Acordão nº 0209600-06.2007.5.04.0511 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 20 de Julio de 2011

Magistrado ResponsávelMaria Cristina Schaan Ferreira
Data da Resolução20 de Julio de 2011
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0209600-06.2007.5.04.0511 (RO)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara do Trabalho de Bento Gonçalves, sendo recorrentes MARINEZ CRISTIANETTI PESUTTO, SÃO PAULO ALPARGATAS S.A. E UNIÃO e recorridos OS MESMOS.

Inconformadas com a sentença das fls. 374/380, em que julgada parcialmente procedente a reclamatória trabalhista, as partes e a União recorrem ordinariamente.

A reclamante, às fls. 382/392, ao argumento de que houve cerceamento de defesa, requer seja declarada a nulidade da sentença. Sucessivamente, insurge-se contra os aspectos da decisão que seguem: horas in itinere, adicional de insalubridade, doença profissional. Requer, ainda, o prequestionamento dos seguintes dispositivos: artigo 5º, X, XXXV, LIV e LV, artigo 7º, XXVIII, ambos da Constituição Federal e artigos 186 e 927 do Código Civil.

A reclamada, por sua vez, postula a reforma da decisão recorrida no que tange à condenação ao pagamento da remuneração por intervalos intrajornada irregularmente concedidos (fls. 393/396).

Em suas razões, às fls. 419/422, a União postula reforma da sentença vergastada e autorização de descontos previdenciários sobre a parcela prevista no artigo 71, § 4º, da CLT deferida na origem.

Oferecidas contra-razões às fls. 403/414, 425/430 e 432/437, sobem os autos a este Regional.

Em parecer exarado à fl. 441, o representante do Órgão Ministerial opina pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

ISTO POSTO:

PRELIMINARMENTE.

RECURSO ORDINÁRIO DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE. NÃO-CONHECIMENTO ARGÜIDO EM CONTRA-RAZÕES.

Aduz a reclamada, em suas contra-razões, que a União não detém legitimidade recorrer no feito, visto que não figura na relação processual e a sentença consiste em decisão cognitiva, não homologatória.

Sem razão.

Tratando-se de contribuições previdenciárias, a União possui legitimidade e interesse recursal.

Rejeita-se a argüição de não-conhecimento do recurso ordinário da União suscitada em contra-razões pela reclamada.

MÉRITO.

RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE.

1. CERCEAMENTO DE DEFESA.

A reclamante requer seja declarada a nulidade da sentença e remetidos os autos à origem, ao argumento de ter havido, no feito, cerceamento de defesa, porquanto não ouvida testemunha por ela convidada, a qual não se apresentou devidamente identificada à audiência.

A recorrente alega que o indeferimento da oitiva pelo juízo a quo não encontra respaldo legal, ferindo o princípio do devido processo legal, constituindo prejuízo à autora por evidente cerceamento de defesa. Refere que o depoimento da testemunha não ouvida era fundamental à produção de provas sobre horas in itinere, insalubridade, bem como a ocorrência de atividades laborais que exigiam movimentos repetitivos capazes de causar a moléstia discutida no feito.

Ao exame.

Razão não assiste à reclamante: para garantir a lisura e a regularidade do processo, é necessário que haja certeza acerca da identificação das partes, bem como das testemunhas, a fim de evitar posteriores argüições de nulidade.

É sabido que ao comparecer em juízo, os indivíduos devem se apresentar devidamente identificados, munidos de documento hábil para tanto, sob pena de restar configurada situação de extrema insegurança jurídica, especialmente para a parte contrária, que não dispõe de dados suficientes para averiguar eventual suspeição ou impedimento da testemunha, e para o próprio juízo, o qual não possuirá certeza da identidade informada.

Correto o indeferimento por parte do magistrado a quo, não havendo falar-se em cerceamento de defesa, sequer em nulidade da sentença.

Assim, nega-se provimento ao recurso ordinário da reclamante.

2. HORAS IN ITINERE.

A reclamante, na petição inicial, aduz que a reclamada lhe fornecia transporte entre sua casa e a empresa e entre essa e sua casa. Afirma que a sede da reclamada encontra-se em local de difícil acesso, não atendido por transporte público regular.

Defende-se a reclamada, afirmando que sua sede encontra-se em local servido por transporte público regular e que é de fácil acesso.

Sobre o assunto, a juíza da origem assim decidiu:

“A reclamante alega residir no interior de Vila Flores, distante cerca de 20km da reclamada. Refere ter utilizado o ônibus disponibilizado por esta às 12h45min, chegando ao trabalho às 13h50min. No trajeto de volta, afirma ter tomado o ônibus às 22h10min, chegando em sua residência às 23h. Assevera jamais ter recebido o pagamento pelas horas despendidas entre a sua residência e a reclamada. Postula, com isso, pagamento de horas extras “in itinere”, com reflexos no repouso semanal remunerado, aplicados os adicionais de 50%e de 100%, e, pelo aumento da média remuneratória, reflexos em férias vencidas e proporcionais, com 1/3, gratificações natalinas, aviso prévio e FGTS, com 40%.

