Acordão nº 0095800-50.2009.5.04.0601 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 4 de Agosto de 2011

Número do processo0095800-50.2009.5.04.0601 (RO)
Data04 Agosto 2011
ÓrgãoTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Porto Alegre - RS) (Brasil)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da Vara do Trabalho de Ijuí, sendo recorrentes JAIR DE ALMEIDA E TRANSPORTES RODOVIÁRIOS LETSARA LTDA. e recorridos OS MESMOS.

Inconformadas com a sentença de procedência do feito, proferida pelo juiz Rogério Donizete Fernandes (fls. 156/160-carmim, complementada na fl. 167), dela recorrem as partes.

A reclamada recorre da condenação em horas extras, inclusive pela inobservância do intervalo entrejornadas do artigo 66 da CLT, aduzindo estar o reclamante sujeito ao instituto jurídico do artigo 62, I, da CLT. Por cautela, requer a redução da jornada arbitrada para efeito da condenação em horas extras.

O reclamante, por sua vez, renova o pleito do pagamento do adicional de periculosidade, argumentando que a aferição realizada no caminhão pelo INMETRO não diz propriamente com o tanque de combustível suplementar, mas com as alterações necessárias na documentação do veículo, relativamente ao chassi e ao peso. No que tange ao trabalho suplementar, requer a majoração da jornada arbitrada na origem. Também pede o deferimento do adicional noturno e do cômputo reduzido da hora noturna. Requer, ainda, o deferimento dos honorários assistenciais, indicando a juntada da credencial sindical após o término da instrução do feito.

Com contrarrazões, sobem os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

ISTO POSTO:

I - Recursos das partes (item comum)

1. Horas extras. Motorista carreteiro. Artigo 62, I, da CLT. A magistrada de origem concluiu pela viabiabilidade do controle da jornada de trabalho do reclamante, mesmo que de forma indireta, na medida em que havia previsão do tempo de viagem, utilização de tacógrafo e de rastreamento via satélite. Afastou a aplicação do artigo 62, I, da CLT, e entendeu pelo descumprimento da obrigação prevista no artigo 74, § 2º, da CLT. Atentando para o conjunto probatório dos autos, fixou a jornada média de trabalho cumprida pelo reclamante no horário das 7h às 22h, com duas horas de intervalo, considerado o labor em domingos e feriados, com o gozo de quatro dias de folga por mês, um em cada semana. Condenou a reclamada, portanto, ao pagamento de horas extras, assim consideradas as excedentes da 8ª diária e 44ª semanal, em razão da inexistência de acordo compensatório de horário. Deferiu, ainda, as horas suprimidas do intervalo previsto no artigo 66 da CLT, pela inobservância do descanso de 11 horas entrejornadas.

Inconformada, a reclamada recorre. Argumenta que o contrato de trabalho foi redigido sob a égide do artigo 62, I, da CLT, justamente por se tratar de atividade incompatível com a fixação de horário de trabalho, “haja vista que a reclamada nunca controlou a carga horária cumprida pelo reclamante, mesmo que indiretamente, desconhecendo totalmente os horários de trabalho”. Diz que a jornada acolhida em sentença é humanamente impossível de ser cumprida, aduzindo não ser crível a realização de trabalho superior a 13 horas/dia. Impugna os tacógrafos juntados pelo reclamante na fl. 137, afirmando terem sido eles selecionados, com o intuito de demonstrar extensa jornada. Repisa não ter controlado o horário do reclamante, tanto que sequer exigia que ele a apresentasse os tais tacógrafos. Invoca o entendimento versado na OJ 332 da SDI-I do TST. Esclarece a finalidade da utilização de equipamento de rastreador, dizendo constituir exigência da seguradora, a fim de localizar a carga e o veículo de roubo ou furto. Sustenta que o reclamante tinha liberdade para cumprir sua carga horária, escolhendo “ao seu alvedrio a jornada de trabalho”, e assevera inexistente comprovação do controle indireto do horário. Transcreve trecho do depoimento da testemunha Julio Cesar Guisso, a fim de demonstrar a liberdade do motorista quanto ao cumprimento da jornada. Diz que as previsões de tempo de viagem constituem mera estimativa de tempo que normalmente os caminhões demoravam para percorrer determinado trajeto, circunstância que afirma incapaz de elidir a aplicação do artigo 62, I, da CLT. Relata imprescindível o agendamento para a chegada do caminhão na aduana, não constituindo fator de controle de jornada de trabalho. Relativamente à jornada arbitrada, por cautela, requer sua redução para o labor de 8 horas, sem pagamento de horas extras e intervalo entrejornadas, por compatível com a prova produzida. Ainda subsidiariamente, pede a fixação da jornada em 10 horas, entre as 7h às 19h, com intervalo de duas horas para alimentação.

