Acórdão nº REsp 1251000 / MG de T3 - TERCEIRA TURMA

Número do processoREsp 1251000 / MG
Data23 Agosto 2011
ÓrgãoTerceira Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.251.000 - MG (2011⁄0084897-5)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : R R F
ADVOGADO : L.F.V.N. E OUTRO(S)
RECORRIDO : A M P J DE S
ADVOGADO : GLEICYANE C P J SANDANHA
INTERES. : R R J

EMENTA

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. GUARDA COMPARTILHADA. CONSENSO. NECESSIDADE. ALTERNÂNCIA DE RESIDÊNCIA DO MENOR. POSSIBILIDADE.

  1. Ausente qualquer um dos vícios assinalados no art. 535 do CPC, inviável a alegada violação de dispositivo de lei.

  2. A guarda compartilhada busca a plena proteção do melhor interesse dos filhos, pois reflete, com muito mais acuidade, a realidade da organização social atual que caminha para o fim das rígidas divisões de papéis sociais definidas pelo gênero dos pais.

  3. A guarda compartilhada é o ideal a ser buscado no exercício do Poder Familiar entre pais separados, mesmo que demandem deles reestruturações, concessões e adequações diversas, para que seus filhos possam usufruir, durante sua formação, do ideal psicológico de duplo referencial.

  4. Apesar de a separação ou do divórcio usualmente coincidirem com o ápice do distanciamento do antigo casal e com a maior evidenciação das diferenças existentes, o melhor interesse do menor, ainda assim, dita a aplicação da guarda compartilhada como regra, mesmo na hipótese de ausência de consenso.

  5. A inviabilidade da guarda compartilhada, por ausência de consenso, faria prevalecer o exercício de uma potestade inexistente por um dos pais. E diz-se inexistente, porque contrária ao escopo do Poder Familiar que existe para a proteção da prole.

  6. A imposição judicial das atribuições de cada um dos pais, e o período de convivência da criança sob guarda compartilhada, quando não houver consenso, é medida extrema, porém necessária à implementação dessa nova visão, para que não se faça do texto legal, letra morta.

  7. A custódia física conjunta é o ideal a ser buscado na fixação da guarda compartilhada, porque sua implementação quebra a monoparentalidade na criação dos filhos, fato corriqueiro na guarda unilateral, que é substituída pela implementação de condições propícias à continuidade da existência de fontes bifrontais de exercício do Poder Familiar.

  8. A fixação de um lapso temporal qualquer, em que a custódia física ficará com um dos pais, permite que a mesma rotina do filho seja vivenciada à luz do contato materno e paterno, além de habilitar a criança a ter uma visão tridimensional da realidade, apurada a partir da síntese dessas isoladas experiências interativas.

  9. O estabelecimento da custódia física conjunta, sujeita-se, contudo, à possibilidade prática de sua implementação, devendo ser observada as peculiaridades fáticas que envolvem pais e filho, como a localização das residências, capacidade financeira das partes, disponibilidade de tempo e rotinas do menor, além de outras circunstâncias que devem ser observadas.

  10. A guarda compartilhada deve ser tida como regra, e a custódia física conjunta - sempre que possível - como sua efetiva expressão.

  11. Recurso especial não provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, P. deT.S. e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.

    Brasília (DF), 23 de agosto de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    Relatora

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.251.000 - MG (2011⁄0084897-5) (f)

    RECORRENTE : R R F
    ADVOGADO : L.F.V.N. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : A M P J DE S
    ADVOGADO : GLEICYANE C P J SANDANHA
    INTERES. : R R J

    RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    RELATÓRIO

    Cuida-se de recurso especial interposto por R.R.F., com fundamento no art. 105, III, “a” e “c”, da CF, contra acórdão proferido pelo TJ⁄MG.

    Ação: de guarda, com pedido liminar, ajuizada pelo recorrente em desfavor de A.M.P.J. de S., pela qual busca a guarda do filho comum.

    Narra o autor que, após tentativa da recorrida de levar o filho para morar em outra cidade, decidiu pedir a guarda do menor, tanto para manter incólume a situação de R.R.J., quanto por apresentar melhores condições de criar o filho, do que a genitora desse.

    Decisão: em 25.08.06, o i. Juiz deferiu o pedido liminar de guarda provisória.

    Decisão: em 14⁄09⁄06, foi deferido pedido de visitas formulado por A.M.P.J. de S., para que esta tenha o filho – R.R.J. – em sua companhia, aos finais de semana, até o julgamento da ação de guarda (fl. 172).

    Parecer do MP do Estado de Minas Gerais: pela fixação da guarda do menor, de forma compartilhada, igualitariamente, pelos genitores (fls. 331⁄335).

    Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido, deferindo a guarda compartilhada de R.R.J. (fls. 336⁄348).

    Decisão em Embargos de declaração: acolheu os embargos de declaração para determinar que a criança fique, alternadamente, com os pais nos finais de semana, feriados e férias escolares e, durante as semanas, também de forma alternada, por quatro dias com um dos genitores e três com o outro.

