Acórdão nº 0007970-50.2005.4.01.3900 de Tribunal Regional Federal da 1a Região, Terceira Turma, 18 de Octubre de 2011

Magistrado ResponsávelDesembargador Federal Tourinho Neto
Data da Resolução18 de Octubre de 2011
EmissorTerceira Turma
Tipo de RecursoApelação Criminal

Assunto: Peculato (art. 312, Caput e § 1º) - Crimes Praticados por Funcionários Públicos Contra a Administração em Geral - Direito Penal

APELAÇÃO CRIMINAL 0007970-50.2005.4.01.3900 (2005.39.00.007980-8)/PA Processo na Origem: 79705020054013900

RELATOR: JUIZ TOURINHO NETO

APELANTE: ALDEMAR DE DEUS DO ESPIRITO SANTO JUNIOR

ADVOGADO: AIRTON JOSE DE VASCONCELOS E OUTROS(AS)

APELADO: JUSTICA PUBLICA

PROCURADOR: UBIRATAN CAZZETA

ACÓRDÃO

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, para diminuir a pena e substituir a pena privativa de liberdade por 02 (duas) restritivas de direito.

Brasília, 18 de outubro de 2011.

Juiz TOURINHO NETO Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. JUIZ TOURINHO NETO (RELATOR):

  1. Trata-se de apelação criminal interposta por ALDEMAR DE DEUS DO ESPÍRITO SANTO JÚNIOR contra sentença proferida pelo Juiz Federal da 4ª Vara da Seção Judiciária do Pará, Antônio Carlos A. Campelo, que o condenou à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 91 (noventa e um) dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente à época do fato, pela prática do delito previsto no art. 312 c/c o art. 71, ambos do CP.

  2. Narra a denúncia que (fls. 02/10):

    [...] Segundo as apurações encetadas no âmbito da ECT, o denunciado, assistente administrativo, lotado na Seção de Manutenção e Operações de Veículos da Gerência de Transportes/PA (SMOV/GETRA/PA), designado para realizar atividades de legalização de veículos da ECT, junto ao DETRAN, teria se utilizado indevidamente de serviços de corretagem (despachantes) no licenciamento de veículos, causando prejuízos à empresa. As irregularidades ocorreram nos anos de 1996 e 1997.

    Era, o denunciado, o responsável pela programação mensal dos veículos que deveriam ser licenciados, repassando os valores das despesas a serem efetuadas ao Chefe da SMOV/GETRA para providenciar a emissão das Autorizações de Pagamento.

    Para efeito de entendimento, cumpre mencionar que a movimentação dos recursos financeiros para pagamento dos licenciamentos de veículos da ECT, para que chegassem ao denunciado, seguiam o seguinte iter: eram emitidas autorizações de pagamentos - AP's (adiantamentos) para outros empregados (ou para o próprio investigado), os quais repassavam os valores diretamente para o denunciado, que deveria apresentar a comprovação das despesas, as quais eram atestadas pelos destinatários das AP's. Toda a documentação deveria ser entregue ao chefe imediato do denunciado - CARLOS ALBERTO LIMA BARROS, a quem cabia apresentá-la à Gerência Financeira.

    Nesse contexto, os fatos vieram à tona apenas em dezembro de 1997, quando o empregado DAVID DE QUEIROZ BEZERRA, Chefe da Seção de Manutenção e Operações de Veículos - SMOV/GETRA, a quem o Chefe Imediato do denunciado, CARLOS ALBERTO LIMA BARROS, era subordinado, recebeu a AP n° 97/6352.

    A Gerência Financeira - GEFIN cobrou de DAVID QUEIROZ a comprovação da AP, tendo este interpelado ALDEMAR sobre os comprovantes dos serviços realizados, os quais lhe foram entregues apenas no último dia do prazo fixado pela GEFIN.

    Ao atestar os comprovantes, estranhou a apresentação de um recibo no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) referente a serviços prestados por despachante, posto que o denunciado era designado para a realização dos serviços de selagem e licenciamento de veículos junto ao DETRAN.

    Questionado formalmente sobre os fatos, o denunciado confirmou que o recibo era de fato referente a serviços de corretagem, ressaltando que no valor ali expresso estavam incluídas despesas com vistoria dos carros pesados, inclusive das unidades do interior do Estado do Pará e Amapá, capas para montagem de processos de licenciamento, além de outras despesas que não aparecem nas guias de recolhimento.

    Disse não possuir a mesma habilidade de um corretor profissional para desembaraçar algumas situações burocráticas junto ao DETRAN. Alegou que a utilização dos serviços de despachantes era do conhecimento da Gerência de Transportes.

    [...] Foram colhidas declarações de vários empregados do mesmo setor do denunciado, sendo todos uníssonos em afirmar que era ALDEMAR o único responsável pelo licenciamento de veículos, a quem eram entregues os valores destinados para esse fim.

    [...] Instado a prestar esclarecimentos, MAURÍCIO COELHO MADUREIRA, então Gerente de Transportes, negou qualquer ordem para utilização de serviços de corretagem no licenciamento de veículos, tendo informado haver expedido uma CI, no mês de agosto/97, solicitando à SMOV/GETRA que todas as comprovações de despesas de adiantamentos passassem obrigatoriamente pelo Gerente de Transportes para serem visadas, situação que não ocorreu com as comprovações de despesas de licenciamento de veículos que eram entregues diretamente na GEFIN. sem passar nem pelo Chefe da SMOV/GETRA.

