Decisão Monocrática nº 2010/0020051-4 de CE - CORTE ESPECIAL

Número do processo2010/0020051-4
Data10 Agosto 2010
ÓrgãoCorte Especial (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.180.905 - RJ (2010/0020051-4) RELATOR : MINISTRO HAMILTON CARVALHIDO

RECORRENTE : M.T.A.L.

ADVOGADO : ANDRÉ FURTADO E OUTRO(S)

RECORRIDO : MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO

PROCURADOR : FREDERICK B BURROWES E OUTRO(S)

DECISÃO

Recurso especial interposto por M.T.A.L., com fundamento no artigo 105, inciso III, alíneas "a" e "c", da

Constituição Federal, contra acórdão da Décima Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, assim ementado: "APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE DÉBITO TRIBUTÁRIO.

IPTU. CONCESSÃO DE USO DE HANGAR DE AEROPORTO. AVENÇA FIRMADA ENTRE A INFRAERO E A AUTORA. DIREITO REAL. RESOLÚVEL. INCIDÊNCIA DO IMPOSTO. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO PARA JULGAR IMPROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL." (fl. 510).

Opostos embargos declaratórios, restaram rejeitados em acórdão assim sumariado:

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INOCORRÊNCIA DAS HIPÓTESES DO ART. 535 I E II DO CPC. NÃO HÁ OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. A REFORMA DO DECISUM DEVE SER BUSCADA POR MEIO DE OUTRO RECURSO QUE NÃO ESTE. O INTUITO É PRÉ-QUESTIONAR A MATÉRIA.

DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS." (fl. 532).

Além da divergência jurisprudencial, a insurgência está fundada na violação dos artigos 32 e 34 do Código Tributário Nacional, cujos termos são os seguintes:

"Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a

propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título." E teriam sido violados, porque:

"(...)

A controvérsia abordada na presente ação mandamental diz respeito à legitimidade do lançamento do IPTU, diretamente no nome do

concessionário, classificando-o como proprietário (lançamento fiscal, "carnê" do IPTU) referente ao imóvel concedido pela

INFRAERO.

Ora, o Código Tributário Nacional trata do tributo no art. 32 e 34 do CTN. O caput, expandindo a definição constitucional como cumpre à lei tributária complementar, determina que:

"Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a

propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município."

O artigo 34, que já foi diversas vezes interpretado pelo E. STJ, assim diz:

Art. 34. Contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu possuidor a qualquer título.

Eminente Ministro(a), o Recorrente é mero detentor de direitos pessoais. Como bem disse o Ministro José Delgado, ao analisar caso idêntico (RESP 681.406-RJ) (pág. 5 do acórdão): "O cessionário de uso não tem o domínio útil. A relação jurídica surgida entre o cessionário de uso e o cedente é um típico negócio jurídico

bilateral de natureza contratual. Sobre esse negócio jurídico não incide IPTU". E completa: "O contrato de concessão é pessoal. Não é contrato real".

Desta forma o acórdão feriu os artigos 32 e 34 do CTN. Aliás, a eminente Ministra Eliana Calmon assim manifestou em seu voto no julgamento do RESP 390.698-SP, de questão relacionada à sujeição passiva do IPTU:

Examinando-se o art. 34 do CTN pode-se ter uma errônea idéia, por apontar o artigo como contribuinte o possuidor a qualquer título.

Contudo, doutrinariamente, distingue-se a posse oriunda de direito real, situação em que assume o possuidor o ônus do proprietário, daquela oriunda de direito pessoal, quando detém esse título pela só existência de um contrato, tal como a locação, o comodato etc.

Com relação ao IPTU, somente é contribuinte o possuidor que tenha animus domini, como ensina o professor Odmir Fernandes (Código Tributário Nacional, Editora Revista dos Tribunais, pág. 97), de forma que jamais poderá ser taxado de contribuinte do aludido imposto o locatário ou o comodatário.

E mais:

"O IPTU é imposto que tem como contribuinte o proprietário ou o possuidor por direito real, que exerce a posse com animus domini.

  1. O cessionário do direito de uso é possuidor por relação de direito pessoal e, como tal, não é contribuinte do IPTU do imóvel que ocupa.

  2. Recurso especial improvido." (REsp 685316/RJ, 2ª Turma do STJ, Rel. Min. Castro Meira).

    Desta forma, está clara, na hipótese, a violação dos artigos 32 e 34 do CTN, na medida em que o Tribunal de origem contrariou a lei federal (CTN) e negou-lhes vigência, ademais o contrato tem natureza jurídica de direito pessoal. Ausente, in casu, o animus domini.

