Acórdão nº HC 205666 / SP de T6 - SEXTA TURMA

Data23 Agosto 2011
Número do processoHC 205666 / SP
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 205.666 - SP (2011⁄0100655-7)

RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
ADVOGADO : HELOÍSA ELAINE PIGATTO - DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO
PACIENTE : A.C.D.S.
PACIENTE : CLÉCIO ROBERTO FURLAN

EMENTA

HABEAS CORPUS. USO DE DOCUMENTO FALSO - ART. 304 DO CÓDIGO PENAL. NÃO-APRESENTAÇÃO AOS AGENTES POLICIAIS. INCURSÃO NO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE. AUTODEFESA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. IMPOSSIBILIDADE. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. QUESTÃO PREJUDICADA. ORDEM DENEGADA.

  1. A apresentação, ou não, de documentos falsos aos agentes policiais é circunstância que não pode ser revista, pois demanda incursão no acervo fático-probatório dos autos, medida inviável em sede de habeas corpus.

  2. A utilização de documento falso para escamotear a condição de foragido, não descaracteriza o delito de uso de documento falso - art. 304 do CP. Inaplicável nestas circunstâncias a tese de autodefesa cuja utilização restringe-se ao delito previsto no art. 307 do Código Penal. Precedentes do STF.

  3. Incompetência da Justiça Federal. Questão prejudicada.

  4. Ordem parcialmente conhecida e, nesta extensão, denegada.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer parcialmente da ordem de habeas corpus e, nesta parte, a denegou, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ⁄CE), Maria Thereza de Assis Moura, Og Fernandes e S.R.J. votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília (DF), 23 de agosto de 2011(Data do Julgamento)

    MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA

    (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)

    Relator

    HABEAS CORPUS Nº 205.666 - SP (2011⁄0100655-7)

    RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
    IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
    ADVOGADO : HELOÍSA ELAINE PIGATTO - DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
    IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO
    PACIENTE : A.C.D.S.
    PACIENTE : CLÉCIO ROBERTO FURLAN

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (RELATOR): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de A.C.D.S. e C.R.F., contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que prover parcialmente a Apelação Criminal n. 00063497120064036181, para reconhecer a incidência da atenuante da confissão espontânea na dosimetria da pena do segundo paciente.

    Noticia a impetrante que os pacientes estão submetidos a constrangimento ilegal, pois os agentes não apresentaram documentos falsos, sendo a conduta imputada a eles desprovida de dolo.

    Defende que, do acervo probatório dos autos, verifica-se que "os pacientes não chegaram nem ao menos a apresentar os documentos falsos, tendo sido apenas apreendidos durante a diligência dos Agentes Federais." (fl.3)

    Sustenta que os documentos jamais foram utilizados pelos sentenciados, mas apenas adquiridos por estes, sendo a apreensão das carteiras falsas ocorrido em diligência na casa em que se encontravam.

    Alega que, se típica, a ação praticada se amoldaria a prevista no art. 307 do Código Penal.

    Enfatiza, que mesmo assim, a conduta não merece ser punida, uma vez que "a finalidade dos pacientes era a de impedir que as autoridades policiais descobrissem algo sobre suas extensas fichas criminais e dos respectivos mandados de prisão expedidos em seu desfavor." (sic) (fl. 5)

    Invoca jurisprudência desta Corte Superior, a fim de destacar que a imputação de identidade falsa pelo agente é conduta atípica, pois se afigura exercício regular de direito.

    Aponta que o Superior Tribunal de Justiça entende que atribuição de falsa identidade mediante apresentação de documento falso, durante abordagem policial, quando o agente teme ser preso ou ser descoberto algum delito, constitui autodefesa, logo não há se falar em tipicidade da conduta.

    Aduz ser incompetente a Justiça Federal para examinar os fatos imputados aos acusados, visto que não existindo conduta típica referente ao uso de documento falso, não há mais competência dessa justiça especializada.

    Requer a concessão da ordem a fim de anular o acórdão objurgado e afastar as condenações pelo uso de documento falso e, por conseguinte, a envio dos autos à Justiça Estadual.

    Liminar indeferida (fls. 100 e 101).

    Informações prestadas a fls. 110 a 116.

    O Ministério Público Federal, por meio do Subprocurador-Geral da República Antônio Fonseca, manifestou-se pelo não conhecimento da ordem (fls. 123 a 126)

    É o breve relatório.

    HABEAS CORPUS Nº 205.666 - SP (2011⁄0100655-7)

    RELATOR : MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS)
    IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
    ADVOGADO : HELOÍSA ELAINE PIGATTO - DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
    IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3A REGIÃO
    PACIENTE : A.C.D.S.
    PACIENTE : CLÉCIO ROBERTO FURLAN

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (RELATOR): Busca-se o reconhecimento da atipicidade das condutas, tendo em vista o não uso de carteiras de habilitação falsas ou, subsidiariamente, pelo emprego de identidade falsa, com finalidade de se evadir de ação policial, fundando-se a defesa, nesta última linha argumentativa, que a apresentação de documento falso constitui autodefesa. Defende-se, ainda, que, em razão da atipicidade dos fatos, a incompetência da Justiça Federal para examinar o feito.

