Decisão Monocrática nº 2009/0030743-0 de S1 - PRIMEIRA SEÇÃO

Número do processo2009/0030743-0
Data29 Abril 2011
ÓrgãoPrimeira Seção (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 25.454 - AC (2009/0030743-0) (f)

RELATOR : MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) RECORRENTE : AURICÉLIA FREITAS DE ASSIS

RECORRENTE : MARIA DA LIBERDADE MARQUES DE ANDRADE

RECORRENTE : M.R.D.N.

ADVOGADO : VALDO LOPES DE MELO

RECORRIDO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO

DECISÃO

Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus interposto por Auricélia Freitas de Assis, Maria da Liberdade Marques de Andrade e M.R. doN., contra acórdão proferido pelo

Tribunal Regional Federal da Primeira Região (Habeas Corpus nº 2008.01.00.055696-4).

Narra a impetração que as recorrentes foram denunciadas pela suposta prática das condutas descritas no art. 168-A do Código Penal, porque, na qualidade de administradoras da empresa Rio Branco Ltda., teriam deixado de repassar à Previdência Social, no prazo legal, as contribuições descontadas de seus empregados entre dezembro de 2000 e março de 2004, na quantia de R$ 92.431,30 (noventa e dois mil, quatrocentos e trinta e um reais e trinta centavos), objeto do Procedimento Fiscal nº 09161577.

Contra a decisão que recebeu a denúncia impetrou-se habeas corpus no Tribunal Regional Federal da Primeira Região. A Terceira Turma Criminal denegou a ordem, e o acórdão recebeu esta ementa:

HABEAS CORPUS. ART. 168-A C/C 29 E 71, TODOS DO CP E LEI 8.212/91 (APROPRIAÇÃO INDÉBITA PREVIDENCIÁRIA). INÉPCIA DA DENÚNCIA.

TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. OFENSA À COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA.

CAUSA DE EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. ATIPICIDADE DA CONDUTA.

NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CONFIGURADO.

  1. No crime societário, a jurisprudência tem admitido que a denúncia narre de forma mais ou menos genérica a conduta dos denunciados, não a tendo por inepta por não descrever pormenorizadamente a

    participação de cada investigado desde que possibilite o exercício da ampla defesa. Precedentes.

  2. Ofensa à coisa julgada pressupõe a repetição de demandas

    idênticas o que não ocorreu na hipótese.

  3. O habeas corpus não é idôneo para analisar a existência de causa excludente de culpabilidade, que deve ser aferida na instrução processual. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

  4. A atipicidade da conduta só poderá ser verificada em habeas corpus nos casos em que se apresentar de forma inequívoca e sem necessidade de exame aprofundado de provas, o que não ocorre na hipótese.

  5. A ausência de justa causa somente se caracteriza quando ficar evidente a atipicidade da conduta ou inexistência de indícios de autoria e materialidade do crime, independente de dilação

    probatória. Precedentes.

  6. Havendo indícios de autoria e de materialidade, não há de se falar em trancamento da ação penal, nem constrangimento ilegal. Os fatos descritos na denúncia revelam a necessidade de apuração do suposto crime previsto no art. 168-A do CP, c/c 29 e 71.

  7. Ordem que se denega.

    No Superior Tribunal de Justiça, sustentam as recorrentes que a denúncia contra elas oferecida nos autos da Ação Penal nº

    2008.30.00.003291-0 teria originado-se de sentença absolutória prolatada nos autos da Ação Penal nº 2006.30.00.001603-0 e violaria a coisa julgada penal. Argumentam, ainda, que no período narrado na peça acusatória a empresa era administrada apenas pela recorrente Maria da Liberdade Marques de Andrade, que passava por dificuldades financeiras e não possuía recursos para pagar a folha de empregados.

    Tal a situação, busca o reconhecimento da causa supralegal de excludente de culpabilidade. Por fim, alegam violação ao princípio da ampla defesa, tendo em vista o não conhecimento do recurso administrativo. Requerem o provimento do recurso a fim de extinguir a Ação Penal nº 2008.30.00.003291-0.

    Ouvido, opinou o Ministério Público Federal pelo não provimento do recurso. O parecer portou esta ementa:

    Recurso ordinário em habeas corpus. Crime de apropriação indébita previdenciária (art. 168-A do Código Penal). Pretensão de

    trancamento da ação penal.

    O trancamento da ação penal pela via estreita do habeas corpus é medida de exceção, só admissível quando emerge dos autos, de forma inequívoca e sem a necessidade de valoração probatória, a

    inexistência de autoria por parte do indiciado ou a atipicidade da conduta.

    Parecer pelo não provimento do recurso.

    As últimas informações extraídas do endereço eletrônico do Tribunal Regional Federal da Primeira Região dão conta de que, em 11.02.2011, o Juiz da Segunda Vara Federal determinou a suspensão do trâmite processual e do curso do prazo prescricional, nos termos do art. 68 da Lei nº 11.941/09.

    É o relatório.

    Passo a decidir.

    Consta das informações prestadas pelo Juízo de origem, verbis: A ação constitucional impetrada em favor das pacientes diz respeito à Ação Penal nº 2008.30.00.003291-0, em trâmite nesta Vara, na qual o Ministério Público Federal denuncia o cometimento, em tese, o crime previsto no art. 168-A do Código Penal.

