Acórdão nº HC 177566 / MS de T5 - QUINTA TURMA
Data | 18 Agosto 2011 |
Número do processo | HC 177566 / MS |
Órgão | Quinta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil) |
HABEAS CORPUS Nº 177.566 - MS (2010⁄0118592-8)
RELATOR | : | MINISTRO JORGE MUSSI |
IMPETRANTE | : | A.R.D.S. |
ADVOGADO | : | IRAN PEREIRA DA COSTA NEVES - DEFENSOR PÚBLICO |
IMPETRADO | : | TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL |
PACIENTE | : | A.R.D.S. |
ADVOGADO | : | ROBSON DE SOUZA - DEFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO |
EMENTA
HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO PRIVILEGIADO E QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. APLICAÇÃO DOS ARTS. 420 E 457 DO CPP COM A ALTERAÇÃO PROMOVIDA PELA LEI Nº 11.689⁄08. NORMA DE NATUREZA PROCESSUAL. APLICAÇÃO IMEDIATA.
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No âmbito do direito processual penal, quando se fala em aplicação da lei no tempo, vige o princípio do efeito imediato, representado pelo brocardo latino tempus regit actum, conforme previsão contida no artigo 2º do Código de Processo Penal.
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O art. 420, parágrafo único, do CPP, alterado pela Lei 11.689 de 9⁄6⁄08 – que permite a citação por edital do réu solto que não for encontrado –, bem como o art. 457 do CPP, alterado, também, com a edição e entrada em vigor da Lei 11.689 de 9⁄6⁄08 – que deixou de exigir a presença do acusado na sessão plenária para que esta se realize – tratam-se de normas de natureza processual, motivo pelo qual devem ser aplicadas de forma imediata sobre os atos processuais pendentes.
DOSIMETRIA. FUNDAMENTAÇÃO. CONCURSO DE CIRCUNSTÂNCIAS LEGAIS. PREPONDERÂNCIA. CONSTRUÇÃO DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL RECONHECIDO. NOVA FIXAÇÃO DA PENA.
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A revisão da pena imposta pelas instâncias ordinárias via habeas corpus é possível, mas somente em situações excepcionais, de manifesta ilegalidade ou abuso de poder reconhecíveis de plano, sem maiores incursões em aspectos circunstanciais ou fáticos e probatórios.
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No que concerne à aplicação da pena-base, é inegável que ao sentenciante é reservada uma larga margem de discricionariedade. Entretanto, não se trata de discricionariedade livre, e, sim, vinculada, devendo o togado singular guiar-se pelos oito fatores indicativos relacionados no caput do art. 59 do Código Penal, a saber: culpabilidade; antecedentes; conduta social; personalidade do agente; motivos, circunstâncias e conseqüências do crime; e comportamento da vítima, e indicar, especificamente, dentro destes parâmetros, os motivos concretos pelos quais considera favoráveis ou desfavoráveis as circunstâncias judiciais, fixando a pena-base conforme seja suficiente para a reprovação e prevenção do delito denunciado.
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No caso, infere-se que a Corte originária, houve por bem, e motivadamente, como lhe obriga o previsto no art. 93, IX, da CF⁄88, manter a sentença condenatória.
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Tendo a decisão impugnada asseverado que a condição de cônjuge da vítima foi "motivo determinante do crime", não há o que se falar, neste momento e por esta via, em sentido contrário.
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A doutrina majoritária e a jurisprudência dos Tribunais Superiores definiram que há uma escala de preponderância inclusive em relação as hipóteses previstas no artigo 67 do Código Penal, sendo assim apresentada na ordem decrescente: 1º - menoridade (personalidade do agente); 2º - reincidência; 3º - confissão (personalidade do agente); e 4º - motivos determinantes.
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Deve, portanto, preponderar a atenuante da personalidade (confissão) sobre a agravante do motivo determinante do crime (contra a cônjuge).
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Ordem parcialmente concedida para reduzir a pena restritiva de liberdade para 8 (oito) anos de reclusão, mantidos os demais termos da sentença condenatória.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder parcialmente a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ⁄RJ), Gilson Dipp e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 18 de agosto de 2011. (Data do Julgamento).
MINISTRO JORGE MUSSI
Relator
HABEAS CORPUS Nº 177.566 - MS (2010⁄0118592-8)
IMPETRANTE : A.R.D.S. ADVOGADO : IRAN PEREIRA DA COSTA NEVES - DEFENSOR PÚBLICO IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL PACIENTE : A.R.D.S. ADVOGADO : ROBSON DE SOUZA - DEFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO RELATÓRIO
O SENHOR MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em favor de A.R.D.S., apontando como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul (Apelação Criminal n. 2010.003817-2⁄0000-00).
Noticiam os autos que o paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 1 (um) mês de reclusão, no regime inicialmente semi-aberto, imposta pela prática da conduta descrita no artigo 121, §§ 1º e 2º, inciso IV, do Código Penal. Contra esta decisão a defesa se insurgiu por meio de recurso de apelação criminal para o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, ao qual foi negado provimento. O recurso da acusação foi provido para definir o regime prisional inicial como fechado.
