Acórdão nº RMS 31050 / RS de T6 - SEXTA TURMA

Número do processoRMS 31050 / RS
Data28 Junho 2011
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 31.050 - RS (2009⁄0236950-7)

RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES
RECORRENTE : O.S.E.C.D.I.L.
ADVOGADO : RICARDO FERREIRA BREIER E OUTRO(S)
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
INTERES. : NCOMPUTING CO LTDA

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CRIMES CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL. BUSCA E APREENSÃO. PROCEDIMENTO OBJETIVANDO CONSTITUIR O CORPO DE DELITO PARA FUTURA AÇÃO PENAL PRIVADA. NULIDADE DA PROVA PERICIAL. INOCORRÊNCIA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 159 E 527 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUTO DE APREENSÃO SEM A ASSINATURA DAS TESTEMUNHAS PRESENCIAIS. MERA IRREGULARIDADE. PREJUÍZO INEXISTENTE.

  1. Nos crimes contra a propriedade imaterial que se processam mediante ação penal de iniciativa pública, a busca e a apreensão podem ser efetuadas pela autoridade policial, nos termos da regra geral do art. 240, § 1º, do CPP, como normalmente ocorre na apuração das demais infrações criminais.

  2. Todavia, nos crimes sujeitos à ação penal de iniciativa privada, a medida preparatória criminal deverá ser realizada por dois peritos nomeados pelo juiz, que verificarão a existência de fundamento para a constrição do material a ser submetido à perícia, consoante o disposto nos arts. 527 e 530-A do Código de Processo Penal.

  3. No caso, apesar de o mandado de busca e apreensão ter sido deferido com fundamento no art. 240 do Código de Processo Penal, a diligência seguiu o rito especial disposto na legislação de regência, à exceção da presença de duas testemunhas, exigida pelo art. 530-C do mesmo diploma legal.

  4. O fato de o exame de corpo de delito ter sido efetivado por apenas um perito oficial não induz à nulidade do procedimento. Tal conclusão decorre da interpretação sistemática dos arts 527 e 159 da Lei adjetiva, com a redação dada pela Lei nº 11.690⁄08, que passou a exigir a presença de duas pessoas para realização do exame tão somente na falta de perito oficial.

  5. De outra parte, a circunstância de não constar no termo de busca e apreensão a assinatura de testemunhas, especificamente designadas para tal fim, conforme dispõem os arts. 245, § 7º, e 530-C do CPP, não tem o condão de ensejar a nulidade da diligência sub judice, por se tratar de mera irregularidade formal.

  6. De qualquer forma, os oficiais de justiça que participaram da busca e apreensão, assinando, inclusive, o respectivo termo, podem figurar como testemunhas para atestar a legalidade da diligência, não havendo nenhum impedimento legal nesse sentido. Não se pode olvidar, ainda, que o ato contou com a participação dos representantes legais de ambas as partes, todos com a autorização do Juiz de primeiro grau.

  7. Ademais, pacífico na jurisprudência desta Corte que no processo penal vige o princípio pas de nullité sans grief (art. 563 do CPP), sendo ônus do interessado demonstrar o prejuízo a que lhe teria sido imposto, o que não ocorreu na hipótese dos autos.

  8. Por fim, a assertiva de que a busca e a apreensão extrapolaram os limites estabelecidos pela ordem judicial que a autorizou, observa-se que a questão não foi apreciada pelo Tribunal de origem, sendo certo, ainda, que a recorrente não juntou nenhum documento para comprovar o alegado.

  9. Recurso a que se nega provimento.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior, V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ⁄CE).

    Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

    Brasília, 28 de junho de 2011 (data do julgamento).

    MINISTRO OG FERNANDES

    Relator

    RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 31.050 - RS (2009⁄0236950-7)

    RELATÓRIO

    O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança impetrado por Ory Soluções em Comércio de Informática Ltda., contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

    Colhe-se dos autos que Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal de São Leopoldo⁄RS deferiu o pedido de busca e apreensão requerido pela empresa N.C.L., sediada na Coréia do Sul, com o escopo de produzir prova à caracterização de crime contra a propriedade industrial, em tese praticado pelo ora recorrente.

    A medida cautelar, concedida com fundamento no art. 240 do Código de Processo Penal, efetivou-se em 30 de julho de 2009, conforme Auto de Busca e Apreensão de fl. 242 e-STJ, sendo o respectivo Laudo Pericial apresentado em 11 de agosto de 2009 (fls. 295⁄322 e-STJ).

    Inconformada, a empresa recorrente, O.S.E.C.D.I.L. impetrou mandado de segurança.

    O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por unanimidade de votos, denegou o mandamus, cassando a liminar parcialmente deferida, nos termos do acórdão assim ementado:

    MANDADO DE SEGURANÇA. CRIME CONTRA A PROPRIEDADE IMATERIAL. BUSCA E APREENSÃO. INOBSERVÂNCIA DE PROCEDIMENTO ESPECÍFICO. NULIDADE. PREJUÍZO INEXISTENTE.

