Acordão nº 0000307-94.2010.5.04.0121 (RO) de Tribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul), 13 de Octubre de 2011

Magistrado ResponsávelAlexandre CorrãŠa da Cruz
Data da Resolução13 de Octubre de 2011
EmissorTribunal Regional do Trabalho - 4ª Região (Rio Grande do Sul)
Nº processo0000307-94.2010.5.04.0121 (RO)

VISTOS e relatados estes autos de RECURSO ORDINÁRIO interposto de sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara do Trabalho de Rio Grande, sendo recorrentes GRANJA 4 IRMÃOS S.A. E VALDIR VAZ NUNES e recorridos OS MESMOS.

Inconformadas com a sentença de parcial procedência das fls. 179/184, da lavra do Exmo. Juiz Edenilson Ordoque Amaral, as partes recorrem.

A reclamada, mediante as razões de recurso ordinário das fls. 188/193, busca reforma da sentença no tocante à natureza do salário utilidade, à condenação ao pagamento de horas extras, ao trabalho em domingos e feriados, e aos reflexos das horas extras nos repousos semanais remunerados.

O reclamante, por sua vez, consoante as razões de recurso ordinário adesivo das fls. 203/204, pretende a condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios.

Com contrarrazões apenas da parte reclamada, às fls. 207/209, sobem os autos para julgamento.

É o relatório.

ISTO POSTO:

I - RECURSO ORDINÁRIO PRINCIPAL DA RECLAMADA

1. HABITAÇÃO. SALÁRIO IN NATURA.

O Magistrado da Origem reconheceu como salarial a habitação fornecida pela demandada ao autor, deferindo a integração do salário, então in natura, nas horas extras, férias com acréscimo de 1/3, gratificações natalinas, aviso-prévio e FGTS acrescidas de 40%. A decisão restou fundamentada mediante os seguintes termos (fl. 180):

Em primeiro lugar, constato que não estão preenchidos os requisitos estabelecidos no § 5º do artigo 9º da Lei n. 5.889/73 para que haja a exclusão da natureza salarial. Esse dispositivo legal determina que “A cessão pelo empregador, de moradia e de sua infra-estrutura básica, assim como, bens destinados à produção para sua subsistência e de sua família, não integram o salário do trabalhador rural, desde que caracterizados como tais, em contrato escrito celebrado entre as partes, com testemunhas e notificação obrigatória ao respectivo sindicato”. O contrato de trabalho das fls. 32-3 não exclui a natureza salarial da moradia, não está assinado por testemunhas e não há prova de que tenha ocorrido notificação ao sindicato de trabalhadores rurais.

Em segundo lugar, a reclamada não comprova que a concessão de moradia fosse indispensável para a realização do trabalho, ônus que era seu por se tratar de fato impeditivo da pretensão do reclamante.

Em terceiro lugar, constato que o valor descontado do reclamante (R$ 1,90) era irrisório, mesmo considerando as circunstâncias apontadas na defesa da reclamada, numa clara tentativa de descaracterizar a natureza salarial da parcela.

Por fim, ressalto a habitualidade da parcela oferecida pela reclamada.

Por esses motivos, reconheço a natureza salarial da moradia, fornecida pela reclamada.

Tendo em vista que os descontos serviam apenas ao propósito de tentar descaracterizar a natureza salarial da parcela, condeno a reclamada a ressarcir os valores descontados a título de habitação.

Em função do reconhecimento da natureza salarial da moradia, defiro diferenças no cálculo de horas extras, férias acrescidas de um terço, décimos terceiros salários e aviso-prévio, pela integração do salário in natura. Para efeito de integração, arbitro o valor da parcela em 20% do salário contratual, adotando como parâmetro o disposto na alínea a do artigo 9º da Lei n. 5.889/73.

