Acórdão nº REsp 997475 / RJ de T4 - QUARTA TURMA

Data16 Junho 2011
Número do processoREsp 997475 / RJ
ÓrgãoQuarta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 997.475 - RJ (2007⁄0243543-6)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : A V A E OUTROS
ADVOGADOS : A.C.D.R.
MARCELOR.D.C.F. E OUTRO(S)
RECORRIDO : T M K S E OUTRO
ADVOGADO : MARISTELA LINS PINTO E OUTRO(S)

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. PUBLICAÇÃO DE PARECER EM REVISTA JURÍDICA. CONSULTA ACERCA DA MATÉRIA DISCUTIDA EM AÇÃO CAUTELAR INOMINADA E NA AÇÃO PRINCIPAL QUE A ESSA SE SEGUIU. CITAÇÃO POR EXTENSO DE NOME DE MENOR FALECIDO VÍTIMA DE DOENÇA CONTRAÍDA EM TRANSFUSÃO SANGUÍNEA. LEGITIMIDADE DOS PAIS PARA AJUIZAR DEMANDA REPARATÓRIA. DIREITO PRÓPRIO. SEGREDO DE JUSTIÇA. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DOLO. PUBLICAÇÃO DE CIRCULAÇÃO RESTRITA. DANO MORAL IN RE IPSA. INEXISTÊNCIA. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros M.I.G., A.C.F., João Otávio de Noronha e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator. Sustentou oralmente o Dr. Pedro Ivo Jourdan Gomes Bobsin, pela parte recorrente.

Brasília, 16 de junho de 2011(Data do Julgamento)

MINISTRO RAUL ARAÚJO

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 997.475 - RJ (2007⁄0243543-6)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : A V A E OUTROS
ADVOGADOS : A.C.D.R.
MARCELOR.D.C.F. E OUTRO(S)
RECORRIDO : T M K S E OUTRO
ADVOGADO : MARISTELA LINS PINTO E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO:

Por T.M.K.S e OUTRO foi proposta ação de reparação de danos em face de A.V.A e OUTROS alegando, em apertada síntese, que seu filho nasceu com problemas de saúde, tendo sido submetido a diversas cirurgias na Clínica São Vicente, acabando por adquirir, em uma dessas intervenções, o vírus da AIDS.

Em face dessa situação, os autores ingressaram, em novembro de 1993, com ação cautelar inominada contra a Clínica com a finalidade de garantir o tratamento médico que a criança necessitava, tendo-se requerido na inicial que o processo tramitasse em segredo de justiça. A liminar foi deferida, porém, em 9 de março de 1994, o menor faleceu.

No mês de novembro do ano seguinte, dizem os autores que foram surpreendidos com a notícia de que fora publicado parecer na Revista dos Tribunais nº 721, da autoria de um dos réus intitulado "Transmissão de AIDS por transfusão de sangue. Inexistência de nexo de causalidade. Ausência de Responsabilidade Civil", tratando da questão discutida na ação cautelar inominada e no processo principal que a ela se seguiu, havendo menção explícita ao nome do filho dos autores, em flagrante ofensa ao segredo de justiça requerido naquelas demandas.

Proposta a presente ação de reparação de danos por danos morais, dela foram excluídos, por ilegitimidade passiva, os três primeiros réus (a Clínica e seus advogados), permanecendo no pólo passivo da demanda apenas o jurista autor do parecer (fls. 585⁄587). O pedido, em primeira instância, veio a ser julgado procedente, com a condenação do réu ao pagamento de cinquenta salários mínimos a título de danos morais (sentença proferida em 29.8.2002 - fls. 719⁄725).

Por ambas as partes foram interpostas apelações, sendo a dos autores provida, para elevar o montante da condenação para R$56.000,00 (cinquenta e seis mil reais), e a do réu desprovida, pela Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em acórdão que guarda a seguinte ementa:

"Civil Indenizatória. Dano moral. Segredo de justiça. Publicação de parecer em revista jurídica versando sobre transmissão de aids, via transfusão sanguínea, em menor com total identificação." (v. fls. 829 - julgamento realizado em 18.02.2004).

Foram rejeitados os embargos de declaração opostos pelo réu (fls. 843⁄847).

Vem, então, recurso especial de A.V.A., com fundamento nas letras "a" e "c" do permissivo constitucional, sustentando maltrato aos arts. 21, 131 e 535 do Código de Processo Civil e ao art. 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de apontar dissídio jurisprudencial no que respeita ao valor fixado a título de danos morais.

Diz o recorrente, de início, que o acórdão é omisso, porquanto não esclarece quais os critérios utilizados para elevação da condenação por danos morais. Afirma que: "Em decorrência da apelação dos recorridos (de uma folha e meia), o aresto recorrido aumentou a condenação em mais de quatro vezes, sem apresentar qualquer justificativa para tanto." (fl. 853).

