Decisão Monocrática nº 2011/0085926-2 de T2 - SEGUNDA TURMA

Número do processo2011/0085926-2
Data18 Outubro 2011
ÓrgãoSegunda Turma (Superior Tribunal de Justiça do Brasil)

RECURSO ESPECIAL Nº 1.255.352 - SC (2011/0085926-2)

RELATOR : MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI

RECORRENTE : UNIÃO

RECORRIDO : W.M.N.

ADVOGADO : JOSÉ SÍLVIO WOLF E OUTRO(S)

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. TERRENO DA MARINHA. TRANSFERÊNCIA DE IMÓVEL CONSTRUÍDO SOBRE TERRENO EM REGIME DE MERA OCUPAÇÃO. COBRANÇA DE LAUDÊMIO. LEGALIDADE. DECRETO-LEI 2.398/87, ART. 3º. PRECEDENTES DAS TURMAS DA 1ª SEÇÃO. ATUALIZAÇÃO. ART. 28 DA LEI N. 9.784/99.

CONTRADITÓRIO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. ART. 1º DO DECRETO N.

2.398/87. SIMPLES RECOMPOSIÇÃO PATRIMONIAL. MATÉRIA DECIDIDA PELA PRIMEIRA SEÇÃO, NO RESP 1.150.579/MG, MIN. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJE DE 17/08/2011, JULGADO SOB O REGIME DO ART. 543-C DO CPC.

ESPECIAL EFICÁCIA VINCULATIVA DESSE PRECEDENTE (CPC, ART. 543-C, § 7º), QUE IMPÕE SUA ADOÇÃO EM CASOS ANÁLOGOS.

RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO

DECISÃO

  1. Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido em demanda visando à declaração de inexigibilidade do laudêmio. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu que "como a posse precária, sem o domínio útil, não é compreendida no texto legal vigente que disciplina a matéria, carece de pressuposto legal a intenção de cobrar laudêmio sobre a transferência de benfeitorias construídas por ocupantes em terrenos de marinha" (fl. 120). Opostos embargos de declaração (fls. 124/127), restaram parcialmente

    providos para fins de prequestionamento (fls. 128/133).

    Nas razões do recurso especial (fls. 138/151), a recorrente aponta ofensa aos seguintes dispositivos: (a) art. 535, II, do CPC, pois, mesmo com a oposição dos embargos de declaração, não foram sanados os vícios apontados; (b) art. 3º do Decreto-Lei 2.398/87, porque (I) "como restou inequivocadamente demonstrado nos autos, o imóvel em questão está situado em terreno de marinha e em relação a este fato é cobrada taxa de ocupação" e (II) "a transferência onerosa de direitos sobre terrenos da União é fato gerador para a incidência do laudêmio" (fls. 141/142); (c) arts. 67 e 101 do Decreto-Lei 9.760/46 e art. 1º, I, II, do Decreto-Lei 2.398/87, ao argumento a

    atualização da taxa de ocupação deve ser correspondente ao valor do domínio pleno do bem; (d) arts. 11 e 12 do Decreto-Lei 9.760/46, alegando que a comunicação do processo administrativo somente pode ser feita por edital. Sem contra-razões (fls. 153).

  2. Não há nulidade por omissão no acórdão que, mesmo sem ter examinado individualmente cada um dos argumentos trazidos pelo vencido, decide de modo integral e com fundamentação suficiente a controvérsia posta. No caso dos autos, o Tribunal de origem julgou, com fundamentação suficiente, a matéria devolvida à sua apreciação.

  3. Acerca da controvérsia autos, reporto-me ao voto proferido no REsp 1.222.761/SC (DJe de 25/02/2011), julgado pela 1ª Turma, no qual fui relator:

  4. Dispõe o art. 3º do Decreto-Lei 2.398/87:

    "Art. 3º Dependerá do prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias, a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil de terreno da União ou de direitos sobre benfeitorias neles construídas, bem assim a cessão de direito a eles relativos." A interpretação desse dispositivo tem sido objeto de controvérsia no âmbito da 1ª Seção. Há julgados entendendo que a referência a "direitos sobre benfeitorias neles construídas" (a) diz respeito apenas a construções sobre terrenos de marinha cujo aforamento está devidamente formalizado em nome do alienante; e há outra corrente segundo a qual (b) diz respeito a construções sobre qualquer terreno de marinha, mesmo em regime de mera ocupação. De acordo com primeira linha de entendimento são os seguintes julgados:

    ADMINISTRATIVO. TERRENO DA MARINHA. LAUDÊMIO. ENFITEUSE. NÃO

    OCORRÊNCIA. DECRETO-LEI 2.398/87. NÃO PAGAMENTO. MERA OCUPAÇÃO.

    RECURSO NÃO PROVIDO.

  5. A enfiteuse ou aforamento, modalidade de direito real sobre coisa alheia, consiste na divisão do domínio em direto, exercido pelo proprietário ou senhorio, e útil, transmitido ao enfiteuta ou foreiro, que fica obrigado ao pagamento de uma pensão anual ou foro.

  6. Tratando-se de direito real de caráter perpétuo, o domínio útil é passível de transação onerosa, hipótese em que, caso não seja exercido o direito de opção pelo senhorio direto, será devido pelo enfiteuta o pagamento do laudêmio.

  7. O art. 3º do Decreto-Lei 2.398/87 dispõe que o pagamento de laudêmio sobre terreno da União, correspondente a 5% do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias nele realizadas, somente é devido na hipótese de constituição de enfiteuse.

  8. Não tendo havido na hipótese dos autos a enfiteuse, mas a mera ocupação de terreno da Marinha, conforme restou destacado pelas instâncias ordinárias, não há como submeter a alienação do imóvel ao prévio pagamento de laudêmio. Precedente do STJ.