    Preliminarmente. Prejudicada a questão envolvendo o sigilo do laudo pericial, por perda do objeto.

    Mérito. Para se declarar a nulidade de um ato, não basta sua imperfeição, é necessário, outrossim, haver prejuízo ao processo ou às partes.

    No caso, em que pese constar no mandado de busca e apreensão ter sido a diligência deferida com fulcro no artigo 240 do CPP, a medida foi cumprida com observância dos ditames previstos no artigo 524 e seguintes do mesmo diploma legal, não ocasionando qualquer prejuízo à parte impetrante.

    À unanimidade, preliminarmente, julgaram prejudicado o pleito referente ao sigilo do laudo pericial, e, no mérito, denegaram a segurança, cassando a liminar parcialmente deferida. Unânime.

    Em suas razões recursais, a empresa recorrente sustenta a nulidade absoluta da medida preparatória criminal, ante a inobservância do disposto no art. 527 do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a diligência de busca e apreensão a ser realizada nos crimes contra a propriedade imaterial.

    Alega a recorrente que o procedimento cautelar em questão seguiu a regra geral descrita no art. 240, § 1º, do CPP, inaplicável na hipótese dos autos.

    Para tanto, aduz que Magistrado a quo nomeou apenas um perito oficial – Dr. Rodrigo Azevedo –, desrespeitando as normas específicas para a diligência em apreço, que exigem a presença de dois peritos.

    Acentua, nesse ponto, que o fato de o perito ter se feito acompanhar por um auxiliar não supriria a ilegalidade do ato judicial, visto que não se trata de perito de confiança nomeado pelo Juiz.

    Diz, ainda, que, embora houvesse a presença de pessoas no local – inclusive a ora recorrente e seus procuradores –, não foram indicadas, especificamente, duas testemunhas para a diligência.

    Por fim, afirma que a medida de busca e apreensão realizada extrapolou os limites estabelecidos pela ordem judicial que a autorizou, já se adentrou no interior da empresa, em salas e outros locais não autorizados na decisão.

    Requer, em suma, a concessão da ordem para que sejam anulados todos os atos praticados desde da busca e apreensão realizada.

    A Subprocuradoria-Geral da República manifestou-se pelo improvimento do recurso.

    RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 31.050 - RS (2009⁄0236950-7)

    VOTO

    O SR. MINISTRO OG FERNANDES (RELATOR): Como é sabido, os crimes praticados contra propriedade imaterial – aí incluídos os delitos relativos à propriedade industrial – em regra se apuram mediante ação penal de iniciativa privada, exceto os previstos nos arts. 184, §§ 1º, 2º, e 3º, do Código Penal (ex vi do art. 186 CP), e 191 da Lei nº 9.279⁄96, bem como os cometidos em prejuízo de entidades de direito público.

    Nesse sentido:

    No que respeita aos crimes contra a propriedade industrial (dos crimes

    contra as patentes, contra os desenhos industriais, dos crimes contra as marcas, dos crimes cometidos por meio de marca, título de estabelecimento e sinal de propaganda, contra indicações geográficas e demais indicações, e de concorrência desleal, previstos nos arts. 183 a 195 da Lei n. 9.279; de 14-5-1996), com exceção do tipificado no art. 191, que é de ação pública incondicionada, todos são de ação penal privada.

    (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Comentários ao Código de Processo Penal. 12ª ed. São Paulo: Saraiva. 2009. pág. 524)

    Considerando que a maioria desse delitos deixam vestígios, a parte interessada deve requerer a realização de medida preparatória de busca e apreensão, a fim de colher dos elementos necessários para o exercício do direito de ação, ou seja, a prova da materialidade delitiva e indícios de sua autoria.

    Nos crimes contra a propriedade imaterial que se processam mediante ação penal pública, a busca e a apreensão podem ser efetuadas pela autoridade policial, nos termos da regra geral do art. 240, § 1º, do Código de Processo Penal, como normalmente ocorre na apuração das demais infrações criminais.

    Vejam-se os precedentes desta Corte Superior de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, respectivamente:

    CRIME CONTRA A PROPRIEDADE INTELECTUAL – Busca e apreensão. Regra geral. Aplicabilidade. Crimes puníveis mediante ação penal pública. Afastamento da regra específica. Nos crimes contra a propriedade intelectual, de ação penal pública, a autoridade policial pode instaurar o inquérito e proceder à busca e apreensão de acordo com a regra geral descrita no art. 240, § 1º, do CPP, afastando-se a aplicação do art. 527 do CPP.

    (STJ – REsp 543.037⁄RJ, Quinta Turma, Min. Gilson Dipp, DJ de 16.11.2004)

    HABEAS CORPUS – Crime contra a propriedade intelectual, art. 184, § 2º, do Código Penal. Busca e apreensão. Ação penal pública incondicionada. Código Penal, art. 186 (redação dada pela Lei nº 6.895⁄89). Aplicação do art. 240 do Código de Processo Penal. Os crimes contra a propriedade imaterial previstos nos §§ 1º e 2º do art. 184 do Código Penal processam-se mediante ação...

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