    Com a peça acusatória foram apresentados diversos documentos, entre eles cópia de outra ação penal, processo nº 2006.30.00.001603-0/2ª Vara, no qual as pacientes foram ouvidas na condição de testemunhas, sendo suas declarações um dos fundamentos do órgão acusador para imputar-lhes a autoria do delito.

    A denúncia foi recebida fundamentadamente, após juízo preliminar e perfunctório, determinando-se, na mesma ocasião, a citação das acusadas para a apresentação de resposta escrita à acusação.

    A sentença prolatada na Ação Penal nº 2006.30.00.001603-0 absolveu Narciso Mendes de Assis, Naildo Carlos de Assis e João de Castro Branco – sócios da empresa O.R.B.L. – da conduta descrita no art. 168-A do Código Penal. O Ministério Público Federal ofereceu nova denúncia em desfavor das ora recorrentes. Reparem que as duas ações penais apuraram condutas criminosas diversas, não sendo de falar em litispendência ou em coisa julgada. Muito embora a

    tipificação seja a mesma em ambos os feitos (art. 297 do Código Penal), eles referem-se a agentes diferentes.

    Em uma ação penal, os sócios da empresa O.R.B.L. foram absolvidos, tendo em vista a ausência de provas relativamente à prática de atos de gestão. Na segunda ação penal, a conduta descrita no art. 168-A do Código Penal é imputada as recorrentes em razão de serem procuradoras e responsáveis pela gerência da empresa O.R.B.L. Assim, a despeito de a capitulação do crime ser a mesma, os sujeitos dos crimes não se confundem, inexistindo

    constrangimento ilegal a ser reconhecido.

    Nesse sentido:

    HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. CONDENAÇÕES EM DUAS AÇÕES PENAIS. LITISPENDÊNCIA OU COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA.

    CONDUTAS DELITUOSAS DIVERSAS.ORDEM DENEGADA.

    1. Não há que falar em litispendência ou em coisa julgada se, embora a tipificação seja a mesma em duas ações penais (art. 297 do Código Penal), elas referem-se a condutas delituosas diferentes.

    2. Em uma ação penal, o paciente foi condenado por inserir sua foto em um documento de identidade verdadeiro de terceiro (adulterar documento verdadeiro). Na outra, foi condenado por comparecer ao Instituto de Identificação portando uma certidão de nascimento em nome de terceiro e preencher a ficha de identificação civil como se fosse ele, objetivando obter carteira de identidade falsa

      (falsificar documento público).

    3. Ordem denegada. (HC 96.974/SP, Ministra Maria Thereza, DJe de 22.03.2010.)

      HABEAS CORPUS . LITISPENDÊNCIA. PACIENTE PROCESSADO EM DOIS

      PROCESSOS PELO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. DELITO PERMANENTE.

      SENTENÇA PROFERIDA EM UM DOS FEITOS. COISA JULGADA. IDENTIDADE APENAS QUANTO AOS TIPOS PENAIS. FATOS TOTALMENTE DIVERSOS.

      FLAGRANTES DISTINTOS. AUSÊNCIA DE BIS IN IDEM. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL INVIÁVEL.

    4. O crime previsto no art. 33, caput, da Lei 11.343/2006, de natureza permanente, a despeito de envolver a prática reiterada de atos, caracterizando unidade jurídica e, por conseguinte, ação penal única, não descarta a possibilidade de instauração de feitos

      diversos se, após a prisão em flagrante e liberação do paciente, os atos potencialmente ofensivos continuaram ocorrendo, dando ensejo à outra lavratura de auto de flagrante delito.

    5. Inviável acolher-se o pleito de trancamento da ação penal pelo reconhecimento da ocorrência do instituto processual da coisa julgada e do vedado bis in idem se as denúncias insertas nos

      processos, apesar de capituladas parcialmente em delitos idênticos, narram fatos diferentes e descrevem crimes de narcotráfico

      decorrentes de prisões em flagrante distintas, e procedidas em contexto totalmente diversos.

    6. Ordem denegada. (HC 107.760/SP, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 15.06.2009.)

      CRIMINAL. RHC. ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. LITISPENDÊNCIA.

      NÃO-OCORRÊNCIA. FATOS DIVERSOS. RECURSO DESPROVIDO.

  8. Hipótese em que se alega litispendência em razão da existência de duas ações penais contra o paciente, nas quais lhe é imputada a prática de crimes de estelionato pela internet e formação de

    quadrilha.

  9. Na primeira denúncia, o paciente é acusado do pagamento de títulos de crédito, para terceiro; e na segunda, da prática de movimentações financeiras superiores a três mil reais, em seu nome, lesando correntistas do Banco do Brasil.

  10. Evidenciando-se que as exordiais acusatórias não cuidam dos mesmos fatos, tendo em comum apenas a forma fraudulenta de agir, por meio da rede mundial de computadores – Internet, sendo distintas as causas de pedir, não há que se falar em litispendência.

  11. Recurso desprovido. (RHC 19.165/PA, Relator Ministro Gilson Dipp, DJ de 29.05.2006.)

    O exame da alegação de que a recorrente M. daL.M. deA. estaria acobertada por causa supralegal excludente de culpabilidade – inexigibilidade de conduta diversa –, tendo em vista as dificuldades financeiras enfrentadas pela empresa, ensejaria análise aprofundada da matéria fático-probatória, o que é vedado na via estreita do habeas corpus. A propósito:

    PENAL. HABEAS CORPUS. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. ATIPICIDADE DA CONDUTA.

    REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. VIA ELEITA. IMPOSSIBILIDADE.

    ...

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