Acórdão nº HC 178141 / MS de T5 - QUINTA TURMA

Data14 Junho 2011
Número do processoHC 178141 / MS
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 178.141 - MS (2010⁄0122360-8)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
ADVOGADO : IRAN PEREIRA DA COSTA NEVES - DEFENSOR PÚBLICO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
PACIENTE : C.D.O.
ADVOGADO : ADRIANO CARLOS DE OLIVEIRA SILVA - DEFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO

EMENTA

HABEAS CORPUS. FURTO SIMPLES. DOSIMETRIA. ANTECEDENTES CRIMINAIS E PERSONALIDADE VOLTADA À PRÁTICA DE DELITOS. DIVERSAS ANOTAÇÕES PENAIS. DOCUMENTAÇÃO INSUFICIENTE PARA AFASTAR A AFIRMAÇÃO JUDICIAL. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. PREJUÍZO PARA A VÍTIMA. FUNDAMENTO IDÔNEO. CULPABILIDADE ACENTUADA. NEGATIVA DE AUTORIA. DIREITO À NÃO AUTO-INCRIMINAÇÃO. SISTEMA DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. OFENSA. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. ARGUMENTAÇÃO GENÉRICA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL PARCIALMENTE DEMONSTRADO. SANÇÃO REDIMENSIONADA.

  1. Impossível afastar a conclusão de existência de maus antecedentes e de personalidade voltada à prática delitiva, quando apontadas diversas outras anotações por crimes contra o patrimônio, indicativas de que o envolvimento do paciente com o ilícito não é esporádico, quando a documentação colacionada aos autos é insuficiente para afastar as afirmações feitas pelas instâncias ordinárias.

  2. Havendo suficiente fundamentação quanto às consequências do delito para a vítima, que sofreu elevado prejuízo patrimonial em razão do crime praticado pelo acusado, não há que se falar em ilegalidade da sentença na parte em que aumentou a pena-base em razão da desfavorabilidade dessa circunstância judicial, nem do aresto que a manteve nesse ponto.

  3. Os arts. 5º, LXIII, da CF e 186, e seu parágrafo único, do CPP, conferem ao acusado o direito ao silêncio ou à não auto-incriminação, ao permitir que, por ocasião de seu interrogatório, cale acerca dos fatos criminosos que lhe são imputados, ou ainda, e via de consequência do princípio do sistema de garantias constitucionais, negue a autoria delitiva, sem que isso enseje apenação criminal ou mesmo valoração negativa dessas declarações pelo magistrado, que poderá, no máximo, desconsiderá-las quando do cotejo com os demais elementos probatórios colacionados, pois ao depor não está o réu obrigado a se auto-incriminar.

  4. Não tendo o juiz sentenciante demonstrado, de forma concreta, as razões pelas quais considerou desfavoráveis as circunstâncias do delito, de rigor a redução da pena-base nesse ponto.

  5. Habeas corpus parcialmente concedido para, afastando as circunstâncias judiciais ilegalmente consideradas, reduzir a pena-base imposta ao paciente, tornando a sua reprimenda definitiva em 1 (um) ano e 9 (nove) meses de reclusão e pagamento de 12 (doze) dias-multa.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ⁄RJ), G.D., Laurita Vaz e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 14 de junho de 2011. (Data do Julgamento).

    MINISTRO JORGE MUSSI

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 178.141 - MS (2010⁄0122360-8)

    IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
    ADVOGADO : IRAN PEREIRA DA COSTA NEVES - DEFENSOR PÚBLICO
    IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL
    PACIENTE : C.D.O.
    ADVOGADO : ADRIANO CARLOS DE OLIVEIRA SILVA - DEFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO

    RELATÓRIO

    O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de C.D.O. contra acórdão proferido pela Primeira Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul que negou provimento à Apelação Criminal n.º 2010.016991-0⁄0000-00, interposta pela defesa, mantendo a sentença que condenou o paciente à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial fechado, mais multa, pela prática do delito previsto no art. 155, caput, do Código Penal.

    Sustenta a impetrante a ocorrência de constrangimento ilegal, porquanto não teria o Juízo singular fundamentado concretamente a fixação da pena-base acima do mínimo legal, em inobservância ao disposto no art. 93, IX, da CF.

    Defende que a valoração negativa das circunstâncias judiciais teria ocorrido de forma equivocada, haja vista que os dados apontados pela autoridade impetrada seriam inerentes ao próprio tipo penal violado, o que não justificaria o gravame suportado pelo sentenciado.

    Requereu, liminarmente e no mérito, fosse reduzida a reprimenda imposta ao paciente.

    A liminar foi indeferida.

    Informações prestadas.

    O Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão da ordem.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 178.141 - MS (2010⁄0122360-8)

    VOTO

    O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Certo que a revisão da pena imposta pelas instâncias ordinárias via habeas corpus é possível, mas somente em situações excepcionais, de manifesta ilegalidade ou abuso de poder reconhecíveis de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios, consoante reiteradamente vem decidindo este Superior Tribunal de Justiça.

    In casu, verifica-se que o paciente foi condenado à pena de 2 (dois) anos de reclusão, em regime inicial fechado, e ao pagamento de 15 (quinze) dias-multa, pela prática do delito previsto no art. 155, caput, do Código Penal, porque, no dia 23-11-2006, "subtraiu bacias, panelas, chaleiras, formas para bolo, copos térmicos, canecas e leiteiras de alumínio, facas de cozinha, bules, cafeteira italiana, cerca de 200 metros de fiação elétrica, cadeiras de nylon, peças de roupas, ferramentas, motor de geladeira, motor de freezer, aparelho de som marca CCE com duas caixas de som, canivete multiuso e alicate, pertencentes a J.M.B." (e-STJ fl. 12).

    Inconformada, a defesa interpôs apelação perante o Tribunal de origem, à qual foi negado provimento, mantido, na íntegra, o édito condenatório.

    No que se refere à sustentada ilegalidade na pena-base imposta ao paciente, necessário se faz, para melhor análise da questão sub examine, transcrever o trecho da sentença condenatória relativo à dosimetria da pena, verbis:

    O acusado possui péssimos antecedentes penais, consoante se vê da certidão de distribuições criminais juntada às fls. 63⁄67, da qual consta informação de vários outros procedimentos penais contra si instaurados, inclusive, vários além daquele considerado para o fim de forjar reincidência, sendo contumaz na prática de crime de furtos e outros pequenos delitos, o que denota personalidade voltada à prática criminosa.

    As circunstâncias e consequências do crime desbordam do normal do tipo penal, haja vista o grande prejuízo suportado pela vítima, consoante laudo de avaliação de fl. 34, superou R$ 3.000,00 (três mil reais).

    O comportamento da vítima não justifica a prática do delito pelo acusado.

    A culpabilidade do acusado é manifesta, inclusive, sequer denota arrependimento da prática criminosa, não chegando sequer a admitir a prática criminosa, tendo tentado induzir o Juízo a erro com as versões que apresentou no inquérito e em Juízo.

    Em tal contexto, as circunstâncias judiciais são penalmente desfavoráveis ao acusado, fundamento pelo qual fixo as penas-base acima dos mínimos legais, ou seja, 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão e 13 (treze) dias-multa. (e-STJ fls. 18-19)

    A Corte impetrada, por sua vez, manteve inalterada a sanção-base irrogada ao paciente, sob o argumento de que "o réu tem personalidade voltada para a prática de crimes contra o patrimônio, tem maus antecedentes e é reincidente específico" (e-STJ fl. 29).

    A aplicação da pena-base é o momento em que o juiz, dentro dos limites abstratamente previstos pelo legislador, deve eleger, fundamentadamente, o quantum ideal de pena a ser aplicada ao condenado criminalmente, visando à prevenção e à repressão do delito praticado.

    Assim, para chegar a uma aplicação justa da lei penal, o sentenciante, dentro dessa discricionariedade juridicamente vinculada, deve atentar para as singularidades do caso concreto, guiando-se pelos oito fatores indicativos relacionados no caput do art. 59 do Código Penal, dos quais não deve se furtar de analisar individualmente, a saber: culpabilidade; antecedentes; conduta social; personalidade do agente; motivos, circunstâncias e consequências do crime; e comportamento da vítima, e indicar, especificamente, dentro destes parâmetros, os motivos concretos pelos quais as considera favoráveis ou desfavoráveis, pois é justamente a motivação da sentença que oferece garantia contra os excessos e eventuais erros na aplicação da resposta penal.

    Na hipótese em apreço, verifica-se que o juiz singular, quando da apreciação das circunstâncias judiciais, considerou desfavoráveis ao paciente a culpabilidade, os antecedentes, a personalidade, as circunstâncias e as consequências do delito.

    Segundo a doutrina, na análise da circunstância judicial da culpabilidade, "deve aferir-se o...

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