Acordão nº 0004200-80.2009.5.04.0751 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 17 de Agosto de 2011

Magistrado ResponsávelJoãƒo Ghisleni Filho
Data da Resolução17 de Agosto de 2011
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0004200-80.2009.5.04.0751 (RO)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juízo da Vara do Trabalho de Santa Rosa, sendo recorrente JOÃO ARLEI DA SILVA RAMOS e recorrida JOHN DEERE BRASIL LTDA.

Inconformado com a sentença proferida pela Juíza do Trabalho Marcele Cruz Lanot Antoniazzi, às fls. 1098/1111, recorre o reclamante. Pretende rediscutir a doença ocupacional, e os direitos decorrentes, reintegração ao emprego, estabilidade, danos morais, estéticos e materiais, além de adicional de insalubridade e base de cálculo, adicional de periculosidade, horas extras e intervalo intrajornada (fls. 1116/1125).

Contrarrazões da reclamada nas fls. 1128/1138.

Distribuídos, vêm os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

ISTO POSTO:

CONHECIMENTO.

Tempestivo o apelo (fls. 1112/1116), regular a representação (fl. 24). Custas processuais são encargo da reclamada (fl. 1110, verso), e depósito recursal inexigível, encontram-se preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso.

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE.

1. DOENÇA OCUPACIONAL. REINTEGRAÇÃO. ESTABILIDADE. DANOS MORAIS, ESTÉTICOS E MATERIAIS.

O Juízo de origem entende possuir o reclamante doença de origem degenerativa e pré-existente, sem qualquer relação com o trabalho desenvolvido em prol da reclamada, sequer tendo a empregadora responsabilidade por eventual agravamento das lesões. Rejeita os pedidos de nulidade da dispensa, reintegração ao emprego e indenizações pretendidas.

O reclamante não se conforma, asseverando ter laborado por mais de onze anos na mesma função, montador, sendo a reclamada, indústria de máquinas agrícolas. Relata que, nesse período, trabalhou em extensas jornadas, invariavelmente superiores a média de dez horas diárias, como demonstram os registros de horários relativos ao período não prescrito. Rebela-se contra o fundamento apresentado na sentença para afastar o nexo de causalidade entre as lesões e o trabalho, de que teria “ajudado a fazer um puxadinho nos fundos da casa de sua irmã” , destacando que a calosidade nas suas mãos percebida no dia da perícia era recente, posterior a sua dispensa, sem qualquer relação com o trabalho prestado em prol da reclamada. Entende, portanto, injusta a decisão que preteriu mais de dez anos de vínculo de emprego em jornadas superiores a dez horas, diante de tarefa pequena, como pedreiro, realizada recentemente. Aponta o laudo pericial (fl. 848), que demonstra com exatidão o conjunto de polias montadas nas colheitadeiras diariamente, registrando a postura inadequada, além da necessidade de movimentação de peças e equipamentos por meio de talhas com esforço físico e em posições ergonomicamente inadequadas. Destaca ter o perito médico confirmado possuir alterações de origem degenerativas, pré existentes, mas que se agravaram com as atividades laborais realizadas com esforço físico, importando em concausa. Refere também ter o perito médico atestado a redução da capacidade laborativa, tendo em vista não estar apto ao exercício das mesmas funções ou de outras que exijam esforço físico. Denuncia possuir o setor onde laborou, solda, elevados índices de afastamento por lesões osteomusculares relacionadas ao trabalho, fatos comprovados pelo estudo de fls. 66/187. Requer o reconhecimento de que é portador de doença ocupacional, devendo a reclamada ser condenada ao pagamento de indenização em equivalente aos salários e demais parcelas do contrato relativas ao período de estabilidade. Pretende indenização por danos morais e estéticos sem, contudo, indicar valores, assim como pensão mensal vitalícia no valor correspondente ao piso normativo da categoria profissional, desde a data do acidente (junho de 2006).

À análise.

O reclamante trabalhou para a reclamada de 02.06.1997 a 09.09.2008, como montador, percebendo ao final remuneração de R$ 1.316,72 (fl. 597). Possui 35 anos (27.11.1975).

Na inicial, alega ser portador de severa lesão na coluna cervical, conforme laudo de ressonância magnética datado de 23.03.07, onde consta sinais de ruptura radial posterior do ânulo fibroso do disco intervertebral de L3-L4 (fl. 33).

Em defesa, a reclamada assevera não ter o reclamante sofrido acidente do trabalho ou desenvolvido qualquer patologia relacionada ao labor, já que as suas atividades não exigiam esforço físico. Destaca os exames de imagem juntados com a inicial, que atestam possuir ele lesão na coluna vertebral de origem degenerativa.

O laudo médico conclui possuir o reclamante lombalgia em razão de alterações de origem degenerativas, pré-existentes, que podem ter se agravado com atividades laborais com carga e esforço físico (fl. 886).

A ressonância magnética da coluna vertebral lombo sacra realizada em 23/03/2007, descreve alterações degenerativas iniciais disco-ligamentares e osteo-articulares da coluna vertebral lombo-sacra; degeneração com incipientes protusões discais posteriores subligamentares L2-L3-L4-L5; sinais de ruptura radial posterior do ânulo fibroso do disco intervertebral de L3-L4 (fls. 950/951).

