Decisão Monocrática nº 2007/0280039-9 de CE - CORTE ESPECIAL

Número do processo2007/0280039-9
Data14 Outubro 2010
ÓrgãoCorte Especial (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.010.129 - SC (2007/0280039-9) RELATOR : MINISTRO LUIZ FUX

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RECORRIDO : O.Z.E.C.L.

ADVOGADO : OLAVO RIGON FILHO E OUTRO(S)

INTERES. : MUNICÍPIO DE JOAÇABA

ADVOGADO : ELEANDRO R BRUSTOLIN E OUTRO(S)

DECISÃO

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EDIFICAÇÃO DE PRÉDIO À MARGEM DE RIO. PEDIDO DE DEMOLIÇÃO.

CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. SÚMULA 07/STJ.

  1. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório encartado nos autos, em face do óbice erigido pelo teor da Súmula 07/STJ. REsp 776.802/PR, DJe 29/06/2009; REsp 1056605/RJ, DJe 25/03/2009; RESP 756437/AP, DJe de 19.09.2006; RESP 439506/RS, Dje de 01.06.2006 e RESP 278324/SC, Dje de 13.03.2006.

  2. In casu, a questão relativa à legalidade da edificação erigida às margens do Rio do Peixe, objeto da ação coletiva ab origine, foi analisada pelo Tribunal local à luz do contexto fático-probatório encartado nos autos, mormente as disposições constantes do Plano Diretor do Município de Joaçaba, consoante se conclui do excerto do voto-condutor do acórdão hostilizado:

    "...2. In casu, como fatos incontroversos extrai-se dos autos que: a) a apelada edificou o prédio com autorização do Município; b) parte do prédio está localizado em área de preservação permanente assim definida no Código Florestal (Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965, art. 2º, a, I); c) há dezenas ou centenas de outros prédios construídos às margens do Rio do Peixe sem a observância da

    distância de trinta metros das suas margens (o que é público e notório, e revelam as fotografias ¿ fls. 149/151); d) construiu a apelada em local em que já havia outro prédio; e) nenhuma árvore foi abatida.

    A demolição de parte do prédio causará à apelada prejuízo de elevada monta, sem nenhum benefício direto e/ou imediato ao meio ambiente. À vista das peculiaridades do caso, penso que a conversão da obrigação de demolir o prédio em indenização mais se harmoniza com os

    princípios de Justiça e com os objetivos finalísticos de toda a legislação relativa ao meio ambiente, solução sugerida pelo patrono da apelada nos memoriais apresentados e na tribuna, quando do julgamento do recurso.

    O quantum da indenização deverá corresponder ao valor do prejuízo que sofreria a apelada com a demolição de parte do prédio e deverá ser inteiramente aplicada na restauração parcial da mata ciliar às margens do Rio do Peixe.

  3. Recurso Especial a que se nega seguimento.

    Trata-se de Recurso Especial interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA (fls. 239/252), com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, em sede de Embargos Infringentes, assim ementado:

    "DIREITO AMBIENTAL – AÇÃO CIVIL PÚBLICA – EDIFICAÇÃO DE PRÉDIO À MARGEM DE RIO – DISTÂNCIA PREVISTA NO CÓDIGO FLORESTAL NÃO

    RESPEITADA – PEDIDO DE DEMOLIÇÃO – CONVERSÃO EM INDENIZAÇÃO – PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE – EMBARGOS INFRINGENTES PROVIDOS

    Não há razão de direito que justifique a demolição de prédio

    destinado à exploração de supermercado tão-somente por não ter sido respeitada a distância da margem de rio prevista no art. 2º do Código Florestal (Lei 4.771, de 1965), se: a) foi edificado com licença do município, observada a sua legislação, e em local onde já havia outra construção; b) do total da área tida como de preservação permanente (1.320 m²) apenas foram invadidos 44 m²; c) não havia mata ciliar a ser preservada.

    Se da demolição do prédio nenhum benefício resultar ao meio ambiente – e, por via de conseqüência, à sociedade –, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e também a teoria do fato consumado, positivada nos arts. 1.258 e 1.259 do C. Civil –,

    autorizam a conversão da obrigação de fazer (demolição) em obrigação de dar (indenização). O quantum do prejuízo que suportaria o dono do prédio com a sua demolição parcial deve ser transmudado em

    indenização a ser aplicada na recuperação da mata ciliar –

    destinatária da tutela judicial reclamada pelo autor na demanda aforada." (fl. 453)

    Versam os autos, originariamente, ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público de Santa Catarina em face do Município de

    Joaçaba, objetivando a condenação do demandado a abster-se da concessão de alvarás de licença, para a construção em áreas

    situadas às margens dos Rios Peixe, Tigre, Antinha; e Limeira, com base nas Leis Municipais nº 1.095/93 e 1.227/85, cujo pedido foi julgado improcedente pelo Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Joaçaba-SC, consoante se colhe da sentença exarada às fls. 218/230.

    Irresignada com o teor da sentença, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina interpôs recurso de apelação, perante o Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, o qual resultou provido (fls. 381/389), por maioria, por compreender nulo o alvará

    anteriormente concedido pelo Município, uma vez que a obra em questão está sendo realizada em área de preservação permanente, ordenando a recomposição e recuperação da área degradada, com a demolição da parte do imóvel incompatível como o Código Florestal, verbis:

    "A União fica adstrita à edição de normas gerais, embora nem sempre seja claro em que se distinguem as normas gerais das não gerais.

