Acórdão nº 2003.35.00.010727-7 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Quarta Turma, 12 de Julio de 2011

Magistrado ResponsávelDesembargador Federal MÁrio CÉsar Ribeiro
Data da Resolução12 de Julio de 2011
EmissorQuarta Turma
Tipo de RecursoApelação Criminal

Assunto: Crimes Contra a Ordem Tributária (art. 1º Ao 3º da Lei 8.137/90 e Art. 1º da Lei 4.729/65) - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL 2003.35.00.010727-7/GO RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRIO CÉSAR RIBEIRO

APELANTE: REGIS STIVAL PEREIRA

ADVOGADO: PAULO DE TARSO FLEURY E OUTROS(AS)

APELADO: JUSTICA PUBLICA

PROCURADOR: GOETHE ODILON FREITAS DE ABREU

A C Ó R D Ã O Decide a Quarta Turma do TRF da 1ª Região, por maioria, dar parcial provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 12 de julho de 2011.

Desembargador Federal Mário César Ribeiro Relator

APELAÇÃO CRIMINAL N. 2003.35.00.010727-7/GO

RELATÓRIO

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia contra RÉGIS STIVAL PEREIRA pela prática do crime previsto no artigo 1º, inciso I, II, III e IV, e artigo 2º, inciso I, ambos da Lei n. 8.137/90.

Sentenciando o feito (fls. 592/609), o MM. Juiz a quo julgou procedente em parte a denúncia para condenar REGIS STIVAL PEREIRA à pena de 04 (quatro) anos de reclusão e 75 (setenta e cinco) dias-multa, pela prática do crime previsto no artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.137/90 c/c artigo 71 do Código Penal. A pena privativa de liberdade foi substituída por 02 (duas) restritivas de direitos, nos termos dos artigos 43, I; 44, I, II, e III, e § 2º, todos do Código Penal.

Irresignado, o réu REGIS STIVAL PEREIRA interpõe recurso de apelação (fls. 619/622), requerendo a anulação da sentença com base, em síntese, nos seguintes argumentos:

- "(...) o crime pelo qual o apelante foi condenado, trata- se de crime próprio, ou seja, somente pode ser praticado pela pessoa física indicada em lei como contribuinte.";

- (...) percebe-se que em não havendo prejuízo para o Estado, e nem sendo o réu contribuinte nos crimes em que está sendo processado, conclui-se que não poderia haver condenação.";

- "(...) apesar do Ilustríssimo juiz, procurar evitar o bis in idem, o que ocorreu é que existem duas sentenças condenatórias para o mesmo fato, portanto inaceitável bis in idem.

- "(...) a figura típica descrita no artigo 1º da Lei 8.137/90, 'suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório' não ocorreu! Todos os contribuintes, à exceção de João Siris, ou pagaram seus tributos ou parcelaram o crédito tributário, conforme se vê na parte expositiva da sentença apelada." - "(...) não se pode falar em continuidade delitiva, já que os outros co-réus ou tiveram os processos suspensos ou extintos, com trancamento da ação penal ou extinção da punibilidade..." - "(...) há de ser revista a pena por ser exagerada ante aos fatos e circunstâncias demonstrados no curso da instrução probatória e reconhecidos na própria sentença recorrida."

Com contra-razões (fls. 638/650), subiram os autos a esta Corte onde receberam parecer ministerial (fls. 654/657) opinando pelo improvimento do apelo.

É o relatório.

Ao revisor.

Desembargador Federal Mário César Ribeiro

Relator APELAÇÃO CRIMINAL N. 2003.35.00.010727-7/GO

VOTO

Recorre REGIS STIVAL PEREIRA de sentença que o condenou à pena de 04 (quatro) anos de reclusão e 75 (setenta e cinco) dias-multa, pela prática do crime previsto no artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.137/90 c/c artigo 71 do Código Penal.

Sustenta o apelante, em síntese, que não poderia ter sido condenado pelo crime narrado na denúncia, tendo em vista que o referido crime é crime próprio, "ou seja, somente pode ser praticado pela pessoa física indicada em lei como contribuinte"; que não houve prejuízo ao Estado; que existe error in procedendo na sentença em face da existência de duas condenações para o mesmo fato; que não restou configurada a continuidade delitiva por terem os processos dos co-réus sido suspensos ou extintos; e ao final requer a revisão da dosimetria da pena que lhe foi imposta por reputá-la exagerada.

Vejamos.

Narra a denúncia:

"Consta no incluso procedimento administrativo que o denunciado, na qualidade de profissional liberal, emitiu uma quantidade significativa de recibos odontológicos falsos, nos anos de 1998 a 2001, em favor de um grupo de pessoas físicas, as quais utilizavam esses documentos para reduzir as bases de cálculos a serem tributados pelo imposto de renda de pessoa física (IRPF).

No curso da ação fiscal verificou-se a presença de valores altos e irreais para despesas odontológicas, as quais se repetiram por mais de um exercício, razão pela qual suspeitou-se que não correspondiam à efetiva prestação dos serviços mencionados.