    MAURÍCIO MADUREIRA admitiu a existência de estudo para verificar a viabilidade de contratação de serviços de despachantes de veículos, o que não se concretizou em razão da falta de uma tabela por parte de despachantes autorizados pelo DETRAN (fls. 115/116).

    A conclusão da Sindicância foi de que ALDEMAR JÜNIOR incorreu em faltas graves, onerando dolosamente as despesas com licenciamento de veículos - valores superfaturados, correspondentes aos anos de 1996 e 1997, mediante ocultação de documentos à sua Chefia e falsificação de assinaturas, tendo sido demitido por justa causa em 13.07.1998 (fls. 441), bem como responsabilizado pela quantia de R$ 33.462,87 (trinta e três mil, quatrocentos e sessenta e dois reais, e oitenta e sete centavos). [...].

  3. Entendeu o MM. Juiz a quo que a materialidade do delito está concretizada nos autos: pelo procedimento administrativo de fls. 17/348, elaborado pelos Correios, o qual indica o prejuízo suportado pela ECT de R$ 33.462,87 (trinta e três mil, quatrocentos e sessenta e dois reais e oitenta e sete centavos), bem como pelo acórdão nº 721/2003, lavrado em desfavor do acusado pelo Tribunal de Contas da União.

    Disse que a autoria está demonstrada: pelos testemunhos de CARLOS BARROS e JOSÉ MARIA FILHO, também funcionários dos Correios, os quais foram uníssonos ao afirmar (fls. 650) que cabia ao réu licenciar veículos junto ao DETRAN/PA, sendo ele o responsável pela contratação dos serviços de corretagem; pelo testemunho de DAVID DE QUEIROZ (fls. 650), que afirmou que os recibos utilizados na prestação de contas eram apresentados à chefia imediata pelo acusado; pelo laudo de exame documentoscópico n° 287/98, no qual está assentado que as rubricas apostas no campo "assinatura do chefe imediato", nos documentos de fl. 35, 36, 37, 40, 45, 46 e 47, denominados "comprovação de despesas", partiram do punho do réu (fls.

    101/105, Vl. I do Apenso I); e pelo laudo de fls. 687/697 (n° 1.152/2009).

    Afirmou que não aproveita ao réu a alegação de que tinha autorização superior para usar os serviços de despachantes, porque a existência ou não desse consentimento não justifica o superfaturamento dos valores detectados. Entendeu que, pelo mesmo motivo, não pode ser beneficiado pelo argumento de que a sua principal atividade estava relacionada com o controle das atividades dos motoristas. Diante disso, condenou o réu (fls. 720/726).

  4. Em seu apelo, o réu aduz que o processo é nulo, pois não se configurou o crime constante na denúncia, eis que ele não se envolveu em empreitada criminosa, mas apenas procedeu à boa execução de seu trabalho, com o conhecimento dos seus chefes, haja vista que a execução dos serviços de plaqueamento dos veículos no DETRAN, com chancelamento dos Correios, ocorreu com a anuência dos seus respectivos diretores, que estavam cientes do trabalho que era realizado, inclusive, com suas respectivas assinaturas nos referidos documentos. Assim, agiu no estrito cumprimento do seu dever legal.

    Salienta que não houve a comprovação de utilização de valores para a execução de um serviço ou de vários serviços de emplacamento de carros para os Correios, ou de serviços realizados junto ao DETRAN, correspondentes à alegada vantagem indevida. Afirma que os laudos de exame documentoscópico e os laudos dos exames grafotécnicos nada comprovaram e que há no processo apenas presunções e simples indícios, os quais não servem para uma condenação criminal. Diz que os depoimentos trazidos pela acusação nada provam contra ele, de modo que deve ser aplicado o princípio "in dubio pro reo".

    Afirma que, se houve alguma vantagem, ela foi devida e justa em razão dos serviços que realizou junto ao DETRAN e outros órgãos com a anuência de seus chefes, de modo que se aplica ao caso o delito de exercício arbitrário das próprias razões, previsto no art. 345 do CP.

    Assevera que, como reconhecido na sentença, é primário, também é trabalhador, é pai de dois filhos e tem residência fixa no distrito da culpa, razão pela qual não se justifica a fixação de sua pena acima do mínimo-legal. Além disso, não houve a correta fundamentação legal da pena, na forma do art. 59 do Código Penal Brasileiro e do art. 93, IX, da Constituição Federal.

    Requer a declaração de nulidade da sentença; ou sua absolvição, por falta de provas e contradições entre as vítimas; ou a fixação da pena no mínimo-legal, em razão da ausência da correta fundamentação legal (fls.

    732/743).

  5. Em contra-razões, o Ministério Público Federal disse que não houve nulidade absoluta do processo ante a inexistência de defesa, pois em todo o feito o réu foi acompanhado de advogado, sendo, portanto, garantido o seu direito à ampla defesa e ao contraditório. Aduz que a materialidade e autoria do delito estão devidamente demonstradas nos autos.

    Afirma que a situação não se subsume ao art. 345 do CP, haja vista que não há pretensão legítima a ser satisfeita pelo réu e que a pena aplicada não merece reparo. Requer o não provimento do recurso de apelação (fls. 748/751).

  6. Nesta Instância, o Ministério Público Federal, pela Procuradora Regional da República Adriana Costa Brockes, opina pelo não...

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