Decisão Monocrática nº 2009/0006512-4 de T5 - QUINTA TURMA

Data02 Agosto 2011
Número do processo2009/0006512-4
ÓrgãoQuinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.111.265 - RS (2009/0006512-4) (f)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL RECORRIDO : R.A.D.A.

RECORRIDO : JOSÉ ANTÔNIO PEREIRA

RECORRIDO : NEUZA CORREIA GEMELLI

ADVOGADO : CLÁUDIA CAMARGO BARROS - DEFENSORA PÚBLICA E OUTROS DECISÃO

Trata-se de recurso especial interposto pelo Ministério Público, com fulcro no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Consta dos autos que os Recorridos NEUZA CORREIA E J.A. foram denunciados pela suposta prática dos delitos previstos no art.

229 do Código Penal e 244-A da Lei n.º 8.069/90 e a Ré ROZELI pela prática do crime tipificado no art. 229 do Estatuto Repressor, nos seguintes termos:

"FATO N. 01:

Em datas e horários ainda não precisados, mas de forma permanente e atual, [...], o denunciado J.A.P., mantém, por conta própria e mediante gerente, casa de prostituição e lugar destinado a encontros para fim libidinoso.

FATO N. 02:

Em datas e horários ainda não precisados, mas de forma permanente e atual, [...], a denunciada N.C.G., mantém, por conta de terceiro, casa de prostituição e lugar destinado a encontros para fim libidinoso.

O denunciado José mantém o bar, onde mulheres se prostituem, as quais recebem comissão pela venda de bebidas aos clientes, servido o local para a realização dos encontros e dos "programas sexuais". O bar é gerenciado pela denunciada Neuza, que o cuida por conta de José.

FATO N. 03:

Em datas e horários ainda não precisados, mas de forma permanente e atual, [...], o denunciado J.A.P., mantém, por conta própria e mediante gerente, casa de prostituição e lugar destinado a encontros para fim libidinoso.

FATO N. 04:

Em datas e horários ainda não precisados, mas de forma permanente e atual, [...], a denunciada R.A.D.A., mantém, por conta de terceiro, casa de prostituição e lugar destinado a

encontros para fim libidinoso.

O denunciado José mantém o bar, onde mulheres se prostituem, as quais recebem comissão pela venda de bebidas aos clientes, servido o local para a realização dos encontros e dos "programas sexuais". O bar é gerenciado pela denunciada Rozeli, que o cuida por conta de José.

FATO N. 05:

Em datas e horários não especificados nos autos, mas no mês de setembro de 2002, [...], o denunciado J.A.P., submeteu a adolescente D R, com 16 anos de idade na época dos fatos, à prostituição.

FATO N. 06:

Em datas e horários não especificados nos autos, mas no mês de setembro de 2002, [...], a denunciada N.C.G.,

submeteu a adolescente D R, com 16 anos de idade na época dos fatos, à prostituição.

Na ocasião, o denunciado José e sua companheira R.A. deA., foram até a casa da vítima e a trouxeram para trabalhar no "bar" de propriedade de José, sob a gerência da denunciada Neuza Correia Gemelli, sendo D submetida a fazer "programas sexuais" no próprio estabelecimento." (fls. 2/6)

A denúncia foi recebida em 7/5/2003 (fl. 247). Após regular

instrução criminal, foram os acusados absolvidos da prática do delito previsto no art. 229 do Codex Penalista por entender que a conduta não constituiria infração penal por estar socialmente aceita, e também do crime tipificado no art. 244-A da Lei n.º 8.069/90 uma vez que a menor não teria sido submetida à prostituição pelos Recorridos (fls. 245/257).

Contra tal decisão, a defesa interpôs recurso de apelação, tendo a Corte local, por maioria, negado provimento ao reclamo em acórdão que restou assim ementado:

"CASA DE PROSTITUIÇÃO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

SUBMISSÃO DE MENORES À PROSTITUIÇÃO.

A simples manutenção de casa de prostituição, atividade socialmente aceita na realidade atual da vida, inclusive, nas altas rodas, cercada de "glamour", não tem mais como ser penalmente reprovada.

Não há, no simples convite à prostituição, formulado a jovem com 16 anos, já prostituta, ao que tudo indica, a caracterização do artigo 244-A do ECA. Voto vencido.

Apelo não provido, vencido, em parte, o relator, que o provia no que tange ao crime do ECA." (fl. 305)

Irresignado, o Parquet interpõe o presente recurso especial ao fundamento de que o aresto objurgado teria negado vigência aos arts.

229 do Diploma Repressor e 244-A do Estatuto da Criança e do

Adolescente, bem como que haveria divergência jurisprudencial sobre a matéria.

Sustenta que a conduta de manter casa de exploração sexual

constituiria infração penal, não havendo que se falar na sua

descriminalização ante a aceitação pela sociedade de referido comportamento.

Assevera que o fato de terem JOSÉ e NEUZA, "proprietário e gerente dos estabelecimentos vocacionados a encontros libidinosos, [...], permitido e dado condições para que menores laborassem como

prostitutas no local" (fl. 333), já seria suficiente para o

enquadramento dos mesmos nas penas do art. 244-A da Lei n.º

8.069/90, sendo prescindível para tanto que os réus usassem de coação a fim de submeter as vítimas menores ao ato de exploração sexual.

