Decisão Monocrática nº 2009/0053095-6 de S1 - PRIMEIRA SEÇÃO

Data03 Agosto 2011
Número do processo2009/0053095-6
ÓrgãoPrimeira Seção (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.168.344 - SP (2009/0053095-6)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

AGRAVANTE : L.G.D.F.B. E OUTRO

ADVOGADO : CLEVERSON ZAM

AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

INTERES. : BERTOLO AGROPASTORIL LTDA

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. MEIO AMBIENTE. ÁREA DE RESERVA LEGAL EM PROPRIEDADES RURAIS: DEMARCAÇÃO, AVERBAÇÃO E RESTAURAÇÃO. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. OBRIGAÇÃO EX LEGE E PROPTER REM, IMEDIATAMENTE EXIGÍVEL DO PROPRIETÁRIO ATUAL.

AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO PARA, DESDE LOGO, NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.

DECISÃO

  1. Trata-se de agravo de instrumento de decisão que deixou de admitir recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo assim ementado:

    AÇÃO CIVIL PÚBLICA AMBIENTAL - ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP) E RESERVA LEGAL - PROPOSITURA DA AÇÃO CIVIL VERTENTE - INDISCUTÍVEL LEGITIMIDADE PASSIVA DOS TITULARES DO DOMÍNIO, BEM COMO DOS

    EXPLORADORES DETENTORES DA POSSE, NADA IMPORTANDO, QUANTO A ESTES, QUEM, QUANDO E PORQUE DESMATOU A ÁREA - RESPONSABILIDADE AMBIENTAL OBJETIVA E "PROPTER REM". Área de Preservação Permanente não se confunde com Reserva Legal de 20%, devendo ser esta instituída, demarcada e averbada. Contundente a prova da inexistência da reserva legal de 20%, confirmados os fatos pelos próprios réus, não colhe a pretensão de isentarem-se da responsabilidade ante afirmações de que já receberam o imóvel no estado atual, por ser a responsabilidade ambiental objetiva e "propter rem". Normas de proteção ambiental que se aplicam imediatamente. Incabível o pleito de indenização, porque o cuidado com o meio ambiente não traduz apossamento, desapropriação ou qualquer restrição de direitos. Prazos para cumprimento das determinações originadas na sentença merecendo ampliação, cumprindo fixar cento e oitenta (180) dias para apresentação de cronograma ao DEPRN, e mais trezentos e sessenta (360) dias para sua execução após aprovação daquele órgão.

    RECURSO AO QUAL SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

    (fls. 377/378, e-STJ)

    Nas razões de recurso especial (fls. 403/424, e-STJ), o recorrente aponta violação ao art. 16, da Lei 4.771/65 (Código Florestal), e ao art. 99, da Lei 8.171/91, com a redação dada pela MP 2.166-67/01, ao argumento de que (a) é "incontroverso nos autos que os imóveis rurais de propriedade dos recorrentes não possuem matas ou formações sucessoras de matas há mais de cinqüenta anos, sendo totalmente explorados", de sorte que, se 'receberam as propriedades rurais no exato estado em que hoje elas estão, é evidente que não praticaram qualquer depredação ou dano ambiental, não incidiram em ilícito algum, não podendo ser alvejada pela ação civil pública e compelida a recompor cobertura florestal ou mesmo a demarcar e averbar no álbum imobiliário a chamada área de reserva florestal'; e (b) "o recorrido está tentando, por via oblíqua, realizar inusitada

    desapropriação indireta no bojo de uma ação civil pública - com a agravante de nem mesmo oferecer justa e prévia indenização - ou, então, pretende indenização de quem sabidamente não causou dano ambiental, olvidando a necessidade de nexo de causalidade a

    justificar tal pleito". Pela alínea c do permissivo constitucional, aponta divergência com julgados do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e desta Corte Superior, sustentando que (a) "a

    averbação da reserva legal só é exigível quando se cuide de situação que envolva efetiva supressão ou alteração da forma de exploração de área de floresta ou de cobertura natural; o que não se dá quando não haja cobertura florestal, ou se cuide de simples aquisição de áreas de cultura e campo", sendo que "muito antes da edição do Código Florestal de 1.965, os imóveis rurais dos recorrentes já eram totalmente explorados através de pastagens nada existindo, ali, de floresta ou outra forma de vegetação nativa"; (b) "não se pode impor a obrigação de reparar dano ambiental, através de restauração de cobertura arbórea, a particular que adquiriu a terra já desmatada"; e (c) "está compelido a averbar a reserva florestal apenas aquele proprietário que tenha interesse em explorá-la economicamente".

    Contra-razões ao recurso especial e contraminuta ao presente

    agravo respectivamente às fls. 458/462 e 471/475 (e-STJ).

    O parecer do Ministério Público Federal, às fls. 490/494 (e-STJ), opina pela manutenção da decisão agravada, apontando que "o acórdão de origem não merece qualquer censura, vez que decidiu a questão posta nos autos, no mesmo sentido da jurisprudência pacificada por esta Corte".

  2. A 1ª Turma desta Corte, em caso análogo (REsp 1.179.316/SP, Min.

    Teori Albino Zavascki, DJe de 29/06/2010), cujos fundamentos são plenamente aplicáveis à hipótese dos autos, firmou o entendimento sintetizado na seguinte ementa:

    ADMINISTRATIVO. MEIO AMBIENTE. ÁREA DE RESERVA LEGAL EM PROPRIEDADES RURAIS: DEMARCAÇÃO, AVERBAÇÃO E RESTAURAÇÃO. LIMITAÇÃO

    ADMINISTRATIVA. OBRIGAÇÃO EX LEGE E PROPTER REM, IMEDIATAMENTE EXIGÍVEL DO PROPRIETÁRIO ATUAL.