O reclamante, por sua vez, vindica o aumento da jornada arbitrada, pretendendo seja ela fixada das 6h às 23h, com dois intervalos intrajornadas de 30 minutos cada, inclusive em domingos e feriados, além do labor durante toda a noite, duas vezes na semana. Baseado no aludido horário, pleiteia também o adicional noturno e o cômputo reduzido da hora noturna. Transcreve trechos da prova oral, a fim de comprovar suas alegações.

Ambos os recursos merecem parcial acolhida.

O contrato de trabalho em exame vigeu de 05.05.2004 a 09.05.2009, desempenhando o reclamante a função de motorista carreteiro. Suas tarefas eram exercidas externamente, atuando no transporte rodoviário de cargas interestadual e internacional, conforme objeto social da empresa ré à fl. 13.

Nos termos do artigo 62, I, da CLT, os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho não estão abrangidos pelo regime de duração normal da jornada. Entendo que esse dispositivo não tem o escopo de afastar o direito à satisfação das horas extras para aqueles empregados que, apesar de realizarem atividades externas, podem ser fiscalizados, ainda que indiretamente, pelo empregador. O trabalho externo que exclui a limitação de sua duração é aquele que permite ao prestador de serviços liberdade para prestá-los quando lhe for mais conveniente, sem possibilidade de controle pelo empregador. E ainda que a condição de trabalho externo tenha sido registrada na ficha de registro de empregado (fl. 27-verso) e no acordo de horário (fl. 29-carmim), estes elementos formais não impedem a sujeição do reclamante ao capítulo relativo ao controle de horário, pois prevalecente a verdade real revelada nos autos.

Seguindo este raciocínio, vejo que, embora a reclamada não efetivasse o controle da jornada, havia a possibilidade de fazê-lo, pelo que entendo inaplicável a regra de exceção do artigo 62, I, da CLT.

Com sede no Estado do Rio Grande do Sul, mais precisamente na cidade de Ijuí, a reclamada concedia cargas para serem transportadas pelo reclamante com destino nacional, como, por exemplo, para os Estados de São Paulo, Mato Grosso e Minas Gerais, e internacional, como para a Argentina. Segundo a prova oral, o percurso comum do autor era realizado entre São Paulo e a Argentina, demandando em torno de 15 dias para os trechos de ida e de volta e permitindo efetuar duas viagens por mês.

A demora da viagem, que fazia com que o autor permanecesse afastado da sede da empresa por 15 dias ou mais, não inviabilizou a possibilidade do controle da jornada pela demandada. A começar pelo depoimento pessoal do preposto, segundo o qual a presença do rastreador do veículo era imprescindível para o transporte da mercadoria, e mesmo que o autor organizasse o seu horário, havia “uma previsão de tempo médio de viajem para se ter uma previsão de chegada e essa previsão de chegada é acompanhada pelo pessoal operacional da reclamada (grifei - fl. 147).

As quatro testemunhas ouvidas, duas a convite de cada parte, confirmaram que havia previsão de horário de chegada da mercadoria, existindo também o rastreamento do caminhão, inclusive com indicação dos postos de gasolina em que o motorista deveria parar para pernoitar. Além de as testemunhas corroborarem a extrapolação da jornada de trabalho para além das oito horas, revelam que o sistema de rastreamento era realizado por quatro “funcionários” da empresa, circunstância que não só promovia a segurança do caminhão e da carga, mas também permitia que o empregador aferisse o tempo de percurso e de parada do empregado, circunstância suficiente para viabilizar o controle da duração da jornada de trabalho. Nesse sentido são as declarações das testemunhas, cujos trechos destaco:

Testemunha Julio Cesar Guisso (trazida pelo reclamante) - "que trabalhou para a reclamada de 2003 a novembro de 2006, como motorista; que trabalhou com o reclamante, sendo que ambos eram motoristas de caminhões-carreta, fazendo viagens da Argentina para São...

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