Decisão Monocrática nº 2007/0259327-5 de T3 - TERCEIRA TURMA

Data11 Novembro 2010
Número do processo2007/0259327-5
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.002.639 - RJ (2007/0259327-5)

RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RECORRIDO : P D B DA S (PRESO)

ADVOGADO : ISMAEL ABRAHAM ABUAWAD

PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AOS REVOGADOS ARTS.

214 C/C 224, "A", DO CP. TIPICIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA.

VEDAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA SEGUIMENTO.

DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO, com fundamento na alínea "a" do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, manejado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, ementado verbis:

"ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. VIOLÊNCIA PRESUMIDA (ART. 214, C/C ART.

224, 'a', CP). ATIPICIDADE ABSOLVIÇÃO. O tipo do atentado violento ao pudor pressupõe a realização de um significativo ato libidinoso, de modo a violentar a liberdade sexual, não bastando, para a

constituição do tipo, a ação disfarçada de passar a mão por cima ou por baixo da roupa, enquanto réu e ofendida estavam sentados no sofá, assistindo televisão, presentes irmãos e mão da ofendida, então com 11 anos. Além disso, o conceito de violência presumida objetiva proteger a ingenuidade sexual, a ignorância e o

desconhecimento da própria sexualidade. E a ofendida era quem dominava a situação, pois o réu só alisava o seu corpo nas partes por ela consentidas. Não comprovado o fato criminoso, impõe-se a absolvição. Recurso provido". (fl. 221).

Sustenta o recorrente, às fls. 225/233, ter havido violação aos revogados artigo 214 combinado com o artigo 224, alínea "a", ambos do Código Penal.

As contrarrazões, apesar de apresentadas pelo recorrido, foram desentranhadas dos autos, em virtude de serem intempestivas (fl.

44).

O Tribunal de origem admitiu o recurso às fls. 245/247.

O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 253/258, pelo conhecimento e provimento do recurso especial, verbis:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CRIME COMETIDO CONTRA CRIANÇA DE ONZE ANOS DE IDADE. TOQUES NAS NÁDEGAS E REGIÃO GENITAL DA VÍTIMA. PERFEITA CONFIGURAÇÃO. SUPOSTOS ATOS DE SEDUÇÃO PRATICADOS PELA VÍTIMA. CAUSA QUE, MESMO SE RECONHECIDA, NÃO

ISENTARIA DE PENA O RECORRIDO. IRRELEVÂNCIA DA VONTADE OU

CONSENTIMENTO DA OFENDIDA POR SE TRATAR DE PESSOA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. VÍTIMA MENOR DE QUATORZE ANOS. PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA.

PARECER PELO CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO ESPECIAL".

É o relatório.

A insurgência não merece prosperar. Com efeito, da leitura da pretensão recursal, observa-se que o recorrente pretende, em

verdade, rediscutir a tipicidade da conduta do recorrido, o que demandaria, necessariamente, o reexame dos fatos e das provas produzidas nos autos.

É assente que cabe ao aplicador da lei, em instância ordinária, fazer um cotejo fático probatório a fim de analisar a conduta descrita. Nesse contexto, verifica-se não possuir esta senda eleita espaço para a análise da matéria suscitada pelo recorrente, cuja missão pacificadora restara exaurida pela instância ordinária.

De fato, para se chegar a conclusão diversa da que chegou o Tribunal de origem, seria inevitável o revolvimento do arcabouço carreado aos autos, procedimento sabidamente inviável na instância especial. Não se mostra plausível nova análise do contexto probatório por parte desta Corte Superior, a qual não pode ser considerada uma terceira instância recursal.

No mais, referida vedação encontra respaldo no enunciado nº 7 da súmula desta Corte, verbis: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial". Confiram-se, nesse sentido, os

precedentes da Corte:

"PENAL. HOMICÍDIO CULPOSO. EXCLUSÃO. ELEMENTO SUBJETIVO DA CONDUTA.

INVIABILIDADE. 1. No âmbito do recurso especial, mostra-se descabida a análise da existência de culpa e do nexo de causalidade entre a conduta e o resultado típico, por força da Súmula 7 do STJ. 2.

Agravo interno improvido." (AgRg no Ag 873.337/PA, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), SEXTA TURMA, julgado em 07.02.2008, DJ 25.02.2008 p. 372).

"Recurso especial. Improcedência da alegação de ofensa aos arts.

381, III, e 619 do Cód. de Pr. Penal. Acórdão devidamente

fundamentado e não-omisso. Alegação de inocência. Reexame de fatos e provas (impossibilidade). Súmula 7. Agravo regimental improvido." (AgRg no Ag 613.894/SP, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 08.11.2005, DJ 20.02.2006 p. 378).

"AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSO PENAL. VIOLAÇÃO AO ART. 386, VI, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7 DO STJ. 1. A alegação de violação ao art. 386, VI do CPP, envolvendo a existência de provas suficientes para a condenação depara com o óbice da Súmula 7 do STJ. 2. Agravo regimental improvido." (AgRg no Ag 611539/SP, Rel. Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, SEXTA TURMA, DJ 16.05.2005).

"RECURSO ESPECIAL. PENAL. ESTELIONATO. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

SÚMULA N.º 07 DO STJ. 1. Tendo em vista que o réu foi condenado pelo Tribunal a quo com base em provas documentais e testemunhais, a pretensão recursal de reverter o julgado implicaria,

necessariamente, o reexame do conjunto fático-probatório, o que não se coaduna com a via eleita, consoante o enunciado da Súmula n.º 7 do STJ. 2. Recurso não conhecido." (REsp 604.980/SE, Rel. Min.

LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, DJ 02.08.2004).

"CRIMINAL. RESP. FUGA DE PESSOA PRESA OU SUBMETIDA A MEDIDA DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. SENTENÇA CONDENATÓRIA.

PENA CONCRETIZADA. ALEGAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA A CONDENAÇÃO. FALTA DE PARTICULARIZAÇÃO DO DISPOSITIVO LEGAL VIOLADO.

REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INVIABILIDADE. NÃO

CONHECIMENTO. RECURSO NÃO CONHECIDO. (...). III. Ademais, mostra-se inviável o conhecimento de argumento acerca da insuficiência de provas para a condenação do réu, ante o inevitável reexame do conjunto fático probatório dos autos, que se faria necessário.

Incidência da Súmula n.º 07/STJ. IV. Recurso não conhecido." (REsp 489.181/RO, Rel. Min. GILSON DIPP, QUINTA TURMA, DJ 22.09.2003).

Por fim, no que concerne à violência presumida, importante destacar que, conforme já externei no julgamento do recurso especial nº 430.615/MG, o tema, por certo, é de grande valor, como cediço, porque envolve a liberdade sexual de pessoas cuja capacidade a lei considera incompleta. Aliás, abordar os transtornos da violência sexual já traz em si a reflexão de princípios básicos das sociedades humanas, imagine-se quando um dos entes envolvidos é menor de 14 anos.

Conquanto todas as preocupações encaminhem o magistrado a buscar a proteção do ente mais desfavorecido, não se pode, por outro lado, cerrar os olhos para situações especiais da vida humana que, de certo modo, dificultam o enquadramento típico no caso concreto. Não me parece juridicamente defensável continuar preconizando a ideia da presunção absoluta em fatos como os tais se a própria natureza das coisas afasta o injusto da conduta do acusado.

Vale ressaltar, neste ponto, que em recente decisão a Sexta Turma defendeu a quebra de mais esse paradigma penal, em julgamento do HC 88.664/GO, de que relator o eminente Desembargador Celso Limongi.

Na oportunidade, lembrou o Ilustre magistrado, que as sociedades mudam e os conceitos e preconceitos de igual modo. A propósito, cabe destacar do seu belo voto:

"Adianto que vou aceitar os fatos exatamente como o fizeram o nobre Juiz de primeiro grau e o E. Tribunal goiano: o paciente, homem de mais de trinta anos de idade e casado, manteve relações sexuais com uma adolescente de menos de 14 anos de idade. Não discuto se tais relações sexuais ocorreram em 23 de novembro ou 23 de dezembro. Se elas ocorreram em 23 de dezembro, a adolescente contaria já com 14 anos de idade e o fato não seria típico. Mas, seja: consideramos que o contato sexual ocorreu em 23 de novembro e a menor contava 13 anos e onze meses de idade. Não discuto, igualmente, se era virgem ou se já haveria mantido relações sexuais com seu primeiro namorado, negado, obviamente, por este. Nem igualmente está em discussão se a menor procurou beneficiar o namorado, trazendo falsos dados para arredar a tipicidade da conduta do paciente. O que me parece

importante é que o paciente, mesmo casado, insistiu em entreter namoro com a menor, a ponto de pedir ao pai desta autorização para namorá-la. E, negada a autorização, não resistiu em levá-la a um motel, onde o casal se entregou às práticas sexuais. A conduta do paciente se subsumiu ao tipo descrito no artigo 213, combinado com o artigo 224, alínea "a", ambos do Código Penal? Por esse fato, merece o paciente a pena que lhe foi imposta, 6 anos e 9 meses de reclusão, em regime inicial fechado? É essa pena objetivamente justa? O comportamento do paciente merece, sem dúvida, críticas. Com 32 anos de idade e chefe de família, não deveria assediar a menor. Há referências a ter sido preso anteriormente e não dedicar-se ao trabalho. São apenas referências. De qualquer modo, não estamos nem podemos examinar sua conduta do...

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