  9. Recurso especial não provido.

    (REsp 1.128.194/SC, 1ª Turma, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe de 22/09/2010)

    PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC.

    INOCORRÊNCIA. BENS PÚBLICOS. LAUDÊMIO. MERA TOLERÂNCIA. OCUPAÇÃO DE TERRENO DE MARINHA. INEXISTÊNCIA DE DESDOBRAMENTO DA POSSE, DE CONTRATO OU DE TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO ÚTIL A TÍTULO ONEROSO.

    NÃO-CABIMENTO DE LAUDÊMIO.

  10. Os órgãos julgadores não estão obrigados a examinar todas as teses levantadas pelo jurisdicionado durante um processo judicial, bastando que as decisões proferidas estejam devida e coerentemente fundamentadas, em obediência ao que determina o art. 93, inc. IX, da Lei Maior. Isso não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

  11. Pacífico nesta Corte Superior o entendimento segundo qual, em caso de ocupação irregular de terreno de marinha por mera tolerância da União, é incabível a cobrança de laudêmio pela transferência da detenção. Precedente: REsp 926.956/RS, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 17.12.2009.

  12. Recurso especial provido.

    (REsp 1.108.953/SC, 2ª T., Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 10/09/2010)

    Adotando a segunda linha de entendimento, a 1ª Turma, no julgamento do REsp 1.143.801/SC (Relator p/ Acórdão Min. Luiz Fux, DJe de 13/09/2010), por maioria, decidiu que "a transferência onerosa de quaisquer poderes inerentes ao domínio de imóvel da União condiciona-se ao prévio recolhimento de laudêmio ". Este julgado restou assim ementado:

    PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. TERRENO DE MARINHA. TRANSMISSÃO DE OCUPAÇÃO. PAGAMENTO DE LAUDÊMIO. LEGALIDADE.

    ARTIGO 3.º, DO DECRETO-LEI N.º 2.398, DE 21.12.1987.

  13. O artigo 3.º, do Decreto-lei n.º 2.398, de 21 de dezembro de 1987, dispõe que:

    "Art. 3° Dependerá do prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento) do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias, a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil de terreno da União ou de direitos sobre benfeitorias neles construídas, bem assim a cessão de direito a eles relativos." 2. Consectariamente, a transferência onerosa de quaisquer poderes inerentes ao domínio de imóvel da União condiciona-se ao prévio recolhimento de laudêmio. Isto porque, não obstante o instituto do laudêmio estivesse intimamente vinculado ao domínio útil, a novel lei ampliou-o para alcançar, também, a transferência onerosa de qualquer direito sobre benfeitorias construídas em imóvel da União, bem como a cessão de direitos a ele relativos.

  14. In casu, a parte autora alega ser proprietária de dois imóveis situados em terrenos de marinha e que se viu obstada de lavrar as competentes escrituras de venda e compra dos referidos imóveis, os quais são utilizados em regime de ocupação, porque lhe fora exigido o pagamento de taxa de laudêmio, aduzindo, assim, ser incabível tal cobrança, por não se tratar de hipótese de transferência do domínio útil do imóvel, vinculada ao aforamento ou à enfiteuse, mas

    tão-somente de cessão de direito, por tratar-se de mera ocupação, não sujeita à cobrança de laudêmio.

  15. É lícito à norma erigir figuras assemelhadas sujeitas ao

    laudêmio, posto obedecido o princípio da legalidade e a

    indisponibilidade dos bens ou faculdades inerentes à titularidade do domínio público.

  16. Recurso especial conhecido e provido, divergindo do E. Relator.

    Na mesma linha decidiu também a 2ª Turma no REsp 1.128.333/SC, Min. Herman Benjamin, DJe de 30/09/2010:

    DIREITO ADMINISTRATIVO. OCUPAÇÃO DE IMÓVEL LOCALIZADO EM TERRENO DE MARINHA. ALIENAÇÃO DE CONSTRUÇÃO. INCIDÊNCIA DO LAUDÊMIO.

  17. Pela ocupação de imóvel da União, localizado em terreno de marinha, é devida apenas a taxa prevista no art. 127 do Decreto-Lei 9.760/1946.

  18. Diferente, contudo, é a situação em que o ocupante pretende transferir a terceiros, mediante alienação a título oneroso,

    apartamento construído no referido imóvel. Nesse contexto, viável a cobrança de laudêmio, conforme expressamente previsto no art. 3º do Decreto-Lei 2.398/1987, que deu nova redação ao art. 130 do

    Decreto-Lei 9.760/1946, e nos arts. e do Decreto 95.760/1988.

  19. Inaplicável o entendimento de que o laudêmio somente pode ser cobrado na transferência do imóvel aforado, nos termos do art. 686 do Código Civil, porque os imóveis localizados em terreno de marinha encontram-se sujeitos ao regime jurídico administrativo, sendo disciplinados por legislação específica, total ou parcialmente derrogatória dos princípios e dos institutos de Direito Privado.

  20. Recurso Especial provido.

    O Ministro Herman Benjamin, que defendia a primeira corrente, nessa oportunidade modificou seu ponto de vista pelas razões assim alinhadas:

    Em primeiro lugar, penso que não é o caso de aplicar, genericamente, o art. 686 do Código Civil, tendo em vista que o instituto da ocupação de terreno de marinha está inserido no regime jurídico administrativo, o qual, conforme a melhor doutrina, pode se utilizar de institutos do Direito Privado, com adaptações em função das peculiaridades do caso concreto e dos princípios da supremacia e da indisponibilidade do...

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