Acórdão nº REsp 1185374 / RJ de T4 - QUARTA TURMA

Número do processoREsp 1185374 / RJ
Data16 Junho 2011
ÓrgãoQuarta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.374 - RJ (2010⁄0048358-2)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
R.P⁄ACÓRDÃO : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : S.C.D.T.F.S.
ADVOGADO : JOÃOC.M.F.L. E OUTRO(S)
RECORRIDO : A.C.D.J.E. E OUTRO
ADVOGADO : JOÃO TANCREDO E OUTRO(S)
RECORRIDO : F.C.F.D.T.U.
ADVOGADO : L.S.D.S. E OUTRO(S)
RECORRIDO : C.E.D.E.D.T. E LOGÍSTICA CENTRAL
ADVOGADO : MARIA DO SOCORRO SUKY OLIVEIRA CONTRUCCI

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RECURSO ESPECIAL RETIDO. REITERAÇÃO. CONCESSÃO DE EXPLORAÇÃO DE SERVIÇO DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO DE PASSAGEIROS. SUPERVIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE SUCESSÃO EMPRESARIAL.

  1. Nos termos do § 3º do art. 542 do Código de Processo Civil, é obrigatória a reiteração do recurso especial retido. Na hipótese, embora feita de forma deficiente, houve reiteração que atendeu à finalidade da norma e ao prazo legal, por ocasião da interposição do recurso especial contra a decisão final.

  2. Não há falar em ofensa ao art. 535 do CPC, tendo em vista que o julgado abordou todas as questões necessárias à integral solução da lide, mesmo sem ter examinado individualmente cada uma das matérias levantadas pela parte vencida, não havendo, portanto, cogitar de sua nulidade.

  3. A concessionária de serviço de transporte ferroviário de passageiros SUPERVIA é parte ilegítima para responder por ilícito ocorrido na época em que a prestadora dos serviços era a FLUMITRENS. O próprio Acórdão recorrido registra a inexistência de cláusula no contrato de concessão que responsabilize a nova concessionária pelas contingências da anterior, o que, em regra, não enseja a sucessão empresarial.

  4. Recursos especiais conhecidos e providos.

    ACÓRDÃO

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Raul Araújo, conhecendo e dando provimento ao recurso, divergindo do relator, no que foi acompanhado pelos M.M.I.G. e João Otávio de Noronha, a Quarta Turma, por maioria, decide conhecer e dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto divergente do Ministro Raul Araújo, que lavrará o acórdão. Vencido o relator, Ministro Luis Felipe Salomão, que não conhecia do recurso. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira.

    Brasília, 16 de junho de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO RAUL ARAÚJO

    Relator para acórdão

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.185.374 - RJ (2010⁄0048358-2)

    RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
    RECORRENTE : S.C.D.T.F.S.
    ADVOGADO : JOÃOC.M.F.L. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : A.C.D.J.E. E OUTRO
    ADVOGADO : JOÃO TANCREDO E OUTRO(S)
    RECORRIDO : F.C.F.D.T.U.
    ADVOGADO : L.S.D.S. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : C.E.D.E.D.T. E LOGÍSTICA CENTRAL
    ADVOGADO : MARIA DO SOCORRO SUKY OLIVEIRA CONTRUCCI

    VOTO VENCEDOR

    O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO:

    Na última sessão, pedi vista dos autos para analisar a possibilidade de conhecimento do recurso especial retido, no qual se veicula a ilegitimidade passiva ad causam da SUPERVIA.

    O eminente Relator, Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, nesse ponto, concluiu pelo não conhecimento do recurso retido, porquanto não teria havido sua expressa reiteração, na forma do art. 542, § 3º, do Estatuto Processual Civil, por ocasião da interposição do presente recurso especial - este apresentado contra decisão final do colendo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. Desse modo, entendeu configurada a preclusão consumativa a obstar o conhecimento do recurso retido.

    Após o exame dos autos, contudo, chego a conclusão diversa, com a devida vênia do eminente Relator.

    Verifica-se que, em audiência de conciliação, o d. Juízo a quo proferiu decisão rejeitando a preliminar de ilegitimidade passiva da SUPERVIA CONCESSIONÁRIA DE TRANSPORTE FERROVIÁRIO S⁄A, integrada por decisão em embargos declaratórios (fls. 48⁄49). A seguir, a ora recorrente apresentou agravo de instrumento (fls. 351⁄364), o qual, no entanto, restou improvido pelo c. Tribunal de Justiça estadual, nos termos da ementa a seguir transcrita:

    "Agravo de instrumento.

    Responde a Supervia pelas obrigações resultantes de atos ilícitos ocorridos anteriormente à sua posse no serviço ferroviário.

    'Legitimidade passiva. Concessionária de transporte ferroviário. Responsabilidade Civil. Transferência de patrimônio.

    A empresa que recebe o patrimônio da anterior concessionária e continua na exploração da mesma atividade responde pela dívida judicial já constituída antes da alienação.