    Acórdão: o TJ⁄MG negou provimento à apelação interposta pelo recorrente, mantendo a guarda compartilhada fixada pelo i. Juiz e também preservando os períodos em que o menor passará com cada um dos genitores, nos termos da seguinte ementa:

    GUARDA – PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO – DEFERIMENTO DA GUARDA COMPARTILHADA – APELO – INEXISTÊNCIA DE MOTIVOS QUE JUSTIFIQUEM A MODIFICAÇÃO DA GUARDA DEFERIDA – GARANTIA DO MELHOR INTERESSE DO MENOR – MANUTENÇÃO DA SENTENÇA HOSTILIZADA. (fl. 450, STJ).

    Embargos de declaração: interpostos pelo recorrente, foram rejeitados (fl. 467, STJ).

    Recurso especial: alega violação dos arts. 535 do CPC; 1.583 e 1.584 do Código Civil de 2002, bem como divergência jurisprudencial.

    Sustenta, além da ocorrência de omissão do acórdão recorrido, que a guarda compartilhada só deve ser deferida quando houve relacionamento cordato entre os pais.

    Aduz, ainda, que a fórmula adotada pelo Juízo de 1º grau, e ratificada pelo Tribunal de origem, quanto à permanência do menor, alternadamente na casa dos pais, mesmo durante a semana, caracteriza guarda alternada, que é repudiada pela doutrina, pelos efeitos deletérios que tem sobre a psique da criança.

    Juízo prévio de admissibilidade: sem a apresentação de contrarrazões, o TJ⁄MG negou seguimento ao recurso especial (fls. 503⁄504, STJ).

    Parecer do MPF: de lavra do Subprocurador-Geral da República Antônio Fonseca, pelo não conhecimento do recurso especial. (fls. 523⁄530, STJ).

    É o relatório.

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.251.000 - MG (2011⁄0084897-5) (f)

    RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
    RECORRENTE : R R F
    ADVOGADO : L.F.V.N. E OUTRO(S)
    RECORRIDO : A M P J DE S
    ADVOGADO : GLEICYANE C P J SANDANHA
    INTERES. : R R J

    RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

    VOTO

    Sintetiza-se a lide, além do debate relativo à omissão existente no acórdão recorrido, em determinar, sucessivamente:

    i - se a guarda compartilhada pode ser fixada, mesmo não havendo consenso entre os pais;

    ii - se é viável a determinação de que o menor permaneça alternadamente com os pais, mesmo durante a semana.

    Da violação do art. 535 do CPC.

    O recorrente, quanto à violação do art. 535 do CPC, afirmou que o Tribunal de origem tangenciou o pedido sucessivo, feito em apelação de que, se fosse mantida a guarda compartilhada de R.R.J., a presença do menor com a mãe deveria se restringir aos finais de semana, de maneira alternada.

    Nota-se, porém, apesar da ausência de expressa manifestação do Tribunal de origem quanto ao tema, que a manutenção da sentença, também no que toca a alternância da presença do menor na casa dos pais, representou, por óbvio, a rejeição do pleito deduzido por R.R.J.

    E foi essa a exata manifestação do TJ⁄MG, na apreciação dos embargos de declaração interpostos na origem, contra o acórdão do julgamento de apelação:

    Como se vê, não houve contradição alguma. Apenas não foi acolhida a tese recursal do embargante. O acórdão foi claro ao esclarecer que a forma do compartilhamento fixada na sentença atende aos interesses do menor e, por isso, deve ser mantida. (fl. 471, STJ).

    Assim, ausente qualquer um dos vícios assinalados no art. 535 do CPC, inviável a alegada violação de dispositivo de lei.

  12. Do prequestionamento e do dissídio jurisprudencial.

    Conquanto não se verifique manifestação expressa, no acórdão recorrido, dos artigos 1.583 e 1.584 do CC-02, apontados como violados no recurso especial, supera-se a questão, tanto por remeter o debate travado na origem aos referidos dispositivos de lei, que regulam, no Código Civil, a guarda compartilhada, como também por apresentarem os julgados apontados como paradigma, similaridade com a hipótese dos autos, e entendimento diverso daquele preconizado pelo Tribunal de origem.

  13. Da necessidade de consenso para a aplicação da guarda compartilhada (violação dos arts. 1.583 e 1.584 e dissídio jurisprudencial).

    A guarda compartilhada – instituto introduzido na legislação brasileira apenas em 2008 –, pela sua novidade e pela complexidade que traz em sua aplicação, tem gerado inúmeras indagações, sendo a necessidade de consenso uma das mais instigantes, opondo doutrinadores que versam de maneira diversa sobre o tema e também a jurisprudência, ainda não pacificada quanto à matéria.

    Como já tenho afirmado em outros julgamentos, os direitos assegurados aos pais em relação aos seus filhos são na verdade outorgas legais que têm por objetivo a proteção à criança e ao adolescente e são limitados, em sua extensão, ao melhor interesse do menor.

    Corrobora o raciocínio a afirmação de Tânia da Silva Pereira e Natália Soares Franco no sentido de que:

    A vulnerabilidade dos filhos deve ser atendida no intuito de protegê-los. Afastada a ideia de um direito potestativo, o poder familiar representa, antes de tudo, um conjunto de responsabilidades, sem afastar os direitos pertinentes. Assim é que, atender o...

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