão de Camila Lopes Canária e N.R.V.N. como dependentes, respectivamente, deR.G.G. e C.R.V.'. Destarte, tendo a sentença confirmado, implicitamente, a medida initio litis, impõe-se a reforma do decisum nesta parte no sentido de cassar a liminar." (fls. 533/534).
Opostos embargos declaratórios, foram estes rejeitados com aplicação de multa de 1% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 538, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil (fl. 591).
Além da divergência jurisprudencial, a insurgência especial está fundada na violação dos artigos 6º, 128, 215, 460, 481, parágrafo único, 538, parágrafo único, e 535, inciso II, do Código de Processo Civil, 148, inciso IV, 208, inciso VII, e 209 do Estatuto da Criança e do Adolescente, 2º, parágrafos 1º e 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil, 28, parágrafo único, da Lei nº 9.869/99, e 1º da Lei nº 7.347/85.
Recurso tempestivo, respondido e admitido na origem.
Parecer do Ministério Público Federal pelo parcial provimento do apelo excepcional.
Tudo visto e examinado, decido.
In casu, o Ministério Público do Estado da Bahia ajuizou ação civil pública com pedido de liminar contra o Estado da Bahia, objetivando a inscrição de menores sob guarda judicial como dependentes do segurado inscrito no Plano de Saúde do Servidor Público - Planserv, além do restabelecimento das inscrições canceladas após a alteração da Lei nº 8.213/91 pela Medida Provisória nº 1.523/98 e da Lei Estadual nº 7.249/98.
Em suas razões, sustenta o recorrente, em resumo, que o acórdão que rejeitou os declaratórios violou os artigos 128, 460, 535, inciso II, e 538 do Código de Processo Civil, uma vez que deixou de
analisar expressamente "(...) a especificidade da norma estadual ao tratar do plano de saúde de seus servidores, do fato de reconhecendo a aplicabilidade do art. 33, § 3º, do ECA e de que a exclusão dos menores sob guarda importaria em ir de encontro ao art; 227, § 3º, VI, da CF/88, é declarar a inconstitucionalidade da norma estadual e, por conseguinte, a necessidade de que esta matéria seja submetida ao Plenário e não a uma câmara fracionária, sob pena de violação ao art. 481, § único, do CPC." (fl. 602).
E que a multa é indevida já que os embargos foram opostos com fins de prequestionamento.
Alega, ainda, que, ao afastarem "(...) a alegação de nulidade da citação sob fundamento de que o Estado tendo apresentado defesa teria suprido a pretensa nulidade (...)" (fl....
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