Acórdão nº HC 150924 / BA de T6 - SEXTA TURMA

Data04 Agosto 2011
Número do processoHC 150924 / BA
ÓrgãoSexta Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

HABEAS CORPUS Nº 150.924 - BA (2009⁄0204103-9)

RELATOR : MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)
IMPETRANTE : R.C. E OUTROS
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO
PACIENTE : M.M.R.D.B.
PACIENTE : EDGAR RIBEIRO DE BRITTO

EMENTA

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO. TRANCAMENTO. ADEQUAÇÃO TÍPICA DA CONDUTA. DOLO DOS ACUSADOS. INVIABILIDADE. EXAME APROFUNDADO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO. SÚMULA 438⁄STJ.

ORDEM DENEGADA.

1 - O réu defende-se dos fatos postos na denúncia e não da capitulação ali inicialmente indicada pelo parquet. Somente pelo detalhamento das provas, procedimento próprio da instrução criminal, é que se apontará com maior clareza qual era a real intenção e o tipo penal em que as condutas imputadas aos pacientes melhor se enquadram.

2 - Os pacientes foram acusados pelo crime de falsificação de documento público, consubstanciado na apresentação e juntada de uma Certidão do Cartório de Imóveis falsa em processo judicial. O Magistrado de primeiro grau, não verificou a ocorrência de nenhum dos núcleos do tipo penal previsto no artigo 179 do Código Penal - fraude à execução - e qualquer investigação sobre o dolo dos pacientes esbarra no óbice ao exame aprofundado do conjunto fático-probatório, procedimento incompatível com a estreita via do mandamus, que é caracterizado pelo rito célere e cognição sumária.

3 - O trancamento da ação penal em sede de habeas corpus é medida excepcional que somente pode ser deferida quando se mostrar evidente a atipicidade do fato, se verifique a absoluta falta de indícios de materialidade e de autoria do delito ou que esteja presente uma causa extintiva da punibilidade, hipóteses não encontradas no presente caso. Precedentes do STJ e do STF.

4 - O Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de não ser possível o reconhecimento da prescrição antecipada pela pena "virtual" por ausência de expressa previsão legal nesse sentido. Súmula nº 438⁄STJ.

5 - Habeas corpus denegado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

A Sra Ministra Maria Thereza de Assis Moura e os Srs. Ministros Og Fernandes, S.R.J. e V.D.G. (Desembargador convocado do TJ⁄RS) votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura.

Brasília (DF), 04 de agosto de 2011 (data do julgamento).

MINISTRO HAROLDO RODRIGUES

(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE)

Relator

HABEAS CORPUS Nº 150.924 - BA (2009⁄0204103-9)

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE): Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de M.M.R. deB. e E.R. deB., denunciados como incursos no art. 304, c⁄c o art. 297, ambos do Código Penal, apontada como autoridade coatoa o Tribunal Federal da 1ª Região, que denegou a impetração lá deduzida.

Buscam os impetrantes o trancamento da ação penal ao argumento de que "os fatos descritos na exordial acusatória consubstanciam, em tese, o delito do art. 179 do Código Penal" (fl. 5). Asseveram que, por se tratar de fraude contra a execução, crime cuja ação é pública de iniciativa privada, faltaria legitimidade ao Ministério Público para deflagração da persecução penal, devendo ser extinta a punibilidade pela decadência do direito de queixa.

Alegam, ainda, que, feita a adequação da conduta imputada à figura típica de fraude à execução, verifica-se a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva do Estado pela pena em abstrato, pois "o delito fora praticado em 03⁄10⁄1997, e a pena máxima cominada a este é de dois anos, operando-se, portanto, o termo do prazo prescricional em quatro anos, contados da ação ou omissão, nos termos do art. 109, V, do Código Penal" (fl. 24)

Por fim, caso rejeitados os pedidos anteriores, pleiteiam seja "reconhecida a ausência de interesse processual em virtude da prescrição pela pena antecipada para trancar a ação penal instaurada em desfavor dos pacientes" (fl. 37).

A douta Subprocuradoria-Geral da República, ao manifestar-se, opinou pela denegação da ordem.

Com a aposentadoria do Ministro Nilson Naves os autos foram a mim redistribuídos.

É o relatório.

HABEAS CORPUS Nº 150.924 - BA (2009⁄0204103-9)

VOTO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄CE) (RELATOR): Eis o teor da exordial acusatória:

"Conforme se verifica dos autos do Inquérito em anexo, havia sido ajuizada contra Agência Marítima Brunave Ltda., de propriedade dos pais dos denunciados, vultosa Reclamação Trabalhista proposta por Demonstenes Nascimento, que teve curso perante a 13ª Junta de Conciliação e Julgamento de Salvador, na qual referida empresa restou, ao final, sucumbente.

Assim, ante a iminência de que os bens da Brunave fossem submetidos a hasta pública, o Segundo Denunciado concebeu maquiavélico plano consistente em simular a transferência do patrimônio da mencionada pessoa jurídica para o nome de familiares, de sorte a blindá-lo dos efeitos da constrição judicial.