Após inúmeros julgados sobre a matéria, sabe-se que a protusão discal pode evoluir para a hérnia de disco. A hérnia de disco afeta principalmente pessoas a partir dos 40 anos de idade, constituindo-se em afecção aguda ou crônica da coluna vertebral onde ocorre a migração do núcleo do disco intervertebral normalmente posterior, que acaba comprimindo estruturas altamente inervadas, causando dor e outros sintomas incapacitantes. A patologia é degenerativa e tem como principais fatores de risco o envelhecimento e a propensão individual. O risco pode aumentar se houver trabalho ou a prática de esporte envolvendo levantamento de peso ou excesso de movimentos de dobra ou giro da coluna. Desta forma, os processos degenerativos dos discos da coluna podem conter componente ocupacional, pois todo aumento de pressão sobre o disco torna a degeneração ainda mais precoce.

Assim, comprovada a existência de lesão de coluna vertebral, impõe-se perquirir sobre as condições em que o trabalho era realizado, mormente no caso, onde o contrato teve razoável duração, mais de onze anos (de 02.06.1997 a 09.09.2008).

Por ocasião da perícia técnica, o reclamante relata que realizava a montagem do sem-fim do tanque graneleiro (6 meses), depois passou para a montagem dos elevadores (2 anos); montagem do conjunto de polias da trilha da correia mestra (2 anos). Passou para a linha de plantadeira, onde montava a lança, vácuo, chicote, piso e sulcador. Além destas tarefas, ajudava na descarga de peças, tendo auxiliado os colegas na montagem do chicotes e coluna de direção, dentre outras tarefas listadas no laudo a fl. 847. A descrição das tarefas realizadas converge com o perfil profissiográfico previdenciário - PPP, elaborado pela reclamada e juntado nas fls. 454/457.

Refere ter iniciado com dores na coluna em 2000 ou 2001. Nesta época, realizava a montagem do conjunto de polia da trilha e correia mestra, relatando que, para a tarefa, ficava deitado sobre o pneu dianteiro da colheitadeira (imagem da fl. 848).

A reclamada, em sua manifestação sobre o laudo, opõe-se quanto a esta alegação, informando que nos postos 7 e 8, onde eram montadas as polias, os pneus não estão postos, pois são montados somente no posto 16. Não seria crível que a empresa exigisse que o empregado trabalhasse deitado sobre superfície irregular. Contudo, do que se depreende dos depoimentos das testemunhas, em período anterior, a atividade era feita em posição não ergonômica, tendo havido a modificação do processo produtivo no decorrer dos anos.

A testemunha convidada pela reclamada, Sandro Gerdes, dada vista da fotografia da fl. 848, informa que o montador trabalha em pé para a montagem daquela polia, pois o pneu não está mais no local e isso ocorre há uns cinco anos, não sabendo informar qual a posição do empregado anteriormente. Afirma que o reclamante montava aquela polia (fl. 1095).

Já a testemunha Alceno Schubert, convidada pelo autor, diz que o reclamante montava a polia exibida na imagem da fl. 848, e para a regulagem, o empregado permanecia em posição bastante incômoda, posicionando-se entre o pneu e a máquina. Relata ter havido mudança no procedimento depois da implantação da esteira, e isso ocorreu uns quatro ou cinco anos antes da testemunha sair da empresa. Refere ter sido implantado sistema de talha que auxilia na montagem da polia, mas a regulagem ainda exige bastante esforço para “chegar”, mesmo com a melhora do acesso (fl. 1094 e verso).

A empresa dedica-se à fabricação de tratores, colheitadeiras, colhedoras, plantadoras, dentre outros, para mecanização agrícola, produtos de grande porte (informações do sítio www.deere.com.br). Embora não tenha sido juntado aos autos o PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, a reclamada deve possuir grau de risco 3 (grave) para fins previdenciários.

Assim, impõe-se concluir que, apesar de as lesões terem origem degenerativa, o trabalho é, evidentemente, concausa do agravamento do quadro. O reclamante é jovem, com 35 anos, e as atividades realizadas com esforço aceleraram o processo de degeneração dos discos intervertebrais, fazendo com que passasse a sentir antecipadamente os efeitos de lesões que, sob ação do envelhecimento natural, somente se manifestariam bem mais tarde.

Infere-se do contexto probatório o dano, e nexo de concausalidade com as condições de trabalho, pois as tarefas executadas pelo reclamante ao longo do contrato de trabalho exigiam força física e posições não ergonômicas. Neste sentido, a conclusão do perito médico de fls. 885/886.

A existência de concausa é circunstância que não elimina a culpa do empregador, admitindo-se tão somente a mitigação do valor da indenização, já que as condições em que era realizado o trabalho concorrem para o dano sofrido pelo empregado.

A discussão quanto a ser a responsabilidade civil do empregador objetiva, calcada na teoria do risco, ou subjetiva, hipótese em que deve ser provada a culpa, é desnecessária no...

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