A reclamada, na contestação, ressalta estar localizada na estrada RST 470, quilômetro 109, na cidade de Veranópolis, o que considera local de fácil acesso e de grande circulação de veículos. Alega ser a região servida por transporte público regular.

Inicialmente, observo que o tempo despendido no trajeto até o local de trabalho somente caracteriza tempo à disposição do empregador quando preenchidos os requisitos legais insculpidos no art. 58, § 2°, da CLT, quais sejam: local de difícil acesso ou não servido por transporte público e que o transporte seja fornecido pelo empregador.

No caso dos autos, embora a reclamada tenha admitido o fornecimento de transporte, não há a comprovação de que o local onde esta se encontra seja de difícil acesso ou não servido por transporte público, ônus que cabia à reclamante por ser fato constitutivo de seu direito, nos termos do art. 818 da CLT. Pelo contrário, os documentos das fls. 79-80 apontam para a existência de transporte público na região, inclusive no horário compatível com a jornada de trabalho da reclamante. Repiso que o fato de a reclamada fornecer transporte, por si só, não é suficiente para se concluir pela caracterização das horas “in itinere”, ao contrário do que supõe a reclamante (fl. 300).

Destarte, ausente um dos requisitos, indefiro o pedido de pagamento de horas “in itinere”, com os seus reflexos”.

Insurge-se a reclamante contra esse aspecto da decisão, ao argumento de que os horários do transporte público existente era incompatível com o da jornada realizada.

À análise.

Conforme consagrado na jurisprudência e hoje assimilado pelo artigo 58, § 2º, da CLT, as horas in itinere correspondem ao tempo gasto pelo trabalhador, em condução fornecida pelo empregador, no itinerário de locomoção ao local de trabalho e de retorno à residência, quando impossibilitado de fazê-lo por meios próprios ou por via de transporte regular público.

No caso em comento, os documentos das fls. 79/81 demonstram que o local em que instalada a empresa ré é servido por transporte público regular (horários compatíveis com a jornada da reclamante constantes à fl. 80) e que a reclamante optou, entretanto, em utilizar o transporte fornecido pela empregadora (fl. 81).

Referida prova documental logra infirmar a tese ventilada na inicial e nas razões recursais, impondo-se manter o julgamento de improcedência do pedido de horas in itinere.

Nega-se provimento ao recurso ordinário da reclamante.

3. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE.

Rebela-se a reclamante contra o improvimento do pedido de condenação da reclamada ao pagamento do adicional de insalubridade, aduzindo que a magistrada a quo baseou sua decisão tão somente no laudo pericial. Refere que mantinha contato constante com produtos químicos como acetato, cola, solvente, e toluol, todos nocivos à saúde. Diz que os EPIS apenas reduzem os efeitos maléficos de referidas substâncias, não sendo hábeis a neutralizar a insalubridade. Frisa que as máscaras fornecidas não evitavam a absorção por meio das vias respiratória de tais substâncias, especialmente de hidrocarbonetos aromáticos, porque desprovidas de filtro de carvão.

Ao exame.

De acordo com o laudo pericial das fls. 326/331, a reclamante laborava no setor de pré-fabricados, passando cola com pincel em solados, depois passou para o setor de trilhos ou células e montagem, em que conformava cabedais de calçados (aquecimento e posterior resfriamento), abastecia essas células e, por fim, procedia à limpeza de calçados mediante o uso de pano embebido em acetato de etila e colocava palmilha e atacadores nos mesmos.

O perito do juízo concluiu que a reclamante não esteve submetida a condições insalubres, porquanto fez uso de equipamentos de proteção hábeis a elidir os agentes causadores de insalubridade.

Data vênia do entendimento exposto na origem, tem-se que não se pode entender que os equipamentos de proteção tenham sido entregues de forma suficiente, em quantidade e periodicidade adequadas, bem como entender que os efetivamente entregues atendem às especificações técnicas de qualidade. A reclamada não junta documentos hábeis a comprovar o regular fornecimento de equipamentos de proteção individuais à reclamante por todo o período contratual, sequer demonstra freqüência suficiente na entrega no período em que há recibo de entrega (vide documentos da fl. 78). Alguns equipamentos demoravam mais de um mês para serem fornecidos novamente ao empregado, sem, sequer, consistirem em equipamentos de longa duração.

Desta forma, constatado que o exercício das atividades desempenhadas pela reclamante dava-se em condições insalubres e que não há demonstração da efetiva elisão de tais condições, tem-se que devido o pagamento do adicional à autora.

No caso, constataram-se o ruído e elementos químicos como agentes causadores de insalubridade. De acordo com a NR 15, anexo I, a exposição a ruído contínuo ou intermitente superior ao limite de tolerância, condição insalubre em grau médio, gera o direito à percepção de adicional de 20%.

Já a exposição a agentes químicos como aos que exposta a reclamante (cola e acetato de etila - hidrocarboneto aromático) é causadora de insalubridade em grau...

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