Aduz o recorrente, por outro lado, que o art. 17 do Estatuto da Criança e do Adolescente é inaplicável à espécie. Isso, porque o parecer objeto da presente controvérsia foi publicado mais de um ano depois da morte do menor, o que revela que a criança não sofreu dano algum, não transmitindo a seus herdeiros eventual direito à indenização, daí sua ilegitimidade para ajuizar a demanda.

Assim, não se está a proteger, in casu, a integridade física, psíquica ou moral de uma criança, mas a discutir o suposto dano sofrido pelos pais em decorrência de publicação do nome de seu filho em revista técnica, após seu falecimento. Assevera que referido dispositivo legal somente poderia incidir para regular o caso se a publicação tivesse ocorrido ao tempo em que o menor estava vivo.

Afirma o recorrente, ainda, que houve erro na valoração da prova. Isso, porque "toda a pretensão dos recorridos é fundamentada em uma suposta violação ao segredo de justiça que, segundo eles, teria sido deferido antes da publicação do parecer elaborado pelo recorrente. No entanto, o documento de fls. 233 é prova cabal de que, quando o parecer foi publicado, não havia "qualquer decisão da M.M. Juíza deferindo o processamento em Segredo de Justiça." (fl. 855).

Sustenta, nessa ordem de idéias, que o aresto recorrido enxergou um segredo de justiça onde não existia, consoante é possível verificar da certidão expedida pela Secretaria da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, onde tramitaram as ações originárias.

Diz, também, que o fato de haver referência na capa do processo de que este tramitava em segredo de justiça não supre a ausência de decisão do magistrado impondo esse óbice à publicidade dos atos processuais, assegurando ser indispensável o deferimento formal do pedido de segredo de justiça para que ele se opere. Assevera que a livre apreciação da prova não autoriza possa o juiz desconsiderar os fatos narrados nos autos, pleiteando seja dada correta valoração às provas, de modo a que seja julgado improcedente o pedido dos recorridos.

Sustenta, de outra parte, que o valor fixado a título de danos morais, R$56.000,00 (cinquenta e seis mil reais), o equivalente a 233 salários mínimos à época em que prolatado o acórdão, não se mostra razoável, mormente se comparado a casos mais graves, nos quais as indenizações foram menores. Cita, a propósito: o REsp 243.093⁄RJ (divulgação de nome de policial em lista de agentes supostamente envolvidos em crime de corrupção, indenização fixada em 200 salários mínimos); o REsp 202.826⁄RJ (atropelamento seguido de morte, indenização fixada em 200 salários mínimos); e a Apelação Cível 99.013120-3 (divulgação de fotografia de uma mulher em reportagem intitulada "Cresce a prostituição no centro de Lages", indenização fixada em 100 salários mínimos).

Requer, nesse contexto, a redução da condenação, tendo em vista ainda que a publicação ocorreu em revista de cunho técnico-jurídico, de circulação restrita, além de o filho dos recorrentes não ter sofrido nenhum dano, porquanto já falecido na ocasião e por ter inexistido dolo por parte do parecerista.

Aponta, por fim, que apesar de os recorridos não terem seu pedido atendido na integralidade, já que pleitearam fosse a indenização fixada em 500 salários mínimos, os ônus da sucumbência foram carreados somente ao ora recorrente, quando deveria ter sido reconhecida a sucumbência recíproca, nos termos do art. 21 do Código de Processo Civil.

Assinala, ademais, haver no que se refere ao ponto, dissídio em relação ao REsp 242.317⁄BA, da relatoria do eminente Min. EDUARDO RIBEIRO. Acrescenta que a transcrição da ementa é suficiente para demonstração da divergência jurisprudencial nos casos de dissídio notório.

Contrarrazões às fls. 900⁄905. Dizem os recorridos que a matéria trazida no recurso especial carece de prequestionamento, nem sequer havendo indicação clara de qual dispositivo legal teria sido violado. Afirma, ademais, que o recurso também não pode ser conhecido por se pretender o reexame dos fatos da causa. Assevera, por fim, que a fixação a menor do valor requerido a título de danos morais não dá ensejo à sucumbência recíproca.

O recurso especial ascendeu a esta Corte por força do provimento do Ag 685.576⁄RJ.

A Subprocuradoria-Geral da República opina pela manutenção do aresto recorrido (fls. 1.067⁄1.069).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 997.475 - RJ (2007⁄0243543-6)

RELATOR : MINISTRO RAUL ARAÚJO
RECORRENTE : A V A E OUTROS
ADVOGADOS : A.C.D.R.
MARCELOR.D.C.F. E OUTRO(S)
RECORRIDO : T M K S E OUTRO
ADVOGADO : MARISTELA LINS PINTO E OUTRO(S)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (RELATOR):

Diz o recorrente, de início, que a colenda Corte de origem elevou o montante fixado na sentença a título de danos morais em mais de quatro vezes sem apontar quais os critérios utilizados para...

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