Régis Stival Pereira foi intimado várias vezes para reconhecer a autoria dos recibos e informou, em 02/12/2002, que não recebeu nenhum tipo de rendimento para emiti-los e que realmente não equivalem a verídicas prestações de serviços.

A conduta delituosa importou em R$ 595.185,00 (quinhentos e noventa e cinco mil, cento e oitenta e cinco reais) deduzidos irregularmente a título de despesas médicas em nome de mais de setenta pessoas (fls. 05/17), sendo este valor correspondente somente às quantias atestadas pelos recibos cuja autenticidade foi reconhecida pelo denunciado.

Diante das circunstâncias, REGIS STIVAL PEREIRA está incurso nas sanções dos artigos 1º, incisos I, II, III e IV, e 2º, inciso I, ambos da Lei 8.137/90." (fls. 02/03)

Pois bem, depreende-se do conjunto fático-probatório constante dos autos que o réu RÉGIS STIVAL PEREIRA emitiu recibos inidôneos que foram utilizados por contribuintes com a finalidade precípua de comprovação de despesas odontológicas o que lhes permitiria reduzir ou suprimir imposto de renda.

Como é sabido tais comprovantes não são apresentados concomitantemente com a declaração de ajuste, mas sim, devem ser guardados pelo prazo de 05 (cinco) anos para, ser for o caso, apresentá-los à autoridade fiscal. Decorre daí que a conclusão do processo de ajuste anual apenas se finda com a homologação da declaração, seja de forma tácita pelo decurso do qüinqüênio legal, ou de forma expressa pela autoridade fiscal, sendo que no presente caso, após a confrontação dos dados, foi lavrado auto de infração pela inconsistência observada.

Pois bem, a ação fiscal instaurada contra o réu, profissional de saúde, visava verificar a divergência entre os dados constantes nas suas declarações de Imposto de Renda Pessoa Física e os valores que teria aferido diante da confrontação com os dados oriundos das declarações daqueles que informaram utilizar seus serviços profissionais para fins de abatimento do imposto devido.

No caso dos autos, O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, conforme Representação Fiscal Para Fins Penais e documentos que a acompanham - fls.

07/23 e 24/439, ofereceu denúncia somente contra o emissor dos recibos inidôneos, o réu RÉGIS STIVAL PEREIRA (fls. 02/03), imputando-lhe a conduta tipificada no artigo 1º, incisos I, II, III e IV, e, ainda no artigo 2º, inciso I, ambos da Lei 8.137/90, tendo o MM. Juiz a quo condenado-o pela prática do crime previsto no artigo 1º, inciso IV, da Lei 8.137/90 c/c artigo 71 do Código Penal.

Ora, os crimes previstos no Decreto-lei nº 8.137/90 são próprios ou seja somente podem ser praticados pelo contribuinte ou o responsável, ambos sujeitos passivos da obrigação tributária principal.

Com efeito, nesse sentido, comentando os dispositivos da Lei em referência, assim leciona LUIZ REGIS PRADO (in DIREITO PENAL ECONÔMICO, RT, 2ª ed., pp. 310/311):

Nas figuras típicas em análise, sujeito ativo é o contribuinte ou o responsável que praticar quaisquer das condutas comissivas ou omissivas previstas no artigo 1º ou 2º e incisos da Lei 8.137/90 (delito especial próprio), ambos sujeitos passivos da obrigação tributária principal, consoante definidos no artigo 121, parágrafo único, do Código Tributário Nacional.

Contribuinte é aquele que tem relação direta e pessoal com o fato gerador de uma obrigação tributária, enquanto o responsável é quem faz parte da relação jurídica tributária em decorrência de disposição legal expressa. Este último tem um liame indireto com o fato gerador e, em face da conceituação dada pelo Código, é sempre um terceiro, permitindo também o dispositivo legal que, eleito este, seja excluída a responsabilidade do contribuinte, ou seja, esta mantida subsidiariamente, na hipótese de o terceiro não cumprir total ou parcialmente a obrigação, quando será então chamado para suprir ou complementar o pagamento.

E, mais adiante, acrescenta:

"No tocante ao concurso de pessoas, cumpre destacar que, na seara da sonegação fiscal, quem sonega tributo, em regra faz uso de expedientes sofisticados, com interposição de terceiras pessoas ('fantasmas', 'testas de ferro', 'laranjas', 'pseudoproprietários'); isto porque a realização do injusto típico utiliza-se de falsidade substancial ou ideológica. Assim, agente do delito será aquele que realiza a ação ou omissão descrita no tipo objetivo (contribuinte ou responsável) ou determina, ordena ou prescreve a terceiro que atue em seu nome. As regras da autoria e participação são plenamente aplicáveis. Ainda que o agente não venha a determinar a prática da referida conduta, mas tenha dela conhecimento e a utilize para supressão ou redução de tributo, será sujeito ativo do delito. A autoria colateral é possível, mas...

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