Acórdão nº HC 198113 / CE de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoHC 198113 / CE
Data07 Junho 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 198.113 - CE (2011⁄0036411-7)

RELATOR : MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)
R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
IMPETRANTE : G.W.M.
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO
PACIENTE : E A C F
ADVOGADO : PAULO CÉSAR FEITOSA ARRAIS E OUTRO(S)
PACIENTE : L C F P

EMENTA

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. SONEGAÇÃO FISCAL. USURA. FUNCIONAMENTO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEM AUTORIZAÇÃO. (1) PAGAMENTO DO TRIBUTO ANTES DO OFERECIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. MATÉRIA NÃO TRATADA NA ORIGEM. COGNIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. (2) PRESCRIÇÃO DA AÇÃO PENAL. FEITO AINDA NA FASE INVESTIGATÓRIA. ANÁLISE DELICADA: AUSÊNCIA DE ENQUADRAMENTO TÍPICO - TAREFA QUE INCUMBE AO MINISTÉRIO PÚBLICO (MODELO ACUSATÓRIO). IMPETRAÇÃO DEFICIENTEMENTE INSTRUÍDA. AUSÊNCIA DE CERTIDÕES DE ANTECEDENTES CRIMINAIS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AUSÊNCIA.

  1. Tema não levado a debate no Tribunal a quo (extinção da punibilidade, relativa ao crime de sonegação fiscal, pelo pagamento do tributo) não pode ser enfrentado por esta Corte Superior, sob pena de supressão de instância.

  2. O reconhecimento da prescrição ainda na fase de inquérito é tarefa das mais delicadas, diante da ausência de enquadramento típico promovido pelo Ministério Público, titular da ação penal pública - apanágio do sistema acusatório. Para que se possa decretar a extinção da punibilidade, em tal contexto, é imperioso que o impetrante promova a devida instrução do writ; contudo, deixou-se de apresentar, por exemplo, a certidão de antecedentes criminais dos pacientes. In casu, na imputação de usura, a reincidência funciona como majorante, que deve ser considerada para o cálculo da prescrição; ademais, sendo dois os pacientes, há a possibilidade de incidência da majorante do concurso de agentes que, vindo a ensejar incremento, menor que seja, implicará a prescrição em oito anos - lapso que não foi alcançado. Na espécie, também, não se implementou a prescrição em relação aos delitos de sonegação fiscal e funcionamento de instituição financeira sem autorização.

  3. Ordem denegada.

    ACÓRDÃO

    "Prosseguindo no julgamento após o voto-vista da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, conhecendo parcialmente do pedido e, nesta extensão, denegando a ordem, no que foi acompanhada pelos Srs. Ministros Og Fernandes e V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS), a Turma, por maioria, conheceu parcialmente da ordem de habeas corpus e, nesta parte, a denegou, nos termos do voto da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, que lavrará o acórdão. Vencido o Sr. Ministro Relator, que a concedia parcialmente"Votaram com a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura os Srs. Ministros Og Fernandes e V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS).

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília, 07 de junho de 2011(Data do Julgamento)

    Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

    Relatora

    HABEAS CORPUS Nº 198.113 - CE (2011⁄0036411-7)

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE): Cuida-se de habeas corpus impetrado em favor de E. A. C. F e L. C. F. P., apontando-se como autoridade coatora o Tribunal Federal da 5ª Região.

    Pretende-se o trancamento do inquérito policial, instaurado para apurar a suposta prática dos crimes previstos nos arts. 13 do Decreto nº 22.626⁄1933 (Lei da Usura), 16 da Lei nº 7.492⁄1986 (Crime contra o Sistema Financeiro Nacional) e art. 1º da Lei nº 8.137⁄1990 (Crime contra a ordem tributária), pela ocorrência da prescrição da pretensão punitiva nos dois primeiros delitos e por falta de justa causa no que diz respeito ao crime contra a ordem tributária.

    A liminar foi indeferida à fl. 877.

    Dispensadas as informações, a douta Subprocuradoria-Geral da República, ao manifestar-se (fls. 882⁄886), opinou pela denegação da ordem.

    É o relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 198.113 - CE (2011⁄0036411-7)

    VOTO VENCIDO

    O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE) (RELATOR): Tenho que o pedido comporta parcial provimento.

    Ao denegar a impetração originária, no que interessa, disse o acórdão atacado:

    O Paciente está a ser investigado pelos crimes previstos no art. 13, do Decreto nº 22.626⁄1933 (agiotagem), no art. 16, da Lei nº 7.492⁄86 (operação sem autorização legal de instituição financeira) e no art. 1º, I, da Lei nº 8.137⁄90 (sonegação fiscal) isto porque, como particular (pessoa física) e como sócio da empresa ‘Ferraz Factoring Ltda’, estaria praticando (ou teria praticado) agiotagem, crimes contra a ordem financeira, e sonegação de tributos federais.

    Embora tenha determinado a suspensão do Inquérito Policial por medida de cautela, com as informações advindas da Autoridade Impetrada, entendo que deva ser dada continuidade ao procedimento investigativo penal.