  3. Em nosso sistema normativo (Código Florestal - Lei 4.771/65, art.

    16 e parágrafos; Lei 8.171/91, art. 99), a obrigação de demarcar, averbar e restaurar a área de reserva legal nas propriedades rurais constitui (a) limitação administrativa ao uso da propriedade privada destinada a tutelar o meio ambiente, que deve ser defendido e preservado "para as presentes e futuras gerações" (CF, art. 225).

    Por ter como fonte a própria lei e por incidir sobre as propriedades em si, (b) configura dever jurídico (obrigação ex lege) que se transfere automaticamente com a transferência do domínio (obrigação propter rem), podendo, em conseqüência, ser imediatamente exigível do proprietário atual, independentemente de qualquer indagação a respeito de boa-fé do adquirente ou de outro nexo causal que não o que se estabelece pela titularidade do domínio.

  4. O percentual de reserva legal de que trata o art. 16 da Lei 4.771/65 (Código Florestal) é calculado levando em consideração a totalidade da área rural.

  5. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

    No voto condutor do acórdão, manifestei-me nos seguintes termos: 4. Esse entendimento guarda perfeita harmonia com a jurisprudência do STJ sobre a matéria, como se pode constatar dos seguintes

    precedentes:

    ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AVERBAÇÃO DE ÁREA DE RESERVA LEGAL. ART. 16, § 8º, DA LEI 4.771/65 (CÓDIGO FLORESTAL). EXIGÊNCIA LEGAL, MESMO PARA ÁREAS ONDE NÃO HOUVER FLORESTAS. RECURSO PROVIDO.

  6. Exige-se, nos moldes do § 8º do art. 16 do Código Florestal, que a área de reserva legal seja averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no ofício de registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de

    transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas naquele mesmo Código.

  7. Hipótese em que o Tribunal de origem, interpretando a referida norma, concluiu que a averbação da área de reserva legal somente seria obrigatória em relação às áreas onde houvesse florestas, campos gerais ou outra forma de vegetação nativa.

  8. O aludido dispositivo, no entanto, deve ser interpretado em conjunto com as demais disposições do Código Florestal,

    especialmente no que se refere às determinações do art. 44 do mesmo diploma legal.

  9. É dever do proprietário ou possuidor de imóveis rurais, mesmo em áreas onde não houver florestas, adotar as providências necessárias à restauração ou à recuperação das formas de vegetação nativa, para se adequar aos limites percentuais previstos nos incisos do art. 16 do Código Florestal.

  10. Tem-se, assim, que a exigência de averbação da reserva legal à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no ofício de registro de imóveis competente, não se aplica somente às áreas onde haja

    florestas, campos gerais ou outra forma de vegetação nativa.

  11. "O meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito que a Constituição assegura a todos (art. 225 da CF), tendo em

    consideração as gerações presentes e futuras. Nesse sentido,

    desobrigar os proprietários rurais da averbação da reserva florestal prevista no art. 16 do Código Florestal é o mesmo que esvaziar essa lei de seu conteúdo" (RMS 18.301/MG, 2ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 3.10.2005).

  12. Recurso ordinário em mandado de segurança provido, para que, nos atos de transmissão de imóveis rurais realizados perante o Ofício de Registro de Imóveis da Comarca de São Sebastião do Paraíso/MG, seja cumprida a norma prevista no § 8º do art. 16 do Código Florestal, a qual determina a averbação da área de reserva legal.

    (RMS 22.391/MG, 1ª T., Min. Denise Arruda, DJe de 03/12/2008) ADMINISTRATIVO. DIREITO AMBIENTAL. RESERVA LEGAL. ARTS 16 E 44 DA LEI Nº 7.771/65. NECESSIDADE DE AVERBAÇÃO.

  13. Nos termos do artigo 16 c/c art. 44 da Lei 7.771/65, impõe-se aos proprietários rurais a averbação da reserva legal à margem de matrícula do imóvel, ainda que não haja na propriedade área

    florestal ou vegetação nativa.

  14. Em suma, a legislação obriga o proprietário rural a manter e, eventualmente, recompor a fração da propriedade reservada por lei.

  15. "Essa legislação, ao determinar a separação de parte das

    propriedades rurais para constituição da reserva florestal legal, resultou de uma feliz e necessária consciência ecológica que vem tomando corpo na sociedade em razão dos efeitos dos desastres naturais ocorridos ao longo do tempo, resultado da degradação do meio ambiente efetuada sem limites pelo homem" (RMS 18.301/MG, Rel.

    Min. João Otávio de Noronha, DJU de 03.10.05).

  16. Recurso ordinário provido.

    (RMS 21.830/MG, 2ª T., Min. Castro Meira, DJ de 01/12/2008)

    ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO. AVERBAÇÃO DE RESERVA FLORESTAL. EXIGÊNCIA. CÓDIGO FLORESTAL. INTERPRETAÇÃO.

  17. O meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito que a Constituição assegura a todos (art. 225 da CF), tendo em

    consideração as gerações presentes e futuras. Nesse sentido,

    ...

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