    Narra a denúncia que:

    [...]

  5. No dia primeiro de junho de 2006, por volta das 7:00 hs, da manhã (fls.07), dando cumprimento a mandado judicial de busca e apreensão expedido pela 4ª (quarta) Vara da Justiça Federal de Minas Gerais (fls. 73 do IPL), uma equipe conjunta de Policiais Federais de Minas Gerais e São Paulo adentrou na Rua Baianópolis, n° 18, Bairro Jardim Angélica, São Paulo-SP, com o fim de prender o réu ANDERSON, havendo notícia de que ele é autor de vários outros roubos à agência da Caixa Econômica Federal no Estado das Minas Gerais.

  6. No interior deste imóvel, após serem rendidos, os réus apresentaram documentos falsos aos policiais. ANDERSON apresentou uma Carteira Nacional de Habilitação em nome de R.G.D.S. enquanto CLÉCIO apresentou uma Carteira Nacional de Hbilitação em nome de R.V. deS. (cópias as fls. 16 do IPL). Assim, os réus praticaram o crime tipificado no art. 304 do Código Penal.

    [...] (fls. 80 e 81)

    Posteriormente, o édito condenatório considerou que a conduta dos pacientes amoldava-se à figura típica do art. 304 do Código Penal, tendo em vista a utilização de documentos falsos, a fim de se esquivarem de ordem de prisão, verbis:

    [...]

    A negativa de que tenham usado os documentos quando foram abordados pelos policiais federais não é suficiente para infirmar a acusação. Isto porque os depoimentos dos policiais que efetuaram a prisão em flagrante dos réus são consistentes e consentâneos com as demais provas e as circunstâncias em que houve essa prisão. Do depoimento do APF C.S.I., extraio o seguinte trecho:

    (...) Confirma que o acusado A. apresentou uma carteira nacional de habilitação em nome de outra pessoa, não se recordando, neste mesmo, do nome utilizado. ANDERSON justificou tal atitude dizendo que era procurado pela Justiça. O outro rapaz, CLÉCIO, também apresentou uma CNH em nome de outra pessoa, tendo dito, posteriormente, que fez isso porque tinha medo, pois estava sendo procurado pela Polícia por um roubo que ele havia praticado. Não houve resistência à prisão. (...)

    Com efeito, tratando-se de réus foragidos da Justiça e estando os policiais em diligências de cumprimento de mandado de busca e apreensão expedido pela 4ª Vara Federal da Seção Judiciária de Minas Gerais, é compreensível que os réus se utilizassem de documento falso para identificarem-se aos policiais, procurando mostrar ser quem não eram.

    [...]

    O egrégio Tribunal a quo, por sua vez, confirmando a materialidade e autoria do delito previsto no art. 304 do Código Penal, asseverou que as carteiras de habilitação foram apresentadas pelos réus aos policiais, com a finalidade de se livrarem da ação dos agentes estatais, conforme de dessume do seguinte excerto:

    [...]

    A autoria do crime é inconteste para ambos os apelantes. Assim, não prospera a alegação da defesa de que os acusados não teriam apresentados as CNH falsas aos policiais federais.

    No conjunto probatório presente nos autos a versão dos réus não se sustenta. O testemunho dos policiais federais que efetuaram as diligências foram consistentes tanto em sede policial quanto em juízo.

    [...]

    Ademais as companheiras dos acusados confirmaram em depoimento prestado na fase inquisitorial o relato dos policiais.

    Lilian de Campos Martins (fls. 11⁄12):

    que em princípio os dois autuados declinaram aos policiais tratarem-se de Rômulo e Roberto, sendo que momentos depois afirmaram que estavam com documentos falsos; que ambos utilizavam esses documentos por serem fugitivos da polícia (...)

    Priscila Gonçalves de Oliveira (fls. 13⁄14):

    "que os dois ofertaram aos policiais documentos em nome de Rômulo e Roberto; (...) que ambos se utilizaram desses documentos por serem fugitivos da polícia (...)"

    Por sua vez, a materialidade do delito restou comprovada pelo laudo de exame documentoscópico de fls. 358⁄364, que confirmou serem falsas as informações contidas das Carteiras de Habilitação apresentadas pelos réus A. e Clécio.

    Portanto, não resta dúvida de que a conduta de A.C. deS. e C.R.F. subsume-se ao artigo 304 doC.P.

    [...] (fls. 66 a 68)

    Inicialmente, verifica-se que se mostra insubsistente a argumentação de que os pacientes não apresentaram documentos falsos aos agentes da policia federal, porquanto o procedimento adotado pelos réus restou perfeitamente caracterizado nas instâncias ordinárias, motivo pelo qual se mostra inviável rever o entendimento a quo, sem que seja necessário incursão no conjunto fático-probatório dos...

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