    As informações prestadas pela Autoridade Impetrada indicam que os fatos não se restringiram apenas ao ano de 2002, conforme alegado pelos Impetrantes, estendendo-se ainda no decorrer de anos seguintes, até o ano de 2005, estando os fatos ainda no estágio inicial de investigação, quando então será verificada a real extensão dos fatos havidos como delituosos.

    Segundo as ditas informações, foi constatado que o Paciente e sua sócia na empresa ‘Ferraz Factoring Ltda’, possuíam um vasto patrimônio, incompatível com as suas atividades profissionais, e com as declarações prestadas à Receita Federal.

    De acordo com as ditas informações '... podemos citar, apenas a título de exemplo, o LAUDO DE EXAME FINANCEIRO nº 1005⁄2010 – SETEC⁄SR⁄DPF⁄CE (fls. 693⁄714 – em anexo), no qual consta que, em relação à empresa F.F.L., 'ocorreram créditos bancários de R$ 161.271,35 e R$ 368.917,08 nos anos de 2004 e 2005, respectivamente, sendo incompatível com a ausência de receitas declaradas para estes exercícios'. Consta também, quanto à pessoa física de EUGÊNIO ALVES CALVALCANTE FERRAZ, que 'observa-se incompatibilidade entre créditos bancários e rendimentos declarados para o ano de 2001, 2002, 2003 e 2005, com destaque para o ano de 2002 onde os rendimentos declarados representam apenas 42,85% dos ingressos de valores nas contas do investigado' – fls. 71 e 78⁄80.

    Além disso, há depoimentos no Inquérito Policial que o ora Paciente '... se utiliza de um laranja de nome 'PAULO ROBERTO DE AGUIAR SANTOS' o qual “atua como exequente ou como testemunha nas diversas execuções no interesse de EUGÊNIO”, disse, ainda, 'QUE EUGÊNIO é muito conhecido como agiota na cidade de Fortaleza⁄CE' – fls. 72.

    Também o já referido LAUDO DE EXAME FINANCEIRO nº 1005⁄2010 esclareceu que, quanto ao Paciente, '... há 'incompatibilidade entre créditos bancários e rendimentos declarados para os anos de 2001, 2002, 2003 e 2005, com destaque para o ano de 2002, onde os rendimentos declarados representam apenas 42,85% dos ingressos de valores nas contas do investigado' – fls. 80.

    Assim, embora as investigações iniciais do Inquérito Policial tenham constatado a possível prática delituosa até os anos de 2005, nada impede que, com a continuidade das investigações, que se encontram em aberto com a quebra de sigilo da empresa, e dos seus sócios, já decretada, e com perícias contábeis a serem realizadas, possa verificar-se o prosseguimento das atividades delituosas pelos anos seguintes.

    Então, não houve, na verdade, um único fato isolado, ocorrido em 2002, tal como alegou o Paciente, o que levou à contagem do prazo prescricional do dia em que o crime se consumou (art. 111, I, do Código Penal) no momento do deferimento da liminar.

    Na verdade, houve a permanência dos delitos, sendo constatada na etapa inicial das investigações policiais a continuidade dos fatos, até o ano de 2005, podendo, como esclarece a Autoridade Impetrada, ter continuidade até os dias atuais, inexistindo prova da cessação das atividades delituosas.

    Incide, no caso, o disposto no Inc. III, do art. 111, do Código Penal:

    'Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:

    (...)

    III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;'

    Ainda não constatada a cessação dos delitos, não há como iniciar a contagem do prazo prescricional, especialmente no que tange ao crime previsto no art. 13, do Decreto n º 22.626⁄1933 (agiotagem).

    No concernente ao crime previsto no art. 16, da Lei nº 7.492⁄86 (funcionamento irregular de instituição financeira), a pena máxima é de 04 (quatro) anos, e o prazo prescricional acha-se previsto no art. 109, IV da Lei Penal básica, que o estabelece em 08 (oito) anos.

    Tendo os fatos delituosos estendido-se, supostamente, até o ano de 2005, e sendo o prazo prescricional de 08 (oito) anos (art. 109, IV, do CP), ainda não transcorreu, até a data atual (2011) o lapso temporal necessário à extinção da punibilidade pela prescrição em abstrato.

    Finalmente, no tocante ao ilícito previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8.137⁄90 (sonegação fiscal), ainda não se pode considerar iniciada, sequer, a contagem do prazo prescricional.

    O col. Supremo Tribunal Federal – STF já se posicionou no sentido de que, enquanto não se constituir o crédito tributário, tal como previsto no art. 1º da Lei nº 8.137⁄90, também não há fluência do prazo prescricional, que só se iniciará com a consumação do delito, ou seja, com o exaurimento do procedimento administrativo fiscal.

    Tal fato também se acha posto na Súmula Vinculante nº 24 do STF: 'não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137⁄90, antes do lançamento definitivo do tributo'.

    De acordo com a documentação trazida aos autos pela Autoridade impetrada, os procedimentos: a) investigativo; b) e o administrativo fiscal para a verificação do montante do crédito tributário suprimido pelo ora Paciente, não tendo havido, ainda, o dies a quo do prazo prescricional.

    Existindo indícios da autoria e da materialidade delitiva, bem como a descrição básica da conduta do Investigado, ora Paciente, de forma a permitir a sua defesa dos fatos,...

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