    Recurso conhecido e provido.' (REsp 399.569-RJ - STJ - 4ª Turma - v.h. - Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar)

    Agravo de instrumento a que se nega provimento." (fl. 455)

    Em face desse acórdão, a SUPERVIA interpôs recurso especial (fls. 581⁄586), alegando ofensa ao art. 229 da Lei 6.404⁄76 e, assim, pleiteando o reconhecimento de sua ilegitimidade passiva ad causam para responder por ação de reparação de danos materiais e morais decorrentes de acidente em transporte ferroviário de responsabilidade da anterior concessionária, FLUMITRENS. Afirmou, ademais, que a SUPERVIA "não é sucessora da empresa estatal Flumitrens - que continua em pleno vapor, explorando parcela significativa de transporte ferroviário urbano de passageiros -, não pode a Supervia responder por obrigações anteriores ao seu contrato de concessão, isto é por danos causados exclusivamente pela Flumitrens".

    Foi determinada a retenção do referido recurso especial, nos termos do § 3º do art. 542 do Código de Processo Civil (fl. 590).

    Na sequência, houve a prolação de sentença (fls. 488⁄493) e de acórdão em apelação, ambos reconhecendo a responsabilidade da SUPERVIA, da CENTRAL e da FLUMITRENS pelos danos morais e materiais decorrentes da morte do marido e pai das recorridas, A.C.D.J.E. e OUTRO. Surgiu, então, decisão final impugnada por novo recurso especial da SUPERVIA, o presente REsp 1.185.374⁄RJ, aqui em exame.

    Nesse recurso especial (fls. 667⁄674), com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, a SUPERVIA, ainda que não tenha reiterado expressamente o recurso especial retido, renovou, em suas razões, a tese, suscitada no retido, de ilegitimidade passiva ad causam e, nesse contexto, sustentou novamente a violação ao art. 229 da Lei 6.404⁄76. Argumentou, para tanto, in verbis:

    "No caso, o aresto recorrido aplicou, na espécie, ainda que, implicitamente, o art. 229 da Lei n.º 6.404⁄76 (que trata de cisão), onde ele não poderia incidir contra a recorrente, já que a SUPERVIA (3ª ré) - também condenada solidariamente - não se confunde com a FLUMITRENS (1ª ré) e CENTRAL (2ª ré e verdadeira sucessora da FLUMITRENS), conforme se comprovou na apelação interposta pela recorrente.

    A SUPERVIA, ora recorrente, não é sucessora da FLUMITRENS, nem da CENTRAL (verdadeira sucessora da FLUMITRENS), bem como não absorveu parcela do patrimônio destas, tratando-se de empresas sem ligação com a recorrente - que continuam em pleno vapor, explorando parcela significativa de transporte ferroviário urbano de passageiros -, não podendo a SUPERVIA, por conseguinte, responder por obrigação (acidente datado de 1995) anterior ao seu contrato de concessão." (fls. 672⁄673)

    Nota-se, pois, que, no presente recurso especial, houve repetição das razões do recurso especial retido, embora a ora recorrente não tenha expressamente requerido sua ratificação. Com efeito, a SUPERVIA, além de alegar ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, reproduziu os fundamentos de ilegitimidade passiva ad causam e de ofensa ao art. 229 da Lei das S⁄A, alcançando, assim, a finalidade de reiteração das razões do recurso retido, conforme exigência do § 3º do art. 542 do mesmo diploma processual, o qual dispõe:

    "Art. 542 (...)

    § 3º O recurso extraordinário, ou o recurso especial, quando interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar ou embargos à execução ficará retido nos autos e somente será processado se o reiterar a parte, no prazo para a interposição do recurso contra a decisão final, ou para as contrarrazões." (grifo nosso)

    Desse modo, entendo que a melhor interpretação a ser dada é no sentido de aceitar que a ratificação do recurso retido, embora feita de forma deficiente, atendeu à finalidade da norma e ao prazo previsto para a interposição do recurso especial contra decisão final.

    O que importa é a finalidade do ato, ou seja, se puder atingir seu objetivo, ainda que irregular na forma, deve ser tido como válido. Entendo, portanto, que devem prevalecer os princípios da instrumentalidade das formas e do aproveitamento dos atos processuais.

    Na hipótese em exame, embora não haja pedido expresso de reiteração das razões do recurso retido, não se pode olvidar que a finalidade de ratificação foi atingida.

    A propósito, a lição de Cândido Rangel Dinamarco (in Instituições de Direito Processual Civil, Vol. II, 5ª ed., São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 600⁄601), in verbis:

    "A consciência de que as exigências formais do processo não passam de técnicas destinadas a impedir abusos e conferir certeza aos litigantes (due process of law), manda que elas não sejam tratadas como fins em si mesmas, senão como instrumentos a serviço de um fim. Cada ato processual tem um fim, ou escopo específico, e todos eles em conjunto têm o escopo de produzir uma tutela jurisdicional justa, mediante um processo seguro. Tal é a idéia da instrumentalidade das formas processuais, que se associa à liberdade das formas e à não-taxatividade das nulidades, na composição de um sistema fundado na razão e na consciência dos escopos a realizar. Em primeiro lugar, na própria configuração do ato a lei deixa certa margem de liberdade aos sujeitos processuais (princípio da liberdade: supra, nn. 89 e 674); ao definir as conseqüências da inobservância da forma, renuncia ao enunciado de um rol taxativo, limitando-se a cominar umas poucas nulidades e preferindo deixar que a identificação de todas as outras se faça mediante o inteligente confronto entre o fato e o modelo a ser reproduzido nele (não-taxatividade); finalmente, manda que nesse confronto se tenha em conta o escopo e jamais se afirme a nulidade quando este houver sido atingido (instrumentalidade das formas)....

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