Sustenta o impetrante que o constrangimento ilegal suportado pelo paciente residiria na alegada nulidade do julgamento ao qual foi submetido perante o Tribunal do Júri, aduzindo que este não teria sido validamente intimado acerca da data designada pelo juízo singular.
Assere que a interpretação dada pelo magistrado singular ao disposto nos artigos 420 e 457 do Código de Processo Penal, com a alteração realizada com o advento da Lei n. 11.689⁄08 - os quais autorizam o julgamento de crimes dolosos contra a vida sem a presença do acusado solto na respectiva sessão -, estaria em desacordo com princípios processuais garantidos na Constituição Federal, asseverando que a exceção - intimação por edital - não pode ser tomada como regra - intimação pessoal.
Alega, ainda, que os dispositivos introduzidos no ordenamento jurídico com o advento da citada novel legislação não poderiam ser aplicados à hipótese em apreço, já que dotados de natureza mista - de direito processual e material -, razão pela qual, por se mostrarem mais gravosas ao acusado, seriam desprovidos de retroatividade.
Aponta, também, ofensa ao princípio da individualização da pena e da obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais, argumentando existir desproporcionalidade entre a atenuação da pena imposta ao paciente, em razão da reconhecida confissão espontânea, e do aumento operado por ocasião do reconhecimento da agravante do crime cometido contra cônjuge.
Pretende, liminarmente, a anulação da sentença condenatória no que diz respeito à dosimetria da pena operada, bem como a suspensão dos efeitos do acórdão objurgado até o julgamento do mérito da impetração, no qual requer a confirmação do pleito liminar.
Documentação juntada aos autos (e-STJ fls. 14 a 79).
A liminar foi indeferida, em 18.08.10 (e-STJ 85 a 86).
Informações prestadas (e-STJ fls. 92 a 109).
A douta Subprocuradoria-Geral da República opinou pela parcial concessão da ordem (e-STJ fls. 113 a 116).
É o relatório.
HABEAS CORPUS Nº 177.566 - MS (2010⁄0118592-8)
VOTO
O SENHOR MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Conforme relatado, busca-se, no presente writ, a anulação da sentença condenatória.
Colhe-se dos autos que o paciente foi condenado à pena de 8 (oito) anos e 1 (um) mês de reclusão, no regime inicialmente fechado, imposta pela prática da conduta descrita no artigo 121, §§ 1º e 2º, inciso IV, do Código Penal.
Pois bem.
Inicialmente, sem razão o impetrante em relação a alegada nulidade do julgamento ao qual o paciente foi submetido perante o Tribunal do Júri, aduzindo que este não teria sido validamente intimado acerca da data designada pelo juízo singular.
Com efeito, certo é que no âmbito do direito processual penal, quando se fala em aplicação da lei no tempo, vige o princípio do efeito imediato, representado pelo brocardo latino tempus regit actum, conforme previsão contida no artigo 2º do CPP, in verbis:
"Art. 2º A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior."
A respeito do aplicação da lei processual penal, Guilherme de Souza Nucci aduz que:
A regra é que ela seja aplicada tão logo entre em vigor e, usualmente, quando é editada, nem mesmo vacatio legis possui, justamente por ser norma que não implica na criminalização de condutas, inexigindo período de conhecimento da sociedade. Passa, assim, a valer imediatamente (tempus regit actum), colhendo processos em pleno desenvolvimento, embora não afete atos já realizados sob a vigência de lei anterior. (Código de Processo Penal Comentado. 9ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 68).
Nessa ordem de idéias, portanto, observa-se que o art. 420, parágrafo único, do CPP, alterado com a edição e entrada em vigor da Lei 11.689 de 9⁄6⁄08 – que permite a citação por edital do réu solto que não for encontrado –, bem como o art. 457 do CPP, alterado com a edição e entrada em vigor da Lei 11.689 de 9⁄6⁄08 – que deixou de exigir a presença do acusado na sessão plenária para que esta se realize – ao contrário do aventado no mandamus, tratam-se de normas de natureza processual, motivo pelo qual deve ser aplicada de forma imediata sobre os atos processuais pendentes.
Sobre as modificações trazidas pela legislação em comento insta destacar o posicionamento doutrinário de Marcellus Polastri Lima:
Mas a grande novidade, sem dúvida, é a possibilidade da realização do julgamento sem a presença do acusado.
É que, no sistema anterior o réu deveria estar presente, sendo o delito inafiançável, pois, caso não tivesse sido localizado para intimação da pronúncia, o feito ficaria sobrestado, até a localização do réu, e mesmo se fosse intimado o acusado, se não comparecesse ao julgamento, este não poderia se realizar.
Agora, como se viu anteriormente, é possível a intimação editalícia da decisão de pronúncia, ficando o réu de qualquer forma intimado e, assim, poderá ser feito seu julgamento à revelia
(Manual de Processo Penal. 2.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 771 e 772).
Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente:
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