Deveras, no evolver das investigações restou apurado que os Embargos de Terceiros ajuizados, em outubro de 1997, pela Primeira Denunciada, através da advogada Sílvia Magalhães Sacramento (fls. 25⁄27), haviam sido instruídos com Certidões falsas, supostamente emitidas pelo Quarto Ofício de Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Salvador, das quais constava que a Agência Marítima Brunave Ltda., teria vendido, em janeiro de 1996 (fls. 29⁄31), à pessoa de Marcella Ribeiro de Brito, os bens imóveis objeto de penhora, em 07 de fevereiro de 1996, na mencionado Reclamação Trabalhista (fls. 28).

A falsidade foi comprovada não só através de diligência realizada pelo Juízo da 13ª Vara d Trabalho, junto ao Cartório do Quarto Ofício, que noticiou a inexistência de qualquer registro, naquela serventia, de alienação dos imóveis em favor de Marcella (fls. 36⁄37), bem assim mediante exame pericial (fls. 232⁄236).

Em depoimento prestado às fls. 56, M.M.R. deB. veio a declarar que, à época em que era sócia da empresa Agricervo - Comércio, Transporte e Navegação Ltda., pertencente ao mesmo grupo familiar da Agência Marítima Brunave Ltda., costumava assinar procurações para a Belª. Sílvia Magalhães Sacramento. Confirmou, ainda, que, em um determinado dia, referida advogada lhe solicitou que assinasse uma procuração, não informando, contudo, com que finalidade o instrumento de mandato seria utilizado.

Instada a depor, a Belª. Sílvia Magalhães Sacramento confirmou ter prestado serviços advocatícios para empresa Brunave. Destacou, entretanto, que toda a documentação de que se serviu para instruir a petição de Embargos de Terceiro lhe foi entregue por E.L., preposto da empresa. Salientou, ademais, desconhecer a pessoa de quem Edson recebeu tais Certidões (fl. 87).

Dando continuidade aos trabalhos investigatórios, foi o depoimento de E.L., que procurou se isentar de qualquer responsabilidade, afirmando supor que os imóveis descritos nas Certidões eram de propriedade de M.M.R. deB. Ressaltou, por outro lado, que foi informado pela pessoa de Edgard Britto, gestor da mencionada empresa, no sentido de que, como existia uma demanda trabalhista entre a Brunave e um ex-empregado de nome Demostenes Nascimento, estava transferindo o patrimônio da referida pessoa jurídica para familiares, lhe tendo, inclusive, afirmado que os imóveis a serem objeto dos Embargos de Terceiro haviam sido vendidos para Marcella Muniz de Britto (fls. 96).

Pois bem. Não há dúvida, a essa altura, da concepção de um maquiavélico plano, de especial interesse para os denunciados, filhos dos proprietários da Agência Marítima Brunave Ltda., onde trabalhavam - empresa que figurava como Reclamada na Ação nº 01.13.94.0266-03 -, objetivando subtrair o patrimônio daquela pessoa jurídica dos efeitos constritivos da respectiva execução trabalhista.

Registre-se que os bens penhorados naqueles autos, e que foram objeto dos Embargos de Terceiro opostos em nome de M.M.R. deB., tinham como fiel depositário, desde 7 de fevereiro de 1996, ninguém menos que o denunciado E.R. deB.N. (cf. fls. 12v e 28v), mesma pessoa que, segundo declarações prestadas por E.L. daS., lhe transmitira a informação de que os imóveis tinham sido vendidos para Marcella (fls. 96).

Em face do exposto, provada a responsabilidade de M.M.R. deB. e E.R. deB.N. nos fatos delituosos descritos nesta peça acusatória, que se enquadram no art. 304, c⁄c art. 297, ambos do Código Penal, requer o Ministério Público seja recebida a presente Denúncia e instaurada ação penal, citando-se os denunciados para responderem à acusação, por escrito, no prazo de 10 (dez) dias, prosseguindo-se o feito em seus ulteriores termos até final sentença condenatória, ouvindo-se, na instrução, as testemunhas adiante arroladas, tudo na forma da Lei nº 11.179, de 20.6.2008, que deu nova redação a dispositivos do Código de Processo Penal." (fls. 73⁄76)

Ao pronunciar-se sobre a Resposta Escrita apresentada pela defesa, no que interessa, disse o Juiz de primeiro grau:

"Da análise dos autos verifica-se que a presente ação penal objetiva apurar os delitos previstos nos artigos 304 c⁄c 297, ambos do CPB.

Após cuidadosa análise do feito, não vislumbro os requisitos expostos no art. 397 do CPP, a ensejar a decretação da absolvição sumária.

Senão vejamos:

(...)

II) Da adequação típica das condutas narradas pelo MPF

Segundo a defesa, o MPF equivocou-se ao tipificar as condutas imputadas aos acusados, uma vez que a narrativa fática constante da exordial consubstancia o delito previsto no artigo 179 do Código Penal, ou seja, Fraude à Execução. A defesa partiu da premissa de que a própria acusação afirmou que o dolo dos denunciados, ao supostamente se valerem de uma certidão falsa, seria o de subtrair o patrimônio da...

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