    Essa legislação da União não exclui o poder dos Estados e do

    Distrito Federal, suplementarmente, de disporem sobre a mesma matéria. Deve-se entender por suplementarmente o seguinte: na inexistência de lei federal os Estados e o Distrito Federal

    legislarão livremente, sem restrições. A sobrevinda, contudo, ou a preexistência de uma lei federal sobre a matéria só tornam válidas as disposições que não contrariem as normas gerais da União (BASTOS, C.R. Curso de direito constitucional. 22. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 306).

    O ato de invalidação incide sobre um ato administrativo inválido, isto é, produzido sem a devida atenção ao ordenamento jurídico. O objeto do ato de invalidação é, comumente, um ato administrativo ilegal e eficaz, de natureza abstrata ou concreta (GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 6. ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2001. pp. 104/106).

    Na proteção ao meio ambiente não se requisita tombamento patrimonial ou dominialidade pública como condição da ação, mas apenas a

    existência de interesse público na sua preservação. Da mesma forma, basta a probabilidade de dano (visa impedir), não sendo lógico esperar sua ocorrência para depois reprimi-lo (Ap. cív. n.

    98.000924-3, da Capital, Des. Nilton Macedo Machado)" (fl. 380) Os Embargos de Declaração, opostos em face do acórdão de apelação, resultaram rejeitados (fls. 417/424):

    AÇÃO CIVIL PÚBLICA - EMBARGOS DECLARATÓRIOS - EDIFICAÇÃO ÀS MARGENS DO RIO DO PEIXE - ALVARÁ CONCEDIDO PELO MUNICÍPIO EM DESCONFORMIDADE COM O CÓDIGO FLORESTAL - LEI N. 10.257/01 (ESTATUTO DAS CIDADES) - INTERPRETAÇÃO SISTÊMICA - AUSÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE ENTRE A LEGISLAÇÃO NACIONAL - PREVALÊNCIA DO RECUO PREVISTO NO CÓDIGO FLORESTAL - ART. 535 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - PRESSUPOSTOS INDEMONSTRADOS - PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE ACATADOS - INEXISTÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL EXTRA PETITA - PREQUESTIONAMENTO INADEQUADO - PLEITO REJEITADO.

    “Na proteção ao meio ambiente não se requisita tombamento

    patrimonial ou dominialidade pública como condição da ação, mas apenas a existência de interesse público na sua preservação. Da mesma forma, basta a probabilidade de dano (visa impedir), não sendo lógico esperar sua ocorrência para depois reprimi-lo" (fls.

    380/381).

    "Diante da aplicabilidade da lei municipal condicionada às normas gerais prevista em lei de âmbito nacional, não resta dúvida quanto à legislação cabível, devendo preponderar o recuo de 30m, estabelecido pelo art. 2º do Código Florestal, com alteração dada pela Lei n.

    7.803/89" (fl. 385), porque a Lei n.10.257/01 (Estatuto das Cidades) é compatível na espécie com a manutenção de área de preservação permanente às margens de rio.

    "O desrespeito ao recuo estabelecido no Código Florestal faz

    presumir o dano ecológico. Caso contrário, o dispositivo não teria razão de ser, perdendo de vista seu objetivo, qual seja o de

    preservar o meio ambiente. Não faz sentido a imposição de normas preventivas e suas penalidades somente sobre aqueles que

    efetivamente tenham causado dano que, em se tratando de ecologia, geralmente, é irreparável" (fl. 388).

    "Lo razonable es lo opuesto a lo arbitrario, y significa conforme a la razón, justo, moderado, prudente, todo lo cual puede ser resumido en arreglo a lo que dicte en sentido común. El Congreso, el Poder Ejecutivo y los Jueces, cuando actúan, en el ejercicio de su

    funciones específicas, deben hacerlo de manera razonable. Todo acto gubernativo debe resistir la prueba de la razonabilidad” (Segundo V.

    Linares Quintana, Reglas Para La Interpretación Constitucional, Editorial Plus Ultra, 1987, § 13, p. 122), sendo razoável in casu a exegese do acórdão impugnado na proteção ao meio ambiente.

    Não atenta contra o princípio da proporcionalidade quando dele se extraem na fundamentação do veredicto "os requisitos (a) da

    adequação, que exige que as medidas adotadas pelo Poder Público se mostrem aptas a atingir os objetivos pretendidos; (b) da necessidade ou exigibilidade, que impõe a verificação da inexistência de meios menos gravoso para atingimento dos fins visados; e (c) da

    proporcionalidade em sentido estrito, que é a ponderação entre o ônus imposto e o benefício trazido, para constatar se é justificável a interferência na esfera dos direitos dos cidadãos" (Luís Roberto Barroso, Interpretação e Aplicação da Constituição, Saraiva, 4ª ed., pp. 223/224).

    Quando a declaração de ineficácia do Alvará de Construção constitui pressuposto dos pedidos de recomposição e recuperação da área degradada e demolição da...

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