Requer o provimento do apelo nobre para o fim de condenar os réus nas penas do art. 229 do Código Penal e art. 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Contrarrazões apresentadas (fls. 353/361), foi o recurso admitido na origem (fls. 363/364).

Remetido o feito criminal a este Superior Tribunal de Justiça, manifestou-se a Subprocuradoria Geral da República pelo provimento do reclamo especial.

Decido.

Inicialmente, rechaça-se a preliminar arguida nas contrarrazões ao recurso especial, relativa à falta de prequestionamento, já que é desnecessária a expressa menção do dispositivo legal tido por violado no acórdão recorrido, pois o tema nele inserto foi objeto de apreciação pela Corte de origem.

Nesse sentido, já decidiu a Quinta Turma deste Sodalício: "RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. VIOLAÇÃO AO ART. 619 DO CPP NÃO RECONHECIDA. ROUBO. MOMENTO DA CONSUMAÇÃO DO DELITO.

CESSAÇÃO DA CLANDESTINIDADE OU VIOLÊNCIA. REINCIDÊNCIA AGRAVAMENTO DA PENA. NON BIS IN IDEM. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, PROVIDO.

"1. Para que se tenha acesso à via especial, é suficiente a

ocorrência do prequestionamento implícito, ou seja, basta que o Tribunal a quo tenha se pronunciado a respeito da tese jurídica levantada, sendo desnecessária a menção expressa aos dispositivos legais tidos por violados. "[...] "4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido para reconhecer a forma consumada ao crime de roubo, bem como a aplicação da agravante da reincidência na dosimetria da pena" (grifou-se) (REsp 767.584/RS, rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, Quinta Turma, p. no DJU de 24-04-2006, p. 453).

Da mesma forma, a Sexta Turma: "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL PENAL. AÇÃO PENAL PRIVADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇÃO.

POSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO. DESNECESSIDADE. DISSÍDIO CONFIGURADO.

"[...]

"2. A Excelsa Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de que, para fins de

prequestionamento, a violação de lei federal não exige,

necessariamente, que o dispositivo venha expressamente mencionado no acórdão estadual, bastando, a ensejar a interposição de recurso especial, que a matéria da impugnação tenha sido argüida, debatida e decidida. "[...] "4. Embargos acolhidos, sem efeitos infringentes" (grifou-se) (EDcl no REsp 275.650/SP, Rel. Ministro HAMILTON

CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 29.11.2005, DJ 06.02.2006 p.

364).

Igualmente, afasta-se a preliminar de não conhecimento do recurso por necessidade de revolvimento do material fático-probatório, uma vez que as questões trazidas no especial são estritamente jurídicas consistentes no reconhecimento de que a tolerância da conduta de exploração de casa de prostituição pela sociedade não teria

descriminalizado o delito previsto no art. 229 do Estatuto

Repressor, bem como que seria desnecessária a existência de coação sobre a menor "prostituta" para a configuração do crime tipificado no art. 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim, preenchidos os requisitos de admissibilidade do apelo nobre, passo à análise do mérito recursal.

O Tribunal de Origem ao manter a absolvição dos Recorridos pela prática da infração penal "casa de prostituição" assim se

manifestou:

"Quanto à simples mantença de casa de prostituição, de que são acusados os apelados, J.A. porque proprietário, e Rozeli, sua companheira e Neuza, porque gerentes de tais casas, estou em que a r. sentença apelada merece confirmação por seus próprios e

jurídicos fundamentos, que me permito reproduzir, in verbis:

[...]

Materialidade e autoria.

Conquanto a materialidade e a autoria do delito de manter casa de prostituição restarem devidamente assentadas pela prova oral trazida à baila no presente feito, tenho que, no presente caso, despicienda é a aplicação de reprimenda devido à antijuridicidade da conduta descrita no caso em telha.

Explico.

Os réus J.A., Neuza e Rozeli, a quem são imputadas tal conduta, bem como outras testemunhas arroladas, negaram que no estabelecimento comercial descrito à exordial havia casa de

prostituição.

Porém, a menor D R, à fl. 102, asseverou, que:

'Os réus J.A. e Neuza possuíam casa de prostituição em Planalto e a ré R.A. cuidava da casa. A casa de

prostituição era ao lado da rodoviária [...]. Mantinha relações sexuais com os clientes da casa. Esclarece que os réus mantinham duas casas de prostituição em Planalto.

O Policial Militar Alderi Antonio de Oliveira, asseverou que: "Era pública e notória a propriedade das duas casas de prostituição por J.A., mais conhecido como Pingo. Também era de

conhecimento do depoente que Neusa gerenciava uma das casas, porém não tem certeza qual."

Com tais declarações, depreende-se, forma cristalina, que

efetivamente no local funcionava casa destinada à satisfação da concupiscência, sendo despiciendo a análise de todo o caderno probatório para se chegar a tal conclusão.

Contudo, como já decido alhures, reprimenda penal não é medida mais...

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