Não resignada, a reclamada apela. Advoga que a habitação fornecida ao empregado se encontrava dentro de sua sede e se tratava de elemento essencial ao trabalho. Argumenta haver realizado o desconto correspondente no salário do autor, nos termos do art. 458 da CLT. Alega ser empregadora rural e, por essa razão, a concessão de moradia não integra o salário do trabalhador, nos termos do art. 9º da Lei do Trabalhador Rural (Lei n. 5.889/73), o qual transcreve. Sustenta, contrariando a sentença, que os requisitos do §5º do dispositivo legal mencionado estão preenchidos, na medida em que há previsão contratual por escrito de tal benefício e do respectivo desconto, conforme cláusula XVI do contrato de trabalho anexado aos autos (fl. 33), além de previsão normativa” (fl. 189-verso; destaque no original). Nesses termos, requer o afastamento da condenação imposta e, por cautela, a redução do percentual de integração estipulado (de 20%), em face da simplicidade da moradia fornecida.

Examina-se.

O Magistrado singular entendeu que não restaram preenchidos os requisitos necessários à configuração de que a moradia fornecida ao empregado rural não constitui parcela salarial. Tais requisitos constam do §5º do art. 9º da Lei n. 5.889/73 (Lei do Trabalhador Rural), in litteris:

§5º. A cessão pelo empregador, de moradia e de sua estrutura básica, assim como, bens destinados à produção para sua subsistência e de sua família, não integram o salário do trabalhador rural, desde que caracterizados como tais, em contrato escrito celebrado entre as partes, com testemunhas e notificação obrigatória ao respectivo sindicato de trabalhadores rurais. (Destacou-se).

Segundo o preceito supra, a moradia fornecida ao empregado rural somente não é considerada salário in natura se preenchidos os requisitos objetivos constantes do dispositivo em tela.

Consoante fundamentado na sentença, “o contrato de trabalho das fls. 32-3 não exclui a natureza salarial da moradia, não está assinado por testemunhas e não há prova de que tenha ocorrido notificação ao sindicato de trabalhadores rurais” (fl. 180).

Nas razões recursais, no que concerne ao preenchimento dos requisitos do §5º do art. 9º da Lei 5.889/73 - cuja aplicação, diga-se, é requerida pela própria reclamada - a recorrente argumenta, apenas, haver previsão por escrito do benefício da moradia no contrato de trabalho, consoante cláusula XVI (“Ocorrendo a concessão de alimentação habitação e outras prestações 'in natura', fica a Empregadora autorizada a proceder o desconto da parcelas correspondentes, observados os limites legais” - sic), à fl. 33.

Ocorre que, além da referida cláusula não consignar expressamente a natureza não salarial da habitação fornecida ao trabalhador, não se verifica a presença de testemunhas a firmar o ajuste celebrado entre as partes, e tampouco a notificação obrigatória ao sindicato dos trabalhadores rurais. Em outras palavras, ainda que um dos requisitos objetivos fosse satisfatoriamente preenchido (contrato escrito entre as partes), faltariam as testemunhas e a notificação do sindicato.

A respeito da necessidade de que sejam preenchidos todos os requisitos mencionados no dispositivo legal em referência, cita-se acórdão lavrado pelo Exmo. Desembargador José Felipe Ledur nos autos do processo n. 0054500-85.2009.5.04.0641 (julgamento pela 1ª Turma deste Tribunal, em 27/04/2011), cujo excerto, abaixo transcrito, ora se utiliza como razões de decidir:

No presente caso, há contrato escrito celebrado entre as partes, com testemunhas, no qual é prevista a cessão de moradia e sua infra-estrutura básica ao autor (fl. 47). Contudo, o reclamado não comprovou que tal cessão tenha sido notificada ao sindicato de trabalhadores rurais correspondente. Trata-se de fato cujo ônus da prova era do reclamado (princípio da aptidão para a prova). A consequência da falta de comprovação, por força do dispositivo acima transcrito, é o reconhecimento da integração ao salário da moradia e infra-estrutura fornecidas. Não se trata de caso de aplicação da Súmula 367, I, do TST, tendo em vista a regulação especial da matéria no...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT