Acórdão nº REsp 1159379 / DF de S1 - PRIMEIRA SEÇÃO

Número do processoREsp 1159379 / DF
Data08 Junho 2011
ÓrgãoPrimeira Seção (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.379 - DF (2009⁄0194481-9)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
RECORRENTE : D.N.D.A.
ADVOGADO : ARTHUR OCTÁVIO BELLENS PORTO MARCIAL E OUTRO(S)
RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

EMENTA

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. RENDIMENTOS RECEBIDOS POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO PNUD. ISENÇÃO. MULTA. SÚMULA 98⁄STJ.

  1. O Acordo Básico de Assistência Técnica firmado entre o Brasil, a ONU e algumas de suas Agências, aprovado pelo Decreto Legislativo 11⁄66 e promulgado pelo Decreto 59.308⁄66, assumiu, no direito interno, a natureza e a hierarquia de lei ordinária de caráter especial, aplicável às situações nele definidas. Tal Acordo atribuiu, não só aos funcionários da ONU em sentido estrito, mas também aos que a ela prestam serviços na condição de "peritos de assistência técnica", no que se refere a essas atividades específicas, os benefícios fiscais decorrentes da Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, promulgada pelo Decreto 27.784⁄50.

  2. O autor prestou serviços de assistência técnica especializada, na condição de Técnico Especialista, ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, de quem recebia a correspondente contraprestação. Assim, os valores recebidos nessa condição estão abrangidos pela cláusula isentiva de que trata o inciso II do art. 23, do RIR⁄94, reproduzida no art. 22, II, do RIR⁄99.

  3. Nos termos da Súmula 98⁄STJ, embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório.

  4. Recurso especial provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia PRIMEIRA SEÇÃO do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencidos em parte os Srs. Ministros Humberto Martins, Mauro Campbell Marques e Cesar Asfor Rocha, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima, Herman Benjamin e Benedito Gonçalves votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Castro Meira.

    Brasília, 08 de junho de 2011

    MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

    Relator

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.379 - DF (2009⁄0194481-9)

    RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
    RECORRENTE : D.N.D.A.
    ADVOGADO : ARTHUR OCTÁVIO BELLENS PORTO MARCIAL E OUTRO(S)
    RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
    PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI:

    Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido em demanda declaratória de isenção de imposto de renda sobre valores recebidos pela prestação de serviços técnicos ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD⁄ONU, com base no Decreto 59.308⁄66. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região decidiu que "há dúplex tratamento tributário àqueles que prestem serviços a organismo internacional ou em projeto de cooperação técnica, conforme sejam 'funcionários' (amplo sentido) ou, noutro caso, simples prestadores de serviço com contrato por tempo determinado (...), não sendo aos segundos (situação do autor) assegurada isenção" (fl. 308). O acórdão foi assim ementado:

    TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO ORDINÁRIA - PNUD⁄ONU - SERVIÇOS DE CONSULTORIA - IRPF - CARÁTER TRIBUTÁVEL.

  5. Embora haja Convenção Internacional da qual o Brasil é signatário, promulgada pelo Decreto 52.288⁄63, assegurando a isenção tributária aos "funcionários" de organismos internacionais em relação ao IRPF, tratando-se de matéria tributária, de interpretação restrita (art. 108, §§ 1º e 2º, do CTN), a expressão "funcionário" deve ser compreendida no seu sentido mais estreito: aquele que tem vinculação e subordinação hierárquica e por prazo indeterminado.

  6. O Decreto n. 59.308⁄66, artigo V, item 1, estende o tratamento dado aos funcionários dos organismos internacionais somente aos peritos de assistência técnica, atividade não demonstrada, no caso.

  7. A isenção⁄imunidade diplomática não alcança aqueles que, apenas episodicamente vinculados (prazo determinado), prestam serviços de consultoria por força de acordo de cooperação técnica entre a ONU⁄PNUD e o governo brasileiro, tanto menos que tal prerrogativa, se e quando existente, é integral, não apenas em relação ao IRPF.

  8. Apelação não provida.

  9. Peças liberadas pelo Relator em 09⁄12⁄2008 para publicação do acórdão (fl. 311).

    Opostos embargos de declaração (fls. 316⁄324), restaram rejeitados (fls. 334⁄337), com aplicação de multa, em função de seu caráter protelatório.

    Nas razões do recurso especial (fls. 341⁄354), o recorrente aponta ofensa aos seguintes dispositivos: (a) arts. IV, d, e V do Decreto 59.308⁄66 e 108 e 111 do CTN, sustentando que o Acordo Básico de Assistência Técnica com a Organização das Nações Unidas, "por ficção legal, estendeu ao pessoal contratado pelo PNUD o mesmo tratamento tributário conferido aos seus funcionários" (fl. 349); e (b) art. 538, parágrafo único, do CPC, porque inexistente o caráter protelatório dos embargos de declaração apresentados. Contra-razões a fls. 361⁄365.

    Em decisão de fls. 374⁄375, o recurso especial foi parcialmente provido, apenas para afastar a multa do art. 538 do CPC; o acórdão foi mantido no tocante à alegação de violação aos arts. IV, d, e V do Decreto 59.308⁄66, após ressalva de entendimento pessoal firmado no julgamento do REsp 1.031.259⁄DF, porque "As Turmas componentes da 1ª Seção consagraram o entendimento de que a isenção tributária prevista no Decreto 59.308⁄66 se aplica tão-somente à remuneração percebida pelos funcionários de organismos internacionais, não se estendendo, portanto, à renda auferida por prestadores de serviço sem vínculo efetivo. Nesse sentido: REsp 1.121.929⁄RS, 2ª T., Min. Eliana Calmon, DJe de 04⁄03⁄2010; REsp 1.031.259⁄DF, 1ª T. Min. Francisco Falcão, DJe de 03⁄06⁄2009" (fl. 374).

    Interposto agravo regimental, sustentou o recorrente que: (a) ainda não há orientação sedimentada sobre a matéria no STJ, pois as Turmas que compõem a 1ª Seção analisaram apenas quatro recursos especiais sobre o tema até o momento, sendo que o único destes que era patrocinado pelos mesmos subscritores do presente agravo regimental foi objeto de desistência antes do exame dos embargos declaratórios interpostos, com efeitos infringentes, a partir dos dois votos vencidos ali proferidos; (b) "o exame da questão requer interpretação integrada das normas legais - Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas e Acordo Básico de Assistência Técnica - que nem sempre se fez presente nos precedentes trazidos em respaldo à decisão agravada" (fl. 384); e (c) decisão monocrática proferida no REsp 1.165.029⁄DF, Min. Humberto Martins, foi alvo de reconsideração na 2ª Turma para inclusão em pauta, justamente porque "a matéria ainda não está pacificada nesse Tribunal Superior" (fl. 384).

    Em sessão de 28⁄09⁄2010, a 1ª Turma deu provimento ao agravo regimental para tornar sem efeito a decisão monocrática e submeter o julgamento do recurso especial à egrégia Primeira Seção.

    É o relatório.

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.379 - DF (2009⁄0194481-9)

    RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI
    RECORRENTE : D.N.D.A.
    ADVOGADO : ARTHUR OCTÁVIO BELLENS PORTO MARCIAL E OUTRO(S)
    RECORRIDO : FAZENDA NACIONAL
    PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL

    EMENTA

    TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. RENDIMENTOS RECEBIDOS POR PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS AO PNUD. ISENÇÃO. MULTA. SÚMULA 98⁄STJ.

  10. O Acordo Básico de Assistência Técnica firmado entre o Brasil, a ONU e algumas de suas Agências, aprovado pelo Decreto Legislativo 11⁄66 e promulgado pelo Decreto 59.308⁄66, assumiu, no direito interno, a natureza e a hierarquia de lei ordinária de caráter especial, aplicável às situações nele definidas. Tal Acordo atribuiu, não só aos funcionários da ONU em sentido estrito, mas também aos que a ela prestam serviços na condição de "peritos de assistência técnica", no que se refere a essas atividades específicas, os benefícios fiscais decorrentes da Convenção sobre Privilégios e Imunidades das Nações Unidas, promulgada pelo Decreto 27.784⁄50.

  11. O autor prestou serviços de assistência técnica especializada, na condição de Técnico Especialista, ao Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD, de quem recebia a correspondente contraprestação. Assim, os valores recebidos nessa condição estão abrangidos pela cláusula isentiva de que trata o inciso II do art. 23, do RIR⁄94, reproduzida no art. 22, II, do RIR⁄99.

  12. Nos termos da Súmula 98⁄STJ, embargos de declaração manifestados com notório propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório.

  13. Recurso especial provido.

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI (Relator):

  14. A questão, conforme referido no relatório, ainda não foi apreciada no âmbito desta Seção, embora as duas Turmas tenham manifestado posição majoritária em sentido contrário à pretensão recursal, aparentemente em decorrência de circunstâncias especiais dos casos julgados. Com essa ressalva, mas considerando que a 1ª Turma houve por bem submeter a matéria a julgamento pela Seção, cumpre examiná-la em todos os seus contornos.

  15. Para boa compreensão, eis a síntese da controvérsia e os respectivos textos normativos. Dispõe o regulamento do imposto de renda (Decreto 1.041⁄94 - RIR⁄94, vigente à época dos fatos), na Seção que trata dos "Servidores de Representações Estrangeiras e de Organismos Internacionais":

    Art. 23. Estão isentos do imposto os rendimentos do trabalho percebidos por (Leis n°s 4.506⁄64, art. 5°, e 7.713⁄88, art. 30):

    (...)

    II - servidores de organismos internacionais de que o Brasil faça parte e aos quais se tenha obrigado, por tratado ou convênio, a conceder isenção;

    Esse dispositivo está reproduzido pelo Decreto 3.000⁄99 - RIR⁄99, a saber:

    Art. 22. Estão isentos do imposto os rendimentos do trabalho percebidos por (Lei nº 4.506, de 1964, art. 5º, e Lei nº 7.713, de 1988, art. 30):

    (...)

    II - servidores de organismos internacionais de que o Brasil faça parte e aos quais se tenha obrigado, por tratado ou convênio, a...

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