    Quanto à alegação de que o contrato contém cláusula específica conferindo ao recorrente o ônus de arcar com quaisquer tributos incidentes sobre a área dada em regime de concessão, vale ressaltar que a questão é igualmente pacífica.

    As convenções particulares relativas à responsabilidade pelo

    pagamento de tributos não podem ser opostas à Fazenda Pública, nos termos do artigo 123 do CTN (RECURSO ESPECIAL N° 865.386 - RJ).

    Como se vê o art. 123 do CTN que torna ineficaz qualquer convenção entre particulares com a finalidade de alterar a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações tributárias, não podendo ser oposta contra a Fazenda Pública.

    Art. 123 - Salvo disposições de lei em contrário, as convenções particulares, relativas à responsabilidade pelo pagamento de

    tributos, não podem ser opostas à Fazenda pública, para modificar a definição legal do sujeito passivo das obrigações tributárias correspondentes.

    Assim, a tese exposta no acórdão recorrido pela E. 19ª Câmara sobre a transferência da responsabilidade não deve prosperar, merecendo o devido reparo por este C. STJ.

    (...)" (fls. 539/541).

    Recurso tempestivo, respondido (fls. 648/670) e admitido na origem (fls. 703/710).

    O Ministério Público Federal manifestou-se pelo não conhecimento do recurso especial (fls. 742/747).

    Tudo visto e examinado, decido.

    Conheço do recurso, porque tempestivo, regularmente deduzido e prequestionados os dispositivos de lei federal apontados como violados, não havendo falar, ademais, em reexame do contexto

    fáctico-probatório dos autos.

    É esta, a propósito, a letra do acórdão recorrido:

    "(...)

    Com a devida vênia da posição jurisprudencial firmada no âmbito do E. Superior Tribunal de Justiça, deve ser reconhecida a recorrida como sujeito passivo do IPTU pelas razões que a seguir expostas.

    Pois bem. A INFRAERO é empresa pública conforme os termos da Lei nº.

    5.862/72, cujas atribuições institucionais estão elencadas no art.

    1. da referida norma federal, vejamos:

    Art 2º. A INFRAERO terá por finalidade implantar, administrar, operar e explorar industrial e comercialmente a infra-estrutura aeroportuária que lhe for atribuída pelo Ministério da Aeronáutica.

    Infere-se do teor do dispositivo acima transcrito que a área de atuação da INFRAERO é nitidamente atividade de índole pública, de competência da União, na forma do art. 21, XII, “c”, da Constituição da República de 1988, verbis:

    Art. 21. Compete à União:

    [...]

    XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:

    [...]

    1. a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura

      aeroportuária;

      Nesse contexto, tratando-se de imóvel da União, sob a jurisdição e da INFRAERO e porque inexiste possibilidade de exercício do poder tributário pelo Município em razão da imunidade constitucionalmente cedida em razão da reciprocidade entre os entes federativos, tudo levaria a crer pela proibição da incidência do IPTU. De toda forma, não há como fechar os olhos para a circunstância de que o bem em questão – não obstante ser de propriedade da União – teve seu uso cedido a título oneroso à autora (apelada), frise-se, empresa privada, com fins lucrativos.

      A Carta Política de 1988 disciplina exatamente esta situação

      jurídica em tela, quando em seu art. 150, VI, “a”, §3º, dispõe o seguinte:

      Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao

      contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

      [...]

      VI - instituir impostos sobre:

    2. patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;

      [...]

      § 3º - As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o

      promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.

      Da leitura da previsão constitucional em destaque, chega-se a conclusão de que, quando se tratar de hipótese em que o fato gerador de um tributo corresponder ou decorrer da exploração de atividade econômica regrada por norma aplicável a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preço ou tarifas pelo usuário, a regra imunizante cederá permitindo, assim, sobre tal fattispecie, a incidência de tributos sobre a renda, patrimônio ou serviços prestados pelos entes federados, leia-se, por sociedades de economia mista, empresas públicas ou em regime de concessão e permissão de serviços públicos.

      A quaestio trazida neste feito para a análise em grau recursal se cuida de situação em que imóvel de propriedade da União (hangar em aeroporto) está sendo empregado numa atividade de fim exclusivamente privado e com a finalidade de lucro. Veja-se, a apelada presta serviços de “transporte de pessoas e cargas, na modalidade de taxi aéreo” (fl. 03), não se cuidando, pois de nenhuma das atividades afetas à administração aeroportuária, afastada, portanto, a norma de não-incidência qualificada, qual seja, a imunidade recíproca.

      Prosseguindo na apreciação das razões trazidas a esta Corte no apelo da Urbe uma vez reconhecida a impossibilidade de extensão da imunidade recíproca in casu há que se enfrentar o fundamento...

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